A disposição dos quatro bancos individuais dava o nome ao carro, localizados formando um trapézio quando vistos de cima. Os dois passageiros de trás sentavam-se deslocados em direção às extremidades da cabine, não alinhados com os da frente. O motor é central-traseiro, e parte dele está no espaço entre os bancos traseiros. As bitolas são bem diferentes, com 178 mm a mais na traseira.
Ao menos as pernas de quem sentava atrás poderiam ser esticadas, uma delas pelo que se deduz das imagens. O para-brisa é fantástico, totalmente curvo. A cor azul está presente, fora e dentro, mas com o prata da maior parte da carroceria. Depois de certo tempo foi pintado de azul com o contorno em cinza, menos atraente no conjunto. Prata e azul são mutuamente atraentes, já que com céu azul, um carro prata reflete a cor do céu e se torna azulado.
Foi desenhado no estúdio Bertone para a NSU, fabricante alemã que quase cresceu além do que era anteriormente, com o primeiro carro de relativo sucesso com motor rotativo Wankel do mundo, o Ro80.
A NSU Motorenwerke AG – as três letras escolhidas para lembrar a cidade onde foi estabelecida alguns anos depois de sua fundação, Neckarsulm, foi um dos primeiros fabricantes de automóveis, fundada em 1873, portanto o Trapeze também comemorava os 100 anos da marca.
Em 1969 foi comprada pela Volkswagen que a agrupou com a Auto Union, que havia passado ao controle da gigante alemã em 1964. A soma das duas foi batizada de Audi NSU Auto Union AG, um nome impraticável que foi resumido em Audi AG em 1985, e o resto é história.
Mas os alemães da NSU eram diferentes, e adotaram o motor rotativo de Felix Wankel para alguns projetos, notadamente o Ro80, de relativo sucesso inicial em 1967, escolhido “Carro do Ano” na Europa em 1968, mas que depois de milhares de motores prematuramente gastos e trocados em garantia, viu esse sucesso ser transformado em curiosidade histórica, pois os prejuízos que trouxe para a marca a fez insolúvel.
O desenho do Trapeze é de um dos mais influentes e importantes designers de todos os tempos, Marcello Gandini.Entre suas obras, Lamborghinis Miura e Countach, Alfa Romeo Carabo, Bugatti EB110, Lancia Stratos, Renault 5 Turbo, Lancia Sibilo e mais umas duas dezenas de carros muito interessantes e que são até hoje lembrados. Foram 14 anos de trabalho só no estúdio Bertone, para depois de 1980 partir para sua própria empresa e continuar seu trabalho, agora incluindo outros setores de atividades.
Gandini fez o Trapeze com um para-brisas e vidros laterais que lembram muito o Stratos, assim como a forma geral do carro. Analisando-se do ponto de vista da praticidade, o Trapeze se coloca facilmente como o que seria um Stratos de quatro lugares. Os para-choques continuam nas laterais, coloridos e com a mesma forma geral, perfeito para a conservação, evitando amassados desagradáveis que são hoje em dia cada vez mais comuns com a terrível decisão de quase todos os designers do mundo em acabar com as molduras de portas — uma exceção é o Citroën C4 Captur original francês. Redução de custos apenas para quem vende o carro, os compradores que se ajeitem para consertar os amassados, ou que comprem molduras vendidas como acessórios.
As fotos abaixo deixam claras as semelhanças do Stratos com o Trapeze.
Curiosamente, há um quê do Pian GT, desenho do designer brasileiro, já falecido, Márcio Piancastelli, objeto da primeira coluna de Alexander Gromow no AE.
Entradas de ar para o habitáculo, saídas de ar usado na coluna traseira e maçanetas de portas têm forma circular, seguidas pelas coberturas nas rodas, talvez o único detalhe que poderia ser melhor resolvido para o carro ser fabricado em série. Valeria a pena gastar um pouco de tempo de pensamento nas rodas, obviamente.
Dentro, muita camurça, nos bancos, acabamento de portas e no topo do painel, que tinha sua face totalmente plana e bem embutida no corpo do painel, com cor bem clara — branco pelas fotos — e instrumentos principais formados por cortes nesse plano, de aparência muito moderna e que eu gostaria de ver em algum carro atual.
O motor era o mesmo de dois rotores do Ro80, que foi fabricado até 1977. Tinha quase um litro de cilindrada, cada rotor com 497,5 cm³, e desenvolvia 116 cv e 15,8 m·kgf de torque máximo. A mecânica já em produção ajudaria muito o Trapeze ser fabricado em série, mas os problemas do Wankel certamente atrapalharam os planos.
Os faróis ficavam cobertos por uma tampa, que se abaixava ao serem acesos, como no nacional Miura. Nada de faróis escamoteáveis, que requerem mecanismos mais complexos e reforçados, para deslocar maior peso, e que na maioria das vezes “quebram” as linhas do carro, caso do Ferrari F40. Seria fantástico contar com aqueles seis faróis numa estrada a noite.
Como fato curioso, compare nas fotos a seguir o canto traseiro, incluindo a inclinação da coluna, vidro vigia e lanternas com a do SM 4.1, brasileiríssimo da empresa Santa Matilde, de Três Rios, RJ, que foi fabricado de 1977 a 1997, sendo por alguns anos o carro mais caro do Brasil.
As dimensões principais mostram que o Trapeze era bastante compacto, com comprimento 4.080 mm, largura 1.830 mm, altura 1.100 mm e distância entre eixos 2.430 mm. Não se sabe qual era o peso do conceito, mas apenas como estimativa, acredito que não passaria de 1.000 kg
Junte-se a enorme lista de boas ideias que não chegaram ao estágio de produção.
JJ
Fotos: Autocar, khrodocar, Studio Bertone, CarDesignNews