Confesso admirador da engenharia Honda, Alberto Trivellato assumiu o volante do Civic Touring avisando que o que conhecia do carro se resumia à leitura das avaliações feitas à época do lançamento. Fora isso, foi a um evento em concessionária de São Paulo, convidado à conhecer a 10ª geração deste Honda. E só.
Como de praxe, nosso colaborador não leu as publicações anteriores deste Teste de 30 Dias com o Civic para poder expressar de forma mais natural e isenta suas impressões e, de cara, mandou um elogio à já bem avaliada ergonomia do Civic, que premia o motorista com um posicionamento encaixado. O apoio para o braço esquerdo bem conformado na lateral da porta faz par perfeito com o console elevado. O volante cai à mão de maneira natural e a distância encosto do banco até à pedaleira foi julgada exata. Com estatura equivalente à minha, o “capo” da Suspentécnica não precisou tocar em nenhum dos comandos elétricos de ajuste.
Na tarde com trânsito acima da média, achar uma via razoavelmente livre foi algo difícil. Em compensação, pavimentação ruim não faltou no trajeto e aquele que desde o início do teste consideramos um ponto alto do Civic — a capacidade de filtrar as imperfeições do solo e transmitir pouco ou quase nada do desconforto decorrente — foi exaltada. E não sem mencionar ser esta uma característica inédita aos Civic, sempre tendentes à um acerto de suspensão bem mais firme em suas versões anteriores.
A rapidez do volante e seu peso exato à condição urbana dos minutos de Alberto no comando do Honda foi outro ponto destacado como positivo pelo colaborador, assim como a resposta do motor ao acelerador, progressiva e consistente. Menos positivo foi o comentário sobre o câmbio que, apesar de ser um dos melhores da espécie CVT ainda é, segundo Alberto, um sistema que ele considera menos adequado ao seu gosto do que um moderno sistema robotizado de dupla embreagem. Neste critério entra não apenas a preferência pessoal do colaborador como também o caráter do motor do Civic, o 1,5 litro turbo, cuja “verve” esportiva é anestesiada pelo CVT.
Mesmo com a alavanca em “S” e executando a troca de marchas pelas borboletas, o câmbio não deixa de atuar de modo suave, sem oferecer aquele tão apreciado (por Alberto Trivellato e eu mesmo…) “pulo” na passagem de marchas em aceleração plena. Porém, tanto ele como eu chegamos à mais do que óbvia conclusão de que à este Civic Touring cabe o papel de sedã confortável e que seu cliente não obrigatoriamente sentirá falta do caráter apimentado que o motor Honda pode oferecer. Aliás, o Civic Si de nova geração vem aí e… aí sim, a Honda dará a pessoas como nós, inveterados entusiastas da performance, pão para nossos dentes.
No breve trajeto, duas ou três chances de afundar o pé no acelerador e deixar o Civic mostrar seus músculos denunciaram uma característica pouco apreciada pelo colaborador: um retardo na resposta do acelerador quando o pé é levantado abruptamente. De fato, o motor permanece acelerado por ínfimo tempo, mas o suficiente para causar a (má) impressão de que o carro vai seguir acelerando. Mas se trata apenas de estratégia que alguns fabricantes adotam em certos motores para manter as emissões de óxidos de nitrogênio (NOx) dentro dos limites legais.
Já outro “delay”, clássico nos motores superalimentados por turbocompressor, passou praticamente despercebido aos olhos de Trivellato, pois efetivamente neste 1,5-litro Honda a ação da turbina é pronta, sem que haja o desconforto de acelerar e nada acontecer como em motores turbo de gerações antigas, em que a resposta era tardia e na base do tudo ou nada.
De volta à oficina, a análise da carroceria e acabamento interno valeu mais elogios ao Civic geração 10, definido como sóbrio e bem construído, com materiais de boa qualidade e montagem atenta. Erguido no elevador, a boa impressão permaneceu e pela primeira vez desde que iniciamos as visitas à Suspentécnica para a análise das entranhas dos carros do Teste de 30 Dias foi necessário uma desmontagem para ter acesso visual à mecânica, uma vez que a área do motor e parte da suspensão dianteira é coberta por três elementos: protetor de cárter de aço opcional e duas placas, uma de alumínio, menor, que deve ser retirada por ocasião da troca de óleo, por exemplo, e uma bem mais extensa, de plástico, que vai da ponta do para-choque até cerca de um metro além da linha do eixo dianteiro.
Tais componentes não se devem à necessidade de proteção do motor e câmbio, mas principalmente à fatores aerodinâmicos e talvez, também, a uma necessária manutenção de um equilíbrio térmico. Nesta desmontagem, destaque para a facilidade da operação — apesar dos muitos parafusos e travas plásticas, foi fácil retirar tais partes. A qualidade das peças mencionadas, ambas dotadas de uma fina camada de material fonoabsorvente na face interna, também merece destaque. Aliás, todo o assoalho inferior do Civic é coberto por material fonoabsorvente, semelhante à aqueles que comumente estão no lado interno do capô do motor, algo inusual, que confirma o cuidado da Honda para com esta versão, que surpreende pelo silêncio na cabine.
Nesta excursão pela parte inferior do Honda Alberto Trivellato logo aponta para os elementos que são os responsáveis pela suavidade de marcha e nenhum desconforto ao passar por irregularidades no pavimento: as buchas de suspensão hidráulicas, de dimensões generosas, excepcionais “filtros” que isolam as bandejas de suspensão dianteira McPherson e os braços da suspensão traseira multibraço da carroceria.
Não há miséria em termos de horas de engenharia no projeto e execução do Civic Touring, cuja visão inferior, seja no todo seja no detalhe, passa o que se espera de um modelo que chega a sua 10ª geração exibindo uma inegável história de sucesso mundial. Chamou a atenção de Alberto e seus colaboradores e excelência de projeto, sem arrojos técnicos, onde bandejas estampadas em aço, bem projetadas e robustas, não fazem má figura ante outras feitas em alumínio. A bela realização de componentes e a organizada montagem da parte inferior torna este Civic, aos olhos de gente de oficina, um carro bonito, tanto quanto os desenhistas quiseram fazê-lo belo externamente. Um exemplo disso é o elegante escapamento duplo, onde a simetria e impressão de qualidade do componente andam de mãos dadas.
Baixado do elevador na Suspentécnica, o Civic Touring parecia ainda mais admirável do que antes de podermos olhar para suas partes inferiores, aquelas que raramente (ou nunca) seus proprietários irão ver. Boa parte do segredo da eficiência do modelo está ali, sob a forma de — como gosta de frisar Alberto Trivellato — horas e mais horas de engenharia, onde nada é deixado ao acaso, onde cada parte, cada peça, parece ter sido projetada com excelência ímpar sem, no entanto, exageros de qualquer ordem.
Enfim, o Civic Touring é um genuíno Honda, empresa que habituou o mundo à veículos que ainda preservam muito do idealismo prático de seu fundador, um engenheiro autodidata que apreciava soluções elaboradas e complexas mas também valorizava a simplicidade funcional. E é exatamente esta aparentemente paradoxal simbiose que se vê neste Civic de 10ª geração, um carro na plenitude de sua maturidade. Todo novo, todo inédito, mas que é o resultado de anos de aperfeiçoamento.
Depois destas palavras não há como negar que o modelo me agradou de maneira quase que completa, e o quase se deve a pequenos e insignificante detalhes que estão mais no âmbito do gosto pessoal do que no aspecto da necessidade de melhorar o produto. Como Alberto, eu também preferiria um câmbio de dupla embreagem e bobagenzinhas como reduzir o excessivo tamanho dos espelhos retrovisores ou atenuar o claustrofóbico interior por meio de um revestimento de teto claro no lugar de preto, meros detalhes de gosto pessoal.
Nada disso compromete, porém, a delícia que é rodar com o Civic seja onde for, cidade ou rodovia, ou a alegria de ver como este motor é tremendamente econômico e, ao mesmo tempo, garantia de excelente desempenho. Confortável, bonito, agradável… o que mais pretender? Ah, que custasse menos que 130 mil reais. Sabemos todos que nem tudo que custa caro é bom, mas este Civic vale cada real pago por ele.
Como é fácil presumir, jornalistas especializados têm por dever exigir o máximo dos carros de teste para poder emitir opiniões com propriedade. É comum no meio ouvir que a quilometragem de um carro de frota de imprensa equivale a pelo menos o dobro. Sendo assim, não deixou de ser uma demonstração de plena confiança da Honda em seu produto a entrega deste Civic Touring exibindo 25 mil quilômetros rodados no hodômetro, número inusualmente alto para um veículo de frota destinado à avaliações por parte da imprensa. Mesmo com estes quilômetros de “malho” no lombo, o Civic iniciou e terminou o teste como se fosse novo, sem ruídos de nenhuma ordem e tampouco sinais de desgaste. Isso permite intuir que este Civic de 10ª geração pertence mesmo à estirpe de carros que mesmo com o passar do tempo e quilômetros rodados se mantém dignamente íntegros.
RA
Leia os relatórios anteriores: 1ª semana 2ª semana 3ª semana
Honda Civic Touring
Dias: 30
Quilometragem total: 1.927 km
Distância na cidade: 1.210 km (62,8%)
Distância na estrada: 717 km (37,2%)
Consumo médio: 9,5 km/l
Melhor média: 17,0 km/l
Pior média: 5,8 km/l
Média horária: 24 km/h
Tempo ao volante: 80h03minutos
Litros consumidos: 203,84
Custo: R$ 815,17 (média litro R$ 3,95)
Custo km rodado: R$ 0,42
FICHA TÉCNICA HONDA CIVIC TOURING 2017 | |
MOTOR | Quatro cilindros em linha, bloco e cabeçote de alumínio, transversal, 16 válvulas, duplo comando no cabeçote acionado por corrente, variador de fase admissão e escapamento, turbocompressor com interresfriador, gasolina |
Cilindrada (cm³) | 1.498 |
Diâmetro e curso (mm) | 73 x 89,5 |
Taxa de compressão (:1) | 10,6:1 |
Potência máxima (cv/rpm) | 173/5.500 |
Torque máximo (m·kgf/rpm) | 22,4/1.700~5.500 |
Formação de mistura | Injeção direta |
TRANSMISSÃO | |
Câmbio | Transeixo dianteiro automático CVT |
Relações de transmissão (:1) | 2,645 a 0,405; ré 1,858 a 1,264 |
Espectro das relações (:1) | 6,53 |
Relação de diferencial (:1) | 4,81 |
SUSPENSÃO | |
Dianteira | Independente, McPherson, braço inferior triangular com buchas hidráulicas, mola helicoidal, amortecedores pressurizados e barra estabilizadora |
Traseira | Independente, multibraço com buchas hidráulicas, mola helicoidal, amortecedor hidráulico e barra estabilizadora |
DIREÇÃO | |
Tipo | Pinhão e cremalheira, eletroassistida com pinhão duplo, relação variável e indexada à velocidade |
Voltas entre batentes | 2,2 |
Diâmetro do aro do volante (mm) | 360 |
Diâmetro mínimo de giro (m) | 11,2 |
FREIOS | |
Dianteiros (Ø mm) | Disco ventilado/282 |
Traseiros (Ø mm) | Disco/260 |
Controle | ABS (obrigatório), EBD e assistência à frenagem |
RODAS E PNEUS | |
Rodas (pol.) | Alumínio, 7Jx17 |
Pneus | 215/50R17V (Bridgestone Turanza ER33) |
Estepe temporário | T135/80JC16M |
CARROCERIA | Monobloco em aço, sedã 3-volumes subchassi dianteiro, quatro portas, cinco lugares |
CAPACIDADES (L) | |
Porta-malas | 519 |
Tanque de combustível | 56 |
PESOS (kg) | |
Em ordem de marcha | 1.326 |
Capacidade de carga | 409 |
DIMENSÕES (mm) | |
Comprimento | 4.637 |
Largura com espelhos | 2.076 |
Altura | 1.433 |
Distância entre eixos | 2.700 |
DESEMPENHO | |
Aceleração 0-96,5 km/h (s) | 6,9 (imprensa especializada dos EUA) |
Velocidade máxima (km/h) | 202,7 (imprensa especializada dos EUA) |
CÁLCULOS DE CÂMBIO | |
V/1000 c/ rel. mais longa (km/h) | 62,6 |
Rotação a 120 km/h, idem (rpm) | 1.900 |
MANUTENÇÃO | |
Troca de óleo do motor (km/tempo) | 10.000/1 ano |
Revisões (km/tempo) | 10.000/1 ano |
GARANTIA | |
Termo (tempo/anos) | Três anos |