De tempos em tempos, volto aqui a falar de dois assuntos que muito me agradam, especialmente quando andam juntos: carros e propaganda. Hoje, volto ao assunto de um outro ponto de vista: pilotos de Fórmula 1 que associaram seus nomes e suas imagens a veículos.
A ordem a seguir é totalmente aleatória depois do primeiro caso. Esse eu coloquei em primeiro lugar porque sempre fui fã do James Hunt e continuo achando-o o piloto mais lindo da Fórmula 1. Pronto. Me julguem. A partir daí a ordem depende mais de como me lembrava e por isso fui pesquisando. Ah, só para esclarecer, não tenho nada contra piloto de F-1 fazer propaganda de carro popular. Entendo que é uma atitude normal, de quem tem contas para pagar, e que em nada desmerece ninguém. Também vejo essas propagandas como aquelas de apartamentos de 20 metros quadrados feitos por estrelas da televisão que ganham por ano o dobro ou o triplo do que podem custar esses imóveis. Não são para que ninguém ache que esses atores moram num imóvel assim. Ou como os aviões de brinquedo que todos sabemos que não voam, apesar de a propaganda mostrá-los no ar.
1) James Hunt e o Chevette (foto de abertura)
Este caso é um dos mais bizarros, pois nem na sua época o Chevette pode ter sido considerado “possante”. Imagino o que deve ter sido para um piloto que andava a 300 km/h ter que andar num simples carro popular de motor 1,3. Pois é, mas foi isso o que aconteceu com James Hunt, campeão de F-1 de 1976 e o piloto mais lindo da F-1 (será que eu já mencionei isso? rsrsrs). E aqui divido a história em dois: Hunt fez propaganda do Chevette produzido no Reino Unido a partir de 1975. O modelo tinha três portas e motor 1,3. Era fabricado pela Vauxhall, então uma afiliada da General Motors. O anúncio incluía uma frase do piloto inglês: “Espero que você goste do seu Vauxhall assim como eu gosto do meu”. Na segunda parte, conto uma história ainda mais fora-de-série. Em 1977, quando veio ao Brasil para disputar o Grande Prêmio de F-1 em Interlagos, Hunt recebeu da General Motors um Chevette GP 2 para se deslocar pela cidade. O modelo era vendido como uma edição esportiva do Chevette, mas foi vítima da sinceridade do piloto: “Quem compra o carro tem um modelo econômico, mas com aparência esportiva. Para quem não conhece este aspecto, fica a impressão de fantasia. Mais ou menos como uma mulher linda, mas também muito fria”, disse, à época, o Don Juan britânico. Dizem que ele chegou a ir ao Guarujá (SP) com o Chevette. Imagino ele subindo a Anchieta ou o caminho pela Serra do Mar nesse carro…
2) Ayrton Senna e Corcel II e Escort
Quando Ayrton Senna era um promissor piloto de F-1, mas ainda sem um campeonato para chamar de seu, já fazia propaganda de veículos da Ford. Em 1983 foi fotografado pela Ford ao lado de um Corcel II que havia passado por uma atualização no motor 1,6. O destaque era para o combustível usado: álcool, que proporcionava uma potência de até 76 cv. No ano seguinte, em nova campanha da fabricante americana, fez um comercial do Escort XR3 — um carro esportivo com motor 1,6 que produzia 83 cv e ia de 0 a 100 km em 14 segundos. A propaganda era bem-feita e misturava cenas do carro com outras de Fórmula 1, com locução do próprio Ayrton. “Quando toco nele, sito conforto e luxo. Quando ouço o motor, sinto o desempenho, a raça. Esse carro já nasceu esportivo”. O próprio Senna era dono de um XR3.
3) Emerson Fittipaldi e o Fiat 127
Continuando com os exemplos de pilotos inalcançáveis e suas propagandas de carros acessíveis, não podia deixar de mencionar o bicampeão brasileiro. Emerson foi garoto-propaganda do Fiat 127, um subcompacto que virou um sucesso depois de seu lançamento, em 1971 quando se tornou um sucesso na Europa. O slogan da época, usado globalmente, era “Um carro à frente do seu tempo”. O modelo que chegou ao Brasil em 1976, o 147, era o 127 europeu com algumas alterações. Na propaganda brasileira, Emerson dizia: “Já testei muitos veículos ao longo de minha vida e acredito que não há nada como o 127”. O modelo, é bom que se diga, tinha 47 cv de potência, considerado “muito potente” naquela época.
4) Jim Clark e o Lotus Elan
O grande piloto escocês, bicampeão mundial em 1963 e 1965, fez propaganda de um carro Lotus, Elan que era dele mesmo. “Eu dirijo meu Lotus Elan por prazer e não porque tenho de fazê-lo”, dizia a propaganda feita por Clark, vestindo o tradicional kilt escocês. O modelo do anúncio está preservado até hoje. É um coupé de duas portas, motor 1,6 que entregava 105 cv, tração traseira e que foi um sucesso na década de 1960.
5) Mario Andretti e o Fiat 128
Depois da propaganda com Emerson Fittipaldi, a Fiat botou suas fichas em outro piloto campeão da F-1: o americano Mario Andretti, que foi campeão em 1978 –¡ o segundo americano,, precedido por Phil Hill em 1961. Andretti foi fotografado ao lado de um Fiat 128 SL, com o qual deu algumas voltas do circuito de Pocono, uma tradicional pista da Nascar. Ele disse: “Dirigir Ferraris que custam US$ 26.000 talvez tenha me tornado um pouco esnobe. Então, tenho que admitir que fiquei um pouco surpreso quando a Fiat me perguntou se eu testaria um carro que custa US$ 2.700”. Sim, a inflação corroeu muito o poder de compra e hoje não há Ferraris por US$ 26.000 nem usado “Eu passei o dia dirigindo e posso garantir: o Fiat 128 Sport Coupé não é um Ferrari, mas é um dos mais confortáveis que já dirigir”. Provavelmente porque o 128 Sport Coupé tinha cerca de 800 kg, motor 1.3 que entregava 64 cv. Mas Andretti não podia ser néscio e acrescentou que “o modelo precisaria algumas centenas de cavalos a mais para assustar os donos de um Ferrari”. Ou seja, uma avaliação muito honesta, na minha opinião.
6) Jackie Stewart e Ford Thunderbird
O escocês tricampeão de Fórmula 1 (1969, 1971 e 1973) fez propaganda de um modelo da Ford, o Thunderbird Turbo conversível de duas portas, lançado em 1983 (o primeiro foi apresentado ao público em 1954). Stewart destaca que “quando estou num carro bem desenvolvido, sinto que estou no controle. Tenho comigo um bom suporte no banco, consigo alcançar tudo, ver tudo, operar tudo de fora eficiente”. O escocês destacava o visual do carro e os detalhes de design que, segundo ele, são tão importantes para um profissional quanto o desempenho do veículo. De fato, no quesito técnico, o motor de 2,3 litros entregava 145 cv e tinha sua imagem vinculada a luxo aliado a um bom desempenho. O modelo saiu de linha em 1990, embora tenham tentado, sem sucesso, relançá-lo em 2000.
7) Jack Brabham e o Holden Torana
O também tricampeão mundial de Fórmula 1 (1959, 1960 e 1966) Jack Brabham fez propaganda de um carro de uma fábrica do seu país, a Holden. O carro australiano era o Torana, um carro esportivo lançado em 1967 derivado do Vauxhall Viva HB (tanto a Holden quanto a Vauxhall pertenciam à General Motors). O modelo tinha motor de 1,2 litro de quatro cilindros que entregava 56 cv. Havia também uma versão esportiva com dois carburadores e freios a disco dianteiros, que recebeu também algumas modificações no motor, que passou a entregar 79 cv e foi batizado como Brabham Torana. O australiano disse à época, que o Holden Torana tinha o melhor câmbio que ele havia viso num carro de passeio. “Tudo no Torana – o seu visual, o seu desempenho, a maneira como ele se comporta nas curvas, sem quase escapar – tudo isso o torna um dos carros mais incríveis que já dirigi”, disse Brabham.
8) Fernando Alonso e o Fiat 500
Em 2011, quando o espanhol bicampeão do mundo (2005 e 2006) Fernando Alonso era piloto da Ferrari, fez uma campanha global do Fiat 500 Twin Air, um carro com motor de dois cilindros e motor 0,9 litro. A ideia foi genial já que parecia pouco provável que um piloto acostumado a dirigir Ferraris ficasse satisfeito com o desempenho de um veículo com apenas 85 cv de potência: no anúncio, Alonso aparece no divã de um analista e fala sobre suas atividades dirigindo o subcompacto enquanto se vêm imagens dele dentro do carro.
Mudando de assunto: Tenho gostado muito desta jovem geração de pilotos de Fórmula 1: Verstappen, Norris, Albon, Gasly e um pouco menos, Russell. Não se trata apenas de qualidades na pista – outros também têm – mas especialmente da forma como encaram um esporte incrível, mas incrivelmente perigoso. Eles viajam juntos, vão a shows juntos, praticam remo juntos, dirigem simuladores juntos e se divertem juntos. Fazia tempo que a F-1 andava muito competitiva, mas de cara amarrada, pilotos mal-humorados… Sei que provavelmente não voltaremos aos tempos da década de 1970, por exemplo, quando as famílias dos pilotos eram amigas entre si, um piloto apadrinhava o filho de outro, mas este ano está lindo de ver como garotos podem ser garotos fora das pistas.
NG
(Correção do texto, em 13/9/23 às 20h45: o primeiro americano a conquistar o título mundial de pilotos de F-1 foi Phil Hill em 1961 e não Mario Andretti em 1978)
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