Seria difícil imaginar um veículo tão adequado como o Jeep Compass para rodar por mais de 2.800 km Brasil adentro durante uma semana, coisa que fiz por um roteiro que se mostrou ao mesmo tempo revelador e exigente.
Largando de São Paulo em uma manhã de domingo, com quatro adultos a bordo e porta-malas completamente lotado, a primeira etapa desta jornada cujo destino foi a paradisíaca Cumuruxatiba, no litoral sul da Bahia, teve como alvo a mineiríssima Governador Valadares.
Foi um “pernada” significativa, de pouco mais de 900 quilômetros, moleza para o Jeep Compass, motoristas e passageiros. Em aproximadamente 13 horas de viagem — incluído neste tempo uma parada para almoço e reabastecimento — além outras duas, breves, para “esticar as pernas”, os ocupantes da maratona chegaram ao pernoite mineiro em forma.
O que faz do Compass um competente e confortável devorador de quilômetros? Em primeiro lugar, o conforto da cabine, pois tanto os bancos dianteiros quanto o traseiro têm conformação adequada para muitas horas de viagem. Fator importante também é a climatização, que no inverninho frouxo do sudeste brasileiro permitiu que o ar-condicionado fosse usado em menos de 30% do percurso, condição esta favorecida pela existência de um eficiente (e gigantesco) teto solar, opcional que eu particularmente aprecio, e que foi usado como eficiente exaustor do ar.
Basculando apenas a porção traseira, o bem projetado teto solar não aumentou em quase nada o ruído interno e proporcionou um ambiente ventilado e agradável. Outro aspecto a elogiar derivado da área envidraçada é a luminosidade, facilmente controlada pela “cortina” que suprime desconforto nas horas de sol a pino.
Ainda sobre a climatização, o sistema de ar-condicionado do Compass possibilita escolher temperaturas diferentes para motorista e passageiro e há duas saídas de ar para os ocupantes do banco de trás, situadas na porção final do console central. Este, como manda o figurino, tem um correto apoio de braço central que esconde um espaçoso porta-objetos.
Falando neles, os porta-objetos, o mais espaçoso fica sob o assento do banco do passageiro, cujo único defeito é o da acessibilidade. Se alguém estiver sentado ao lado do motorista não há chance de colocar nem tirar nada… Já as portas abrigam bem úteis garrafinhas de água e algo mais, todavia a ausência do porta-luvas refrigerado — algo comum em veículos de padrão até inferior ao do Compass — é um aperfeiçoamento que deve entrar na lista de futuras versões deste Jeep.
Mais sugestões? Sim: colocar uma porta USB e tomada de força 12 V para os passageiros da “2ª classe” , que foram obrigados a compartilhar um único cabo de recarga para telefone celular espetado na porta USB situada sob o apoio de braço do console entre motorista e acompanhante, o que exigiu um cabo de dimensões generosas.
Como mencionado no início, o porta-malas de 410 litros ficou lotado, mas não foi necessário retirar sua cobertura e obstruir a visão do vidro traseiro. E isso induz a sugerir mais um aperfeiçoamento nos futuros Compass: melhorar a conformação da cobertura do porta-malas, cujos encaixes sofrem nesta condição de uso carregadão. “Montar” a bagagem de maneira que a tampa permanecesse adequadamente posicionada em seus encaixes e apoios exigiu certa paciência e o ideal seria tal tampa ter um formato mais regular e não côncavo. Fora isso deveria existir de uma rede ou tela para separar porta-malas da área de passageiros, fundamental para a segurança.
Ainda sobre o porta-malas, o robusto assoalho sobre o estepe (de uso temporário) pode ser colocado em dois níveis e em volta da roda-reserva há nichos que, para esta viagem, foram preenchidos por apetrechos que, mesmo sem tê-los usado, serviram de tranquilizante para minha alma: algumas ferramentas, um rolo de arame (viva o arame!), um saco com quatro cintas para amarração, elásticos e luvas.
Sobre o coração deste Compass, o motor Diesel, é preciso dizer que ele mostrou a esperada competência logo de cara: no trecho inicial da viagem, na agora excelente (quem te viu, quem te vê, rodovia Fernão Dias!), de São Paulo a Belo Horizonte, a melhor marca de consumo do teste até agora foi alcançada, ótimos 14,2 km/l, conseguidos sem nenhuma atenção especial para com o acelerador. Aliás, o motor quatro-cilindros de 2 litros dotado turbocompressor é, certamente, um ponto alto deste Jeep. Nas saídas de pedágio a “patada” é empolgante, a progressão, mesmo carregado, nada deixa a desejar e os 35,7 m·kgf de torque a meras 1.750 rpm dizem “presente!” de maneira enfática.
Tal panorama se atenua em velocidades a partir dos 120 km/h: ao afundar o pé no acelerador a resposta não é tão excitante e para ter mais “punch” é preciso trabalhar com o câmbio, o quase impecável 9-marchas, que tanto permite trocas pela alavanca (reduções empurrando) como pelas borboletas posicionadas atrás do volante (redução na esquerda, subir marcha na direita, este um padrão mundial imutável).
Por que chamei o câmbio de “quase impecável”? Certas vezes ele se finge de morto e não permite passar ou reduzir marchas quando julguei pertinente. Já havia sentido isso em uso urbano, na primeira semana do teste, e até comentei sobre a insistência em segurar marchas altas em situações nas quais seria possível usar relação mais longa e deixar o motor trabalhar em rotação menor. Qual o motivo da relutância do câmbio? À parte os óbvios (proteção contra rotação excessiva) uma suposta prioridade para o conforto: ao fugir das baixíssimas rotações, vibrações e/ou ressonâncias desagradáveis seriam evitadas.
De qualquer modo, mesmo teimando em às vezes segurar marcha mais curta, levar o Compass em rodovia foi uma atividade agradável. A 120 km/h com conta-giros mostrando o baixo regime de rotação — cerca de 1.900 rpm — em 9ª, as vibrações inexistem, idem ruídos, sejam eles de motor, aerodinâmicos ou dos pneus. Conversa-se sem alterar o tom de voz na cabine e a sensação de segurança é soberba.
O volante de aro grosso oferece ótima empunhadura e o sistema de direção tem peso exato em qualquer condição, velocidade alta ou manobra. Mesmo em ritmo acima da lei o Jeep Compass transmite excelente sensação de estabilidade e somente perto da máxima, declarada como sendo de 194 km/h, ele fica “na pontinha do pé”, ou seja, meio arisco.
No segundo dia de viagem, o trecho entre Governador Valadares e Prado, já na Bahia, foi instigante. Como esperado, curvas e mais curvas em asfalto mais do que sofrido antes de cruzar a fronteira de Minas Gerais com a Bahia, onde a surpresa foi encontrar logo após a divisa um longo trecho de asfalto novo na BR-418, também conhecida como Estrada do Boi.
Esta porção final da viagem deu ao Compass a chance de mostrar seus músculos em inesperado bom asfalto e com visibilidade excelente. Isso me fez encurtar o tempo de viagem previsto de forma importante e assim o trecho derradeiro, de genuíno off-road, foi feito ainda de dia. Por conta disso, a opção foi pela alternativa pior em termos de piso, a rota que vai de Prado a Cumuruxatiba margeia o Oceano Atlântico.
Sendo época de chuvas, uma ou outra poça de lama separando alguns trechos íngremes pontilharam o trajeto até o destino, mas nada que fosse capaz de colocar em crise nem sequer um carro normal, e muito menos um Jeep como o Compass, dotado de tração 4×4. Em nenhum momento foi preciso tirar o seletor situado no console da opção “Auto”, na qual a tração traseira é somente aplicada caso os sensores indiquem perda de aderência nos pneus dianteiros.
Todos os Compass 4×4 vêm equipados com um sistema de transmissão de vasto cardápio de alternativas no que diz respeito ao comportamento da tração. Fora a “Auto” há a função “Snow” (“neve” em inglês, indicada para terrenos com baixa aderência onde a entrega de torque nas rodas deve ser progressiva e evitar qualquer patinagem), “Mud” (lama, para terrenos pesados, que exigem alguma certa patinagem para manter a progressão) e “Sand” (areia, para terrenos macios e pesados). Além disso a transmissão pode ser bloqueada 50-50% com o botão “Lock” e ainda há a função que, se acionada, impede a perda de aderência em descidas escorregadias.
Para chegar ao destino nada disso foi necessário. Porém, a primeira centena de metros na terra trouxe tremendo desconforto e logo a razão foi compreendida: a pressão dos pneus, cuja sugestão de fábrica 37 lb/pol2 nos dianteiros e 32 lb/pol2 nos traseiros estava excessiva. O próprio painel de instrumentos indicava que medida que escolhi 500 km antes, em Governador Valadares (39-34), havia disparado para 43-37. A solução foi esvaziar os quatro, atuando em cada bico e contando mentalmente até 15. Com isso a pressão desceu a mais adequados 32-29 e o conforto (e a aderência no piso macio) melhorou de maneira evidente.
No abastecimento este trecho de viagem mais tortuoso e acidentado cobrou seu preço: a média desceu para ainda bons 10,4 km/l, cifra esta que caiu no vai e vem turístico da semaninha de férias (sempre rodando na terra ou areia) para 10,1 km/l, marca ainda excelente considerando o intenso para e anda em trajetos curtos permeados por buracos, pontes estreitas e subidões.
A viagem de volta a São Paulo, bem mais apressada que a ida, confirmou os dotes estradeiros do Compass e acrescentou outras informações, como a que diz respeito à eficiência dos faróis de xenônio e competência dos limpadores de para-brisa. A primeira etapa de mais de 800 km, de Cumuruxatiba a Belo Horizonte, ainda teve tempo razoavelmente bom mas com boas duas horas de pilotagem noturna. Já na etapa Belo Horizonte a São Paulo a chuva compareceu e isso aliado à pressa fez o consumo cair dos 14,2 km/l deste mesmo trecho na ida para ainda razoáveis 13 km/l.
Na chegada, após exatos 2.878 km rodados, motoristas e passageiros comemoraram a excelente viagem em grande parte proporcionada pela boa escolha feita: o Jeep Compass que, como disse no início, é com certeza um dos veículos mais adequados para encarar milhares de quilômetros carregado a pleno com segurança, economia e desenvoltura, muita desenvoltura.
Mesmo nos trechos mais esburacados e de asfalto deteriorado a suspensão robusta e os pneus, valentes Pirelli Scorpion Verde medida 225/55R18, não nos deixaram temer por algum contratempo que pudesse atrasar ou estragar o passeio. E, além disso, havia a valentia do motor, sua economia e o soberbo conforto. O que mais seria possível pedir?
Prometo refletir a respeito desta pergunta uma vez que, confesso, meu olhar crítico ainda está sob efeitos desta longa, bela e bem sucedida viagem, onde o meu sempre grande prazer de dirigir foi potencializado por excelente companhia e ele, o Jeep Compass. Ainda com duas semanas de teste pela frente, vou buscar explorar ainda mais este que é o mais querido (leia-se vendido) SUV do Brasil, coisa difícil depois de tantos quilômetros já rodados, mas não impossível. Quem sabe… aquela clássica viagem ao litoral norte paulista e o “gran finale”, a visita à Suspentécnica ainda nos revelem algumas surpresas?
RA
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Jeep Compass Night Eagle Diesel
Dias: 14
Quilometragem total: 3.044 km
Distância em cidade: 279 km (9%)
Distância em rodovia: 2.765 km (91%)
Consumo médio: 11,9 km/l
Melhor média: 14,2 km/l
Pior média: 8,3 km/l
Média horária: 55,6 km/h
Tempo ao volante: 54h43minutos
FICHA TÉCNICA JEEP COMPASS LONGITUDE 2,0 DIESEL 4X4 | |||||
MOTOR | |||||
Denominação | 2.0 MultiJet II 948TE | ||||
Descrição | 4 cilindros em linha, Diesel, dianteiro transversal, bloco de ferro fundido e cabeçote de alumínio, duplo comando de válvulas, correia dentada, atuação indireta de válvulas por alavanca-dedo com fulcrum hidráulico, superalimentado por turbocompressor com turbina de geometriia variável (VGT) com interresfriador, arrefecido a líquido | ||||
Combustível | Diesel S-10 | ||||
Taxa de compressão (:1) | 16,5 | ||||
Diâmetro e curso (mm) | 83 x 90,4 | ||||
Cilindrada (cm³) | 1.956 | ||||
Potência máxima (cv/rpm) | 170/3.750 | ||||
Torque máximo (m·kgf/rpm) | 35,7/1.750 | ||||
Formação de mistura | Injeção direta common-rail Bosch, pressão de injeção 1.600 bar | ||||
TRANSMISSÃO | |||||
Câmbio/rodas motrizes | Automático, 9 marchas à frente e uma à ré, 4 rodas motrizes (traseiras sob demanda), comando pela alavanca seletora e borboletas | ||||
Relações das marchas (:1) | 1ª 4,70; 2ª 2,84; 3ª 1,91; 4ª 1,38; 5ª 1,00; 6ª 0,81; 7ª 0,70; 8ª 0,58; 9ª 0,48; ré 3,80 | ||||
Relação dos diferenciais (:1) | 4,33 | ||||
SUSPENSÃO | |||||
Dianteira | Independente McPherson, braço triangular, mola helicoidal, amortecedor pressurizado e barra estabilizadora | ||||
Traseira | Independente McPherson, 2 braços transversais, mola helicoidal, amortecedor pressurizado e barra estabilizadora | ||||
DIREÇÃO | |||||
Tipo | Pinhão e cremalheira eletroassistida | ||||
Diâmetro mínimo de curva (m) | 11,3 | ||||
FREIOS | |||||
Servoassistência/tipo | A vácuo por bomba | ||||
Dianteiros (Ø mm) | Disco ventilado/305 | ||||
Traseiros (Ø mm) | Disco/278 | ||||
RODAS E PNEUS | |||||
Rodas | Alumínio, 7Jx18 | ||||
Pneus | 225/55R18 | ||||
CARROCERIA | |||||
Construção | Monobloco em aço, suve, 4 portas, 5 lugares | ||||
DIMENSÕES EXTERNAS (mm) | |||||
Comprimento | 4.416 | ||||
Largura sem/com espelho | 1.819/2.033 | ||||
Altura | 1.645 | ||||
Distância entre eixos | 2.636 | ||||
Bitola dianteira/traseira | 1.540/1.540 | ||||
Distância mínima do solo | 218,3 | ||||
DADOS OFF-ROAD | |||||
Ângulo de entrada (º) | 28,7 | ||||
Ângulo de saída (º) | 31,9 | ||||
Ângulo central (º) | 23,2 | ||||
PESOS E CAPACIDADES | |||||
Peso em ordem de marcha (kg) | 1.717 | ||||
Carga útil (kg) | 400 | ||||
Rebocável sem/com freio (kg) | 400/1.500 | ||||
Capacidade do porta-malas (L) | 410/1.191com banco rebatido | ||||
Capacidade do tanque (L) | 60 | ||||
DESEMPENHO | |||||
Aceleração 0-100 km/h (s) | 10 | ||||
Velocidade máxima (km/h) | 194 | ||||
CONSUMO DE COMBUSTÍVEL INMETRO/PBVE | |||||
Cidade (km/l) | 9,8 | ||||
Estrada (km/l) | 11,4 | ||||
CÁLCULOS DE CÂMBIO | |||||
v/1000 na última marcha (km/h) | 65,0 | ||||
Rotação a 120 km/h em 9ª (rpm) | 1.850 | ||||
Rotação à vel. máxima em 8ª (rpm) | 3.600 |