Circular motorizado por ruas e estradas sempre representa o risco de um acidente envolvendo outro veículo ou pedestre. Por isso, em vários países, é obrigatória a cobertura de um seguro contra terceiros, tanto os pessoais como até os materiais.
No Brasil, criou-se o seguro obrigatório para cobertura de danos pessoais em 1966. Chamava-se Recovat (Responsabilidade Civil Obrigatória de Veículos Automotores Terrestres). Em 1974 virou DPVAT e em 2007 passou a ser administrado pela Seguradora Líder, um consorcio que chegou a ter 80 companhias de seguros. E aí veio o inevitável olho gordo de políticos e banqueiros naqueles bilhões de reais. Uma imperdível oportunidade de encher cofres e bolsos através de fraudes, desvios e corrupções de todas as espécies e em todos os níveis.
Da Líder para a Caixa
O DPVAT era cobrado anualmente pelos Detrans junto ao IPVA, imposto estadual sobre a propriedade de veículos automotores, mas que na verdade era um segundo e disfarçado imposto para o veículo poder circular, já que sem pagar o DPVAT o veículo não poderia rodar. Muy espertos… Mas, tantas foram as maracutaias dos diretores da Líder que em 2020, a Susep (Superintendência dos Seguros Privados) retirou dela o DPVAT, transferindo seu saldo bancário (R$ 4,5 bilhões) e a responsabilidade de administrá-lo para a Caixa Econômica Federal.
O DPVAT não foi então cobrado durante três anos (2021 a 2023) pela Caixa, que recebeu fundos (mais que) suficientes para indenizar as vítimas dos acidentes de trânsito. A fonte acabou secando depois de três anos (15/11/2023) e as vítimas deixaram de ter direito à cobertura indenizatória desde então. O governo não se mexeu em tempo hábil e em 2024 o seguro obrigatório também não foi cobrado.
Em maio deste ano, uma Lei Complementar (207/24) foi aprovada pelo Congresso e ele voltaria a ser cobrado em janeiro de 2025, ainda pela Caixa Federal, chamado então de SPVAT. Uma inconstitucionalidade, diga-se de passagem, pois a Caixa não é uma seguradora, mas um banco. Ela tentou estabelecer parcerias com os Detrans de diversos estados para a cobrança do seguro, mas alguns deles se negaram e ela teria então, nestas unidades federativas, que cobrar diretamente dos donos dos veículos, pois trata-se de uma legislação federal e nenhum veículo poderia circular sem pagá-lo. No meio de todo este imbróglio, o Congresso decidiu, em 18/12/2024, eliminar o DPVAT/SPVAT.
Fim do DPVAT não é solução
E como ficam as milhares de vítimas de acidentes de trânsito, sem recursos para despesas médicas e hospitalares?
Os proprietários de veículos, ao contratar uma seguradora para a cobertura de acidentes, já estão cobertos quanto à Responsabilidade Civil. Que incluem danos materiais de terceiros. Tanto o reparo dos carros envolvidos como a indenização dos pedestres (e ocupantes do outro veículo) vitimados.
Entretanto, apenas cerca de 30% dos carros que circulam no Brasil são cobertos por seguros. Os outros 70%, ou não têm cobertura nenhuma, ou são protegidos por estas associações de proteção veicular que não indenizam acidentes pessoais.
Então, os proprietários de veículos devem prestar atenção ao contratar uma companhia de seguro, pois nem todas sugeriam todas as coberturas. E incluir, na apólice, danos materiais e pessoais (corporais) de terceiros. E o APP, seguro que protege os ocupantes do próprio veículo. Além disso, também em relação aos eventuais danos morais, outra indenização que pode ser requerida pelo envolvido num acidente. A rigor, se o veículo provoca um acidente e não tem cobertura de uma seguradora, seu proprietário pode ser processado judicialmente para indenizar os terceiros envolvidos. Por danos materiais, pessoais e morais.
O Congresso Nacional, ao eliminar o seguro obrigatório (DPVAT), pôs fim ao execrável monopólio exercido até 2020 pela Seguradora Lider. E à decisão inconstitucional da Susep de atribuir à Caixa Econômica Federal a responsabilidade de administrá-lo. Entretanto, simplesmente eliminar o DPVAT é deixar desprotegidas as milhares de vítimas de trânsito carentes de recursos.
Tem solução? Sim, Voltemos ao Recovat e à obrigatoriedade do seguro. Mas, quem decide quem seriam o corretor e a seguradora é o dono do veículo. Que só o teria licenciado apresentando ao Detran o comprovante da apólice. A seguradora responde pelas indenizações materiais e pessoais dos acidentes provocados por seus segurados. E as companhias homologadas para operar este seguro criariam um fundo para atender as vítimas de acidentes com automóveis não identificados.
BF
A coluna “Opinião de Boris Feldman” é de exclusiva responsabilidade do seu autor.
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