Promotor ameaça tirar GP de São Paulo. As intermináveis reformas.
Números não batem.
O jornal Diário de S. Paulo publicou em sua edição de 6/10 entrevista com o promotor do Grande Prêmio do Brasil, algo corriqueiro dada a proximidade do evento que se realizará dentro de um mês. O que causa estranheza são as afirmações no mínimo contraditórias que o Sr. Tamas Rohonyi faz acerca das dificuldades enfrentadas para realizar a competição no autódromo de Interlagos. Da cantilena de que a corrida dá prejuízo ao absurdo de afirmar a inexistência de apoio oficial, passando pela manchete de que duas capitais assinariam o contrato para realizar o GP caso a cidade de São Paulo não renovasse o acordo, tudo não passa de uma forma clara de fazer pressão para garantir a continuidade de seguir faturando alto com o produto em questão.
O Grande Prêmio do Brasil é importante para a cidade de São Paulo? Sim, pois garante consumo de serviços nos setores de hotelaria, alimentação, transporte, aluguel de automóveis e, em menor escala, compras e o famoso “intangível” que é colocar o nome da capital paulista em evidência mundial. Certamente o estado da cidade há alguns anos deixa de garantir uma imagem imaculada graças à péssima conservação de ruas, contrastes entre ricos e pobres e o trânsito caótico. Deixando de lado esse último fator, locais como a Cidade do México sofrem dos mesmos males. Vários colegas que cobriram o Campeonato Mundial de F-1 junto comigo preferem pular a viagem ao Brasil por causa desses problemas; exageros de alguns à parte, é inegável que eles têm alguma razão.
O circo da F-1 demanda a cada ponto de parada uma estrutura turística que mesmo uma cidade como São Paulo atende em regime crítico. Basta ver que hotéis praticam preços cheios — na maioria dos casos ultrainchados —, as frotas das locadoras de automóveis, inclusive as de blindados, é usada ao máximo e serviços de entretenimento não desperdiçam a oportunidade de faturar alto na semana do evento.
Segundo declaração de Rohonyi, “Uma pesquisa da Fipe, encomendada por Nádia Campeão, então secretária de esportes na gestão de Marta Suplicy, assegurava R$ 275 milhões em ISS adicionais”. Considerando-se 5% a taxa do Imposto Sobre Serviços a F-1 geraria à cidade um movimento de R$ 5,5 bilhões, número pouco provável. Levando em conta o primeiro ano de Nádia Campeão nesse cargo, em 2001 a arrecadação total de tributos da prefeitura paulistana, segundo o site deepask chegou a R$ 3,26 bilhões!
O dado mais recente disponível nesse mesmo site indica que em 2011 essa arrecadação subiu para R$ 6,63 bi, mais que o triplo do obtido pela cidade do Rio de Janeiro e cerca de 15 vezes o recolhido em Florianópolis. Nenhuma cidade brasileira além de São Paulo tem condição de atender a demanda criada pela F-1 seja em estrutura ou em qualidade de serviço. Dito isso, afirmar que Rio e Florianópolis estão prontas para assumir o lugar de Interlagos no calendário da F-1 é no mínimo uma afirmação mentirosa, típica de quem faz pressão para manter uma situação que há anos lhe é favorável. No final do ano passado chegou-se até mesmo a anunciar que Brasília teria interesse em receber a prova…
O Grande Prêmio do Brasil é importante para o automobilismo nacional? Certamente já foi muito mais e hoje em dia se mostra mais negativo do que positivo: as intermináveis e desordenadas reformas oficialmente cobradas pela Federação Internacional do Automóvel fecham o autódromo por pelo menos 90 dias por ano e afetam diretamente o calendário de provas nacionais e regionais. Em nenhum autódromo ou circuito dos 20 que compõem o calendário do Campeonato Mundial a prova de F-1 ocupa tanto espaço de tempo. O impacto gerado pelo evento na economia da cidade é considerável, mas isso não justifica interferência tão danosa no calendário local, que também gera empregos, tributos e explora a finalidade para a qual o autódromo foi construído.
De acordo com Rohonyi “Das 20 provas, apenas três não têm participação do Estado: Brasil, Inglaterra e Alemanha” e mais adiante menciona que “da nossa parte nunca houve um lobby para trabalhar mais em nível federal ou estadual, mas esse é o meu jeito. Nós fazemos o trabalho braçal, montar o evento não é fácil. Só conseguimos porque todos os prefeitos de São Paulo sempre nos apoiaram.” Contradição, pois além do apoio de alcaides, as verbas milionárias para pagar essas reformas são de origem municipal, estadual ou federal.
Pior do que isso, tais reformas não levam em conta as necessidades do esporte a motor local, sejam elas de calendário, logística ou funcionalidade e não tem seguem mínima lógica. Atualmente cobra-se a demolição dos boxes para reconstruí-los com o pé direito elevado em 40 centímetros; as soluções de engenharia e arquitetura empregadas são de qualidade e concepção discutíveis e sobram em qualquer vistoria básica. Os sistemas de ar-condicionado e o elevador da torre de controle só funcionam quando a F-1 visita o autódromo.
Enquanto isso, os promotores de etapas do campeonato paulista, que pagam R$ 50.220,00 por três dias de uso da pista (sem direito a eletricidade) são frequentemente obrigados a usar o estacionamento da antiga curva do sargento como box e paddock. Quem participa dessas competições é obrigado a conviver com o vazamento perene de esgoto que, muito provavelmente é depositado no lago que sobreviveu após inúmeras reformas. Não custa lembrar que o autódromo está situado em área de manancial.
As razões de tantas “melhorias” em Interlagos são tão curiosas quanto o fato do promotor do evento garantir sua realização mesmo que a prova dê prejuízo à F-1…
WG