Exmo. Sr. Presidente Jair Bolsonaro,
Venho, pela segunda vez, tomar a liberdade de escrever a V. Exa. com o propósito leal e patriótico de auxiliá-lo num assunto em que, desculpe-me a franqueza, o seu governo está enganado.
No momento em que o Congresso, após o recesso, volta a exercer o seu papel de legislar, venho humildemente alertar V. Exa. sobre o perigo de submeter a julgamento, não especializado, um assunto da maior complexidade como o Código de Trânsito Brasileiro, sem ter o projeto passado pelo crivo de uma comissão de especialistas de alto nível.
Assusta-me — ou como dizem os ingleses gentilmente, I am afraid — que erros que constatei pelo noticiário sejam incorporados na revisão do novo Código de Trânsito Brasileiro a ser votado e discutido no Congresso Nacional por não especialistas e, pior ainda, por políticos com interesses eleitoreiros num ano eleitoral.
Aprendi muito cedo, quando tive a responsabilidade de dirigir o trânsito do então Estado da Guanabara, na década de 1960, que “é muito difícil se organizar o trânsito com a política, mas, desgraçadamente, é muito fácil estabelecer regras no trânsito utilizando a política”.
O atual Código, redigido em 1997 por um grupo abnegado e desejoso de acertar, trouxe grandes inovações com o propósito de melhorar as condições do nosso trânsito. Infelizmente, logo no inicio de sua vigência recebeu tentativas amenizadoras de emendas políticas, exatamente dos membros do Congresso que acabavam de aprová-lo.
Mede-se o valor do remédio, no tratamento de qualquer doença, pelos resultados no seu combate. No caso do nosso trânsito, seriamente doente, com um saldo vergonhoso de mortos em acidentes, o remédio empregado não está tendo o efeito desejado na maioria dos casos. Os dados estatísticos não me deixam mentir.
Uma administração de trânsito, que faça jus a este título, e a responsabilidade que deve ter, baseia sua ação nos resultados estatísticos.
No desejo patriótico de deixar registrado para os pósteros, escrevi e publiquei um livro, uma catarse, com o título sugestivo de: “Ultrassonografia do Trânsito Brasileiro”. Nele coloquei tudo que aprendi ao longo de minha já longa vida (94 anos) como último do “Buchanistas”. Nele sugiro aos que têm o poder de agir como se ter um trânsito, tranquilo e com fluidez e que não nos envergonhe.
Ações como modificar a formação do motorista, instituir a vistoria dos veículos, propor melhorias nas condições das estradas, punir as infrações (mas pôr um fim à indústria da multa), e estabelecer uma campanha permanente de segurança nas rodovias, poupando o Governo Federal de conviver com este quadro macabro, desgastante, que hoje temos.
Este livro foi entregue em mãos ao Exmo. Sr. Ministro Sérgio Moro pelo autor do prefácio, jornalista Alexandre Garcia.
Também foi entregue, em mãos, ao deputado relator da proposta de modificação do Código de Trânsito atual que, pelo noticiário que vi das medidas propostas pelo governo, “a emenda será pior do que o soneto,”
Finalizando esta minha angustiada carta, sugiro a V. Exa., confiante em seu espírito público e na sinceridade de propósitos que aprendemos nas escolas militares, que se digne a convocar uma comissão de alto nível técnico a fim de que, tendo o meu “livro-relatório” baseado em mais de 60 anos (desde 1958) estudando e convivendo com o assunto, como definidor de parâmetros ou, se preferirem, roteiro a ser seguido, seja redigido um projeto para as leis de trânsito (foto de abertura) com o rigor que a situação exige, amenizado com medidas construtivas educacionais contrariando fortes interesses financeiros, cientes de que a vida humana e, neste caso a maioria é de jovens, não tem preço.
Assim procedendo, V. Exa. permitirá a este abnegado estudioso da bela “ciência do controle do trânsito”, ainda em vida, a alegria incomparável do dever cumprido.
Queira aceitar, Exmo. Senhor Presidente, os meus mais elevados protestos de consideração.
Celso Franco
Capitão de Mar-e-Guerra (Reformado), Consultor de trânsito.