Pelo menos é assim na Europa, que está se tornando mais e mais eletrificada a cada ano. Mesmo assim muita gente ainda se pergunta se o carro elétrico puro terá ou não futuro. Três anos atrás visitei a eCar Expo na Suécia. Em fevereiro fui a esse salão de novo (ver fotos no final da matéria). Nesses três anos o que aconteceu na Europa?
Com palavras curtas, isso foi o que aconteceu: Jaguar I-Pace, Audi e-tron, Porsche Taycan, Volkswagen ID3, Mercedes EQC, Polestar 2, Volvo XC40 Recharge, Peugeot e-208, DS3 Crossback e-tense, Mini Cooper SE, Opel e-Corsa, Škoda Citigo. Algum mais? Pode ser, mas é o que lembro por ora. Para mim todas essas marcas, menos DS e Polestar, são bem conhecidas. Não é brincadeira.
E de fora da Europa chegaram esses novos BEV (battery electric vehicle, carro elétrico a bateria): Hyundai Kona, Kia E-Niro, Nissan Leaf Mk2, Tesla Model 3, Honda-e. E no mercado há três anos ainda temos: VW e-Golf, VW e-up!, Smart For Two, Renault Zoe (foto de abertura), BMW i3, Hyundai Ionic, Kia Soul, Tesla Model S, Tesla Model X.
Pelo menos 26 carros elétricos puros. Híbridos tem muitos mais. Estará o mundo ficando louco?
Mesmo que a quantidade de modelos sejam “poucos”, os investimentos feitos são de muitos bilhões de euros. E nos anos que virão a indústria automobilística vai investir mais uns 3 bilhões de euros. Assim, isso me parece algo muito sério. De brincadeira não tem nada.
O carro elétrico mais popular no mundo neste momento, o Tesla Model 3, está sendo produzido numa cadência de mais de 1.000 carros por dia, uma empresa que 10 anos atrás mexia com alguns “protótipos” baseado no roadster Lotus Elise. A fábrica onde as baterias dos Teslas são produzidas agora está cobrindo a maior área construída do planeta! Acho que isso é mesmo muito sério. Impressiona-me muito o desenvolvimento da Tesla. Mas nem todos nesse mundo estão impressionados com os carros elétricos. Às vezes escutam-se comentários como:
• “Não gosto de carro elétrico” – Tem de tudo e há quem goste carros pequenos e baratos como o VW up!, alguns Fiat, Hyundai XB e outros. Eu não, mas eles têm lugar no mercado, embora não sejam carros que eu aprecie. Cada um tem seu gosto.
• “Mas pelo menos tem como comprar um carrinho desses” – Sim, no momento carro elétrico é para quem tem muito dinheiro. E futuramente? Tudo vai depender do desenvolvimento das baterias, não sei quantos milhares de engenheiros mundo afora estão trabalhando com isso hoje.
• “Mas gente com dinheiro quer carro com motor de pelo menos seis cilindros, ou mais.” – Alguns sim, outros não. Alguém se lembra os motores mais potentes do mundo produzidos em meados da década 1980? Ferrari Testarossa com 390 cv e Porsche 959 com 450 cv: neste ano o Volvo XC40 Recharge terá 400 cv, um Volvo por uns 60 000 euros (375 mil reais na conversão direta, um Volvo!). Tesla e Porsche têm BEVs com mais de 750 cv. O corpo dói quando aceleram ao máximo. Depois de uma acelerada no modo “Ludicrous” (libera energia máxima da bateria) sei de gente que sai de um Tesla assim preferindo voltar andando a pé. Alguém terá coragem experimentar com o novo modo “Plaid” em novembro deste ano, ainda mais potente?
• “Mas não tem energia elétrica suficiente para todo mundo dirigir carro elétrico“ – Ainda há poucos carros elétricos no mercado, e com perspectiva global de irem crescendo devagar. Sem incluir o mercado chinês, em 2010 eram produzidos uns 1.000 carros elétricos por ano. Em 2015, cerca de 100.000; em 2020 mais que 500.000. Mais do que 1.000.000 em 2025? Acho que sim e pode ser 5.000.000, vamos ver. E a energia? Em 2025 a Volkswagen vai ser um produtor de energia, também. Vão resolver isso, sem dúvida. Ah, também não esquecer que na Europa para produzir um litro de gasolina é preciso algo entre 1 e 1,5 kW·h de energia elétrica. Um BEV normalmente precisa de algo entre 1,5 e 2,5 kW·h para percorrer 10 quilômetros.
• “Mas onde vão achar metais para as baterias?” – Contratos com minas, há muitos novos agora. No momento sei também que em vários lugares no mundo estão construindo fábricas gigantescas para produzir baterias, até uma bem grande na Suécia. E no desenvolvimento de novas baterias há vários objetivos. Preço menor, mais leves, mais energia por volume, carregamento mais rápido e uso de outros materiais. No ano passado 14.000 toneladas de cobalto foram reciclados. É pouco mas tem, e surgem agora empresas para começar reciclagem de baterias. É coisa atrasada, mas está pegando.
• “Carregar é muito vagaroso” – Calma, vagaroso? Sim, é, mas não tanto. Dirigir de Estocolmo a Frankfurt, 1.650 quilômetros, precisa-se gastar quase quatro horas nos seis “pit stops” para carregar a bateria. Quatro horas numa viagem de 19 horas. Alguém acha isso um problema? Nunca na minha vida dirigi tal distância sem fazer pausas. Certo, numa viagem dessas as pausas eram mais de duas horas no total. Mas se leva 17 ou 19 horas para uma viagem tão longa, para muita gente isso não é considerado um problema. Pelo contrário, as pessoas com quem fiz viagens como essa num carro elétrico disseram que pela primeira vez estavam chegando ao ponto final sem se sentirem muito cansadas, e gostaram.
• “E quem não tem como carregar em casa?” – Vai a um posto. No final de 2020 a maior rede de postos na Suécia vai ter carregamento superrápido ou semirrápido em 120 postos. A maioria dos supermercados grandes já tem carregamento semirrápido, com energia de graça. A Tesla tem seus “supercarregadores”. Outra rede de supercarregamento na Europa se chama Ionity. Tem não sei quantos mil pontos para carregar fora da casa na Europa.
• “Vi no YouTube que muitos carros elétricos pegam fogo, seguros não são” Muitos? O carro mais comum de incendiar aqui na Europa é o BMW Diesel. Cada tecnologia tem seu problema. Bateria de íons de lítio pode dar defeito e em casos raros pode se incendiar. O mesmo como um carro com muita gasolina a bordo, também pode pegar fogo se algo quebrar de alguma maneira.
• “Mesmo assim não vou comprar carro pesado e “baratinho como um Kia e-Niro ou VW e-Golf por uns 40 000 euros“. – Então não compre. Mas o dia no futuro em que os custos entre carro de gasolina e carro com bateria forem iguais, qual dos carros vai ser escolhido pelo Sr. Smith, Schmidt, Svensson ou Silva? O carro mais prático para o uso deles. Ou o carro que lhes seja mais confortável. Muita gente vai escolher o carro elétrico simplesmente porque para eles é um carro melhor.
No mercado daqui uns 10 anos acho que vamos ter uma variedade bastante grande. Carro a gasolina, carro BEV, carro a hidrogênio, carro híbrido. Vamos ter várias opções, depende do desenvolvimento das várias tecnologias, das várias necessidades e infraestruturas de vários mercados e de várias decisões políticas.
Minha opinião pessoal? O meu próximo carro de uso para o dia a dia será um BEV usado com uns três ou quatro anos de idade. Mais econômico, mais confortável, mais silencioso, mais gostoso de dirigir num trânsito normal, e sempre climatizado no começo da viagem.
E para não dar depressão nos autoentusiastas desse mundo, devo dizer que toda vez que eu estiver dirigido uma Tesla, S, X ou 3, eu sairei com um sorriso muito grande, é carro para autoentusiasta. Dois dos meus amigos dirigem Teslas e estão muito felizes. Também tenho que dizer que um Nissan Leaf Mk1, como um todo, não é carro para autoentusiasta. O Mk2 é bem melhor mesmo que não faça a coração bater mais forte. Elétrico ou não, há várias maneiras de se fazer um carro.
Na minha garagem sempre haverá um carro a gasolina para os dias que eu quiser sentir meu autoentusiasmo antigo. E ao lado do meu carro barulhento e antigo, vai ficar algo silencioso e moderno, também tenho certeza disso. Antigamente tudo era melhor, não é?
HJ
(Atualizado em 6/08/20 às 9h20, inclusão de duas fotos no texto)
Veículos exibidos na eCar Expo na Suécia em fevereiro (clique na foto para ler a legenda)