Acredito piamente que o ser humano é um ser de hábitos. Temos o hábito de ver determinados canais de televisão (por isso as emissoras relutam em mudar o número ou passar para a frente na grade), ouvir certas emissoras de rádio (OK, A Voz do Brasil não conta) e, no geral, adotar rotinas. Mesmo quem jura de pé junto que é rebelde, que não gosta de trabalhar de terno e gravata ou dentro de um escritório, adota outras rotinas mesmo sem perceber. Com o ato de dirigir é a mesma coisa.
Quando aprendemos a conduzir um carro geralmente o fazemos em carros de câmbio manual. E aprendemos a trocar de marcha cada vez que o motor atinge determinado número de rotações. Mesmo sem que notemos, o ouvido se acostuma e passamos marcha sem nem perceber que o fazemos ou sem olhar para o painel.
Eu só pude ir para o banco da frente com doze anos de idade. Até lá, apesar de meus pais serem motivo de chacota, banco de trás. Minha mãe nem ligava quando ouvia “você parece motorista da sua filha”. Por quê? Porque eles sabiam que era pela nossa segurança. Mesma coisa para o cinto de segurança. Em casa nunca teve democracia para isso. Estava mais para stalinismo brabo. Era usar ao entrar no carro e pronto. Não se discutia, mesmo quando não era obrigatório. Mas isso ficou tão incorporado em meu comportamento que quando tirei carteira e comecei a dirigir fiz a mesma coisa. E sempre obriguei meus passageiros a usá-lo. Afinal, se estou levando alguém, sou responsável por essa pessoa. Nunca obriguei ninguém a usar cinto no próprio carro, embora me desse um pouco de aflição ver alguém sem usá-lo, mas meu carro, minhas regras.
Quando meu famoso tio César, aquele que tinha um Torino, ensinava o primo dele a dirigir eu ia junto. Era bem mais nova, mas esticava a orelha e prestava atenção, pois ele até hoje é um baita volante, sem dúvida uma das pessoas que melhor dirige que eu conheço. Uma das coisas que ele ensinou ao primo e aos próprios filhos foi ao chegar perto de uma travessia ferroviária desligar o rádio, abrir a janela e escutar para ver se vem a composição, além de olhar para os dois lados. Parece bobagem, mas em Buenos Aires tem muito trem que cruza a cidade e outra lição dele foi não confiar nas cancelas. Estou tão acostumada que quando viajo faço a mesma coisa. Vai que o fabricante da cancela é argentino e ela não funciona direito? Meu marido me acha louca (por esse e por outros motivos) mas não consigo mudar minha atitude. E quando se trata de segurança no trânsito acho que nunca é demais.
O mesmo se aplica ao uso dos espelhos. Sempre na posição correta e sempre de olho neles. E não importa se passar por cima da faixa zebrada é proibido. Eu presumo que alguém vai fazê-lo e não deixo de olhar para os lados – e na maioria das vezes isso acontece mesmo. E bicicleta? Aprendi com meu pai a passar a uma distância suficiente para o ciclista cair e eu não passar por cima dele. Ele sempre me disse: “Conte com que ele vai cair”. Claro que com o passar do tempo adotei a mesma filosofia em relação às motos – se bem que aí são eles os que se jogam sobre os carros e pouco podemos fazer, especialmente quando passam entre as faixas, mas tento deixar espaço para ele cair, digamos, com segurança.
E o que dizer de vias preferenciais? Exceto meus queridos leitores e mais uma dúzia de pessoas, poucos realmente sabem qual rua é preferencial mesmo quando está indicado e menos ainda param para dar passagem para quem transita por ela. Resultado: temos de diminuir a velocidade sempre, pois a chance de o outro não parar é enorme. Já perdi a conta de quantas vezes mostrei para outro motorista a placa de “Pare” num cruzamento em que eu estava na preferencial e o indigitado não fazia menção de frear.
Eu já entrei em contato algumas vezes com empresas que mostram em publicidades, por exemplo, um carro ultrapassando outro bem no lugar onde tem uma claríssima faixa dupla contínua amarela. Pensei em avisar a Vivo sobre o anúncio que estão veiculando em que um skatista desce uma estrada de mão dupla, faixa simples em cada sentido, costurando de um lado ao outro e passando diversas vezes por cima da famigerada faixa dupla contínua amarela. Custa gravar o mesmo comercial numa estrada dupla de mão única com faixa branca intermitente? Ou usar o PhotoShop para apagar as provas do crime, ops, quer dizer, da infração? Não, né?
Tenho certeza que somente o dia em que formarmos motoristas que desde pequenos vejam atitudes assim teremos menos acidentes e um trânsito mais seguro.
Mudando de assunto – Já vi em outros países a instalação de vias exclusivas para ônibus com bons resultados. O problema é que em São Paulo a falta de planejamento é total e os motivos são escusos. Pouco antes das eleições foi liberado o acesso de táxis aos corredores com o argumento de que como não há paradas para subida ou descida de passageiros não atrapalham os coletivos. Ora, se a lógica é essa, liberem para carros de passeio que também não recolhem gente!
NG