Passear com um Jaguar Mark II ou com um Alfa Romeo Giulia GT Veloce? Minhas opções eram essas. Ambos os carros — que estavam expostos no evento Brazil Classics Show 2016, em Araxá, MG — são do amigo e colunista do AE, Boris Feldman.
— Veja aí em qual quer ir. Os dois estão à sua disposição — disse ele gentilmente após eu lhe pedir um clássico para o nosso leitor ou leitora “dar uma volta”.
Dúvida cruel. Estava para escurecer e só daria para sairmos com um. E daí, bom…, eu simplesmente não resisto aos encantos desse Alfa, então, confesso, pensei só de relance sobre o que seria mais interessante ao leitor (a), se um ou outro, se um belíssimo e requintado sedã de alto desempenho ou se o amado Giulia GT Veloce. Olhei pausadamente para o Jaguar e em seguida me virei para olhar o Alfa. Minhas pernas bambearam para o Alfa e um ímã me puxou para ele.
— Vamos de Alfa! O Mark II que me desculpe. Nunca dirigi um, enquanto o Giulia GTV, já, mas quando olho um fico louco para guiá-lo. Sou apaixonado por ele. Fazer o quê?” — decidi contente.
O Boris saiu guiando. Antes de dirigir um carro que é especial para seu dono gosto de ver como ele o trata; quais são seus cuidados, como passa por buracos ou lombadas, como o acelera, como passa marchas, até que giro leva o motor, essas coisas. Assim, quando for a minha vez de dirigi-lo, tratarei de não fazer nada que aflija o amoroso proprietário. É assim que se faz com o cavalo dos outros e é assim que se faz com o carro de estimação dos outros.
É gostoso sair de carona com o Boris guiando. Tocada suave, de gentleman driver. Percebe-se que mesmo falando e falando — o Boris é falante e interessante — ele vai sentindo o carro e lhe dando bons tratos. Comando total, de quem sabe o que faz, incluindo aí nas boas aceleradas quando e onde cabe, já que máquina quente, assim como cavalo quente, também gosta de suar.
E o cuore sportivo do Giulia GT Veloce gosta de bombear forte. Ar e gasolina bem misturados não faltam ao motor de 2 litros. São dois Dell’Orto duplos DHLA40, o que dá uma boca para cada um dos quatro cilindros. O bloco e o cabeçote são de alumínio, este com dois comandos de válvulas, duas válvulas por cilindro e câmara hemisférica. A potência é de 131 cv a 5.500 rpm e o torque, 18,5 m·kgf a 4.500 rpm, com taxa de compressão de 9:1. Essa potência específica de 65,5 cv/l é bastante alta para o início da década de 70, quando a média dos carros comuns estava entre 30 e 45 cv/l, e está praticamente dentro da média dos atuais.
Esse GTV pesa 1.040 kg e seu coeficiente aerodinâmico, o Cx, é 0,42. Faz o 0 a 100 km/h em 8,7 segundos e atinge máxima de 198 km/h. Suspensão dianteira independente por triângulos superpostos e mola helicoidal, com barra estabilizadora, e traseira de eixo rígido também com mola helicoidal e bem amarrado com barra Panhard. Freios são a disco nas quatro rodas, excelentes, o câmbio é de 5 marchas. A direção não tem assistência, é rápida mas não tanto, pois ficaria pesada demais.
Bom, resumindo, o que acontece com esse carro é o seguinte: quem sabe dirigir, senta, sai guiando… e gama. Veja só: o banco, cujo assento é rente ao assoalho, é tipo concha e de estofo firme. Assim ele transmite melhor o comportamento do carro. Molas e espumas fofas amortecem e atrapalham a sensibilidade. Vão bem para um sedã familiar, mas não para um legítimo esportivo. Por sinal, o pentacampeão de F-1 Juan Manuel Fangio até mandou que lhe confeccionassem um macacão de pilotagem de tecido bem fino, justamente para ter a maior sensibilidade possível. O mesmo vale para os calçados, que devem ter sola fina.
Voltemos ao Alfa. O volante é em forma de cálice. O aro está mais próximo do motorista que seu cubo. Assim, ao menos, a já conhecida posição de dirigir, estilo “monkey driver”, ideal para quem tem pernas curtas e braços longos, é amenizada. Os Ferrari da época também são assim, dos que fazem guiar com as pernas um pouco dobradas. A alavanca de marchas é espetada direto na caixa de câmbio, e ela é inclinada, fazendo os engates das marchas ímpares serem para frente e para cima. Para ir das ímpares para as pares baixa-se a alavanca, o que na hora do racha sai quase como um tapa se as marchas estiverem no mesmo canal. O trambulador é perfeito, com curso médio e engates leves e precisos.
Vire a chave e vem um motor que gorgoleja grosso. Acelere e o ronco grosso virará um berro raivoso. Gosto disso, opa se gosto! Quem é que não gosta do característico ronco que vem do escapamento dos Alfa? E esse som vem em estéreo, pois enquanto de trás vem o som do escapamento, da frente vem o da aspiração das quatro bocas dos carburadores, só semiamordaçadas por finos filtros esportivos. O conta-giros é grande, de ponteiro branco em fundo preto e com números bem definidos. É bater o olho e imediatamente saber o giro. O ponteiro sobe e desde rápido conforme se bombeia o acelerador, já que é de lei dar uma limpadinha nas gargantas dos Dell’Orto. Assim eles cantam mais afinados e em uníssono.
Os pedais são perfeitamente posicionados e o punta-tacco sai perfeito. Se não saísse, os italianos, merecidamente, emitiriam os mais baixos impropérios, porque italiano que sabe guiar leva a sério essas coisas. Onde já se viu não conseguir fazer telepaticamente o punta-tacco?
A suspensão é até macia. Firme, mas nada áspera, nada incômoda. Não com esse carro do Boris, mas há alguns anos, dirigindo outro Giulia, um Sprint Veloce, que é um modelo um pouco anterior, mas cujo comportamento é praticamente igual, eu vinha meio rápido numa curva de raio longo, quando me deparei com uma pequena e maldosa lombada à frente. O jeito foi frear forte em plena curva; frear o máximo que puder, mas sem travar rodas — acionando o ABS humano mesmo —, e foi com muita satisfação que verifiquei o quão bem esse carro freia em perfeito controle, equilibrado.
Além de lindo sob qualquer ângulo, outra de suas características que mais gosto é que ele é chique. Nada de espalhafato, nada de ostentação. Isso é que é ser chique de verdade.
Bom, então, vejamos o vídeo desse agradável passeio com o amigo Boris e seu gracioso Alfa Romeo Giulia GT Veloce. Ele sabe muito bem o que tem nas mãos e sabe muito bem como nos falar dele.
AK
FICHA TÉCNICA ALFA ROMEO GIULIA GT VELOCE 1973 | |
MOTOR | |
Tipo | 4 cil, 4 tempos, arrefecido a líquido, gasolina |
Instalação | Longitudinal |
Material do bloco/cabeçote | Alumínio |
Diâmetro e curso | 84 x 85,5 mm |
Cilindrada | 1.962 cm³ |
Potência | 131 cv a 5.500 rpm |
Torque | 18,6 m·kgf a 4.500 rpm |
Nº de comandos de válvulas | 2, acionamento por corrente |
Nº de válvulas por cilindro | 2 |
Taxa de compressão | 9:1 |
Formação de mistura | 2 carburadores Dell’Orto DHLA 40 |
TRANSMISSÃO | |
Câmbio | Manual de 5 marchas sincronizadas à frente e 1 à ré |
Relações das marchas | 1ª 3,304:1; 2ª 1,988:1; 3ª 1,355:1; 4ª 1:1 (direta); 5ª 0,79:1; ré 3,01:1 |
Relação de diferencial | 4,555:1 |
SUSPENSÃO | |
Dianteira | Independente, triângulos superpostos, mola helicoidal, amortecedor hidráulico e barra estabilizadora |
Traseir | Eixo rígido, mola helicoidal, tensor longitudinal, barra Panhard, amortecedor hidráulico e barra estabilizadora |
DIREÇÃO | |
Caixa de direção | Setor e sem-fim com esferas recirculantes, sem assistência |
Nº de voltas entre batentes | 3,7 |
Diâmetro mínimo de curva | 10,6 m |
FREIOS | |
Dianteiros | A disco ventilado |
Traseiros | A disco |
RODAS E PNEUS | |
Rodas | Aço, 5J-14 |
Pneus | 165HR14 |
CONSTRUÇÃO | |
Tipo | Monobloco em aço, cupê 2+2, duas portas |
Configuração | Motor e câmbio dianteiro, tração traseira |
AERODINÂMICA | |
Coeficiente de arrasto | 0,42 |
Área frontal calculada | 1,66 m² |
Área frontal corrigida | 0,697 m² |
DIMENSÕES | |
Comprimento | 4.100 mm |
Largura | 1.580 mm |
Altura | 1.315 mm |
Distância entre eixos | 2.350 mm |
Bitola dianteira/traseira | 1.324/1.274 mm |
PESO | |
Em ordem de marcha | 1.040 kg |
CAPACIDADES | |
Porta-malas | 320 litros |
Tanque de combustível | 53 litros |
DESEMPENHO | |
Aceleração 0-100 km/h | 8,7 s |
Velocidade máxima | 198 km/h |