Após a vitória em1959, a Aston Martin também se retirou oficialmente das competições. Com isso, a Ferrari ficou praticamente sozinha e reinou em Le Mans nos seis anos seguintes, já que não tinha concorrentes na principal categoria reservada para carros com motores de 3 litros ou mais.
Na edição de 1960 a Scuderia inscreveu quatro modelos 250 Testarossa V-12 de 3-litros. A vitória foi dos belgas Olivier Gendebien e Paul Frère. Em 1961 outra -tória da Ferrari com o 250 TRI V-12 de 3 litros, novamente com o belga Olivier Gendebien, mas desta vez em dupla com o americano Phil Hill. Gendebien e Hill voltariam a vencer em 1962, mas com o Ferrari 330 TRI/LM, que teve a cilindrada do motor V-12 aumentada para 4-litros.
Em 1963, a Ferrari mais uma vez voltou a vencer desta vez com a dupla italiana Lorenzo Bandini e Ludovico Scarfiotti, pilotando o novo modelo 250P, como motor V-12 de 3 litros. Esta edição, entretanto, foi marcada tragicamente pelo acidente fatal que vitimou o brasileiro Christian Heins, pilotando um Alpine M63 com motor Renault-Gordini de 4 cilindros em linha de 1 litro., inscrito pela equipe oficial da Alpine.
Filho de imigrantes, pai alemão e mãe italiana, Bino como era chamado pela família e amigos, nasceu em São Paulo em 1935 e já aos 18 anos estava envolvido com o automobilismo. Pouco tempo depois foi à Europa participar de competições com Porsche e chegou a correr na edição da 24 Horas de Le Mans de 1959, em dupla com o holandês Carel Godin de Beaufort, com Porsche 718 RSK, mas o carro quebrou na metade da prova.
Convidado pela Alpine para participar de Le Mans em 1963, Bino logo se destacou nos treinos e, na corrida, além de estar liderando na sua classe, também tinha o melhor Índice de Performance entre todos os carros. Porém, ao chegar ao topo da colina no final da grande reta, um ponto cego antes de freada para a curva Mulsanne, Bino foi surpreendido com um piloto deitado na pista. Ao tentar desviar, seu carro escapou e foi bater em uma árvore, se incendiou. Heins teve morte instantânea. Ele dividiria a pilotagem com jornalista automobilístico francês José Rosinski, convidado pela Alpine.
O sucesso da Ferrari em Le Mans, no começo dos anos 1960, rendeu muita promoção gratuita para a marca, que ainda era pequeno fabricante. Na mesma ocasião, Henry Ford II presidia a empresa fundada por seu avô, o empreendedor responsável pela popularização do automóvel, e planejava uma estratégia ousada para conquistar o público jovem. Para isso, a ideia era investir em modelos com apelo jovial e esportivo.
Uma coisa intrigava Ford II: como uma “fabriqueta” instalada em bucólica região agrícola da Itália e que construía em um ano menos carros do que a Ford fabricava em um dia, conseguia tanto ou, algumas vezes, até mais espaço editorial na imprensa especializada, sem gastar 1 dólar, enquanto a Ford investia milhares de dólares em propaganda nas mesmas publicações. Ford II pagou, ou melhor: tentou pagar para ver.
O americano fez proposta para comprar a Ferrari. Bom negociante, o italiano aceitou conversar, mas com uma exigência: ele vendia a fábrica, mas continuaria mandando no departamento de competições e com carta branca para gastar o que fosse necessário. Na reunião com os advogados para a leitura final do contrato, Enzo Ferrari ficou indignado com uma insinuação: “O senhor quer vender sua fábrica, mas continuar mandando?”
Ferrari se levantou, chamou seu advogado para ir almoçar, e mandou seu secretário particular expulsar os “yankees” da fábrica em Maranello. A guerra estava declarada. Irado, Ford II prometeu “esmagar” Ferrari, e não poupou recursos para isso. Bem provavelmente, mais até do que se tivesse comprado a Ferrari e deixado o Commendatore continuar gastando o que quisesse com a Scuderia do Cavallino Rampante.
No projeto do carro para derrotar a Ferrari, a Ford recorreu a empresa inglesa Lola Cars, de Eric Broadley, que havia desenvolvido um protótipo chamado de Lola GT Mark VI, com motor Ford V-8, 4,2-litros do Fairlane, que correu em Le Mans em 1963. Para ganhar tempo, a Ford resolveu apostar na Lola para desenvolver o projeto do GT 40, número referente à altura do carro que era de apenas 40 polegadas (1.016 mm).
Ainda com o motor V-8 de 4,-litros três carros foram inscritos pela própria Ford Motor Company na edição de Le Mans 1964. Mas os três acabaram ficando pelo caminho e Ford II teve que assistir mais uma vitória da Ferrari, com o 275P, motor V-12 de 3,3litros, pelas mãos do italiano Nino Vacarella e o francês Jean Guichet. Porém, o domínio da Ferrari na categoria GT foi quebrado pelo Shelby Cobra Daytona com motor Ford V-8 de 4,7-litros pilotado pelos americanos Dan Gurney e Bob Bondurant.
Este resultado fez Ford II transferir para Carroll Shelby e sua empresa Shelby-American Inc. a responsabilidade de defender oficialmente a marca nas competições e acelerar o desenvolvimento do Ford GT 40. E o texano, que venceu Le Mans em 1959 com Aston Martin, partiu para a ignorância optando por um big-block de 7-litros, que Ford fornecia para as equipes da Nascar. Na ocasião, o motor do Ferrari 330 P2 era de 4 litros.
Mesmo assim, na primeira tentativa com a nova configuração foi um fiasco. Na edição de Le Mans de 1965, os seis GT 40 inscritos ficaram pelo caminho nas primeiras quatro horas de corrida. Os dois inscritos por Shelby, com motor de 7 litros, tiveram problemas de freio, que sofriam com o peso do carro e com a velocidade que chegava próximo aos 350 km/h no fim da grande reta de Le Mans.
Mas os carros da Scuderia Ferrari também abandonaram antes do final da prova. A vitória, entretanto, ainda foi da Ferrari, com o modelo 250 LM, motor V-12 de 3,3 litros, pilotado pelo americano Masten Gregory e pelo austríaco Jochen Rindt. O carro inscrito pelo North American Racing Team, marcou a última vitória da Ferrari em Le Mans e, coincidentemente, assim como na primeira, o ítalo-americano Luigi Chinetti estava envolvido. Na primeira como piloto e na última como dono do carro vencedor.
RM