Esta lista de hoje merece uma explicação logo de cara. Ao contrário da tradicional lista que faço todo janeiro, que trata do que eu, Marco Antônio Oliveira, posso e quero comprar, esta aqui não tem limite de preço. Mas não é uma lista para o dia que ganhar na Mega Sena também: mesmo se tivesse condições financeiras de comprar os carros abaixo, não poderia. Pelo menos não aqui no Brasil. Uma lista de carros que brasileiros não podem comprar, pelo menos não de importadores oficiais.
É uma lista que trata de duas coisas básicas que impedem certos carros de serem vendidos aqui: a estratégia da empresa que os produz e/ou vende, e a legislação brasileira.
Estratégia: conhecemos bem esta. Perua não vende. Câmbio manual não vende. Entendo a lógica perfeitamente. Este tipo de coisa vai ser difícil de reverter. Os dias em que mais que dinheiro era considerado para decisões empresariais parecem que acabaram definitivamente. Só existem máquinas agora, executivos-robô. Triste, mas real.
Pelo menos há como driblar este tipo de coisa importando o carro pessoalmente. Mas pouca gente faz por motivos claros: falta de assistência, preço mais alto, valor de revenda comprometido, trabalho e chateação envolvidos no processo.
Legislação: a lei da nossa terra, que simplesmente nos proíbe de comprar alguns veículos, por estes não cumprirem certas exigências legais de nosso mercado.
Essas legislações são basicamente de proteção aos ocupantes em caso de acidente. Lá fora, no primeiro mundo, é uma preocupação histérica da população, muito porque a maioria das outras formas banais de morte, de Zika-vírus a um moleque te esfaqueando por causa de 20 reais, foram erradicadas, ou ao menos reduzidas a um mínimo.
Lá, a população, mais instruída, mimada e cheia de frescura, exige carros que possam fazê-los sobreviver a qualquer burrada que possam cometer. São tão loucos nisso que pedem até que máquinas guiem por eles, esses desprezíveis moleques mimados que não saem de trás de suas telinhas de mané. Que Deus, em sua infinita sabedoria, tenha piedade de suas almas banais. E que me perdoe por não amá-los como Ele nos amou.
Mas aqui, o povo não está nem aí para isso. Neca, nada. A tal da Latin NCAP, o órgão independente que compra carros, faz crash tests e publica resultados, é completamente ignorada pela população. A lista dos mais vendidos frequentemente coincide com os carros de menor pontuação. Parte da imprensa tenta mostrar isso, chamar a atenção do público, achando-nos atrasados porque não nos importamos com isso, mas sem sucesso. O povo nunca, NUNCA, compra carros pensando em segurança passiva.
Mesmo assim, o nossos governos passam leis que exigem testes e bolsas infláveis, e equipamentos mil. O povo não está nem aí para isso, mas as leis existem. Claro, ninguém quer parecer atrasado, uma republiqueta de bananas, mesmo que na realidade o seja.
Passar leis assim é mole. Quem paga essa maior segurança é quem compra o carro mesmo (ou você acha mesmo que os fabricantes dão isso de graça para você?), ou seja, o povo, e ele não sabe o que é bom para ele. Quem sabe são os políticos e os funcionários públicos do governo brasileiro, esta elite intelectual, este bastião da ética.
O assunto até é tratado com veemência, um problema de saúde nacional, milhares de mortos! Claro, os outros problemas da saúde no Brasil, aquele dos hospitais e políticas públicas, precisam de muito trabalho e dinheiro para sejam resolvidos. Segurança no trânsito? Passar leis! O povo paga multa, paga carro mais caro, sofre andando devagar… O povo paga o pato de novo. Campanhas e mais campanhas para direção segura, televisão todo dia mostrando acidente Brasil afora…
Vivemos num país cheio de leis estranhas e sem lógica, onde assassinos confessos passam 10 anos em liberdade antes de sentir cheiro de cadeia, e onde um capiau que caçou um mico-leão dourado por acidente se sairia melhor se tivesse matado um policial. Pensando nisso, você está perdoado se pensar que o tema deste post seja de baixa importância e prioridade. Mas este é um site que fala sobre carros, e, portanto, é nossa esfera de influência. Não dá para querer fazer um mundo melhor antes de arrumar a bagunça em nossa casa, é o meu lema. Arrume sua vida primeiro, antes de tentar arrumar a dos outros.
Estas legislações são inevitáveis hoje em dia. Nos EUA é ainda muito pior que isso, mas eles merecem, porque ao contrário de nós, eles pediram isso. O que queria, só, é algo mais lógico, menos burro e ignorante do tema. Algo como é na Inglaterra por exemplo, onde pequenos produtores ganham isenção de muitas leis, e assim podem criar coisas fantásticas, cheias de criatividade, algo que fomenta sobremaneira a indústria daquele país. Lotus nasceu assim, criando carros em kit como a Caterham. A Morgan continua fazendo carros de 1936, e está indo muito bem, obrigado. A indústria de competição e de carros antigos daquele país segue o mesmo impulso. E fomentar indústria é algo que precisamos, todos sabem.
Afinal, somos adultos e podemos escolher andar em carros menos seguros em acidentes, se forem coisas tão legais como os carros abaixo. Por que não? Correr risco de uma forma que potencialmente pode machucar apenas a mim mesmo é proibido? Sério?
É por isso então que ofereço esta lista. Uma lista para lembrar-nos que executivos-robô e políticos nos negam maneiras perfeitamente possíveis em outros países de gastar nosso suado dinheirinho. Em ordem crescente de preço, aqui estão os melhores carros que os brasileiros não podem comprar:
(Os carros abaixo não estão à venda oficialmente por seus fabricantes ou representantes no Brasil. O preço é o do país de origem (veja tabela ao fim do texto) convertido para real no câmbio de 16 de janeiro. Não é totalmente justo comparar preços desta forma, mas é uma referência que foi usada aqui para ordenar a lista e balizar o valor de cada carro.)
1) Caterham Seven
Criado durante um jantar na casa de Colin Chapman em 1957, o Seven é a personificação em metal do carro esporte inglês tradicional, direto, cru, sem nenhuma consideração aerodinâmica, mas uma delícia para se dirigir quando as condições são certas. Chapman queria trazer o prazer de dirigir espartano dos tradicionais Austin Seven modificados para competição para os então modernos anos 50, e por acidente trouxe também para o mundo moderno os MG do pré-guerra, de uma forma melhor até que a própria MG.
Tempos depois, quando resolveu que sua Lotus seria uma Ferrari ou Porsche inglesa no início dos anos 70, resolveu parar de fazer o Seven. Graham Nearn, da concessionária Caterham Cars, compra todo o ferramental e os direitos do carro, e continua fabricando-os até hoje.
O Seven é a ferramenta de subversão da ordem do entusiasta, um carro que as pessoas normais não entendem, baixo, feio, esquisito, desconfortável, barulhento, mas que para nós, é o verdadeiro nirvana ao volante. Leve como um monoposto de fórmula, baixo e com rodas semiexpostas, é a personificação de um clichê que só é verdadeiro aqui: um carro de corrida para as ruas.
Como um monoposto, também, não tem portas, mas um teto de lona é oferecido para parca proteção dos elementos. Um carro tão aberto mundo lá fora que frequentemente é chamado de “a motocicleta de quatro rodas”. O que nos lembra que o recomendável aqui é não bater em nada, de jeito algum; a proteção em caso de acidente é também similar à motocicleta: nenhuma.
Hoje é vendido na Inglaterra em um sem-fim de versões, indo do barato, simples e superleve (490 kg!) 160, com um minúsculo tricilíndrico turbo da Suzuki, até o feroz 620R, com um Ford Duratec de 4 em linha e compressor, com 310 cv, e que pode fazer o 0-100 km/h em 2,79 segundos. Em toda versão, uma arma insuperável quando a estrada é sinuosa.
2) Mazda MX5 Miata
Desde o lançamento de sua primeira versão em 1989, o Miata tem sido um oásis de diversão tradicional ao volante num oceano de isolados carros modernos. Direção muito rápida, comandos táteis, equilíbrio perfeito, potência apenas suficiente. A empresa sempre resistiu à tentação de fazer o carro maior e mais potente, mantendo-se fiel ao princípio de carro simples, leve, e deliciosamente gostoso de se dirigir à moda.
A nova geração é mais leve que a anterior, e por isso mesmo mais divertida. Equilíbrio fantástico, suspensões bem acertadas, uma alavanca de câmbio sublime. O Miata permanece fiel à sua fórmula de carro veloz com pouca potência, de carro esporte tradicional, de integração total com a máquina. Uma prova de que 160 cv ainda podem fazer diversão tão grande quanto 700, se usados da forma certa.
Este carro atenderia facilmente todas as leis brasileiras, mas a Mazda há muito nos deixou. Bem que a Fiat poderia pelo menos trazer o 124 Spyder, o seu irmão produzido na mesma fábrica, mas nem isso temos…
3) Toyota GT86/ Subaru BRZ
Duas companhias com forte atuação no país, e nenhuma das duas com coragem para trazer este fantástico cupê esportivo para o Brasil. Já falamos muito deste carro aqui no AE (veja aqui), e portanto aqui vou apenas afirmar que a imagem de ambas as empresas só tem a ganhar com a venda oficial deste carro aqui.
Um carro que é sobre o prazer de dirigir apenas, e não números, pode ser uma venda difícil neste mercado pouco sofisticado, porém. Mas é um dos meus carros preferidos de todos os tempos, e uma verdadeira revelação ao volante.
Nenhum executivo da Toyota aqui do Brasil gosta de dirigir? Como faz caso goste, compra carro de outra marca?
4) Morgan 4/4
Um carro que está em produção ininterrupta há 80 anos (!!), o Morgan é uma maravilhosa ilha de 1936, cercada de 2017 por todos os lados. Todo construído dentro da Morgan, até os parafusos, é não apenas um carro dos anos 30, é fabricado exatamente como era 80 anos atrás.
A estrutura da carroceria é toda de madeira (freixo), revestida de alumínio, e montada diretamente no chassi de aço. A suspensão dianteira é independente por pilar deslizante, patenteada por HFS Morgan, avô do atual dono Peter Morgan, em 1909. Na traseira, eixo rígido. Debaixo do capô, o carro teve uma série de motores diferentes durante os anos, o atual um Ford Sigma de quatro cilindros em linha, 1,6 litro e 111 cv, o que para um carro que pesa menos de 800 kg é mais do que suficiente para entreter.
Claro que os freios hoje são discos, e os amortecedores, pneus, e toda parte eletroeletrônica é moderna e confiável, mas o Morgan é um carro dos anos 30, que pode ser comprado zero-km. É o mapa perfeito de como fazer um carro esporte inglês, também, algo que traz esta bela tradição para os dias de hoje. Uma delícia para dirigir, e uma coisa cheia de significado e amor em sua construção. Algo realmente especial.
5) BMW 318i Touring
Aqui no Brasil se você quiser um BMW série 3, será sempre automático. Se você, como eu, tem uma perua da marca já bem velhinha e desejava poder trocá-la por uma nova, se deu mal também: nada de perua para o Brasil.
Lá fora, principalmente na Europa, a história é outra. Várias configurações, motores (Diesel e Otto) e transmissões são possíveis, bem como interiores em tecido, tração traseira ou nas quatro rodas, tetos solares ou não, rodas de vários tamanhos e desenhos, e até cores internas diferentes.
A que gostaria de comprar é esta aqui. A mais básica de todas, e a mais barata também. Toda a praticidade que preciso, somada à diversão ao volante das antigas, com tração traseira, câmbio manual e um chassis de primeira. O motor de 3 cilindros turbo, com 1,5 litro e 136cv, já experimentamos em um MINI, e tenho certeza que puxaria muito bem o carro, como indica a aceleração de 0-100 km/h declarada em menos de nove segundos. Ah, e já que sonhamos aqui, bancos de tecido por favor.
E tudo isso num carro que tem potencial para ser mais barato que os sedãs 320i à venda aqui.
6) Ariel Nomad
O Ariel Atom é uma empresa que nasceu numa escola de design industrial, fundada por um professor e seu aluno que criaram esta incrível reinterpretação do Seven para o século 21, um carro que como motocicletas tem sua estrutura exposta, usada como um elemento de design. Duas treliças tubulares que vão do eixo traseiro ao dianteiro, e o resto, incluídos aí os dois ocupantes e todo interior do carro, ficam expostos. Não existe teto de lona para o Atom; é para ser usado como uma motocicleta.
O Atom foi o primeiro de muitos carros criados para track days, este crescente esporte-motor que trouxe de volta as pistas os amadores entusiasmados. Um carro esporte básico e visceral, o Atom sempre teve uma relação peso-potência de supercarro, e é uma arma quase invencível em pista.
Mas mais legal ainda é o recente Nomad. Um Ariel que foi para o mato. Com rodas e pneus para fora de estrada e suspensão de curso longo, ajustada para corridas em deserto, mas ainda mantendo sua incrível relação peso-potência (graças a seu potente 4-em-linha Honda e o baixo peso) que não faria feio diante de um Ferrari moderno, o carro é tão divertido que deveria ser proibido!
E na verdade, realmente é proibido para nós. A única forma de tê-lo aqui é para uso exclusivo em fora de estrada, sem emplacar, como o UTV do Carqueijo. O que não deixa de ser uma ideia interessante…
7) Audi A4 Avant quattro
Ao contrário da perua BMW série 3, onde a mais básica versão me parece a melhor, no caso do Audi A4 Avant, as versões mais sofisticadas me interessam mais. O A4 é diferente de um série 3, é um carro ultratecnológico e avançado, legal não pelos motivos tradicionais (traseira de lado na curva, câmbio manual etc), mas legal porque é incrivelmente seguro, confortável e impassível em qualquer situação, dia e noite, chuva e sol. E é extremamente veloz, também, em qualquer situação. Um companheiro perfeito para toda hora e estado de espírito, e não somente para o dia que queremos dirigir apenas.
E por isso considero esta versão ainda melhor que a de 190 cv e tração dianteira que temos aqui. Com a fenomenal tração integral quattro, e 252cv, é uma coisa realmente maravilhosa; uma RS4 light
Mas pelo menos, a Audi traz uma versão da perua, coisa que não podemos falar da BMW. E isso é suficiente para fazer gente trocar lealdade. Preste atenção. BMW!
8) Chevrolet Suburban
Este mastodôntico Chevrolet de duas toneladas e meia é Estados Unidos puro, não destilado. Um carro enorme, pacato mas potente, com um V-8 grande de aspiração natural, suave e torcudo. Chassis separado, espaço por dentro, e uma longa e reta estrada pela frente…
Depois de anos como utilitário de passageiros e carga, hoje é um verdadeiro carro de luxo à americana, com interior de qualidade, e refinamento, desempenho e conforto de carro. pode ter várias configurações internas e vários níveis de equipamento, hoje em dia podendo se tornar mais confortável que a sala de minha casa, com seis bancos individuais com telas individuais, e com rede wi-fi própria.
Mas a minha seria a básica LS, com três sofás e nove lugares. Comparando-o com um ônibus, até que é ágil, veloz e estável. Tudo é relativo…
9) Ford F-150 Raptor
Um monstro de duas toneladas e meia e 456 cv, capaz de fazer o zero-a-cem em cinco segundos cravados. Suspensão e chassi preparados para corridas fora-de-estrada em deserto. Conforto interno de carro de luxo. Garantia de fábrica.
Nunca algo capaz de pular tão alto viveu tempo suficiente para ser produzido em série, e carregar uma garantia. Uma loucura deliciosa e simplesmente irresistível, e outra coisa que só poderia ter vindo dos EUA. Nas imortais palavras do Van Halen:
“Might as well Jump (Jump!)
Go ahead and Jump”
10) Lotus Exige Sport 350
A Lotus anda meio mal das pernas como empresa. Mas qual é a novidade? Esta aqui não é uma lista das melhores empresas. Não somos a Forbes.
O que interessa é que, se você se preocupa mais com prazer de dirigir do que com status e fama (e, sejamos realistas, valor de revenda) ao escolher seu supercarro esporte, esta é a escolha mais iluminada. A Lotus ainda é a referência mundial em ajuste de chassis para a direção esportiva. E mesmo que seu V-6 tenha vindo de um Toyota Camry, é massageado pela empresa para que lhe dê toda a experiência de velocidade e música de um Ferrari.
Um supercarro alternativo para o conhecedor, diferente e menos conhecido, que só os entusiastas entendem. Pena que não exista mais gente que entende isto.