Com o primeiro semestre comprometido, quando a quase totalidade dos concessionários tiveram suas lojas fechadas em lockdowns estaduais e municipais por mais de dois meses, e a segunda metade do ano em acelerada recuperação, o mercado brasileiro fechou 2020 26,7% abaixo do que fizera em 2019. Prever é bem mais que um exercício de bola de cristal, porém arrisco dizer que diferentemente de outras crises que atingiram o setor sobre rodas, ciclos econômicos, etc., a pandemia jamais poderia estar em qualquer cenário provável, o que dirá no que se seguiu a ela.
Dezembro foi um mês quase normal, as vendas de veículos leves estiveram 7,5% menores que mesmo mês do ano anterior e ainda por cima com matéria prima escasseando e provocando cortes na produção e entrega de todos fabricantes. Passados metade de janeiro e a produção de componentes ainda não foi normalizada, nem a de automóveis. Fechamos o ano com doze dias de estoque entre fábricas e concessionários, quando o normal é de cerca de 40 dias. Não se encontra disponibilidade de carros nas lojas, tampouco vontade em negociar preços na turma do outro lado do balcão.
Luiz Carlos Moraes, presidente da Anfavea, apresentou números e projeções do ano em reunião virtual com a imprensa especializada e cadernos econômicos. A entidade mantém o seu otimismo para este ano, porém condicionado ao correto encaminhamento da crise fiscal, aliado a reformas reestruturantes prometidas por este governo assim que assumiu. Se já houver projeções para um plano B, onde nada dará certo, podemos pressupor que existam, seguramente não seriam nada positivas.
Assim sendo, contemos com a boa disposição do governo em conseguir uma agenda mínima. Nesse cenário que se inclua também a normalização de preços das commodities e a previsão de crescimento de 25% para a produção e 16% para vendas no mercado interno passa a ser algo bem factível. Nem assim repetiremos 2019 tão cedo, porém o ar de estabilidade já será suficiente para que os fabricantes atinjam certo equilíbrio em seus balanços e os índices de emprego do setor não sofram novas baixas.
A título de comparação apenas, nos EUA, mercado fechou com queda anual de 14% e dezembro 7% abaixo de mesmo mês de ’19. Itália, México, Reino Unido, França, todos de larga escala de produção de automóveis foram atingidos em níveis semelhantes ao brasileiro e a Coreia do Sul a única exceção, cresceu 5%.
Nosso dezembro não pode ser considerado mau, em termos de vendas/dia útil, superou-se o nível de dez’18, com 11.649 unidades/dia de veículos leves, sinais de procura maior que capacidade de atender desta vez as consideramos positivo sinal de que as coisas se normalizam bem.
Ao todo, licenciaram-se 243.967 autoveículos sendo 232.984 leves, 9.838 caminhões e 1.145 ônibus. Nos doze meses esses números foram respectivamente, 2.058.437, 1.954.828, 89.678 e 13.931. Graças ao desempenho do agronegócio as vendas de caminhões foram as menos afetadas, -11,5% sobre 2019. O efeito nova Strada fez com que os comerciais leves tivessem uma retração de 16%, contra 26,7% de queda total de leves. Ela e a Fiorino foram os únicos modelos a vender mais em ’20 do que em ’19, como veremos a seguir.
No comparativo mês a mês ao longo dos anos, o gráfico mostra-nos uma recuperação ligeiramente mais lenta do que a queda, não um “V” como se desejava, mas de bom tamanho. Nota-se também que dos piores dias de abril e maio, em agosto já superávamos os números da crise de ’16 e a curva de recuperação seguiu até dezembro.
As vendas diretas sofreram baque maior, sempre em números anuais, -29,3% enquanto as vendas no varejo foram 24,4% menores. No seu auge chegaram a representar 45% das vendas e terminaram o ano estabilizadas em 40%. Há uma explicação simples aqui, vários fabricantes, entre a cruz e a espada escolheram o preço, deixando as locadoras sem carros no estoque. Esse cenário deve se repetir neste ano também, alguns governos estaduais decidiram taxar com ICMS as vendas de usados em loja e a farra dos PcDs também será menor, os optantes terão de receber veículos especialmente adaptados. A racionalização das vendas passa a ser fator de maior relevância.
Na distribuição dos licenciamentos por região, o sudeste acabou ficando com 50,6% e a que menos se recuperou dos impactos trazidos pelo Covid, -32% com relação a 2019. O motor e tração do Brasil patinou e é dali que se esperam os maiores crescimentos para este ano.
RANKING DO MÊS E DO ANO
A Chevrolet reagiu e voltou à liderança do mês e também assegurou a coroa de vendas do ano, Fiat em 2º lugar em dezembro e em 3º no ano, encostando na VW. As três grandes daqui fecharam o ano com respectivamente 17,35%, 16,80% e 16,50% do mercado, ou seja menos de 1% as separa.
Em volume de emplacamentos significa 42.214 unidades para a Chevrolet (338.549 no total), 39.745 para a Fiat (321.836 no ano) e 37.675 para a VW (327.683). O segundo pelotão foi comandado pela Hyundai, seguido pela Ford, Toyota e Renault.
Dentre as marcas de maior volume que mais cresceram em dezembro, destacam-se a Jeep (+28%), Fiat (+17%) e Hyundai (+12%).
Onix recuperou o fôlego e fechou dezembro com 16.566 unidades (135.351 no ano), seguido pelo Onix Plus (foto de abertura), com 12.919 (83.392) e HB20 em 3º com 10.433 (86.548). Os suves compactos seguiram sua tendência de crescimento na preferência dos compradores e tivemos 4 modelos no ranking dos dez mais vendidos. Os novos compactos da Chevrolet encerraram dezembro em 1º, 2º e 10º lugares do ranking, um feito e tanto, comprova acertos do fabricante em sua estratégia de renovação de produtos e nos segmentos e maior volume. O consumidor sempre preferirá novidades na hora de escolher investir seu dinheiro na compra de um carro novo.
A lamentar a decisão de saída de cena por parte da Ford, já bastante comentada neste espaço. Quem absorverão os maiores nacos dos 200k/ano que marca do oval azul vendia aqui? Em meio as férias de janeiro muito cérebro deve estar fervendo para escolher as melhores jogadas.
Quantos revendedores Ford permanecerão abertos dos 450 existentes hoje? No pacote de US$ 4,1B anunciados por Dearborn um bom pedaço será para indenizar o fechamento de lojas, sem carros novos de volume e com somente a Ranger, pode-se esperar que num médio prazo restem 10% deles, se muito, tornando-se uma marca equivalente a de alguns importados do segmento de luxo. Confesso que minha bola de cristal não previra tal cenário.
Nos comerciais leves a pequena Strada fez bonito, 10.390 unidades em dezembro e 80.041 no ano, seguida pela Toro com 6.983 (53.974), Saveiro em 3º, Hilux, S10. Até a chegada de novos modelos a Fiat seguirá com seus 50% do segmento de picapes.
Costumo levar em conta em minhas análises de fechamento do ano o que se previra 12, 13 meses atrás, a pandemia não permitiu desta vez.
Desejo a todos leitores um ótimo 2021 recheado de auto entusiasmo.
MAS