Apesar de já termos feito uma matéria bem completa do Renault Sandero R.S. , quando com ele pegamos estrada e também o exploramos numa pista, cá de novo estou com ele, só que para uma semana de “convivência pacífica” na cidade, no trânsito, no “uso civil”. Afinal, essa é a proposta do Sandero R.S., um hatchback esportivo de verdade que, além de preencher nossos anseios por emoção, também supre nossas necessidades corriqueiras de comodidade e praticidade.
Acho importante esse dia-a-dia, porque alguns carros, assim como algumas pessoas, muitas vezes são muito agradáveis num certo lugar, numa certa hora ou situação, porém são inconvenientes para a convivência diária. É como diz a lenda da amante argentina, uma companhia que deve proporcionar prazerosas noites de farra ao desavisado, mas que provavelmente lhe causará embaraços com escândalos, rejeição da família, além de pulverizar seu saldo bancário num estalar de dedos. Pode até valer a pena, mas…
Esse não é o caso do Sandero R.S. Ele não é uma amante argentina. Além de toda ótima esportividade que demonstrou quando com ele pegamos estradas sinuosas e a pista de corrida do Haras Tuiuti, ele agora evidenciou que também se porta bem no dia-a-dia. É dócil, comportado, não é escandaloso, é até discreto, não nos causa embaraços, a família o aceita bem, e não tem nada que indique que acarretará em despesas superiores às de outro carro nacional, não esportivo, e de semelhante porte e cilindrada. É dos raros que proporcionam muito prazer sem nos causar peso na consciência.
Na cidade fez, segundo o computador de bordo, médias entre 6 e 7 km/l de álcool, dependendo do trânsito. Na estrada, 9,5 km/l, mesmo combustível.
A suspensão é um pouco dura, sim, já o havíamos apontado. Para cidades cujo asfalto das ruas foi abandonado de vez, como São Paulo, a suspensão do RS é daquelas que quando estamos sozinhos não há inconveniente algum, apesar de ser preciso um pouco mais de cuidado em evitar buracos, dirigir um pouco mais devagar em trechos mal remendados etc., isso muito devido aos pneus de perfil baixo, 205/45R17. Com pneus assim, de perfil similar, não tem jeito, é preciso cuidado.
Na verdade, essas rodas aro 17 e pneus condizentes, é o único opcional oferecido, pois de série ele tem rodas aro 16 e pneus 195/55R16, iguais às do Sandero GT Line. O comprador deve pesar os prós e contras entre um e outro em vista do uso que pretende fazer do carro. Que faz diferença, faz. Com os de aro 17 o R.S. terá reações mais rápidas e maior aderência lateral e longitudinal. Com os de aro 16 terá mais maciez e despreocupação com buracos, pedras etc. Não o dirigi com rodas aro 16, mas essas diferenças são esperadas.
Essa dureza da suspensão não é tanta e só incomoda um pouco ao levar pessoas cujo perfil é dos que não abrem mão do conforto em favor de esportividade. Por exemplo, senhoras. Saí uma noite com minha mulher e minha mãe e notei que elas, conversadeiras, ao tomarem pequenos solavancos devido à suspensão um pouco dura, às vezes sofriam interrupções nas suas frases. Os pequenos solavancos, diga-se, não foram suficientes para lhes atrapalhar a conversa. Só ao chegar lhes perguntei:
— Um pouco durinho de suspensão, não é?
— É, sim, um pouco durinho. Aquele outro carro, o que você estava testando na semana passada, era bem mais macio, mas, tudo bem.
Elas, como se vê, certamente prefeririam que o R.S. estivesse com rodas aro 16.
Ele, mesmo tendo um vão-livre do solo bem menor que o Sandero “comum” (é 2,6 cm mais baixo), não raspou a frente e nem o fundo em lombadas, e também não raspou a frente em entradas e saídas de garagens de prédios com rampas bastante acentuadas; mais uma prova da desnecessidade dessa mania de erguer tanto os carros brasileiros. Fora que ele ficou bem mais bonito estando na altura certa, a altura que serviu de base para seus designers o desenharem. E, interessante, muita gente veio perguntar que carro que era, pois só o fato de rebaixá-lo — ou melhor, “deserguê-lo” — já mudou o aspecto do Sandero a ponto até de confundir as pessoas, que não o reconheciam. Ah! E todos o acharam lindo, muito mais bonito que o Sandero “comum”. Melhor ainda ficaria sem as faixas adesivas laterais. Acho que ficaria mais chique. Mas isso é gosto meu.
As perguntas que vinham eram das mais inesperadas, tipo:
— O motor é dois-ponto-zero?
— Isso, é um dois litros — resposta.
— Então é dois ponto zero? É? — ele entendendo sem entender o que é ponto e muito menos que tais de litros são esses.
— É. E a suspensão foi toda modificada. Um acerto perfeito e… — eu aqui tentando explicar o que é esse carro, mas sendo interrompido por comentários de alguém que não está me escutando.
— Puxa! E cada rodona preta linda! — o admirado perguntador que não é escutador de respostas.
— Sim. Rodas lindas — comentando, mas já desanimado.
A conclusão é que, se for para ficar ouvindo o que as pesquisas de opinião indicam, para então, a partir delas, construir um esportivo, o produto vai sair mais outro que dá a impressão de ser, mas que não é; será mais um capado com pinta de garanhão. Se pretendem fazer um esportivo de verdade, um que agrade os que realmente gostam e entendem de esportivos, então que consultem só os do ramo. A Renault fez bem. Delegou o Sandero R.S. para a divisão Renault Sport, que é do ramo. Confiou no taco e fez como devia.
Com esse motor de 150 cv a 5.750 rpm e 20,9 m·kgf a 4.000 rpm (álcool) o Sandero RS ficou um canhãozinho. O carro lhe é leve, as marchas são curtas e bem próximas umas das outras, daí que ele parte feito uma bala. Larga rápido. O giro pouco cai nas subidas de marcha e isso deixa muito gostosa a sensação de ir metendo marcha atrás de marcha. Também isso é gostoso mesmo as fazendo em giro baixo. O motor é elástico, o ronco é grosso, gutural, e já em baixíssimo giro disponibiliza farta potência. Basta vermos um trechinho livre, que dá para darmos uma acelerada, que lá vem a acelerada. A gente vicia nesse prazer que ele dá.
Para rodarmos civilizadamente pela cidade, com o tráfego fluindo, acaba sendo muito comum pularmos marcha, tipo 1ª,3ª e 5ª, ou 1ª, 2ª, 4ª, e 6ª. O motor não dá a mínima bola para isso e segue levando seu leve fardo com uma mão às costas. Claro, o fato de as relações serem mais próximas que a média encontrada por aí ajuda nesse caso. Os passageiros também nem percebem que estivemos pulando marcha.
A direção não é leve. Mesmo tendo assistência eletroidráulica indexada à velocidade, na cidade ela não fica leve demais. Fica firme, consistente, do jeito de particularmente gosto. Sente-se ter um carro nas mãos e não um volante solto tipo o desses de jogos eletrônicos. Calibração ideal para um esportivo. Eles (a Renault Sport) cuidaram bem disso.
A posição de guiada, que no Sandero “comum” não me é ideal, principalmente por não ter regulagem de distância de volante, no R.S., apesar de também não tê-la, logo me encaixei com perfeição. Os bancos são diferentes, esportivos, e vem daí esse melhor posicionamento. Mesmo assim, por ser um esportivo, deveria ter regulagem de distância do volante.
Os instrumentos são escuros, é impossível lê-los de dia quando se está de óculos de sol e têm muitos traços, o que dificulta uma rápida leitura. É algo que precisa ser resolvido, pois é estranho ter de ligar luzes para que os instrumentos fiquem iluminados.
A dureza fica por conta de controlar a ansiedade de pegar uma estrada com ele. Ele a fica pedindo quase o tempo todo. Fica pedindo aceleradas fortes esticando cada marcha e, principalmente, implora por curvas, coisa que faz com maestria. O acerto de suspensão pela altura correta, a troca das molas dianteiras e traseiras, a troca da barra estabilizadora dianteira e colocação de uma, interna, no eixo traseiro, os excelentes pneus, entre outras coisas, lhe deram um adorável comportamento.
Nas tomadas de curva a frente entra rápida e ele logo se apoia muito equilibrado entre dianteira e traseira. Avisa com boa antecedência quais são os seus limites. Excelente tração nas saídas de curva e nas largadas parado também.
Na estrada, nas retas, é sólido, grudado no chão, e assim vai até sua velocidade final: sólido, seguro.
O comando do câmbio, a cabo, está perfeito, com engates precisos e justos, tipo carro de corrida. A modulação dos quatro freios a disco é perfeita. O posicionamento dos pedais é tal que permite fácil punta-tacco.
Resumindo, quem é do ramo com certeza será conquistado por ele e não terá nada a reclamar do seu uso diário por ter a suspensão mais firme, fora que durante a semana curtirá um antegozo por saber que no fim de semana poderá colocá-lo na estrada e/ou na pista. Após uma semana com o R.S., a conclusão é que a cada dia mais dele gostamos.
AK
Fotos: Paulo Keller
FICHA TÉCNICA SANDERO R.S. 2,0 | |
MOTOR | |
Designação | Renault F4R |
Instalação | Dianteiro, transversal |
Tipo | 4 tempos, 4 cilindros em linha, bloco de ferro fundido, cabeçote de alumínio |
Nº de válvulas por cilindro/atuação | Quatro, atuação indireta por alavanca-dedo roletada, fulcrum com compensador hidráulico |
Nº de comandos de válvula | Dois, no cabeçote, acionamento por correia dentada |
Cilindrada | 1.998 cm³ |
Diâmetro x curso | 82,7 x 93 mm |
Taxa de compressão | 11,2:1 |
Potência | 145 cv (G) e 150 cv (A); a 5.750 rpm |
Torque | 20,2 m·kgf (G) e 20,9 m·kgf (A); a 4.000 rpm |
Corte de rotação | 6.500 rpm |
Formação de mistura | Injeção eletrônica no duto |
Combustível | Gasolina comum e/ou álcool (flex) |
TRANSMISSÃO | |
Câmbio | Transeixo dianteiro, manual de 6 marchas mais ré, todas sincronizadas |
Relações das marchas | 1ª 3,73:1. 2ª 2,10:1; 3ª 1,63:1; 4ª 1,29:1; 5ª 1,02:1; 6ª 0,81; ré 3,54:1 |
Relação do diferencial | 4,12:1 |
Rodas motrizes | Dianteiras |
SUSPENSÃO | |
Dianteira | Independente, McPherson, braço triangular, mola helicoidal, amortecedor pressurizado e barra estabilizadora |
Traseira | Eixo de torção, mola helicoidal, amortecedor pressurizado e barra estabilizadora integrada ao eixo |
DIREÇÃO | |
Tipo | Pinhão e cremalheira, assistência eletroidráulica, diâmetro de giro 10,6 m |
FREIOS | |
Dianteiros | A disco ventilado de Ø 280 mm |
Traseiros | A disco de Ø 240 mm |
Auxílio | Servofreio com câmara de vácuo de 10″ |
Circuito hidráulico | Duplo em “X” |
RODAS E PNEUS | |
Rodas | Alumínio, 5,5J x 16 (opcional 6,5J x 17) |
Pneus | 195/55R16V (opcional 205/45R17W) |
Estepe | Temporário 185/65R15 (80 km/h) |
DIMENSÕES | |
Comprimento | 4.068 mm |
Largura | 1.733 mm/2.000 mm com espelhos |
Altura | 1.499 mm |
Distância entre eixos | 2.590 mm |
PESO E CAPACIDADES | |
Peso em ordem de marcha | 1.161 kg |
Porta-malas | 320 a 1.200 litros |
Tanque de combustível | 50 litros |
DESEMPENHO | |
Aceleração 0-100 km/h | 8,4 s (G) e 8 s (A) |
Velocidade máxima | 200 km/h (G) e 202 km/h (A) |
CÁLCULOS DE CÂMBIO | |
v/1000 em 6ª | 33,8 km/h |
Rotação a 120 km/h em 6ª | 3.550 rpm |
Rotação à velocidade máxima (6ª) | 6.000 rpm |
MANUTENÇÃO | |
Revisões | A cada 8.000 km |
Troca de óleo do motor | A cada 8.000 km |
GARANTIA | 3 anos ou 100.000 km |