A Alfa Romeo é uma das marcas mais tradicionais do planeta. Fundada em 1910, teve as suas raízes no automobilismo. Um de seus maiores admiradores foi nada menos do que Enzo Ferrari, que começou sua carreira como mecânico, foi piloto e teve espaço para criar a escuderia dentro da equipe de Milão.
Ao longo de sua história tivemos modelos clássicos e com toque de arte na concepção, como o Duetto, criado com inspiração na sépia, o molusco, e que ficou imortalizado no filme “A primeira noite de um homem”, com um jovem Dustin Hoffmann que, vale ressaltar, dá umas belas aceleradas com a macchina durante o longa.
Mas hoje é dia de falar do último modelo produzido pela Alfa Romeo antes de passar o controle acionário para a Fiat e também o último com tração traseira até a chegada do Giulia atual. O 75 traz a genialidade de Ermanno Cressoni, que desenhou também o Fiat Coupé, belíssimo modelo vendido por aqui na década de 90. A produção começou em 1985 e terminou em 1992 com quase 400 mil unidades vendidas.
O 75 Turbo foi lançado em 1985. Além dele outras versões utilizavam motores distintos. Um turbodiesel foi lançado na Europa. Por lá a versão mais forte trazia o V-6 de 2,5 litros e 185 cv. Já fiquei curioso para conhecer esse. Nos Estados Unidos o nome foi trocado para Milano, nesse caso com um V-6 de 3 litros. E aqui falamos do icônico Busso (engenheiro Giuseppe Busso, 1913-2006, seu projetista).
Olhando para ele é possível entender a razão do sucesso. Ainda mais quando estamos frente a frente com algo tão especial. O 75 Turbo Evoluzione é uma a versão de homologação, com apenas 500 unidades cheias de personalidade italiana, gênio forte e tempero milanês. Esse exemplar chegou ao Brasil há alguns meses.
A versão de pista do Grupo A criou belos exemplares e celebrou vitórias no ITC e Giro d`Italia. Mas vários pilotos de renome se sentaram atrás do volante, como Gabriele Tarquini, Nicola Larini e Alessandro Nannini. Fora os italianos tivemos Jacques Laffite, Mario Andretti e Jean-Louis Schlesser.
O design que já é bonito ficou ainda mais vistoso nesse caso. De perto lembra bastante um Lancia Delta, seu conterrâneo. Os para-choques trazem um desenho intimidante com defletor integrado e o body kit aumenta a musculatura com peças muito bem posicionadas. As rodas de 15 polegadas, também na cor vermelha, fecham o pacote estético.
Existem pequenos diferenciadores mecânicos em relação ao 75 Turbo, apesar de entregar os mesmos 155 cv e 23,3 m·kgf de torque. O pulo do gato está na cilindrada. Para se enquadrar no regulamento da FIA que estabelece coeficiente 1,7 para equiparação de motores supercarregados ou turbocarregados com os de aspiração natural, para fins de enquadramento nas classes de cilindrada, no caso até 3.000 cm³, ele traz exatos 1.762 cm³ enquanto a versão convencional é de 1.779 cm³.
Outra questão interessante do ponto de vista técnico é a localização dos freios a disco. Eles são instalados junto à caixa de câmbio, com um design bastante curioso. Esse sistema não é incomum quanto parece e equipou alguns modelos como o próprio Alfa Romeo Alfetta (1972-1987) e outros carros europeus, como o Citroën DS19 de 1955. A vantagem é a redução do peso não suspenso. A desvantagem, como dá para imaginar, é a manutenção mais trabalhosa.
O modelo apresenta um equilíbrio de peso excepcional. Isso por conta de uma questão técnica: a caixa de câmbio com diferencial (transeixo) e a embreagem foram colocadas no eixo traseiro, este com suspensão De Dion localizado por paralelogramo da Watt, o que garante um excelente comportamento dinâmico.
O interior traz elementos interessantes. E alguns diferentes. Algo típico da inovação e criatividade italianas. Vale lembrar do Uno e sua maçaneta diferente e também o painel, com uma ergonomia fantástica pensada para o motorista ativar alguns comandos sem tirar as mãos do volante.
A primeira coisa, aliás, que gostaria de destacar é que os painéis com instrumentos analógicos realmente chamam a minha atenção. Acho incrível acompanhar as informações dessa maneira, através dos clássicos ponteiros que monitoram a usina de força.
Fotos: autor
O 75 traz exatamente isso. Analógico, pois é um carro dos anos 80. Porém recheado de informações importantes — e até essenciais — para o motorista em um carro esportivo. Pressão de óleo, conta-giros, temperatura do motor e o manômetro do turbo. Tudo à frente do piloto e com algarismos na cor vermelha.
Além disso mais algumas coisas chamam a atenção antes de dar a partida. Os comandos dos vidros elétricos ficam no alto. Algo inusitado, me parece com inspiração aeronáutica. O painel traz o Alfa Romeo Control, um check/control que monitora o funcionamento das luzes e do motor. Além disso, o freio de estacionamento também é uma alavanca parecida com um manete.
A partida revela um som familiar. Quem gosta de Alfa Romeo se identifica na hora com o ronco compassado desse motor que foi usado durante algumas décadas pela marca, com bloco e cabeçote de alumínio e bastante tecnologia para a época. Vale ressaltar a turbina Garrett T3, intercooler e radiador de óleo. Tudo para manter o italiano em perfeito funcionamento.
Chega a hora mais divertida. A suspensão é toda acertada para um passeio em Monza, Imola ou uma viagem prazerosa até Nürburgring. Não para nosso piso lunar. Ele sofre um pouco com as irregularidades e se manifesta como um jovem de 33 anos reclamão. Mas não o culpo.
Rua livre e o pé direito se anima. Apesar de ser um turbo dos anos 80 não notei algo bastante comum na época: o turbolag. Claro que ele existe, já que o carro não acelera rápido como um downsized atual, mas a dirigibilidade é bastante agradável.
O escapamento foi todo feito no Brasil. E traz um diâmetro um pouco maior. Quando chego perto do limite de giro a troca de marchas é seguida de um pipoco que estimula os sentidos italianos. A partir da segunda o motor cheio mostra a que veio e se torna mais empolgante.
Realmente uma experiência única. Devolvi o carro com aquele gostinho de quero mais. E isso acontece algumas vezes. De qualquer forma em breve faremos uma matéria com outro modelo da Alfa Romeo igualmente exclusivo por aqui. Vocês não perdem por esperar, no melhor sentido da expressão. Arrivederci.
GDB