Pois é, chegamos hoje ao país que me era mais desconhecido na minha viagem. Digo desconhecido mesmo em termos teóricos neste meu roteiro, pois na prática apenas conhecia a Alemanha, mas havia ouvido muito sobre Polônia e Hungria. Da Eslováquia, apenas alguns conhecidos que estiveram em Bratislava por algumas horas, geralmente entre Budapeste e Praga ou Viena. E só.
Mas a Eslováquia é mais do que a capital. Meu roteiro foi de cavernas e castelos, pois adoro história e tenho fascinação por fenômenos geológicos. Se tiver uma caverna, uma cachoeira, um cânion, uma formação rochosa diferente ou algo assim, é para lá que eu vou. E assim foi. Começamos nossa visita pela linda Bratislava e seguimos cruzando o país em diagonal e rumo ao nordeste.
Apesar de eu sempre fazer minha lição de casa, não pesquisei sobre infraestrutura do país. Talvez por isso tenha me surpreendido com asfalto perfeito e ótima sinalização tanto nas ruas quanto nas estradas (foto de abertura), embora a maioria tenha sido de pista simples e sem acostamento. O carro era o Škoda Octavia que havíamos alugado na Hungria e que, como já mencionei, foi uma excelente escolha. Ótimo porta-malas, motor excelente e todos os recursos de um carro de primeiro mundo. Não fiz o cálculo de quanto dirigimos pela Eslováquia, mas cruzamos o país em diagonal, desde Bratislava até o centro, depois o norte e nordeste e daí para a Polônia.
Já havia estado na República Checa, que durante anos foi, junto com a Eslováquia, a Checoslováquia, mas não sabia muito mais do que isso e, claro, bastante sobre a história do país. Se bem que na Europa Central e do Leste tudo para mim é meio confuso. Assim como a Hungria, houve tanta invasão, anexação e separação de territórios que costumo misturar as coisas. Sem falar, é claro, nos nomes de reis, príncipes e conquistadores que sequer consigo pronunciar.
Logo no início, procurei aprender meu vocabulário mínimo de palavras no idioma local, como já mencionei aqui costumo fazer. Por sorte, algumas palavras começam a se parecer entre os países da região e fica mais fácil, embora não raramente confunda. E isso porque apenas aprendo meia dúzia de coisas… Mas, claro, o idioma é um obstáculo nos povoados menores. Em Bratislava nos entendemos bem em inglês, assim como nos hotéis e em boa parte dos restaurantes. Em Liptovksy Mikulas quis comprar umas latas de patês variados mas, como entender um rótulo exclusivamente em eslovaco? Numa lojinha na qual os produtos estavam atrás do balcão, o simpático vendedor que não falava nada de inglês digitou animal por animal no meu celular para que o Google translator fizesse o resto. Assim, comprei patê de pato, ganso e javali selvagem (mangalica) e dispensei o de peru. Até aquele momento, as palavras que eu escolhi para serem traduzidas foram inúteis, como “carne de almoço”, “óleo” e outras que não me permitiam escolher. O duro de não entender o idioma é que sequer conseguimos escolher as palavras certas para serem traduzidas.
Apesar da topografia, digamos, complicada, do país, com os Montes Cárpatos (que abrigam os menos famosos, mas ainda assim lindos montes Tatras) como a principal marca, e do frio inclemente no inverno, quando não raro chega aos 20 graus negativos, as estradas não tem um único buraco, apesar do trânsito pesado e da pista simples, como foi a maioria do nosso roteiro. As travessias são extremamente bem feitas: pontes de altura adequada e solidamente construídas, como esta estrada entre Bratislava e Bojnice e im que, acho, era próximo de Zehra (foto abaixo). Num dos lugares de interior onde estivemos mais tempo, Orava, no norte do país muito próximo da fronteira com a Polônia, há 130 dias de neve por ano. Canso de ouvir no Brasil que os problemas de qualidade do asfalto são devido ao peso dos caminhões e às constantes chuvas. Detalhe: nas cidades próximas dos montes Tatras o índice pluviométrico é de 1.500 milímetros ao ano – mais de sete vezes mais do que a região de Mendoza, na Argentina. Dou esse exemplo apenas porque me lembro de cabeça que lá é 200 milímetros ao ano… Mas para efeitos de comparação séria, São Paulo tem 1.440 milímetros de precipitação média ao ano. Pesquisei.
Ora, e o que falar da neve na Eslováquia? E da enorme quantidade de caminhões que há, especialmente rumo à vizinha Polônia, que registra a maior frota de veículos pesados da União Europeia? Tem até muita chuva. Ah, essas desculpas…
No total, o país tem somente 49.000 quilômetros quadrados, a maioria de lindas florestas. Habitantes são 5,5 milhões, mas deve ter um número igual de ursos. Aliás, esse foi um dos motivos de atenção. Não vimos nenhum, mas esta é a pior época para encontrar um, pois é no outono que eles se alimentam pantagruelicamente para poder hibernar em seguida. Ou seja, estão no auge da forma física e loucos por alimento. Seria mesmo péssimo encontrar um nesta época. Mas vimos vários cervos selvagens, comuns também pelas florestas do país. Nas estradas, nada de telas nem outro sistema de proteção para os animais selvagens. No entanto, vimos apenas pequenos animais atropelados e, mesmo assim, não mais do que uns 3-4. Pareciam lebres ou pequenas raposas. Fiquei pensando se até os animais selvagens de lá são mais inteligentes do que os destas paragens…
Um dado interessante é que a Eslováquia é o maior fabricante de veículos per capita, com mais de 1 milhão de unidades produzidas anualmente, e o sétimo maior da União Europeia. A indústria automobilística é a principal fonte de receita industrial do país — o VW up! para o mercado europeu sai de lá, por exemplo — e reponde por 12% do Produto Interno Bruto. A maioria, é claro, tem como destino o exterior, e veículos já respondem por 26% das exportações, mas ainda assim o país tem uma frota total de mais de 3 milhões. Sim, isso mesmo. E uma população de 5,5 milhões de pessoas. Devem gostar muito mesmo de carro.
Vi todo tipo de automóvel e de várias marcas. Assim como na Hungria, chamou-me (a ênclise da semana) a atenção que não se veem veículos com película nos vidros. Talvez um 1% com filme apenas nos vidros traseiros — se tanto. Encontramos menos carros brancos, prata ou pretos do que nos outros países. Especialmente, muitos vermelhos, azuis, tons de marrom e ferrugem — enfim, amplo espectro de cores.
Concretamente, o mercado eslovaco é liderado pela Škoda, marca do Grupo Volkswagen, que no primeiro semestre deste ano alcançou 19,38%, seguido da Volkswagen marca, com 9,02% e Hyundai (7,88%). Como se percebe por estes números, o mercado é bem fragmentado entre as marcas.
Assim como na Hungria, vi bicicletas que, aliás, também circulam ora pela rua, ora pela calçada e são amarradas com cadeados em qualquer lugar. Sempre modelos simples, com pneus simples, assentos simples. As pessoas usam bicicleta como meio de transporte, não para ostentar nada. A maioria têm cestinhas e pequenas bolsas, mas vi várias com cadeirinhas de crianças — por sinal, tudo isto fica nas bicicletas e aparentemente ninguém rouba. Como deve ser bom morar num país seguro, não?
Alguns ciclistas, mas poucos, usam capacetes e vi muitos capacetes “completes”, aqueles que protegem toda a cabeça (parecidos com os de moto) e não apenas a parte de cima. Poucas ciclofaixas e muito respeito pelos pedestres e pelos motoristas. E destes pelos pedestres e ciclistas. Em fim, muito respeito de todos para todos. Assim como na Hungria, praticamente não vimos motos — e talvez umas duas na estrada. E as que vimos mão buzinavam histericamente como acontece em São Paulo.
Basicamente, há dois tipos de estradas: as autoestradas (“dial’nica”, em eslovaco), têm duas faixas em cada sentido, separadas por um canteiro central e acostamento, nas quais a velocidade máxima é de 130 km/h. As placas que as indicam são vermelhas, com um D e um número. A que mais usamos foi a D1 e é muito bem feita. As rodovias expressas (“rýchlostné cesty“, em eslovaco, mas não me peçam para pronunciar. Só para escrever levei 4 minutos…) também têm duas faixas em cada sentido, segregadas por canteiro central e velocidade máxima de 130 km/h. As placas de indicação são vermelhas com um R. Trafegamos mais pela R1 e R2, mas também por algumas outras como as E, que são as rodovias europeias — parte da rede internacional de rodovias, uma série de estradas de porte na Europa. Muitas vezes uma R ou uma D se sobrepõem a uma E.
A NDS, a entidade eslovaca que cuida das rodovias no país, administra 1.000 quilômetros de “D“ e “R“. Talvez não seja muito, mas abrange os principais pontos do país. Sem falar que muito do território é floresta, lago e montanha, por isso não consigo avaliar exatamente se é suficiente ou não. Pessoalmente, posso dizer que tive que recalcular alguns tempos e ajustar itinerários porque nem sempre podia ir do ponto A para o ponto B por onde eu achava que seria mais curto. Mas, claro, às vezes tem uma cadeia de montanhas no meio, né? Ou um enorme lago… Mas as que encontramos eram de muito boa qualidade e sinalização, idem.
Assim que atravessamos a fronteira da Hungria com a Eslováquia, vindos de Tokaj e passando novamente por Budapeste, chegamos ao país por Bratislava e tivemos de parar na fronteira para comprar a “vignette”, um dispositivo que registra as passagens pelos pedágios. Aliás, os pedágios são todos controlados eletronicamente e há câmeras e radares fotográficos nas rodovias. Não há portais nem estações de pagamento já que a única modalidade é com a tal vignette. Ela pode ser adquirida com um mínimo de 10 euros e recarregada sempre que necessário, pela internet. Não faço a menor ideia de quanto custam os pedágios, pois descobrimos na fronteira que a nossa vignette já estava carregada. Como não há cabines, não sei dizer valores nem em quais rodovias há pedágio além das D1, D2, D3 e D4. Na verdade, a vignette, ao contrário das que tínhamos usado em países como a Croácia, não é física. Não há tag, nem nada. Eles apenas registram no sistema a placa do carro, os créditos, e pronto. O sistema deve ser muito confiável e não deixo de imaginar como seria aqui.
Para um ano de uso, a vignette custa 50 euros. Para um mês, 14 euros e para 10 dias, 10 euros. E podem ser comprados nos correios ou postos de combustíveis. Simples e prático. Por falar em combustível, assim como na Hungria e na Polônia, o litro da gasolina 95 RON estava por volta de 1,30 -1,50 euro. Mas sem nada, nada de álcool, né?
Nas estradas, novamente todos circulam pela direita. Quando há proibição de ultrapassagem, não há ultrapassagem, seja de caminhão sobre outro veículo ou de carro sobre carro. Dito assim, parece tão óbvio, não?
As velocidades máximas são bastante respeitadas e assim como na Hungria vimos muita polícia à beira das estradas. Na Hungria, muitos dos motoristas que vinham no sentido oposto nas estradinhas de pista simples que pegamos piscavam o farol para avisar da presença dos guardas. Também vimos radares, especialmente ao entrar nos vilarejos, já que nesses lugares a máxima é 50 km/h, nos arredores (bem perto, mesmo), 90 km/h e na maioria, 130 km/h, mesmo nas estradas de pista simples e sem acostamento. Ou seja, só e necessário decorar esses três números, sem pegadinhas, exceto em caso de obras ou alguma exceção.
Em caso de multa, de qualquer tipo, ela pode ser paga com cartão de crédito e isso é feito na hora. Se o policial que faz a autuação não tiver um terminal POS com ele (sim, eles têm isso!) e o motorista em questão não tiver dinheiro em espécie suficiente, a carteira de motorista dele será retida. Confesso que achei isso bem objetivo. Assim como na Hungria e na Polônia, tem tolerância zero para alcoolemia e outras drogas (acho isso fundamental. No Brasil se esquecem que não é o excesso de álcool o único perigo ao volante) e a multa vai de 200 a 1.000 euros. Não há possibilidade de se recusar a fazer o teste. Ou melhor, há. A opção é um ano preso.
Mesmo em túneis, como este entre Orava e Zehra com duas pistas em cada sentido, sem acostamento, a velocidade máxima era de 100 km/h.
É obrigatório o uso de faróis durante o tempo todo, o ano todo. No caso das rodovias de pista simples, sem acostamento e com tantas curvas como as que encontramos, acho que faz sentido. Continuo não achando lógica quando as pistas são separadas por canteiro central, mas deixa pra lá. Volto a discutir isso outro dia, com mais números.
O número de mortes em acidentes no trânsito na Eslováquia caiu de 608 em 2006 para 310 em 2015 de pois de ter atingido o menor índice, de 215, em 2013 e um máximo de 661 em 2007. Em volume de acidentes, em 2006 houve 62.040 registros, com 2 032 pessoas seriamente feridas e 8.660 ligeiramente feridas. Não consegui os dados de 2016 para fazer a conta, mas dá para ter uma ideia de que o número de acidentes fatais é uma porcentagem mínima dos acidentes registrados, pois esses números se mantêm desde 1999.
Chamou-me (segunda ênclise da semana, afinal, fiquei fora um bom tempo, né?) a atenção nas placas de sinalização nas estradas que a ordem das cidades estava invertida. Explico: sempre vi na primeira linha a cidade mais próxima e, na sequência, as mais distantes. Na Eslováquia a mais próxima é a última da lista. Confesso que não entendi, pois sempre achei mais prático que a mais perto estivesse primeiro. Afinal, se temos menos tempo para ler basta ver a primeira. Não encontrei nada sobre legislação a esse respeito e a Eslováquia faz parte da União Europeia e até mesmo da Zona do Euro… sei lá. Fica aí a curiosidade.
Na pequena e linda cidade de Liptovský Mikuláš, de somente 32.800 habitantes, encontrei faixas de pedestres com luzes nas extremidades, todo ao longo da travessia (foto 9). Elas se acendiam e piscavam quando um pedestre se aproximava do local. Nas fotos não fica tão nítido quanto ao vivo, mas eles são bem eficientes, seja para indicar para os motoristas que há um pedestre na faixa ou para facilitar a localização da faixa. Tanto que voltei de dia para fotografar para vocês a luz em si.
Na mesma cidade vi várias faixas de pedestres recuadas da esquina. Novamente, refiro-me a uma pequena cidade, com volume limitado de veículos, mas achei prático isso. Não é em todas as esquinas, mas notei maior facilidade para enxergar quando dirigindo quando a faixa está mais recuada. E evita que se feche o cruzamento quando nos deparamos comum pedestre atravessando. Sim, eles sempre param quando tem um pedestre prestes a atravessar.
Outra coisa da qual gostei muito foi a facilidade para ir de carro a qualquer lugar. Estacionamentos, pagos ou não, fáceis e fartos. Claro que não no centro histórico de Bratislava que, como muitas cidades europeias, é fechado em algumas ruas no seu casco antigo — mas neste caso, muitas menos do que em outros centros. Mesmo castelos no centro da cidade, como o lindíssimo de Bojnice ou o de Orava, são acessíveis de carro até a base. Depois, é só pirambeira — característica de esta minha viagem, aliás. Todo dia tínhamos várias horas de vida de cabrito. Haja perna!
Mudando de assunto: este é totalmente outro assunto, mas merece divulgação de tão absurdo que é. Pela segunda vez um feiciamigo posta algo flagrantemente mentiroso. Nos dois casos, diga-se, jornalistas de muita experiência — este ainda mais que a anterior. Semana passada, pensando eu que meu quase ex-amigo não sabia que o que postara era falso, ingenuamente comentei no perfil dele: feiquinius. Já foi desmentido por vários sites idôneos. Vai ai o link para um deles. E coloquei o link. O que esta criatura fez? Apagou meu comentário imediatamente. Manteve a postagem dele, mentirosa, bem como os comentários de outros amigos que apoiavam a indignação dele. E continua assim vários dias depois. Ou seja, não é mal informado, é mau caráter mesmo. E é daqueles que vivem proclamando que é um democrata, que os simpatizantes de um determinado político espalham feiquiniús, que respeita a opinião alheia e outras mentiras tão grandes quanto a postagem dele. O irônico é que durante um dia ainda recebi notificações de comentários no perfil dele sobre essa notícia — sinal inequívoco de que a plataforma da rede social havia registrado meu comentário. Affe!
NG