Os pais o surpreenderam sentado em sua cadeirinha, com a tampa de uma panela nas mãos, girando-a como se fosse o volante de um carro e fazendo “brum, brum” e, com certeza também fazendo “bibi, fonfon”. Ele tinha cerca de quatro anos e sabe que fizeram uma foto, que nunca viu, do seu “primeiro carro”. (Só revelo sua identidade lá no final da Coluna).
Apesar dessa primeira “experiência” automobilística, ele nunca recebeu de seu pai, muito menos de sua mãe, qualquer incentivo que o levassem a uma carreira sempre ligada ao automóvel. Então, somente aos 14 anos foi fazer Mecânica no Senai e, nas férias corria para a oficina Afinauto, que já não existe mais.
Quando adolescente, seu tio (irmão de sua mãe), o jornalista Douglas Mendonça ia visitar a família dirigindo carros esportivos de testes que deixavam louco de “inveja” o motorista da tampa de panela.
Então, para dirigir os mesmos carros resolveu fazer Jornalismo (na Cásper Líbero) para, como o tio, dirigir carros. E, aos 17 anos, ainda sem CNH foi trabalhar na revista Oficina Mecânica, onde era auxiliar de Bob Sharp, Cláudio Carsughi e Josias Silveira (este último, já nos deixou).Era ele quem instrumentava os veículos para os testes, além de buscá-los nas fábricas.
Quando aos 18 anos, para fazer o exame para sua CNH, foi de carro, parando perto do lugar das provas. Não percebeu que um policial acompanhara sua chegada. E, depois de passar no teste da baliza, dirigiu-se ao carro quando foi interpelado pelo policial que lhe perguntou se havia sido aprovado.
Diante do “sim”, disse a ele: “então não posso mandar guinchar se carro. Mas saia logo daqui.”
Aqui é preciso abrir um parêntese para falar da emoção que ele sentia trabalhando ao lado daqueles que eram seus ídolos, todos amigos do seu tio Douglas, e já veteranos na cobertura do setor automobilístico, conhecedores de mecânica e também pilotos de corrida.
A grande revista
Com a abertura das importações, surgiram muitas publicações abordando o setor automobilístico. E, aos 20 anos foi convidado pelo jornalista Luiz Bartolomais Jr, para trabalhar na revista Quatro Rodas, da então poderosa Editora Abril.
Foi naquela época que teve sua primeira experiência nas pistas, seu sonho desde aquela tampa de panela. Pilotando um Voyage, da Caraigá Veículos, chegou entre os 10 primeiros da categoria (Turismo até 2.000 cm³) numa edição da Mil Milhas, em Interlagos. Seus parceiros no volante foram os jornalistas Eduardo Pincigher e seu tio Douglas Mendonça.
Terminada a corrida, ouviu de muitos o conselho de seguir na carreira de piloto. Ele comenta que sua vantagem era conhecer a mecânica do carro, saber tudo sobre suspensão, motor, câmbio (graças ao curso no Senai), tinha “bundômetro” (gíria usada nas pistas para quem tem grande conhecimento sobre o carro que pilota) como Nélson Piquet, por exemplo. Também correu de Gol, chegando entre os três primeiros e algumas provas.
Josias Silveira o levou de volta para a Oficina Mecânica, de onde logo sai para entrar na Auto & Técnica, editada pelo tio (ele de novo) e Cláudio Carsughi. Ele aíi já tinha 23 anos, em 1995 (segundo ele, eu, chicolelis, estive no lançamento da publicação). A editora publicava também Moto & Técnica, Chevy e Auto & Clássicos.
A sociedade se desfaz e ele fica com a Moto & Técnica, mas logo o Bartolomais volta à sua vida convidando-o para editar a nova publicação, a Motor Show, da Editora Três. Durante algum tempo cuidava das duas revistas.
Voltando às pistas, de Marea
Ai, apareceu a oportunidade de correr com uma camioneta Fiat Marea Turbo, cujo motor subiu de 180 cv para 240 cv. Chegou em 4º na Mil Milhas de Interlagos venceu a 500 Quilômetros de Brasília, mas ele não lembra das datas.
Quando a GM lançou a picape Montana, Pedro Luiz Dias, então diretor da área de Comunicação da fábrica, deu sinal verde e a fábrica disponibilizou três veículos para a equipe correr na Mil Milhas. Só não fizeram o pódio (1º, 2º e 3º) porque a bobina do carro que ele pilotava, quebrou.
Sua próxima incursão na área foi para o time de competição da Fiat, que foi tricampeão brasileiro de Resistência, Categoria Turismo, em 2006, 2007 e 2008 (antes, foi vice por três anos seguidos, 2003, 2004 e 2005). Ele conta que teve a honra de competir com seus ídolos e ganhar deles. Para correr na Stock Car, faltou dinheiro.
Uma fórmula só para ele
No final de 2008, foi convidado pelo então responsável da área de Imprensa da Fiat, Carlos Henrique “Caíque” Ferreira, hoje diretor de Comunicação da Renault, para criar a Fórmula Fiat, para iniciantes nas pistas. Ele foi o responsável pela área técnica, desenvolvendo câmbio e motor do carro, enquanto Adhemar Moro desenvolveu o chassi. Cuidou da categoria de 2010 até 2012. Neste mesmo ano, fez a apresentação da nova motorização da Fiat para a Imprensa e Cláudio, Rawicz o convidou para fazer parte da equipe de Comunicação da FTP (Fiat Powertrain Technologies).
Quando Caíque foi para a concorrência, indicou o pequeno motorista da tampa de panela para seu lugar, como assessor técnico da Fiat. Depois foi galgando postos, respondendo por outras marcas, com a chegada da Ram, Dodge, Jeep, Chrysler e a própria Fiat. Em janeiro de 2021 nasce a Stellantis e mais duas marcas surgem no grupo, Peugeot, Citroën e DS..
Hora de voltar à tampa de panela
Então as questões burocráticas se sobrepõem ao prazer de dirigir e ele lembra dos tempos em que voava pelas pistas ou circulava pelas ruas, avenidas e estradas, fazendo aquilo que ele Ricardo Dilser, sempre quis fazer: sentar na sua cadeirinha, pegar a tampa da panela e dirigir carros.
Ele deixou a Stellantis, onde fez amigos, assim como na Imprensa de todo o País, e foi ser repórter, produtor e apresentador do Auto Esporte (domingo na Globo, 9:30 da manhã). Lá ele faz aquilo que mais gosta de fazer: testar carros, sem burocracia.
CL
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