Faz pouco tempo, comentei aqui rapidamente o filme (ou docu-drama, como se autodefine) “O dilema das redes”. Continuo achando que vale a pena assistir, principalmente por aquelas pessoas que desconhecem como funcionam as redes sociais e sobretudo sobre suas consequências. Cansei de ver gente postando “avisos” ao Feicibúqui dizendo “eu não autorizo o Feicibúqui a usar minhas imagens, etc, etc, etc”. Também cansei de avisar que isso não adianta nada, pois quando você abre sua conta e coloca um xis naquele quadradinho, clica numa coisinha chamada “termos de privacidade” ou coisa parecida, pronto! Já concordou com que eles façam tudo aquilo que você agora não quer que eles façam. Se não leu, problema seu — lembrando, é claro, que muitas vezes a adesão é compulsória, ou você concorda ou você não participa. Mas essa é outra discussão. E que, obviamente, os administradores dessas redes não ficarão sabendo do seu esperneio apenas por uma postagem sua em meio a alguns bilhões de coisas. Sem falar que é estranho alguém que faz “check-in” em cada lugar que vai, posta fotos do café da manhã, almoço e jantar, reuniões com amigos, fotos dos gatos e mais um zilhão de coisas querer algum tipo de privacidade. Nunca vou entender.
Mas o que a internet e as redes sociais têm a ver com autoentusiasmo? É que costumo ver as postagens e os artigos de Eduardo Affonso em O Globo e no perfil dele no Feicibúqui. Ainda estou me recuperando das longas gargalhadas sobre o texto dele publicado ontem (20), no qual ele diz que faria um eventual documentário sobre a indústria automobilística, na linha daquele sobre as redes sociais. Para quem quiser se divertir com doses cavalares de ironia, eis o nome completo já que há alguns homônimos: Eduardo Affonso (Sidney Eduardo Affonso).
Gostei da ideia dele. Ex-executivos (claro, ninguém cospe no prato em que está comendo, mas é frequente fazer isso depois que se refestelou com os acepipes) de fábricas de carros participariam de um documentário no estilo mea culpa chamado “O dilema dos motores”. (foto de abertura). Entre os exemplos citados por ele, um ex-Ferrari diria “por mim, teríamos produzido apenas ambulâncias. E carros do Corpo de Bombeiros. Mas havia pessoas gananciosas e o que poderia ser um lindo projeto acabou se perdendo”.. O engenheiro Y, enxugando uma furtiva lágrima, diria: “Nós sabíamos dos riscos e, ainda assim, colocamos aceleradores”.
Vou fazer meu próprio disclêimer aqui, já que o dele no post é de chorar de rir: quem conhece o escriba sabe que destila hectolitros de ironia com um domínio fantástico do idioma. E sempre com muito bom senso. Por isso, nada de levar o roteiro do filme a sério.
Mais um exemplo do belo texto: “Claro que estava nos planos, desde o início, que ladrões usariam nossos carros nas fugas — confessará K (inicial fictícia), engenheiro de produção da Nissan”. E, ainda: “Devíamos ter resistido e abortado o Ford Bigode enquanto era tempo, mas… fomos fracos”.
Não quero me alongar aqui nas aspas porque acho que vale a pena a leitura do post na íntegra. Pessoalmente, comentei no perfil do meu amigo virtual que “apenas acrescentaria o caráter opressor e racista (reverso? estrutural? Sei lá, deve haver um racismo para chamar de seu/dele) de Henry Ford, que aceitava fazer carros de qualquer cor, ‘desde que sejam pretos’”. Ironia apenas para seguir na linha do proposto, claro.
Eu mesma já perdi não sei quanto tempo nesse tipo de discussão. Uma foi quando alguém criticou obras como viadutos e pontes, alegando que servem apenas aos carros e esquecendo que ônibus, bicicletas, motos, pedestres, tudo utiliza pontes e viadutos.
Outra que me lembro foi a respeito do investimento público feito no Rodoanel “em detrimento” de investimentos no metrô. Para quem conhece São Paulo, o Rodoanel liga as principais rodovias que vem do interior e as do litoral por fora da cidade, na forma justamente de um anel e evita que caminhões destinados ao porto de Santos (ou que de lá venham) passem pelo centro de São Paulo, como era a única opção até alguns anos atrás. Não, ele não é perfeito. Os acessos poderiam ter sido mais bem construídos, falta o trecho Norte para poder ser chamado de anel e outros inconvenientes, mas é fato que ele melhorou muito o trânsito na cidade e reduziu os tempos de circulação dos caminhões. Isso sem falar que muitos deles vão direto a seu destino pelo Rodoanel, como a Zona Sul de São Paulo, sem ter de cruzar toda a cidade. E, claro, o mesmo acontece com carros. Eu mesma usei muitas vezes o Rodoanel para evitar cruzar a cidade à toa.
Isso não significa que não devesse ter sido investido mais dinheiro no metrô, mas ressalto que o Rodoanel foi feito com recursos do governo estadual, assim como o metrô — o governo municipal, em tantas décadas, apenas colocou uns trocados na época em que Gilberto Kassab foi prefeito. Em boa parte das cidades mundo afora, o metrô é obra municipal, por óbvio, pois ele beneficia principalmente os munícipes. Quando há recursos federais, eles são uma parte — e muitas vezes, apenas financiamento. O mais óbvio é que um investimento não deve eliminar o outro e o Rodoanel era (e é) extremamente necessário.
Discutir em rede social é quase sempre perda de tempo. Às vezes caio nessa esparrela e invariavelmente me arrependo. Exceto duas criaturas em quem adoro bater com argumentos e dados. Invariavelmente, eles acabam mudos – xingam, é claro, e me chamam de algumas coisas que obviamente não sou, mas argumento, mesmo, nunquinha. Mesmo com eles raramente discuto, pois além de inútil só dou palco para pessoas carentes que estão atrás apenas de alguma atenção com suas tretas. Basta ver que não tem postagens próprias, apenas entram no mural dos outros, e assim como eu muitos outros cansaram de bater palmas para louco dançar e sequer recebem reações — nem curtidas, nem ironia, nada, muito menos comentários.
Tem gente, é claro, que consegue e gosta de debater e argumentar. Tenho focado apenas nessas pessoas quando sou acometida por uma irresistível vontade de questionar algo. Mas apenas nesses casos é que há algo de positivo pela troca de ideias. Ou seja, rarissimamente me deparo com situações assim.
Mas docu-dramas estão na moda. Assim como mea culpas, ainda que não façam o menor sentido. Vou pedir desculpas pelo fato de minha bisavó ter sido analfabeta? Ou porque ela foi cozinheira numa casa de família, e teria, assim, aceitado uma função machistamente opressora e subalterna? Nos últimos anos dos 1800? Não, né? Por sinal, ela amava cozinhar e eu sou daquelas que acham que lugar de mulher (ou homem) é onde ela (ele) quiser estar. Inclusive na cozinha.
Ao contrário, eram outros tempos e minha bisavó fez questão de que a única filha aprendesse a ler e escrever e frequentasse a escola que lhe fora negada. A tal casa de família era de um excelente escritor argentino que não apenas ensinou a minha avó a ler como também lhe franqueou a própria biblioteca e a incentivou e assim ela acabou sendo uma consumidora voraz de livros para o resto da vida.
Por essa falta de contexto histórico e até mesmo de bom senso é que acho que há de se refletir um pouco antes de sair se autoflagelando por aí por qualquer coisa. Culpar os objetos por coisas feitas pelos humanos não faz o menor sentido. Analogamente, se um motorista embriagado, dirigindo um carro sem freios e com pneus carecas atropela e mata alguém a culpa é do carro? Não, né, parte II.
Mudando de assunto: continuo na linha dos memes ridículos que tanto gosto. Eis mais um:
NG