Aproveitando o jargão em inglês DIY (Do it yourself), gostaria de falar um pouco sobre manutenção de veículos, mecânicos e manuais. Uso o título em português, pois acredito que utilizar um termo estrangeiro quando temos tradução na língua nativa é ignorância.
A foto aí em cima é do meu Tempra, que comprei para um trackday no Autódromo de Curitiba, ou Autódromo Raul Boesel, em Pinhais, na Grande Curitiba. A foto foi feita na garagem de um boxe no dia 7 de maio do ano passado, durante o trackday. Toda a história está nesta matéria.
Final de 2016 (novembro para ser mais exato), o motor do Tempra rajou (bateu), parado no elevador em marcha-lenta. Não preciso dizer que ofendi até a trigésima oitava geração do fundador da Fiat. A princípio achei que era o cabeçote, a esperança de que seja algo simples é a primeira que aparece. Removi o cabeçote, neste já o primeiro erro: a chave não era a correta e um dos parafusos arredondou a cabeça.
Tive que soldar um parafuso sextavado em cima do estragado (que agora estava liso), mas não dei importância, pois sempre que se tira o cabeçote o ideal é trocar o parafuso (ledo engano, abaixo irei explicar melhor). Levei o motor à retífica e o resultado foi: não tem nada de errado com o cabeçote. Pronto, sentença decretada, o motor bateu mesmo, e vem o pensamento: Maldito Fiat, porcaria, esta fábrica só faz lixo, motor dos infernos…
Fiquei aproximadamente umas duas semanas olhando para o carro e criando coragem, mas também fiquei na dúvida: faço eu mesmo ou envio para algum mecânico? Eu já havia removido o motor do Tempra uma vez, e foi um trabalho infernal (três horas para remover o câmbio e mais quatro para remover o motor). Mas eu estou meio irritado com mecânicos em geral, tudo que eles fazem fica errado. Explico melhor: Fiats usam parafuso M10 com passo de 1,25 mm (rosca fina) ou M12 com passo de 1,25 mm (rosca fina, a rosca grossa é de 1,75 mm), e todos os parafusos que foram trocados estavam errados, mal apertados (excesso ou falta de aperto), torquímetro é algo extremamente ignorado em oficinas. Pensei comigo: Quer saber? Faço eu mesmo, não tem pressa e vai ficar mais barato.
Comecei o serviço, mas desta vez resolvi fazer diferente: remover o motor e a caixa juntos, sem separá-los. Além das ferramentas manuais eu possuo uma empilhadeira manual e um elevador de colunas para o auxílio. Me dei bem, em menos de três horas e meia o motor e a caixa estavam fora. Esta ideia de remover tudo junto veio de um programa que assisti que chama “Joias sobre rodas”, no caso ele (Ed China) removeu o conjunto motriz de um Mercedes SL dos anos 80. E aí vai uma dica: copie o serviço dos outros, você vai ganhar muito tempo com isso.
Motor fora, soltei o câmbio, são quatro parafusos, simples e rápido. A caixa é leve, deve pesar uns 20 kg, e já a coloquei no chão, o problema não é com ela, o motor continuou na empilhadeira. Travei o motor na empilhadeira e comecei a desmontagem, nesta hora a gente começa a ver o quanto os mecânicos falham, tanto no retentor traseiro quanto na bomba de óleo (que no Tempra faz as vezes do retentor dianteiro, entre a engrenagem da correia dentada e o bloco). Os parafusos estavam todos errados (já é a segunda retifica deste motor), prossegui com a desmontagem — esta parte é bem simples, desmontar é bem mais fácil do que montar.
Levei bloco e componentes para a retífica, veio o parecer: é preciso retificar o virabrequim, mas o bloco não precisa ser retificado, é possível utilizar os mesmos pistões. Saí à compra de peças: bronzinas, anéis de encosto (alguns chamam de arruela, outros de espaçador) e anéis de segmento novos. Comprei também um jogo de juntas e parafusos para o cabeçote. Aconselho que procurem bem as peças, comprei muita coisa pela internet e posso dizer que o desconto se aproximou da casa de 30% em relação às lojas físicas.
Começo de janeiro, peças na mão pensei comigo, vamos melhorar a encrenca: reduzi o peso do volante do motor (de 9,3 para 7,5 kg), mais redução de peso das polias dos comandos (não pesei, mas foi considerável a redução), e levei tudo para um balanceamento dinâmico. Se você retificou o motor, leve tudo para balancear, vale muito a pena e o serviço não é caro (240 reais para ser exato). Pronto, eu estava com todas as peças na mão, e era hora de começar a montagem.
Aqui vem uma dica para os autoentusiastas e um apelo aos fabricantes: Manual de Reparação! Se você tem o do seu carro, guarde-o com carinho, é útil demais, usei-o, torque de aperto, posições de montagem, tudo que foi possível eu aprendi ali (por exemplo, o torque de aperto dos parafusos do volante é de 140 Nm (14,3 kgfm), e toda vez que o volante é retirado é necessário trocar os parafusos. Os do cabeçote podem ser aproveitados quatro vezes sem problema algum (foi a que me referi no começo). Lembre-se do que eu disse lá em cima, não ter uma ferramenta correta, de R$ 30, me custou R$ 280. Torque de aperto dos mancais, forma de montagem (anel de encosto com o canal para o lado do virabrequim), posição das juntas, sequências de aperto, e por ai vai.
Aos fabricantes, que disponibilizem estes manuais, são importantes demais. Onde conseguir o material: 1- Página do fabricante (a Fiat tem o Reparador Fiat, a Peugeot tem o Peugeot Service, se seu carro vende nos EUA ou na Europa ele obrigatoriamente tem que ter o manual disponibilizado); 2 – Fóruns da marca e/ou modelo (seja aqui no Brasil ou estrangeiro — treine o inglês); 3 – Fabricante das peças (a Mahle tem muito conteúdo, bem como os fabricantes de bombas), 4 – Youtube; 5 – Peça ajuda à retífica, em geral as autopeças fornecem a eles documentação para reparo.
Em 11/02 terminei a montagem da sincronia dos comandos com o virabrequim — sim, estou devagar, quero fazer sem pressa; utilizei trava-parafusos em todas as possíveis situações, apliquei torque recomendado pelo manual, juntas novas; e é incrível a diferença que faz uma montagem seguindo o recomendado pelo fabricante e uma montagem feita de qualquer jeito: o motor está girando bem solto na mão, exatamente como deve ser, parafusos novos — utilizei Allen (sextavado interno) de inox na maioria das situações, assim evito corrosão e fica mais bonito. Tenho orgulho do serviço que eu estou fazendo, e tenho uma certeza: foi bem feito.
A todos que querem começar o faça-você-mesmo: leia muito antes de qualquer coisa, não tenha medo, tenha paciência, use as ferramentas corretas, use equipamentos de proteção e se tiver um amigo, melhor ainda. Alguns serviços que podem ser feitos com apenas um pessoa e pouco conhecimento:
– Troca de óleo, motor e câmbio (inclusive automático)
– Troca dos filtros de combustível, óleo e ar
– Troca das pastilhas de freio (dianteiras é bem simples, as traseiras requerem ferramenta especial, que pode ser comprada na internet por 20 reais)
– Troca do líquido de radiador (não esqueça de sangrar, nos Fiat o sangrador fica no radiador, nos PSA, junto à válvula termostática). Caso você não saiba onde fica, retire a mangueira pequena do reservatório de expansão, ligue o motor, espere sair a água e encaixe-a de novo)
– Troca da correia auxiliar poli-V (alternador, bomba d’água).
– Mangueiras em geral.
– Velas (requer ferramenta especial, mas são baratas) e cabos de velas.
– Bobinas
– Terminal de direção (requer alinhamento após o serviço).
– Troca fluido de freio (requer ajuda de um amigo).
Fontes de informações:
Tempra BR: http://forum.temprabr.com/
Marea: http://www.clubedomarea.com.br/forum/index.php?act=idx
Peugeot: http://www.clubepeugeot.com/forum/
Citroën: http://www.ccdob.com.br/forum/index.php
Oficina Brasil: http://www.oficinabrasil.com.br/forum/
Manual de reparação do Fiat Tempra: http://migre.me/w8tyR
Manual de reparação do Nissan Tiida: http://migre.me/w8tIv
ML
Curitiba – PR