Nas últimas semanas, ao pesquisar sobre algumas histórias da minha família e da família do meu marido que contei neste espaço, acabei falando mais do que o normal (que já é bastante) com meus parentes sobre carros. Alguns me ligaram depois das publicações porque lembraram detalhes de histórias que eu mesma não tinha tão claros.
Percebi que venho, sim, de uma família de autoentusiastas. Se faltam registros fotográficos — eu digo que sou a japonesa da família, sempre com uma câmera na mão — sobram memórias e muitos, muitos detalhes.
Há histórias engraçadas, outras folclóricas. Claro que meu famoso tio César é protagonista de várias.
Talvez a mais estranha acontecida com ele tenha sido numa das muitas viagens de carro que fez a Santa Catarina.. Durante anos ele, minha tia e meus primos passaram férias nas praias brasileiras e ele conhece as estradas como poucos. Com um dos três Torinos que ele teve, desta vez com o ZX vermelho, lá por 1983. Meus tios e primos saíram de Buenos Aires rumo a Florianópolis, junto com outro casal amigo que ia no carro à frente. Em algum lugar no Rio Grande do Sul, sob uma chuva torrencial, meus três primos estavam no banco de trás quando um deles avisa que o chão do carro estava cheio d’água. Era tanta que cobria o pé inteiro de um adulto. E, pior, o nível continuava subindo.
Meu tio tentou avisar ao amigo no carro à frente, mas com tanta chuva e quase sem nenhuma visibilidade, ele nem percebeu e, claro, não havia celular. E, pior ainda, era o outro carro que andava à frente e ditava a velocidade. O tio César avaliou que seria muitíssimo arriscado parar no acostamento nessas circunstâncias e optaram por mudar de lugar, com o carro em movimento. Minha tia foi para o banco de trás ficar com a caçula (que tinha apenas dois aninhos) e os outros dois (acho que deviam ter perto de 7 e 5 anos) foram para o banco do carona. Sim, já sei, tinham menos de 10 anos, não deveriam andar no banco da frente, eram dois… etc., etc., etc. Como sempre digo, qualquer fato deve ser analisado à luz da época, da legislação e, principalmente, dos conhecimentos que se tinham na época. Hoje meus tios acham tudo isso uma loucura.
Mas, vamos à história. Enquanto o César dirigia, minha tia ia no banco de trás tirando a água do assoalho com o copo de uma garrafa térmica como nos filmes em que alguém está num bote tentando tirar a água com uma canequinha para não afundar. Claro que com a janela aberta, a chuva que entrava e o vento, boa parte desses copos de água suja voltava para cima da minha tia.
Finalmente, ao chegar a Porto Alegre, o amigo do meu tio parou como combinado e quando minha tia desceu do carro estava toda molhada de chuva e ainda por cima, suja da própria água. Hoje seria chamada de pessoa em situação de rua, provavelmente. Imaginem a cara de felicidade dela e a de surpresa do casal de amigos, que não estava entendendo nada…
Já com o carro parado num lugar seguro e coberto, meu tio deu uma olhada e, bingo! Em alguma revisão, a concessionária havia esquecido de recolocar uma tampa de plástico que o Torino tinha no assoalho, na parte traseira, justamente sob os pés dos passageiros e cuja falta não era perceptível por estar sob o tapete.
Em alguma revisão, ela deve ter sido pressionada e deslocada, pois estava solta, mas isso só ficou óbvio por causa do enorme volume de água da chuva já que os próprios pneus “empurravam” a água para o assoalho do carro. O jeito foi recolocar a peça. Pessoalmente, não gostaria de ter sido o chefe da oficina que recebeu meu tio na volta. Certamente, ele não recebeu uma dúzia de rosas nem uma caixa de bombons, não.
Outra história de esquecimento de concessionária foi com esse mesmo Torino, quando meu tio o comprou, em 1980. Como disse, era um modelo ZX cupê vermelho. Por coincidência, comprado perto de onde era minha casa em Buenos Aires — mas eu já morava no Brasil naquela época . Lá como cá, o carro é entregue com um sopro de combustível, suficiente apenas para chegar até o posto mais próximo, que no caso era a somente 10 metros do local.
Meu tio pediu que enchessem o tanque, mas logo percebeu que o tanto que entrava de gasolina saía imediatamente e se esparramava pelo chão. Na hora em que notou isso, meu tio fez minha tia e as crianças saírem imediatamente do carro, pelo risco de incêndio, e voltarem para a concessionária. O pessoal do posto rapidamente jogou areia no chão e meu tio foi chamar o responsável pela concessionária. O próprio pessoal da oficina empurrou o carro pela calçada (!) de volta para ver o que estava acontecendo e, claro, resolver o problema. A mangueira de borracha que vai do bocal de enchimento até o tanque de combustível estava mal encaixada nele e a braçadeira estava frouxa.
Pois é, alguém pode se perguntar se minha família é especialmente azarada em relação a carros ou se o Torino é um carro especialmente fraco e respondo categoricamente que não e não. Talvez alguns mecânicos de oficinas sejam meio desligados…
Muitos anos atrás, quando ficava sabendo de alguém que havia perdido uma mala em viagem pensava “poxa, que azar” ou mesmo “será que fulano etiquetou corretamente a bagagem, que a identificou bem?” ou “mas essa companhia aérea perde coisas”… Atualmente, depois de tantas e tantas viagens aéreas realizadas por ano digo com absoluta certeza: perder mala é questão de quantidade de viagens. Quanto mais se voa, mais malas se perdem.
No nosso caso, os extravios se converteram, até agora, todas as vezes em achados. O que não impediu meu marido de quase congelar na Estônia quando a mala dele não chegou junto conosco. De fato, a companhia aérea a achou umas 20 horas depois de nossa chegada, mas aí começou a saga de a mala nos perseguir pela Estônia e pela Finlândia, pois a programação de Noratur era de diferentes cidades no início da viagem.
Finalmente, lá pelo final do terceiro ou quarto dia, nós três nos encontramos — mala, marido e eu. Enquanto isso, ele usou a roupa dele que estava na minha mala, alguma minha (pois é, só um dos meus gorros de neve servia nele, de resto, ele é bem mais alto do que eu e nem as luvas cabiam) mais a roupa que compramos no segundo dia, na Estônia, pois cerca de trinta graus negativos não dá para esperar a mala completa, né?
Resultado? Ele até hoje tem duas calças de esqui, duas jaquetas de esqui, duas botas de neve super densa, dois pares de luvas de neve, dois gorros e alguma camiseta, meia e cueca a mais do que estava previsto.
O mesmo acontece com carro. Quanto mais se anda, maiores as chances de algo acontecer com ele – que pode ser um problemão ou apenas um ligeiro perrengue. Tem gente que diz “tenho carro há 30 anos e nunca bati”. OK, mas quantos quilômetros você tem dirigindo? Esse é o ponto. Carro na garagem não sofre mesmo acidentes.
Lembro clarissimamente do meu primeiro acidente de carro. Foi com o Gol branco, arrefecido a ar — meu primeiro carro também, pois felizmente nunca havia batido com o carro do marido. Saindo do supermercado lá pelas 23h30, de volta do jornal e a caminho de casa, estava eu na avenida Ibirapuera, de 2 ou 3 faixas na época (anos atrás eles encolheram e pintaram mais uma no mesmo espaço em que antes havia menos). Na segunda faixa, o sinal fecha na esquina da República do Líbano e eu paro. Quando ele abriu, eu, que já estava com a seta ligada, viro à direita para entrar na República do Líbano. O carro na pista da direita era um táxi que decidiu seguir em frente. Detalhe: os dois estavam errados, pois a sinalização de solo indicava que eu era obrigada a seguir em frente e ele, a fazer a conversão. Claro que a frente do taxi acertou minha porta direita. Nada grave, pois ambos estávamos em baixíssima velocidade.
Já eram tempos de celular, mas desci e conversei com o taxista, que exigiu que fôssemos fazer o Boletim de Ocorrência, na hora, pois era veículo de frota e, segundo me disse, era obrigado a fazer isso na hora. Fomos ambos até a delegacia e, chegando lá, liguei para meu marido. Tranquilamente expliquei o acontecido e ele, mais tranquilamente ainda, perguntou se eu queria que ele fosse até a delegacia. O quê? Já era mais de meia-noite e meia e ele acordava cedo, então eu disse, não, não precisa. Assim que estiver saindo te ligo, disse eu.
Hoje acho estranho que eu, com meus sei lá, 23 aninhos, tenha resolvido tudo na boa, sozinha, no meu primeiro acidente, mas, de fato, sou tranquila e meu marido mais ainda. Não que ele não seja protetor, mas quando preciso de proteção, não para isso. Ainda assim, tem gente que se surpreende. Sei lá, eu estou acostumada a minha independência e ele também.
No dia seguinte, ao contar para meus pais em dois telefonemas (eles já eram divorciados), os dois me disseram a mesmíssima coisa. Que bom que seu primeiro acidente foi de leve, bobo, num lugar bastante seguro e que não aconteceu nada com ninguém. Agora vê se presta mais atenção na sinalização e, oquei, sabemos que ali todo mundo da segunda pista vira, mas é proibido. Então, não faça mais isso, não se ache uma motorista megaexperiente que sabe tudo e aproveite as lições que pode tirar disto. Simples assim. Sem pânico, sem criar história, mas montessorianamente me dizendo para tirar uma lição do ocorrido. E foi o que fiz.
Naquela época trabalhava como uma louca. Jornal não tinha folga nem nos feriados e tinha dois finais de semana livres por mês. No resto do tempo, trabalhava direto 13 dias, no mínimo, 12 horas por dia. E dirigia perto de 90 quilômetros todo dia. Então, de fato, não posso reclamar dos pouquíssimos e leves acidentes que tive. Fruto, sobretudo, de uma forma de dirigir defensivamente.
Presto muita atenção nos caminhos, mas estacionamentos tendem a me confundir. Depois do advento do celular, dependendo do lugar onde paro o carro fotografo colunas com números e letras e mesmo o andar onde parei. E em shoppings ou lugares maiores vou do prédio à garagem exatamente pelo mesmo ponto por onde entrei, para poder lembrar o caminho que fiz. Mas a tia do meu marido não fez isso uma vez que foi com minha prima ao shopping Iguatemi.
A tia estacionou o carro e foi fazer compras. Na volta, por não fazer como eu, que entro e saio pela mesma porta/escada ou elevador que entrei, ela vai na direção do carro, mas… cadê ele? Nada. As duas lembravam que haviam parado naquele andar, a essa distância dos elevadores, etc., etc, etc. como diria o rei de Sião. Mas nada do carro. Depois de sei lá quanto tempo procurando, chamam um segurança daqueles que transitam pelas garagens do shopping e explicam o caso, já prestes a ir fazer o B.O. por furto. Enquanto minha tia explica os detalhes para o guarda, minha prima percebe que o carro estava exatamente ao lado da coluna que elas lembravam, no lugar perto dos elevadores… mas do outro bloco de elevadores. E gesticula para a mãe apontando que lá estava a viatura. Imagino o carão das duas…
Tenho uma amiga que no dia seguinte à troca de carro foi fazer compras. Deixou o veículo na rua e foi a um par de lugares a pé. Na volta, nada do carro dela. Pior, deviam ter roubado fazia tempo pois havia outro no local. Ela telefona para o marido para saber o que fazer e acionar a seguradora e ele mata a charada na hora: “mas, querida, você está procurando qual carro?” Claro que ela não lembrava do novo e procurava o antigo.
Tem também as historinhas que tempos depois ficaram engraçadas, mas na hora nem tanto.
Em 2006, a filha de uns queridíssimos amigos se formou em Medicina em Alfenas, MG e fomos convidados a participar dos festejos. Nem chamo de formatura, pois parecia mais uma minissérie, já que as comemorações duraram cinco dias seguidos. Meus amigos alugaram uma chácara enorme a sete quilômetros de onde ocorreriam as principais festas. Lá fomos meu marido, minha mãe e eu para o sul de Minas, de carro. Mas já antecipo que nem conhecemos nada, pois entre tantas festas e tanta chuva, ficamos no percurso-salão-chácara-igreja-chácara. A estrada era de terra e choveu todos os dias, exceto, claro, o último, quando poderíamos ter aproveitado a piscina — mas aí já era hora de voltar para casa. A lei de Murphy é implacável.
O primeiro problema surgiu logo no final do segundo dia. Estávamos em vários carros, mas éramos muitas pessoas também e todos saíam praticamente com a lotação máxima o tempo todo. Numa caminhonetinha foi uns dias na frente o famoso “faz-tudo” da firma do meu amigo Zézo. Como se chamava sei lá o quê Ramos de Oliveira, o Zézo, que jamais, jamais, perde uma piada, o chamava de Azeitona. Eu nunca soube o nome dele. Pois bem, lá foi o Azeitona com um furgãozinho com mantimentos suficientes para alimentar nós todos por seis meses, pois além da generosidade outra marca dos meus amigos é o exagero na comida. No dia seguinte ao da nossa chegada, o Azeitona estava ao volante do Palio da filha do meu amigo, indo ou voltando da chácara para não lembro o quê, quando o carro derrapou na lama e bateu num veículo que vinha no sentido contrário. Lá fomos nós com nosso carro acompanhar o Zézo no Cherokee dele e ajudar e dar uma força para o Azeitona, que estava totalmente perdido e assustado, sem saber o que fazer.
Como o caminho era apenas uma estrada pouquíssimo transitada, logo chegamos ao local do acidente. Meu marido desceu em meio a chuva para ajudar o Zézo a avaliar os danos, ver o que seria feito e enquanto faziam ligações telefônicas para chamar guincho e outras formalidades, ficaram dentro do Cherokee, junto com o namorado da filha do Zézo e, talvez, o Azeitona que não me lembro onde estava, enquanto eu ficava dentro do nosso carro. Em algum momento no lusco-fusco da noite, alguém resolveu acender a luz de dentro do Cherokee. Antes não tivessem feito isso. Dali por diante, ninguém mais conseguiu apagar a maldita luz, pois ninguém sabia como haviam sido ligadas já que havia sido um tal de apertar botão a torto e direito. Chegando na casa, meu marido foi tentar desligar o raio da luz. Não acharam o botão e o Cherokee estava com todas as luzes internas acesas havia horas. Parecia quase um trio elétrico, pois não era apenas uma lampadinha, que teria sido desrosqueada. Eram várias e, claro, a Lady Murphy é uma dama implacável e atacou de novo. Não conseguiam desatarrachar as lâmpadas ou abrir as tampas delas, não lembro. O segundo passo foi achar a caixa de fusíveis. Meu marido e a Raquel, esposa do Zézo, finalmente a encontraram. Desligaram o fusível, mas nada de as luzes apagarem. Já era tarde e estávamos todos cansados, alguns haviam tomado chuva, o Zézo precisava resolver a questão do carro batido e, claro, tinha as questões normais como fazer a comida, checar a programação do agitado calendário… Meu marido desconectou a bateria do Cherokee e fomos dormir.
Na noite seguinte, nova festa, mas apesar dos esforços ao longo do dia, nada de conseguir apagar as luzes. Então fomos todos até a igreja onde seria a missa e depois para o salão de bailes para mais uma comemoração. Com chuva e tudo, a cada parada os homens tinham que abrir o capô e desconectar a bateria e, claro, reconectá-la para poder sair com o carro. Enquanto isso, todos os que andavam no Cherokee pareciam noivas a caminho do altar, com todas as luzes internas acesas. Durante o dia, a Raquel e meu marido quebravam a cabeça tentando descobrir como desligar aquele troço. Ou seja, a tempestade perfeita. Diria que com tanta chuva foi exatamente isso. E foi assim até o final da nossa estadia em terras mineiras. Liga e desliga o terminal da bateria a cada parada/partida do carro. E tome chuva.
No final daquela semana, voltamos todos para nossas cidades e minha amiga, que mora em Sorocaba, SP levou o carro ao mecânico para que desligasse aquela coisa. Ele então mostrou que o carro tem uma segunda caixa de fusíveis, que ninguém achou, por isso o desarme não havia funcionado. Bom, paciência. Evidentemente essa não seria uma boa solução, mas ficou o conhecimento. O sujeito olhou e já deu o preço, que ela achou meio caro, mas não tinha alternativa.
Depois de pago o valor do “conserto” o sujeito mostrou para minha amiga que o carro tem um botão para essa tarefa, que ninguém tinha achado. Se quem acendeu as luzes tivesse lembrado como o fez, tudo teria sido resolvido, mas imaginem, caros leitores, três (ou quatro) homens dentro de um carro. É um prato cheio. Nunca vou entender essa mania masculina de sair apertando botões, mexendo em alavancas e controles sempre. A Raquel reclamou do valor cobrado e ele respondeu algo como: Um real para apertar o botão e todo o resto por saber onde ele fica e como desligar as luzes. Grrrr!
Daquela vez, fui uma amiga solidária e tudo, mas em outra ocasião mostrei como posso ser uma pessoa totalmente desligada — na avaliação mais gentil. Um dia, saindo do aniversário de um sobrinho, descemos no elevador com os primos do meu marido que moravam no mesmo prédio que nós. Ao chegar à rua nos despedimos com o clássico comentário: “Até já. Nos vemos na garagem de casa”. Meus primos andaram meio quarteirão com os dois filhos pequenos até o carro enquanto nós entrávamos no nosso, que estava mais perto. Logo em seguida, minha prima começa a acenar com a mão e eu, educadíssima, devolvo o cumprimento. Ela acena mais uma vez, e eu então jogo um beijo e entro no carro, no banco do carona, com o marido ao volante.
Poxa, sou mesmo uma pessoa muito querida, não? Como a prima do meu marido gosta de mim, caramba. Épocas pré-celular. Chegamos em casa e nada deles na garagem. OK, devem ter feito outro caminho, amanhã nos falamos. E fomos dormir. No dia seguinte, veio a ligação pelo interfone: “Pô, vocês não viram que eu estava chamando?”, diz minha prima. “Não, claro que não, achei que estava dando tchau”. Nada disso, o carro deles não pegava e ela estava me chamando para que eu pegasse as crianças e as levasse para casa comigo que ela esperaria o guincho junto com o marido. Uma pessoa pedindo ajuda e esta que vos escreve jogando beijos… affe! Sim, sou um pouco desligada para algumas coisas ou, no mínimo, imagino algo totalmente diferente do que a maioria pensa estar acontecendo ou, pior ainda, seria o óbvio. Como diz o ditado, quando ouvir cascos pense em cavalos, não em zebras. Pois é, eu nem isso. Logo penso em unicórnios.
Tempos atrás, de férias em Mendoza, na Argentina, fomos até o centro da cidade passear, depois de vários dias de vinícolas isolados numa lindíssima casa no Vale do Uco. Entro sozinha numa loja para comprar cartões postais para meu álbum de fotos enquanto meu marido e o casal de amigos com quem estávamos segue até algum lugar a alguns metros de distância. Pergunto onde tem cartões postais e o sujeito atrás do balcão me indica um cantinho meio afastado, onde estava um rapaz com uma mochila e vários cartões postais espalhados.
Lá vou eu e começo a pegar alguns dentro das caixas de sapatos que estavam sobre o balcão e alguns sobre a mesa. O sujeito me olha e com forte sotaque francês me diz: são meus. E eu, “sério que você é fotógrafo? Meus parabéns, são lindíssimos. Você é fera…” rasgo mais alguns elogios (as fotos eram mesmo belíssimas) e continuo selecionando os cartões que queria. Aí ele fala algo que não entendi e, tímida como sou, pergunto se ele prefere falar em francês, já que parece ser de lá. “Não precisa, porque você parece não entender”, me responde em francês. Achei meio grosseiro, pois ele nem sabia meu nível de proficiência na língua de Voltaire, mas OK, paciência.
Nesse intervalo, chega minha amiga e também começa a escolher cartões e eu comento que ele é o fotógrafo. “Que legal, parabéns”, diz ela ao moço e também pega alguns postais. Pagamos e fomos embora e, ao contar a história para meu marido e meu amigo… bazinga! Os dois perceberam o óbvio. O cara não era o fotógrafo coisa nenhuma, era um turista como nós e eu “roubei” os cartões que ele havia selecionado. Quando me dei conta, queria morrer de vergonha. Voltar lá e me desculpar? Como? Queria mais era estapear o sujeito da loja que assistiu a tudo sem me avisar e deve ter se divertido à pampa.
O pior é que estávamos na Praça San Martín, bem no centrinho, e chegamos a cruzar com o outro turista por duas vezes — eu devidamente encolhida para ficar ainda menor do que sou. Ainda gostaria de saber por que quando escuto cascos eu penso em unicórnios quando todos pensam em cavalos, os mais malucos em zebras e eu… deixa pra lá.
Mudando de assunto: mais uma corrida de Fórmula 1 neste ano de tantos cancelamentos. O domingo em si foi legal, assim como o GP, mas para mim a parte a destacar foi algum dia na semana anterior. O repórter Marcelo Courrege, da Globo, correu atrás de Kimi Räikkönen para tentar uma entrevista com o falante finlandês. Meio no desespero, correu e chamou no microfone o narrador Sérgio Maurício (“Sérgio, Sérgio”) para avisar que teria uma palavra do piloto. Aí o finlandês olha para o coitado do repórter, que já conhece há tempos, e diz: “My name is not Sergio (meu nome não é Sergio)” e segue andando. Kimi sendo Kimi e arranjando mais uma desculpa, desta vez engraçada, para evitar dar entrevistas. Até o Courrege deu boas risadas com essa saída do piloto.
NG
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