A temporada 2021 da F-1 ganha a cada dia ares de emoção em níveis até então inéditos. Nem mesmo no auge do apartheid sul-africano ou nas primeiras corridas no Oriente Médio a situação esteve tão complexa. Atentados por mísseis sobre os céus de Riad — onde a F-E se apresentou no fim de semana —, a negativa da Fórmula 1 em aceitar a vacinação para o circo da categoria e a realização de apenas três dias de testes pré-temporada compõem um cenário intrigante, para dizer o mínimo. Paralelamente, a Mercedes (foto de abertura) deu prosseguimento hoje à apresentação dos novos carros — o W12 — para o campeonato deste ano, na maioria dos casos, uma releitura nada radical dos modelos usados em 2020, e Piero Lardi Ferrari, filho do fundador Enzo, lançou um factóide sobre os gastos da F-1 atual.
Em 1985 o apartheid sul-africano estava fervendo e impactava sobre várias atividades. No GP disputado em Kyalami, no dia 19 de outubro daquele ano, os carros da McLaren, por exemplo, não carregavam os logos do seu principal patrocinador e seu esquema gráfico foi grosseiramente disfarçado para amenizar a associação com a multinacional que hoje apoia a Ferrari. Mais: a Beatrice Foods, que bancava o projeto de Carl Haas, só evitou o pior graças a uma jogada de Bernie Ecclestone. No fim de tarde de sexta-feira, 18, ele ofereceu a Alan Jones, o único piloto da equipe, uma quantia equivalente à vitória na corrida de sábado, desde que ele viajasse naquela mesma noite para a Austrália alegando problemas pessoais. Com isso, a Haas ficou sem piloto e não foi punida nem pela FISA (na época o braço da FIA para competições), nem pela FOCA e, de quebra, a empresa americana não sofreu nenhuma represália por apoiar um evento esportivo na África do Sul.
No último fim de semana, durante a prova de F-E em Riade a defesa aérea da Arábia Saudita interceptou mísseis lançados por separatistas Houthis a partir do Iêmen. O ataque aconteceu no período em que o evento se realizava, clara demonstração de atentado terrorista. Posto que a penúltima etapa da temporada está prevista para ser exatamente num circuito de rua na Arábia Saudita, o fato torna-se ainda mais preocupante. Some-se a isso o desenrolar do assassinato do jornalista Jamal Khashoggi na embaixada desse país em Istambul: nos últimos dias os Estados Unidos acusaram o governo saudita de envolvimento nesse crime. Essa atitude contribui para aumentar o clima de tensão, situação que tem potencial para se estender durante bom tempo.
Em um cenário de tensão geopolítica causa estranheza a recusa da Fórmula 1 em aceitar a oferta barenita de vacinar todos os integrantes do circo que desembarcarem em Muharraq, aeroporto situado em uma ilha localizada seis quilômetros ao norte de Manama, a capital do emirado. De acordo com a declaração de um porta-voz da F-1 à BBC, a razão da recusa seria dar prioridade “às pessoas mais vulneráveis. Nós não queremos furar a fila.” Não será surpresa, porém, se a oferta aos integrantes das equipes e da imprensa que viajarem ao Bahrein para a semana de testes pré-temporada dias 12 a 14 próximos) e para a corrida (fim de semana do domingo 28) for aceita voluntariamente. A decisão da F-1 em rejeitar a vacinação em massa não mencionou que instruirá seus profissionais a seguir essa ordem, algo que parece pouco provável.
Esta semana prosseguem as apresentações dos carros para 2021 — hoje Mercedes e amanhã, Alpine, Aston Martin; dia 4, Haas; dia 5, Williams —, sendo que apenas a Ferrari deixou para a semana seguinte (dia 10) a revelação do seu monoposto. Aliás, vem de Maranello a notícia mais forte deste início de semana: Piero Lardi Ferrari, filho do fundador Enzo, externou ao site Planetf1 sua decepção em relação ao fato de que a alta tecnologia desenvolvida pela categoria é guardada a sete chaves:
“Nós temos os monopostos extremamente rápidos e com tecnologia avançada. No entanto, pouca gente sabe disso. Obviamente algumas ideias são protegidas por patentes, mas nós gastamos quantidades absurdas de dinheiro e mantemos tudo em segredo. Alguém me explique o porquê disso!”
A bronca de Piero Lardi reflete a eterna posição da casa de Maranello na política do esporte. Através desses factoides a Ferrari acaba criando condições para conseguir benefícios e compensar pontos débeis de projetos ineficientes, caso óbvio do seu carro atual, e das perenes crises políticas que caracterizam seu organograma. Não raramente a imprensa especializada europeia faz referências aos problemas que os italianos vivem no quinto ano do plano trienal em curso…
Mais uma equipe brasileira no TCR South America
A Honda estará representada extraoficialmente no inédito TCR South America, torneio que será disputado a partir deste ano com provas no Brasil, Argentina, Chile e Uruguai. Serafin Júnior e Duda Pamplona, ex-piloto e diretor técnico da equipe Officer de Stock Car e que nas últimas temporadas ocupou posição semelhante na equipe Crown, confirmaram a compra de dois Honda Civic Type R preparados pela empresa italiana JAS. Um modelo 0-km do sedã que é um dos mais populares da categoria será entregue ao carioca Raphael Reis; um carro de 2020 totalmente revisado será entregue a um segundo piloto ainda não definido.
WG
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