Não foi exatamente a corrida mais emocionante do ano e nas voltas iniciais todos os pilotos mantiveram um ritmo tão conservador que, na fase final das 61 voltas da quilometragem regulamentar, temeu-se por uma bandeirada por tempo decorrido e não por distância percorrida. A primeira dobradinha da história do GP de Cingapura e a primeira da Ferrari desde muito tempo, porém, temperou bem os dias que antecedem o GP da Rússia, marcado para domingo, na olímpica cidade de Sochi. Enquanto Sebastian Vettel e Charles Leclerc ecoam entre si declarações formais de que “a Ferrari está acima de tudo”, por baixo dos panos não é difícil ver que os dois pilotos têm todos os ingredientes para desenvolver uma relação conflituosa digna de grandes campeões.
Ocorre que se Vettel já conseguiu quatro títulos mundiais, Leclerc compensa o histórico inferior a duas temporadas completas com o terceiro lugar no campeonato, duas vitórias, cinco pole positions nesta temporada e gana suficiente para sair em busca de Valtteri Bottas, vice-líder do campeonato, com 231 pontos, 65 atrás do líder Lewis Hamilton e 31 à frente do monegasco e de Max Verstappen, empatados com 200 pontos cada.
A julgar pelo que se viu nas últimas três provas, a ameaça maior ao finlandês não virá do filho de Jos… Enquanto isso, a Mercedes adota uma tática de administrar a vantagem construída na primeira metade da temporada e se dar ao luxo de deslocar parte dos seus esforços para o desenvolvimento do carro de 2020.
Principal rival dos alemães, a Scuderia de Maranello aparentemente conseguiu resolver problemas que afetavam o rendimento do seu carro e administra outro com potencial letal, a disputa entre seus dois pilotos. Vettel voltou a vencer após um ano de jejum no lugar mais alto do pódio e Leclerc só não conseguiu a terceira consecutiva por um erro que ainda renderá manchetes, fotos e postagens. O novato largou na pole position pela quinta vez na temporada e só não venceu porque a dinâmica do seu pit stop teve imperfeições de estratégia que o fizeram voltar à pista atrás do companheiro de equipe e rival que até então só tinha visto a traseira do seu carro.
Enquanto o tetracampeão filosofou sobre o apoio dos fãs como energia que ajudou a superar uma fase difícil, o penta pole-position não escondeu que a forma como ele perdeu a liderança será motivo de muita discussão dentro da equipe. O que ficou claro nesse episódio é que Leclerc tem a marra e a garra de grandes campeões e não disfarça sua disposição de transformar Vettel como um inimigo de equipe digno da rivalidade que caracterizou os tempos de Alain Prost e Ayrton Senna na McLaren.
Ironicamente, quem teve uma atuação extremamente calma para seu arrojado padrão de pilotagem foi Max Verstappen, que soube segurar os ataques Lewis Hamilton apesar de os pneus do seu carro tivessem sete voltas a mais de uso que os que equipavam o Mercedes do inglês. Hamilton, sabiamente, atacou, mas não arriscou o suficiente para petiscar.
No que toca aos respectivos segundos pilotos, Valtteri Bottas foi novamente Valtteri Bottas, tal qual Alexander Albon; o que contrapõe estes dois é o fato que o anglo-tailandês mantém média de 8,7 pontos por corrida desde que foi alçado à Red Bull, índice bem melhor que o índice equivalente de Pierre Gasly. O francês, atualmente na Toro Rosso, somou 65 nas 12 primeiras etapas, ou 5,4 por corrida e jamais conseguiu somar 26 pontos em apenas três corridas, como Albon fez na Bélgica, Itália e em Cingapura.
McLaren e Renault mostraram que já de destacaram das demais equipes e a chance de somarem-se à primeira linha da categoria em 2020 é algo possível. Daniel Ricciardo fez uma de suas grandes atuações da temporada e acabou prejudicado por um erro estratégico: uma segunda parada para trocar o bico do seu carro não foi explorada a contento e ele voltou à pista com pneus mais duros, quando um segundo jogo de médios poderia ter facilitado seu trabalho e garantido pontos, algo conseguido pelo regular e opaco Nico Hulkenberg. No planeta McLaren Lando Norris mostrou consistência e amadurecimento e Carlos Sainz viveu um fim de semana dos menos brilhantes. Enquanto esteve na pista, porém, foi combativo.
Para encerrar uma análise do GP de Cingapura restam dois tópicos: Antonio Giovinazzi e a equipe Haas. O piloto da Equipe Alfa Romeo tornou-se o primeiro italiano a liderar um GP desde Giancarlo Fisichella, mas foi vítima de um erro crasso: o time baseado em Hinwill o manteve na pista por tempo suficiente para colocar em risco sua chance de chegar ao final da prova. Tivessem trocado pneus mais cedo ele teria ficado melhor classificado do que o inglório décimo lugar e segunda corrida consecutiva que ele marca pontos.
Quanto ao time Haas começa a tornar-se curiosa a insistência em apostar em uma dupla de pilotos cujos salários custam menos que o pretendido por um piloto mais experiente. Entre arriscar em um jovem ou apostar na continuidade, Gunther Steiner e Gene Haas optaram pela segunda opção enquanto muitos críticos europeus apostam que o empresário americano já estaria decepcionado com os resultados alcançados a ponto de vislumbrar possibilidades de passar sua equipe adiante. Esta coluna conhece a característica dos americanos em preservar a continuidade e união para atravessar fases difíceis, mas a travessia começa a ficar demasiado longa.
O resultado completo do GP de Cingapura você encontra aqui.
WG