Em primeiríssimo lugar, não é verdade que o elétrico ajuda na “descarbonização” do planeta, como se insinua. Dá essa impressão ao rodar bonitinho e quietinho no trânsito urbano. Mas o CO2 emitido para produzir as baterias e o próprio carro é enorme. E o pior: ao recarregar, quase todos os países do Primeiro Mundo geram energia elétrica a partir de carvão, diesel ou gás.
Mas, vamos supor que o caro leitor não esteja preocupado (mas não confessa…) com o meio ambiente, mas em aderir à novidade tecnológica e reduzir as despesas de abastecimento. E, se tiver células fotovoltaicas no telhado da casa, carro elétrico é sopa no mel…
Custo: ainda é caro. Para tumultuar o mercado, os compactos elétricos já tiveram seus preços reduzidos para perto de R$ 100.000. Mas suves e médios começam na faixa de R$ 250 mil. Sua manutenção normal custa um pouco menos que a do carro a combustão, mas nem pense num acidente que danifique a bateria…
Primeiro e único? – Complicado, ter apenas o elétrico em casa. Ele deve ser o segundo ou terceiro na garage, pois no caso de uma viagem, o mais provável é passar um perrengue na estrada. Mesmo com o mapa dos eletropostos na mão, são grandes as chances de um aborrecimento. No primeiro posto com tomada, pode ter uma fila esperando. E cada um fica pelo menos uns 30 minutos. Mas seu eletromapa registra mais alguns quilômetros à frente. Chega lá, bingo! Ninguém na fila. Porque a tomada está quebrada…
Tecnologia – Elon Musk não foi o único a implantar uma fábrica dedicada aos elétricos. São dezenas na China e pipocam várias pelo mundo nos últimos meses. Até no Brasil já apareceram dois empresários (um brasileiro, outro argentino) carregados de boas intenções para fabricá-los. Mas descarregados de capital e tecnologia. A rigor, o software para fazer um carro rodar com bateria não é tão complicado. Motor elétrico chega a ser de uma simplicidade franciscana. Mas as marcas tradicionais que produzem automóveis a combustão levaram dezenas de anos para atingir um nível mínimo de confiabilidade. Algumas centenárias ainda penam com dificuldades em desenvolver seus produtos. Nem a Tesla, com todo o potencial financeiro de seu dono, escapou de dezenas de problemas mecânicos que já levaram milhares de seus usuários a voltarem para o carro térmico.
Valor de revenda – Automóvel não é investimento financeiro e perde valor no momento em que deixa o showroom. Em geral, recebeu a placa do Detran, já perdeu 20%. Com algumas variações, é lógico. Mas esta regrinha não se aplica ao elétrico, pois depois de rodar cinco a seis anos, ele perde de 30 a 40% do valor inicial. Ou mais, dependendo do custo da bateria que pode custar o mesmo que o carro. Nos principais mercados de usados do Primeiro Mundo, elétricos se acumulam nos pátios por falta de interessados.
Recarga – Quem mora em prédios mais antigos, ou nem tem garagem, ou é quase impossível instalar carregadores. Há casos em que a empresa de energia elétrica exige um transformador defronte ao prédio, com custos elevados e dificilmente rateáveis entre os apartamentos: tem sempre um ou dois chatos que se recusam a entrar na rachuncha. “Eu nem tenho carro, quanto mais um elétrico!..
Alcance – A quilometragem que roda o elétrico é seu maior problema desde que foi inventado no século 19, antes mesmo do motor a combustão. Nenhum problema no trânsito urbano, mas na rodovia o bicho pega. O valor declarado pelo fabricante é conto da carochinha. Pois se reduz com o ar-condicionado, pé no fundo, topografia irregular e com a queda normal de capacidade da bateria. Sem se esquecer de que em regiões de temperaturas muito elevadas ou baixas, pode dividir o alcance pela metade. Lembrando que alcance de automóvel com motor a combustão é mera informação, enquanto com motor elétrico é fonte de (constante) preocupação, a ponto de em percursos extra-urbanos requerer planejamento.
Preço da energia elétrica – se o cidadão verificar sua conta de luz e dividir reais por kW·h, terá o preço unitário da energia, hoje aproximadamente R$ 1,00 por kW·h. Mas R$ 2,00/kW·h já tem sido visto nos carregadores em shoppings e já há notícias de R$ 2,50/kW·h em carregadores de alta potência. Isso em tempos sem as famigeradas “bandeiras coloridas” porque os níveis das represas estão críticos e a geração de energia passa de hidrelétrica à mais cara termelétrica pelo uso de gás natural para transformar água em vapor que aciona as turbinas dos geradores. Então “encher um tanque” de 80 kW·h, em vez de custar R$ 80,00 — uma “moleza” —· passa a R$ 200,00. Com as “bandeiras” custará ainda mais. .
Assistência técnica – Para começo de conversa, a rede de concessionárias das novas marcas ainda é reduzida. Nas tradicionais, nem todas estão habilitadas à novidade. A garantia da bateria é, em geral, de oito anos. Mas o carro elétrico tem suspensão, direção, freios, transmissão e dois sistemas de arrefecimento (para motor e bateria) que podem se quebrar. E aí, a BYD por exemplo, não garante seus componentes por mais que 12 meses…
Moral da história: Claro que existem argumentos positivos, mas muitos que complicam a chegada do elétrico. Como sempre acontece em qualquer transição no mundo. Entretanto, o Brasil tem o dever de estimular o álcool etílico (etanol) como grande alternativa ao combustível de origem fóssil. Ele pode não ser tão eficiente, porém emite menos que o elétrico, em diversas situações. Mas isto é outra história….
BF
A coluna “Opinião de Boris Feldman” é de exclusiva responsabilidade do seu autor
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