Voltei ao assunto da semana passada. Pensei, pensei, mas o remorso por ter deixado de fora alguns estacionamentos realmente legais me tirou o sono. Por isso, cá estou de volta, como nos filmes de zumbis.
Antes de mais nada, vamos ao habeas corpus preventivo: não incluí nenhum estacionamento brasileiro. Procurei bastante, mas não encontrei nenhum à altura dos que listei abaixo em termos de estética e originalidade. Não é preconceito, não, talvez não tenha procurado nos lugares certos, mas o Google não me deu nenhum caminho — ironicamente, achei um belíssimo numa reportagem sobre estacionamentos em Belo Horizonte, mas ao procurar dados sobre ele descobri que ele fica em… Chicago!
Novamente, não levei em consideração preços nem praticidade, sequer tamanho das vagas, mas apenas pura beleza.
E, novamente, não há exatamente uma ordem, pois haveria diversos empates, mas me guiei talvez por alguma conspiração estética. Isto posto, vamos à lista:
1) Quick Parking Morelli Car Park, Nápoles, Itália
Projeto do Kingdom Architects and Planners é um dos meus favoritos também. Nem tanto pelo estacionamento em si, que é mais ou menos comum, mas pelo acesso por um túnel do século XVII a uma antiga caverna. Fica perto da Piazza dei Martiri e é um deleite para os olhos. Tem um website supercompleto, com informações de outros estacionamentos do grupo que, no entanto, não tem o charme deste, ganhador de diversos prêmios. O prédio tem sete níveis, incluindo três para estacionamento do público em geral, e pode ser acessado por três diferentes túneis.
2) RAI Convention Center, Amsterdã, Holanda
Outro estacionamento que se destaca pelo design. Foi projetado por Benthem Crouwel Architects. Gosto muito do desenho das rampas e entrada e saída, que fazem com que as torres pareçam hélices. O espaço interno pode ser usado também como ambiente para convenções — basta retirar os carros. Foi construído em seções pré-fabricadas de concreto e pode-se entrar e sair de cada andar. À noite é iluminado com luzes de LED azuis o que confesso que não sei se me agradaria ao vivo.
3) O “navio afundado”, Seattle, EUA
Construído em Seattle, no início dos anos 1960 pelo escritório de arquitetura de Zaha Hadid, é basicamente um triângulo colocado numa esquina. O que parecem os deques da embarcação ficam nas duas ruas laterais, por onde se acessam as rampas de entrada ao estacionamento. Construído em frente a um dos prédios mais simbólicos da cidade, a Torre Smith, de 1914 e no lugar onde ficava o icônico hotel Seattle, gerou muita controvérsia, mas hoje tem lá sua própria fama em termos arquitetônicos.
4) Estacionamento Fantasma, Hamden, Connecticut, EUA
Este estacionamento foi construído em 1978 e o incluí na lista muito mais pela originalidade do que pela praticidade. Foi desenhado pelo arquiteto e artista James Wines com o objetivo de, textualmente, “tornar o espaço público algo que já era”. Ok, eu já disse que ele é artista, certo? É claro que a “intervenção” dificulta sobremaneira estacionar carros de verdade, mas não deixa de ser uma forma de atrair a atenção para os estacionamentos — daí a minha inclusão nesta lista.
5) Hoenheim-Nord, Strasburgo, França
Construído em 2001, este estacionamento é mais uma obra de Zaha Hadid e não apenas um estacionamento, embora utilize elementos básicos de estacionamento de veículos, tais como asfalto, pintura, luzes. A ideia de colocar baias em ligeiras curvas dá um aspecto interessante à obra que acaba tendo um quê de arte. Assim como o estacionamento fantasma, este entra na categoria “o arquiteto brilha mais do que o estacionamento em si”. Ainda assim, achei interessante incluí-lo — só não sei se é prático ou mesmo se as pessoas conseguem identificar as vagas e onde devem parar exatamente…
6) C42, Paris, França
Projeto do escritório de arquitetura francês de Manuelle Gautrand, esta obra de arte do design é peculiar até no nome: C, de Citroën, e 42 por ser o número na avenida Champs-Elysées. O local abriga o showroom da marca desde 1927, sempre com elegância, mas a torre de exibição de carros me encantou. Ela foi erguida em setembro de 2007 e ganhou alguns prêmios internacionais. Tem oito bases giratórias, cada uma com espelhos, que contem diferentes modelos de veículos Citroën que se erguem numa espetacular coluna de carros.
7) Parkhaus Engelenschanze, Stuttgart, Alemanha
Ao contrário dos estacionamentos convencionais, escuros e fechados, este prédio de garagem no país dos carros foi desenhado pelo escritório Petry- Wittfoht Freier (posteriormente apenas Wittfoht) com muita elegância, design, luz e criatividade. O prédio fica no centro da cidade de Münster. O que mais me chamou a atenção, e do que mais gostei, foi a cortina de vidro de várias cores, que vão do transparente ao verde e que são pintados em seu interior com linhas horizontais de comprimentos diferentes e que dão uma sensação de profundidade muito interessante. O interior da construção é um charme à parte: um pátio interno aberto para o qual os seis andares tem vista e que proporciona luz natural durante o dia. À noite, uma iluminação especial dá um aspecto especial ao estacionamento.
8) Marina City, Chicago, EUA
As duas torres de Marina City lembram espigas de milho. Foram construídas em 1964 e o projeto original é de Bertrand Goldberg. A metade superior de Marina City contem 450 apartamentos e escritórios, enquanto a parte inferior tem 896 vagas de estacionamento por prédio. Uma curiosidade autoentusiasta: as torres de Marina City ficaram famosas em 1979 no filme “Caçador Implacável” (The Hunter), de 1980, com meu ídolo Steve McQueen. Numa cena antológica, uma perseguição de carros termina com um Pontiac caindo de uma das torres no rio Chicago, logo abaixo do prédio. O engraçado é que encontrei esta foto ilustrando uma matéria de jornal sobre estacionamentos em… Belo Horizonte!
9) The Community Bookshelf, Kansas City, EUA
Outro dos meus prédios favoritos justamente por juntar dois dos meus hobbies: carros e livros (FOTO DE ABERTURA). Construída em 2004, a Estante Comunitária (tradução livre minha, mesmo) é também conhecida como a Garagem do Distrito da Biblioteca (mais uma tradução livre) nasceu da necessidade de expandir o estacionamento da biblioteca da cidade. O município consultou os moradores e surgiu a ideia de fazer uma enorme estante de livros na fachada, feita com painéis de concreto e estrutura de alumínio — o interior é um estacionamento, mesmo. Para quem como eu tem curiosidade de saber quais foram os títulos escolhidos para tal honraria, eis a lista, também a partir de uma seleção dos moradores e confirmada pelo conselho da biblioteca. Confesso que gostei muito das escolhas:
– História da cidade de Kansas
– Ardil 22, de Joseph Heller
– Primavera silenciosa, de Rachel Carson
– Ó Pioneiros!, de Willa Cather
– Cem anos de solidão, de Gabriel García Márquez
– Seus olhos viam Deus, de Zora Neale Hurston
– Fahrenheit 451, de Ray Bradbury
– A república, de Platão
– As aventuras de Huckleberry Finn, de Mark Twain
– Tao Te Ching, de Lau Tsu
– Coleção de poemas de Langstom Hughes, de Langston Hughes
– Alce negro fala, de Alce Negro, segundo John G. Neihardt
– Homem invisível, de Ralph Ellison
– O sol é para todos, de Harper Lee
– Diários da expedição, de Lewis e Clark
– Undaunted courage: Meriwether Lewis, Thomas Jefferson, And The Opening Of The American West by Stephen Ambrose (não tem tradução para o português)
– O senhor dos anéis, de J. R.R. Tolkien
– Uma história em duas cidades, de Charles Dickens
– A menina e o porquinho, de E.B. White
– Romeu e Julieta, de William Shakespeare
– Truman, de David G. McCullough
– um volume de livros infantis com vários autores, incluindo o Mágico de Oz e Winnie Pooh.
Mudando de assunto: costumo fazer compras numa loja chamada de “clube de compras” que vende algumas coisas por unidade e outras em pacotes, e coloca dois tipos de etiqueta para que o comprador saiba quanto pagará por cada item. No caso de fardos de papel higiênico, por exemplo, aparece o preço do pacote de 40 rolos e, logo abaixo, o de cada rolo. No caso dos hambúrgueres, por exemplo, pacotes com duas unidades mostram o preço da caixa e o preço de cada hambúrguer. Assim, nos produtos semelhantes, mas com embalagens de tamanhos diferentes, usam vários tipos de unidade, dependendo do produto, mas são sempre intuitivas e fáceis de entender. Ou era o que eu achava. Pois bem, recentemente tive uma demonstração explícita de por que este país não vai para rente. Estava eu passando diante da gôndola dos xampus quando uma mulher disse para o marido: “Eu não entendi. Tem o preço por unidade, mas tem preço por quilo também. Será que precisa pesar?”. Novamente, caros leitores, estamos falando de xampu, vendido em frascos. Meu marido me puxou pelo braço pois explodi numa gargalhada e tive que correr para outra gôndola para me esconder. Vai que a inteligência dessa criatura é contagiosa?
NG