Assistir televisão é um dos meus passatempos mais frequentes quando estou em casa. Faço isso enquanto trabalho no computador, cozinho, arrumo papéis e contas… enfim, é muito comum que algum aparelho esteja ligado, embora poucas vezes tenha minha atenção exclusiva – caso, por exemplo, das corridas de carro de diversos tipos. Sou vidrada em alguns seriados, mas nem nesse caso deixo de fazer algo paralelamente. Sou a própria multitarefas nesse caso.
Assisto mais canais fechados do que os abertos e confesso que alguns só sei que existem quando zapeio pelo guia de programação e me deparo com seus nomes e números. Mas nunca os vi nem sei qual o tipo de programação que apresentam. Lembro que quando assinei um pacote de televisão fechada, séculos atrás, um dos argumentos que me atraíram foi me livrar das propagandas e do horário eleitoral… Ironicamente, hoje, em época de votação assisto vorazmente o programa não-tão-gratuio, embora o principal resultado seja apenas me irritar com as mentiras que vejo, com candidatos que já ocuparam diversos cargos públicos e nunca fizeram aquilo que agora juram de pé junto farão e com a precariedade de certas candidaturas. Algo assim como aquele aspirante a vereador (se não me falha a memória) que no início da redemocratização anunciava como curriculum ter sido campeão de braço de ferro sei lá eu onde. Já no caso da propaganda, enquanto algumas me irritam profundamente como as de cerveja bem no início do verão, tem algumas obras de arte em seu haver, embora cada vez mais raras. Ainda para mencionar uma de cerveja, a da Heineken com David Coulthard e Nico Rosberg no estilo Missão Impossível é simplesmente deliciosa.
Ultimamente tenho me encantado com a campanha do VW Jetta — aquele filme no qual o pai chama o filho, que está usando fones de ouvido e digitando no celular tipo “não estou nem aí com o mundo” e o fascínio que o carro exerce sobre o garoto num simples passeio junto com o pai.
Espertíssimo ele, aliás. Em vez de tentar um diálogo com alguém que até na expressão corporal não quer nenhuma interação, apenas mostra os recursos do novo carro e conquista a atenção e admiração do filho, a ponto de ele nem lembrar de seu “interlocutor” no celular. Aliás, lembrei de uma frase da ótima Rita Lobo: “Se você tem filhos adolescentes e quer receber alguma atenção, compre um cachorro”. Ou, neste caso, diria eu, um Jetta, hehehehe. E para não deixar de comentar, que música! Maravilhosa.
Esse tipo de cumplicidade pai-filho estabelecida pelo novo carro é algo lindo de se ver. Lembro até hoje quando meu pai chegou em casa com o Torino prata e saímos todos à rua para admirar o possante. Ou quando ele comprou o Rambler branco para minha mãe. Não vi quando ele comprou o Maverick amarelo gema de ovo, mas assim que chegamos ao Brasil ele nos mostrou o carro tal qual o pai do filme do Jetta. Com direito a todos os detalhes e explicações sobre o motor, como se crianças de menos de uma década de idade pudessem entender esse nível de detalhamento. Mas, oquei, meu pai era assim mesmo. Nunca falou como bebê com as filhas, nem com palavras erradas ou infantilizadas e às vezes acredito que ele achava que eu entendia aos seis anos o que representavam 6 cilindros em V ou no que mudaria minha vida andar num carro com três carburadores. Mas ele mostrava e explicava.
Já disse aqui que tive uma infância muito boa, feliz e com família extremamente amorosa, ainda que com uma educação rigorosa . Por isso, lembrar desses momentos, em meio a tantos outras recordações boas, não é pouca coisa. Comecei a gostar de carros quando era pequena, mas bem depois das primeiras aquisições veiculares. Logo, não acho que tenha sido isso que despertou em mim o autoentusiasmo. Se fosse assim, minha irmã gostaria de carros – e ela apenas diferencia uma moto de um carro pelo número de pneus. Deve ter sido que eu estava fadada a gostar mesmo.
Tempos atrás, numa consulta com meu ortopedista, comentei com ele que apesar de ter desistido da ginástica olímpica há anos devido às várias lesões que sofri, ainda tinha flexibilidade e movimentos acima do que se esperaria de uma pessoa da minha idade que não tivesse praticado esportes. Ele me explicou que é ao contrário. Que acabamos fazendo (quando o fazemos) algum esporte para o qual nosso corpo está mais preparado e do qual ele gosta mais. “Se não, 90% dos meninos fariam judô e 90% das meninas balé porque é o que a maioria dos pais manda fazer inicialmente”, disse. Ou seja, mesmo sem perceber, o corpo escolhe o que quer e para o que tem mais habilidade. Isso responde parcialmente minha dúvida existencial: durmo tarde porque trabalhei muitos anos em jornal diário ou trabalhei em jornal diário tantos anos porque gosto de dormir tarde? Respostas para a redação, se as tiverem.
Claro que comprar um carro quando eu era pequena era um acontecimento, especialmente pelos valores envolvidos. Não que hoje seja barato, mas naquela época era como viajar para Europa. A família inteira ia até o aeroporto se despedir do felizardo que ia embarcar como se se tratasse de uma decolagem da Nasa rumo a Marte. Hoje tem gente que nem beijinho de quem mora na mesma casa ganha quando viaja de tão comum que é – ambas coisas, diga-se, viajar e ser ignorado pelos filhos adolescentes, segundo a Rita Lobo… Ou por acaso alguém imagina que seria comum a família inteira ir até o ponto de ônibus porque alguém vai pegar um busão para ir aí pertinho?. Não, né? Essas coisas ficaram cada vez mais comuns. Hoje cunhados ou irmãos trocam de carro e mesmo sendo uma família unida nem sempre ficamos sabendo.
Mas é claro que o acontecimento não é o carro, como objeto, e sim o momento que ele proporciona. Que atire a primeira CNH quem não tem um pouco desse autoentusiasmo na veia.
Aliás, quem tiver, nos vemos sábado no Box 54 no encontro dos 10 anos do AE. Até lá!
Mudando de assunto: pois é, acabou o Campeonato de Fórmula 1 deste ano. Agora terei de me aguentar até março… Da corrida em si não há muito o que falar. Espetacular o acidente do Hulkenberg (de corrida, diga-se, pois apesar de envolver o Grosjean desta vez ele não teve culpa), a ultrapassagem do Vandoorne sobre Ocon e Grosjean ao mesmo tempo e pena o Kimi ter quebrado justamente na despedida da Ferrari. Também gostei de ver o circuito onde estive. É muito legal reconhecer cada curva – sei lá, é diferente ter estado lá do que ter visto pela televisão, ainda que tenha acompanhado as corridas de lá pela televisão durante anos. Adorei a imagem final de Hamilton e Vettel escoltando Alonso. Misto de respeito e homenagem. E palmas para o engenheiro do Alonso que respondeu à altura à ironia do espanhol, quando ele tentava animá-lo para tentar marcar um ponto mais no campeonato. “Mas eu já tenho 1.800 pontos…”. “Well for me, make it 1.801” que numa tradução livre seria algo assim como “então faça 1.801”. Meu ídolo. esse engenheiro!
NG