Recentemente, descrevi aqui alguns causos de barbaridades cometidas pelas autoridades de trânsito às vésperas das eleições. Muitos leitores contribuíram contando exemplos em suas cidades e a primeira conclusão óbvia é que esse tipo de coisa acontece em todo lugar. Ou, como dizem os espanhóis, em todas as casas se cozinham favas.
Quem acompanha minhas escrevinhações sabe a tara que eu tenho por planejamento. Sim, é assim que a classifico, pois é mais do que uma mania. É uma verdadeira obsessão. Pena que quando falamos de trânsito sejamos tão poucos os que acreditamos nos bons resultados do planejamento. E certamente boa parte das autoridades não está entre os maníacos por planejamento como eu.
A toda hora vejo casos de atitudes tomadas de afogadilho, sem avaliação correta das consequências e sequer com uma comunicação minimamente adequada à população — vejam que já nem falo em consulta. Ultimamente, consideraria um avanço gigantesco se apenas fôssemos informados corretamente sobre mudanças no trânsito. Nem aspiro a ser consultada ou a ter acesso a estudos sérios sobre o assunto.
Infelizmente, mesmo as menores cidades sofrem com essa afobação por parte das autoridades viárias, mas é mais notável logo antes das eleições. Estive recentemente em Araçoiaba da Serra, no interior de São Paulo e a pouco mais de 100 quilômetros da capital. Lá, o atual prefeito é candidato à reeleição. Depois de quatro anos sem fazer quase nada em termos de trânsito, as autoridades locais decidiram mudar o sentido de algumas ruas. Seria muito fácil controlar o trânsito na cidade, pois basicamente não há maiores problemas. Os mais comuns são pessoas dirigindo sem habilitação carros, mas especialmente motos; motos com escapamento aberto; motoqueiro empinando moto; e carros com Insulfilm G5 em todos os vidros, incluindo o para-brisa… Ou seja, basicamente coisas simples que não requerem investimentos a não ser fiscalização e que, aliás, são de facílima verificação pois dependem apenas de controle visual.
O centro da cidade tem, basicamente, três ruas: uma que “sobe”, uma que “desce” e outra mão dupla, cortadas por umas seis transversais. Como eu digo, a placa de “seja bem-vindo” e a de “volte sempre”, caso existisse, poderiam ser uma só, frente e verso.
Pois bem, lá até hoje as tais “travessias elevadas” (lombadas disfarçadas de faixa para pedestres) colocadas em torno da praça principal não chegam até o meio-fio e obrigam cadeirantes a usar outros acessos. São um perigo para todos, pois não raro alguém torce o pé nos espaços que ficam entre a lombada e o meio-fio. Mas em vez de arrumar essa barbaridade que já dura anos, o prefeito quis inovar e mudou a mão de três ruas a partir do dia 1/10. As três vias têm não mais do que três quarteirões de comprimento — a população da cidade é de 30.000 habitantes, mas a enorme maioria mora na área rural. O centro, mesmo, é pequeno.
A faixa indicando a mudança de mão colocada nas esquinas durou apenas uns três dias. Deixaram outra numa rua onde não houve mudança e não indica em que lugar foi feita a alteração. Ou seja, informação que não informa.
Nem preciso dizer que muita gente anda entrando na contramão, pois depois de alguns anos dificilmente alguém vai olhar a placa que indica a mão e que, por sinal, está bastante recuada em relação à esquina, o que faz com que seja visível praticamente apenas depois de feita a conversão errada.
Uma rua que corta as três principais e era mão dupla, a Antônio Alves de Oliveira, que liga as Ruas Professor Toledo à Tenente Benedito Camargo Pinto, passou para sentido único. Mas essa mudança sequer foi feita no mesmo dia que as outras. Esta foi no dia 16/10, o que, é claro, só aumenta a confusão de motoristas e transeuntes.
Mas a sinalização de solo, e mesmo a vertical, mal foram atualizadas. Parece que a tinta usada para marcar os pezinhos que indicam o sentido a ser utilizado pelos pedestres ao andar na calçada (assunto que abordei aqui faz pouco tempo no Mudando de Assunto e mais uma vez, alguns dias depois, sobre o mesmo assunto e na mesma seção, agora com fotos) acabou e não deu tempo de padronizar a sinalização de solo no restante das ruas em torno daquelas que foram alteradas.
Aí é um tal de dar de cara com carro vindo no sentido oposto, na pista errada na tal rua de mão dupla… Mas, como brigar com o outro motorista se há duas faixas duplas indicando a separação entre as pistas? Ah, e para quem tem curiosidade, os tais pezinhos pintados de amarelo nas calçadas já estão imperceptíveis, tamanha a qualidade da tinta usada.
Lembro que há um par de anos foi feito o mesmo na capital paulista, próximo do shopping Eldorado. De um dia para o outro, literalmente, diversas ruas mudaram de mão no trecho no quadrilátero entre a praça Guilherme Kwall, o próprio shopping, o Clube Hebraica e a marginal do Pinheiros. Tenho uns amigos que moram lá e foram surpreendidos um dia, de manhã, ao sair de casa. Nenhuma consulta, estudo, sequer uma comunicação prévia. Nadinha. Você vai dormir um dia com sua rua com um sentido e acorda com outro. Eu mesma quase entrei na contramão um par de dias depois do início da mudança, indo visitar estes meus amigos, pois já não havia mais faixas indicando a mudança. Bem, não se pode dizer que morar no Brasil não seja sempre cheio de novidades. A cada hora, uma surpresa — e nem sempre agradáveis. De tédio não morreremos nunca por estas paragens.
A Nora má que habita dentro de mim tem as ideias mais malucas sobre este tipo de mudança de supetão. Uma é que tem algum brincalhão nessas autarquias que se diverte vendo a preocupação de quem entra numa contramão ou das quase batidas que sempre acontecem nessas horas — algo assim tipo aquelas pegadinhas tão populares na televisão. Imagino que sejamos os protagonistas de programas cômicos em algum lugar, talvez em outro país. Outra é que alguém vive tentando verificar se os motoristas estão, assim como os escoteiros, sempre alertas e muda o sentido das vias apenas para checar se andamos todos solertes — imagino que seria apenas pela farra ou talvez com fins de pesquisa comportamental. “Quem é o motorista alerta? Onde ele mora? Quais são seus hábitos? Sexta-feira, no Globo Repórter…”.
Uma terceira hipótese, mais maldosa e, no entanto, mais provável, é que seja apenas uma forma de arrecadar mais com multas. Se não, qual seria o motivo para não deixar bem clara e bem óbvia a mudança? Vejam, caros leitores, que não entro aqui no mérito de se a mudança é necessária ou se ela melhorará a fluidez do trânsito — apenas imagino quais os motivos para a falta de indicações úteis e práticas para os motoristas e pedestres, que não raro se confundem quanto a para qual lado da rua olhar (ou, pelo menos, para qual olhar primeiro).
Mudando de assunto: sempre gostei de carros, mas tenho uma memória extremamente falha para modelos e, especialmente, detalhes. Mas curti muito este pôster que algum conhecido postou em algum dos vários grupos sobre carros e pilotos dos quais faço parte no Feicibúqui. Interessante notar a diferença (será que é sempre uma evolução?) entre os carros ao longo do tempo. Estes foram os eleitos como os melhores carros do ano nos EUA.
NG