Quem disse que carrinhos miniatura são para criança? Anos atrás, reconheço, era até difícil encontrar modelos que não fossem totalmente infantis, mas felizmente hoje não mais. É como histórias em quadrinhos. Hoje se você for numa livraria (OK, cada vez mais raras), ou melhor, se procurar numa livraria online “HQ” facilmente encontrará histórias para adultos. Por “adultos” não me refiro apenas a histórias eróticas que, claro, também estão lá. Mas a histórias para adultos, mesmo. E com preços que crianças dependentes de mesada nem em sonhos conseguiriam encarar.
O mesmo aconteceu com os carrinhos. Daqueles que se usavam para brincar no chão, simular corridas e até estraçalhar uns contra outros passamos a modelos riquíssimos em detalhes que ficam em vitrines e são apenas para serem admirados e manuseados com o máximo cuidado.
É o caso da coleção de carrinhos do meu marido. São anos e anos colecionando e nem são muitos. Acabei de contar e dá exatos 28 (foto ao lado). Não é muito perto dos meus mais de 300 patos, mas os valores envolvidos também são muito, muito diferentes. Para evitar que o hobby saia totalmente de controle, ele estabeleceu um parâmetro: apenas modelos de Fórmula 1, em escala 1:18 e com o piloto. OK, é um critério como outro qualquer, mas pelo menos serve para limitar um pouco a enorme variedade que há no mercado.
Eles foram comprados ao longo de muitos anos e com muita, muita parcimônia. Durante os anos em que trabalhei numa empresa norte-americana era mais fácil, pois a Amazon dos Estados Unidos costuma ter mais variedade e se prazo não é problema, dava para encomendar, mandar entregar na casa de algum colega que mora lá que gentilmente os guardava e quando vinha para o Brasil, ou quando alguém ia daqui para lá (ou mesmo eu), trazia a encomenda. Aliás, até hoje tem nessa empresa uma gentilíssima pessoa que tem uma parte de um armário na casa dele reservada para as encomendas que o pessoal do Brasil manda para a casa dele. Assim, antes de fazer a mala e embarcar, é só passar lá e checar o que está guardado, pôr na mala e pronto. Não apenas por isso, mas por outra dezena de atributos é uma das pessoas mais amáveis que conheço. Justamente por isso, ninguém abusava no tamanho nem no valor das encomendas, para não atrapalhar a cota dele.
Quando o prazo era menor, todos os que viajavam avisavam no escritório (bem, quase todos, sempre tem alguém menos simpático), passavam os dados do hotel e traziam as coisas uns para os outros. Obviamente tudo vinha sem caixas, muitas vezes sem manuais e qualquer outra coisa que pudesse ocupar espaço. Vários dos nossos carrinhos chegaram assim e, numa deferência de colecionador, os nossos vieram com as caixas transparentes e com os encaixes, pois afinal colecionador que se preze guarda a caixa original. Sem a menor intenção de vender a preciosidade, diga-se.
Foi assim que consegui um dos meus favoritos — justamente por ser tão diferente. Um McLaren Mercedes MP4-98T 1998 de dois lugares¨em fila (tandem, em inglês). Chegou a ser usado apenas para demonstração por Mika Hakkinen (ao volante) e seu irmão Erja no banco de trás (foto abaixo).
O carrinho favorito do meu marido, e também um dos meus, é o Lotus Ford 49 1967 de Jim Clark, na verdade, dois deles, um com e outro sem aerofólio, com duas pinturas diferentes (foto abaixo). De fato, um primor de design e extremamente bem feito como miniatura. Aliás, esse é outro problema. Tem muitos na internet, mas alguns são artesanais e por demais toscos. Mas já compramos um muitíssimo bem acabado. Compras pela internet, se não forem de sites idôneos ou diretamente dos fabricantes, requerem muitos cuidados.
A miniatura do Jaguar R2 Ford 2001 de Pedro de la Rosa (foto abaixo) eu achei por puro acaso. Estava a trabalho em Madri e no final de semana fui por minha conta a Segovia de trem, a passeio. Assim que saí da estação fui andando até o Aqueduto e, por puro acaso, encontrei uma loja de brinquedos. Sim, brinquedos. Como sempre faço, comecei a procurar miniaturas de carrinhos e achei uma 1:18 de Pedro de la Rosa. Não era exatamente nosso piloto favorito, nem nosso carro favorito, mas não tínhamos esse modelo e o preço era excelente. Claro que o comprei. Coloquei na minha mochila o trambolho e passei o resto do dia, peguei o trem e depois o metrô em Madri carregando a geringonça. Mas valeu tanto pela originalidade quanto pelo preço.
Olho sempre na Amazon e tenho vários deles na minha lista de desejos, mas cada vez há menos deles e muitos deles estão em falta — fora que não quero incomodar meus ex-colegas de trabalho nem tenho previsão de ir para os Estêites. E com o dólar nas alturas…
Sempre quis ter um modelo de Ferrari do Gilles Villeneuve (tenho só um McLaren Ford, a foto de abertura), um dos meus pilotos favoritos, mas nunca encontrei nenhum, assim como nunca achei nada de José Carlos Pace nem de James Hunt.
Dos pilotos mais antigos é muito difícil. Do Juan Manuel Fangio, nadinha de nada. E, claro, para piorar teria de ser escala 1:18 e com o piloto… Com o modelo de Jackie Stewart fizemos uma ligeira exceção e um bem-bolado, pois o piloto está do lado de fora do carro (foto abaixo), mas ele faz parte do conjunto — logo, está dentro dos parâmetros da coleção. Fora que é tão maravilhosamente lindo que não teria como não entrar na vitrine, não?
É claro que o móvel tem porta de vidro para não empoeirar os carrinhos e as únicas pessoas que tem direito de abrir somos meu marido e eu. E só nós dois os limpamos — com um pincel de cerdas macias e pano no vidro. Quando alguém quer ver algum modelo, apenas um de nós o entrega na mão da pessoa, que deve ser maior de idade, estar absolutamente sóbria, tem de pegar a miniatura com as duas mãos e não pode sair de um raio de meio metro de nós, assinar um termo de compromisso de 43 páginas em três vias, registrado em cartório e mais alguma exigência. Já pensei em passar chave, mas esteticamente ficaria muito feio o móvel, que fica num lugar meio reservado da casa, mas se um dia achar que há muito trânsito de gente não hesitarei em embrulhar o móvel com uma concertina eletrificada e mandar a estética às calendas…
O Brabham de Piquet (foto abaixo) deu um pouco de canseira para conseguir, mas é claro que não podia faltar. Mas também há poucas opções de carros de Piquet. De fato, mesmo para dois piquesistas fanáticos como nós, termos apenas uma miniatura é quase uma heresia…
Como originalidade, temos uma miniatura de um Lotus Ford 1972 72D da então escuderia Scribante (foto abaixo), que pertencia a um empresário sul-africano que comprava e inscrevia carros de Fórmula 1 para correr quase exclusivamente em circuitos sul-africanos. Em 1972 ele comprou um Lotus Ford, obteve o patrocínio do fabricante de cigarros Lucky Strike (branco e vermelho) e o carro competiu com o também sul-africano Dave Charlton ao volante. Na mesma prova, estava Emerson Fittipaldi com o Lotus Ford 1972 72D, só que preto e dourado, patrocinado pelo também fabricante de cigarros John Player Special e que lhe rendeu o campeonato mundial naquele ano. Como curiosidade, nós temos o modelo do Ronnie Peterson 72D, que era igual (mas do ano seguinte), mas não o do Emerson em 1972.
Pela originalidade, gosto muito do Tyrrell Ford P34 1977 de seis rodas usada por Patrick Depailler (foto abaixo). Pessoalmente, acho um carro icônico e que rompeu parâmetros. Fazer um modelo com seis rodas para mim é pensar fora da caixa realmente.
O mais impressionantes é que há modelos para todos os gostos, embora muito concentrados em alguns pilotos e em algumas escuderias. De algumas marcas e pilotos podem ser encontrados vários modelos da mesma corrida com os pneus de chuva e de pista seca (porque o piloto trocou durante a prova) e até mais de um modelo de testes e o de classificação. O preciosismo chega a tal ponto que detalhes como o tipo de pneu ou mesmo patrocinadores mudam de uma corrida para a outra e são rigorosamente os que foram usados na prova.
Tampouco podiam faltam alguns modelos do Senna, que são um pouco mais fáceis de achar. Temos cinco miniaturas de carros de Ayrton Senna — um excepcional piloto, sem dúvida.
Quando estivemos em Abu Dhabi, há uns três anos, fomos ao parque da Ferrari e, claro, à loja, e para nossa decepção tem pouquíssimas miniaturas. Conseguimos a muito custo comprar uma na escala 1:18 do Vettel, mas se não me falha a memória além dessa havia apenas mais um modelo, que nós já tínhamos. O resto era quase tudo camisetas, bonés, chaveiros e outros itens da marca, mas não miniaturas. São várias lojas dentro do parque e entrei em absolutamente todas e em absolutamente todas perguntei — vai que tinham alguma num armário escondido? Mas não, nadinha.
Algumas miniaturas comprei numas lojas de brinquedos na rua da Constituição, uma ruazinha meio escondida travessa da superpopular 25 de Março, em São Paulo, mas faz tempo que não tem mais lá — apenas os manjados Matchbox e um monte de brinquedos chineses. Mas nunca deixo de passar por lá e dar uma espiada. Fora que o preço era bem acessível.
Nossas miniaturas tem de ter partes móveis, como o capô, as portas, as rodas tem de girar — ou seja, tem de ser uma miniatura completa e não apenas uma casca maciça do carro. Por isso também é tão difícil achar um.
Tem gente que se dedica a fazer as miniaturas e, como disse alguns realmente fazem com perfeição. Mas são poucos. Há fabricantes nacionais, mas mesmo os internacionais tem um catálogo muito pequeno de opções. Mesmo assim, é melhor do que quando dependíamos apenas dos caríssimos (e maravilhosos) japoneses da Exoto — até agora os meus preferidos. A Minichamps tem ótima qualidade e uma variedade bem razoável. Mas é um hobby além de hoje bem mais caro do que já foi cada vez mais difícil de realizar pois não sei exatamente por que há cada vez menos opções — de boa qualidade, digo. Daquelas mais ou menos, está cheio.
Mudando de assunto: Até que em fim uma corrida de Fórmula 1 este ano. O GP da Áustria foi até emocionante em alguns momentos, mas talvez mais pela expectativa que eu tinha depois de tanto tempo sem ver carros num circuito… Adorei ver o pódio diferente. Gosto do Bottas, embora reconheça que não é um piloto, assim, digamos, campeão, e especialmente dessa turma mais nova, Leclerc, Norris, Albon. Vibro com as performances deles. E agora um comentário que sei pode ser mal interpretado, mas espero que não o seja. Se for verdade que a Mercedes teve problemas de aquecimento nos sensores por causa da pintura preta, bem feito. Obviamente sou pela igualdade de direitos e contra a discriminação e pratico isso sempre no meu dia a dia, mas estou cansada de politicagem. Pintar um carro sem testar os efeitos disso em seus componentes é burrice — sempre que se coloca ideologia acima do profissionalismo há consequências. O problema não é a cor do carro — tanto é que muitos correm com pintura preta e não há problemas com os sensores – mas tudo tem que ser checado e rechecado antes. Há formas e formas de lutar por ideais e de fazer realmente diferença. Por isso também não critico os pilotos que não quiseram se ajoelhar na hora das fotos. Não acho que isso faça a menor diferença. Você posar ajoelhado numa foto, mas não ter atitudes realmente igualitárias em sua vida é hipócrita e marqueteiro. Prefiro menos alarde e mais sinceridade.
NG