Mas tampouco as vendas vêm reagindo como os números totais podem sugerir num olhar pouco profundo.
Após a apresentação de resultados da Anfavea no último 6 de junho, notei a pressa dos cadernos econômicos dos grandes jornais em divulgar números positivos do setor automobilístico. De fato, a produção deu um salto de 23% neste ano, quase que só impulsionada pelas exportações e em maio destacaram-se os maiores níveis de produção e vendas desde 2014. Argentina e México protagonizam o crescimento dos embarques em volume. É sabido que o excesso de capacidade ociosa dos fabricantes, que supera os 50%, forçou-os a buscar saídas, e elas estão justamente nos portos.
No mercado doméstico, os números totais nos sugerem haver uma reação marginal, se muito. Os emplacamentos de automóveis e comerciais leves no acumulado do ano foram 2,2% superiores aos do mesmo período de 2016. O mês de maio teve cinco dias úteis a mais do que abril, 22 contra 17, portanto para 29% mais dias de vendas, o licenciamento total saltou 25%.
Há, de fato, uma reação no mercado doméstico?
Há, mas somente na região Sudeste, que foi a única que apresentou crescimento este ano, com licenciamento de 421.367 automóveis e comerciais leves, alta de 6,7% sobre mesmos cinco meses de 2016. As demais regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste e Sul, todas registraram retração nas vendas da ordem de 2% (Norte ficou com – 4%).
O canal de vendas diretas, ou vendas a frotistas, é quem vem turbinando essa reação que vemos no gráfico acima. Em maio, elas representaram 42% dos licenciamentos e no acumulado do ano, 37%. Um ano atrás, esses números foram respectivamente 34% e 30%. Traduzindo:
• Em 2017 venderam-se no varejo 503.585 automóveis e comerciais leves e 298.685 por venda direta, totalizando 802.270.
• Comparando com o mesmo período de 2016, temos respectivamente 550.547 no varejo, 234.267 por canal direto e um total de 784.813.
A supersafra já começou, com ela espera-se mais atividade econômica nas regiões onde o agronegócio é mais forte. A esperar para ver se isso irá puxar vendas de automóveis para cima.
A análise desta coluna está fundamentada nos números divulgados pela Anfavea e Fenabrave.
A turbulência política afugenta compradores?
Não é o que temos notado. Depois do impeachment da presidente Dilma Rousseff muitos apostaram numa recuperação quase instantânea da economia, este escriba entre eles. Com apaziguamento da política e fim das ações descoordenadas e sem noção da equipe da presidente, olhamos com otimismo para frente. Estávamos iludidos, o nó a resolver era um tremendo desequilíbrio fiscal que a doutora fazia questão de esconder fraudando números e a maior recessão da história da república. Multiplicou-se a desconfiança e esta contribuiu para o país perder seus ratings de crédito das três agências de risco que avaliam o país.
Seu sucessor, o presidente Michel Temer, cuidou de instalar rapidamente uma nova equipe econômica e esta partiu em busca do reequilíbrio fiscal. Passaram-se poucos meses para que a inflação desse trégua, aprovaram um teto para gastos públicos no Congresso, restam aprovar as reformas trabalhista e da previdência. Tudo ia seguindo seu tortuoso curso com duros embates no parlamento, até que um deputado suplente, emissário do presidente Temer para tratar com um megaempresário, foi flagrado com uma mala de dinheiro. Se a política já andava difícil, após esse triste e lamentável episódio têm-se a impressão que a coisa desandou.
Poucos apostam no sucesso das reformas trabalhista e previdenciária, não no montante e profundidade que a situação exige. Com reformas meia-boca, resta aos menos otimistas aumentarem ainda mais seu ceticismo. Particularmente, esta coluna não consegue vislumbrar sinais positivos adiante. Não no momento atual.
Curiosamente, os níveis de vendas de autoveículos mantiveram-se estáveis. Caminhões e ônibus, estes sim estão em mais um ano desastroso, mas até eles parecem esboçar reação.
No entender deste colunista, o que pode trazer ventos mais favoráveis ao mercado será a volta das contratações, e com elas o retorno do crédito ao consumidor. Caso o presidente Temer se garanta no mandato até o final do ano que vem, que não o faça à custa de comprometer o pouco que temos.
Outro fator que sabemos ser de fundamental importância para uma reação de verdade é a volta do crédito. Numa viagem aos EUA, o Google que nos segue por onde vamos plantou uma propaganda do Buick Encore (a versão Buick do Chevrolet Tracker que temos aqui) que me chamou a atenção. Com mil dólares de entrada faz-se um leasing de $69/mês. Se um dia essas condições de venda se fizerem presentes por aqui, nosso mercado seria outro.
RANKING DO MÊS E DO ANO
Em maio as vendas de automóveis e comerciais leves foram 25% superiores ao mês de abril. Mas a Fiat cresceu 39%, BMW e VW +30%, Ford , Renault e Citroën com +29%; foram as marcas que mais se destacaram. Não houve declínios, porém expandir-se menos que o mercado significa perder participação, Peugeot cresceu 8%, Jeep e Audi +10%, Land Rover +13% e Toyota +14%. Ford retomou o quarto posto de maior fabricante da Hyundai, mas foi por pouco.
Num ano em que tivemos crescimento das vendas da ordem de 2,2%, despontam Jeep e Nissan, que lançaram novos suves, Compass e Kicks, com +51% e +39% respectivamente. Sem lançamento de novos produtos, Ford também brilhou e cresceu 13%, Chevrolet +10% e Renault +4%. As marcas de luxo foram as que mais perderam em 2017: Audi com -26%, Land Rover com -23%, BMW com -20%.
Onix segue esmagando concorrentes. Liderou as vendas de maio com 15.007 unidades comercializadas, seguido pelo Ford Ka, com 9.326, que tomou o segundo posto do HB20, com 8.961. Sandero em 4º lugar, Gol em 5º, Uno figura pela primeira vez no ano entre os 10 mais vendidos, porém com 71% de suas vendas destinadas a frotistas, não me parece irá se sustentar nesse patamar por muito. Compass foi novamente o suve mais vendido do país, com 4.450 unidades, seguido de perto pelo HR-V, com 4.408 e Creta, que se consolida na 3ª posição, com 3.751. Creta já é o segundo Hyundai mais vendido também no acumulado do ano.
Renegade caiu algumas posições no ranking, a despeito de 55% de suas vendas saírem por canal direto (um ano atrás eram 25%) e o maior responsável por essa queda é seu irmão de plataforma e fábrica, o Compass. Na soma dos dois modelos, Jeep cresce e domina o segmento de suves com folga. A notar a estratégia da Honda e Renault, com armas para brigar pelo cliente de suves compactos, cada uma com dois modelos próximos em proposta e preços que miram dois tipos distintos de compradores.
Nos cinco primeiros meses do ano, as vendas do novo Chevrolet Cruze apresentaram crescimento de 133%, o renovado Honda Civic foi bem também, com +66%. Nos segmentos de volume, quem puxou as vendas foi o sedã compacto VW Voyage, com +47%, seguido do Sandero com +46%, Ford Ka, com +28%. Onix também apresenta crescimento importante de 20%, lembrando que em 2017 as vendas subiram apenas 2,2%. Em ano deprimido, forte crescimento de alguns modelos traz nova ordem entre os fabricantes.
Nos comerciais leves, Strada em 1º, com 4.612 unidades, seguida de perto pela irmã maior Toro, com 4.401 e Saveiro, com 3.997 — VW volta a encostar nas líderes. Hilux num bom quarto posto, mas já não tão longe da Chevrolet S10, que agora oferece câmbio automático tanto para as versões movidas a diesel, quanto para as flex.
Nos cinco primeiros meses do ano, Strada e Toro bem próximas, com respectivamente 20.003 unidades e 19.108, S10 cresceu 29%, Ranger cresceu 9% e Hilux parece haver sentido o baque, registrando declínio de 8%, num segmento que se expandiu 2,5% sobre mesmo período de 2016.
Nestes dois meses teremos o lançamento de duas novidades, o Fiat Argo, já apresentado à imprensa, e o Renault Kwid. Ambos disputam o segmento de entrada e prometem sacudir o mercado.
Até o mês que vem.
MAS