Talvez inspirada pela retomada da temporada de Fórmula 1 esta semana tive uma epifania. Um verdadeiro momento Família Autoentusiasta.
Por pura curiosidade, ao ver as lindas disputas nas pistas entre gatotos de 24 anos (um deles filho de um ex-piloto), resolvi pesquisar sobre famílias na Fórmula 1. Sabemos que é um esporte caro e bastante exclusivo, logo uma indicação de alguém que já está lá — ou esteve — pode ajudar muito, não?
Assim, de forma a não cansar meus leitores com tanta história de automobilismo argentino, resolvi pesquisar e me debruçar sobre este outro tema. Por questões apenas de metodologia, e de forma a ordenar e limitar um pouco estes textos, vou focar em quem teve alguma participação na F-1, seja por parte de pai ou de filho. Por isso deixo de fora desta vez Felipe e Nicolas Giaffone, Dale Earnhardt e Dale Earnhardt filho, Al Unser (Sr, Jr e todos os outros, como Bobby, Johnny, Robby), entre outros muitos casos de parentes pilotos.
Também deixo de lado irmãos, que foram muitos, e só os mencionarei quando houver sobrinhos envolvidos. A ordem de aparição dos nomes é cientificamente aleatória, depende da minha memória. Ou seja, uma metodologia como outra qualquer — a diferença é que é meu nome que está nesta coluna e eu escolho qual uso — assim, bem no estilo democracia stalinista. Brincadeirinha, é claro. É que não sabia como escolher uma ordem, pois ando meio revoltada com o tempo em geral. Deve ser porque falta pouco para meu aniversário e não quero pensar muito nisso…
Como são muitos nomes e achei várias fotos muito legais, vou separar a coluna em partes e hoje falarei apenas dos brasileiros e de um “infiltrado”, o Max Verstappen, que namora uma brasileira, Kelly Piquet, filha do tricampeão mundial de F-1, Nelson Piquet. Como eu disse, é um critério como outro qualquer…
Emerson, Wilson e Christian Fittipaldi
Logo de cara, lembrei dos Fittipaldi. Aliás, como não pensar nesse clã, fundamental para o automobilismo de competição brasileiro? E, claro, Emerson é o mais conhecido: bicampeão de F-1 em 1972 e 1974 foi também o primeiro brasileiro a ostentar o título mundial da categoria. Também foi campeão da Champ Car (nome da categoria depois da cisão entre a Cart e a IRL, em 1997). Em 1989, venceu a icônica 500 Milhas de Indianápolis, repetindo o feito em 1993. Também disputou campeonatos de Fórmula Vê, onde alcançou algumas vitórias, Fórmula 3 (campeão em 1969, aos 22 anos), Fórmula Ford, kart…
O irmão de Emerson, Wilsinho, correu na Fórmula 3, na Fórmula 1 (onde disputou 38 grandes prêmios e marcou 3 pontos, mas não conseguiu vitórias). Juntos, os irmãos criaram a equipe Copersucar e construíram um carro de competição que chegou a disputar 122 grandes prêmios, mas que somou apenas 44 pontos e não alcançou nenhuma vitória.
Christian, filho de Wilsinho e sobrinho de Emerson, foi campeão de kart, vice-campeão da Fórmula Ford, venceu a Fórmula 3 sul-americana, a Fórmula 3000 internacional (mais ou menos equivalente à atual Fórmula 2) e participou de 43 provas da F-1. Disputou também corridas da Nascar, de protótipos (como a 12 Horas de Sebring e a 24 Horas de Daytona) e a 500 Milhas de Indianápolis e a Stock Car brasileira.
Nelson, Nelsinho, Geraldo, Laszlo e Pedro Piquet
A família Piquet é outra que logo vem à lembrança de todos os aficionados por automobilismo. Nelson Piquet é tricampeão mundial de F-1 (primeira digressão: abomino o termo “ex-campeão” de qualquer coisa, exceto se a pessoa perdeu o título por algum motivo, a posteriori. Se não, é campeão, bicampeão, tricampeão ou qualquer coisa. O fato de não ser o campeão reinante não significa que a pessoa não tenha um título, ou dois ou sete. Alain Prost é tetracampeão mundial de F-1, mesmo que esteja aposentado há anos).
Voltando ao assunto: Piquet ganhou os campeonatos de F-1 de 1981, 1983 e 1987. Ele havia começado no kart aos 14 anos e fora campeão brasileiro em 1971 e 1974. Em 1976 foi campeão de Fórmula Super Vê. Piquet disputou 208 grandes prêmios de Fórmula 1, por seis equipes diferentes e conquistou seus três títulos com duas equipes diferentes, dois pela Brabham e um pela Williams. Assim como digo claramente que sou torcedora do Boca Juniors e do Corinthians, não escondo nadinha que sou fã do Nelson Piquet. Aliás, nem se quisesse disfarçar eu conseguiria. Acho a trajetória profissional dele simplesmente fantástica e adoro esse estilo gozador que ele sempre teve. Pronto, final do “momento tiete”. Por enquanto.
Um dos filhos de Nelson, Nelsinho, correu na F-1 de 2008 a 2009 sem conseguir vitórias, mas marcando 19 pontos. Na Fórmula E foi campeão mundial em 2014-2015, havia sido campeão mundial da F-3 britânica em 2004, campeão da Fórmula 3 sul-americana, mas também havia disputado campeonatos de Nascar, GP2 (onde teve algumas vitórias) e Stock Car.
O filho mais velho de Nelson, Geraldo, correu de kart e na Espron. A partir de 2003 começou a disputar a Fórmula Truck, onde teve alguns bons resultados e foi vice-campeão em 2008 e 2011. Outro filho de Piquet (sim, são muitos, exatamente sete), Laszlo, disputou provas de kart (algumas junto com seu irmão Nelsinho), provas de supermoto, incluindo o campeonato paulista, o brasileiro e o europeu.
O caçula Pedro também disputou no kart, na Fórmula 3 Brasil (onde ganhou os campeonatos de 2014 e 2015), Fórmula 3 europeia, GP3 Series, e Fórmula 2 e Fórmula 3 europeias. Vi o Pedro correndo em Interlagos numa etapa da Porsche Cup anos atrás e ele deu um show, apesar da pouquíssima idade.
Chico e Daniel Serra
Ainda dentro dos quadros brasileiros, temos os casos de Chico Serra, que foi campeão da Fórmula 3 britânica em 1979, correu na Fórmula 1 — embora sem resultados expressivos em seus 33 grandes prêmios — assim como na disputa na Cart (então Fórmula Indy) e alcançou consagração na Stock Car Brasil, categoria na qual é tricampeão (1999, 2000 e 2001). Seu filho Daniel também é tricampeão da Stock Car Brasil (2017, 2018 e 2019), foi vice-campeão da Fórmula Renault brasileira em 2004, vice-campeão em 2011 no campeonato Brasileiro de Marcas e Pilotos e obteve duas vitórias na 24 Horas de Le Mans.
Rubens, Dudu e Fernando Barrichello
Claro que não poderia deixar de fora o Rubens Barrichello. Ele tem um currículo impressionante no automobilismo. Resumidamente, foi campeão sul-americano de kart (em 2015), cinco vezes campeão brasileiro de kart, cinco vezes campeão paulista de kart, campeão da Stock Car Brasil (2014), campeão da Fórmula Opel (1990), campeão da Fórmula 3 britânica (1991) além de outros títulos importantes, ainda que locais, como oito vezes vencedor das 500 Milhas da Granja Viana. Se na F-1 ele não conquistou um campeonato, disputou 326 grandes prêmios, acumulou 658 pontos e teve 11 vitórias, além de dois vice-campeonatos.
Seus dois filhos seguem carreira no automobilismo. Eduardo (Dudu), começou no kart, foi para a Fórmula 4 nos Estados Unidos e foi vice-campeão de F2000 dos Estados Unidos. Fernando corre de kart e está na nova Fórmula 4 Brasil este ano, que começa agora em maio. Vamos ver como andam, pois o pai já demonstrou enormes qualidades em todas as categorias que disputou.
Jos e Max Verstappen
O holandês Jos Verstappen começou no kart aos 8 anos e logo ganhou o campeonato holandês júnior da categoria. De lá foi para a Fórmula Opel Lotus e depois de vencer o campeonato de Fórmula 3 alemã em 1993, chegou à Fórmula 1 em 1994. Na categoria, ele disputou 107 grandes prêmios por 7 equipes diferentes e conseguiu 17 pontos e dois pódios. Casou-se com uma elogiadíssima kartista belga, Sophie-Marie Kumpen, com teve o filho Max.
Max Verstappen, que corre com a bandeira holandesa, conseguiu várias vitórias e títulos nacionais no kart belga e holandês. Em 2007, aos 10 anos, ganhou o Rotax Mini Maxklasse, ainda no kart, no qual venceu todas as 18 corridas disputadas. No ano seguinte, ganhou 16 das 18 corridas. No campeonato do Benelux no Rotax Mini Maxklasse chegou em primeiro lugar em 11 das 12 provas disputadas em apenas três finais de semana. No mesmo ano venceu 11 das 12 corridas da classe Cadete do campeonato belga de kart. Impressionante.
Em 2014, Max foi competir pela Fórmula 3 europeia. Ganhou 10 corridas no seu ano de estreia, mas como havia marcado relativamente poucos pontos em outras provas, acabou o campeonato em terceiro lugar. Em 2015, naturalmente, foi para a F-1. Até agora, ele tem um título mundial (2021), 144 corridas, 21 vitórias e 62 pódios. Claro que o sistema de pontos mudou ao longo dos anos e temos hoje muitas mais corridas do que há uma ou duas décadas, mas Max acumula incríveis 1.582,5 pontos na carreira.
Não acredito que talento, per se, seja hereditário. Todos estes pilotos podem ter recebido bons conselhos em casa e talvez o nome de seus pais tenha ajudado a abrir portas, mas ninguém fica em nenhum esporte competitivo se não tiver méritos próprios ou muito dinheiro para pagar um assento dentro de um cockpit. Indicações podem abrir portas, mas elas podem ser fechadas com a mesma facilidade. O mesmo serve para qualquer profissão, mas, convenhamos, em poucas áreas nós, autoentusiastas, nos empolgamos tanto para acompanhar trajetórias pessoais.
Mudando de assunto: para alguém com insônia braba como eu, corrida de F-1 na madrugada é uma maravilha. A da Austrália me deixou sem dormir até lá pelas 6 horas da manhã. Adorei as ultrapassagens do Sergio Pérez, sempre lindas plasticamente e que mostram uma incrível habilidade. Esperava alguma manobra assim do também ótimo em ganhar posições Daniel Ricciardo, mas não aconteceu. De resto, lamentei o abandono do Red Bull de Verstappen e de Sainz com seu Ferrari, mas fiquei muito feliz com a vitória de Leclerc a bordo de um lindo Ferrari. E, claro, Russell confirma que tem muito potencial. Só me incomodam profundamente as interrupções na transmissão de televisão, com anúncios de patrocinadores que dividem a tela com a prova ao vivo — incluindo áudio — e os malditos pop-ups durante toda a prova. Um horror e uma falta de respeito com o telespectador.
NG