Algum tempo atrás, minha esposa solicitou um segundo automóvel para atividades rotineiras. Com o orçamento limitado e pouca disponibilidade de crédito com juros razoáveis, acabei negociando com minha mana uma condição especial para adquirir a Maria Eugênia, que estava encostada na garagem a maior parte do tempo e já fazia parte da família havia vários anos.
Adquirida inicialmente por meu cunhado de seu mano em condições similares, havia passado de mão em mão por três dos cinco irmãos, eu seria o quarto. Obviamente, já era batizada, porém apelidada de Geniosa devido à sua forte personalidade. De origem ítalo-brasileira, orgulhava-se de ser do tipo perua em extinção e tinha um coração que não cabia no peito.
Decidi buscá-la em um fim de semana que se tornou inesquecível. Depois de uma amistosa carona de 1.000 km e jantar com vários loucos amantes do esporte a motor, conheci pessoalmente um dos meus ídolos e constatei prazerosamente o óbvio ululante. Dia seguinte, mala pronta , muita estrada, nada iria estragar meu dia. Nem o cansaço que chegou, o rádio que pifou, o ar-condicionado que parou, escapamento que furou, nem a feição da patroa quando viu a viatura e não aprovou.
Depois de exames de rotina e recuperação dos malefícios da ociosidade, constatou-se um vício difícil de ser tratado. A bebedeira, que de tanta já me deixou em situações constrangedoras, de ter que carregá-la algumas vezes para o posto. Outra chatice é o metódico hábito para despertar e a marcha-lenta irregular. Doutores brasileiros e argentinos foram consultados sem sucesso, é um caso perdido.
Se que vaso ruim não quebra, este ditado não se enquadra á Maria Eugênia. Certa vez, em terras sul-mato-grossenses, sofreu com o calor e resolveu parar. Quando chegou o socorro, fez sua assistência também parar e exigir ajuda. Ao sair da oficina, não reagia e precisou de energia para abrir os olhos e logo em seguida teve uma pequena hemorragia que quase incendiou sua alma. Essa é só uma das histórias.
Apesar das pirraças, seu espírito é bastante aventureiro. Juntos percorremos milhares de quilômetros para destinos variados, deslocando todo tipo de carga, especialmente malas, bicicletas, cachorros, churrasqueira, móveis e tudo mais o que uma família precisa deslocar em suas viagens.
Não é de muita paparicarão, mas trata bem suas visitas e oferece boa recepção. É comportada em ritmo moderado, mas adora uma folia. Quando sobe o giro, sai de baixo, empurra o que tiver pela frente e chega a preocupar pela falta de discernimento quando peço para parar.
Atualmente exerce um papel importante em nossa família e tem sido única responsável pela área de transporte. Não está bem cotada em manter o cargo por muito tempo, até porque, suas exigências estão ficando cada vez mais altas e estão ficando fora dos padrões. Mas até que chegue o momento de decidir quem virá a sucedê-la, vamos curtindo dia após dia, cada um deles com um causo diferente.
RA
Fotos: autor
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