A visita à oficina, que costumeiramente encerra nossos “30 dias”, foi precedida de uma conversa ao telefone. Nela, eu e o “capo” da Suspentécnica, Alberto Trivellato, passamos em revista alguns pontos importantes como, por exemplo, rememorar nosso teste de 30 dias realizado há cerca de um ano como o FIT EXL, carro do qual deriva o WR-V.
Na teste de 2016 nosso colaborador se revelou um entusiasta do Fit, aliás, do modo de fazer carros da Honda. Resumidamente, um concentrado de tecnologia sem desperdício — inclusive da própria tecnologia! Para Alberto, a engenharia da Honda é sintética, não transborda e nem falta. E, bom conhecedor de Fit (e Civic, e Accord, HR-V, CR-V, Prelude e por aí vai…), sua vontade de assumir o volante da novidade WR-V era grande.
Como de costume, Alberto cumpriu nosso combinado, o de não ler os textos que são publicados antes da visita à oficina. O intuito é tornar seus comentários sejam livres de preconceitos e, para minha felicidade, bastaram algumas centenas de metros ao volante para que o profissional destacasse aquele que é, talvez, o aspecto mais surpreendente do novo Honda: a personalidade mercante.
Cara de Fit, jeito de Fit, motor de Fit e boa parte da suspensão de Fit e… uma dinâmica completamente exclusiva, individual. Como eu mesmo escrevi logo no comecinho desta avaliação, se fosse colocado vendado dentro do WR-V e me levassem para dar um giro, eu não adivinharia ser ele um derivado do menor dos Honda.
No trajeto que precede a investigação das entranhas, com o carro no elevador da oficina, mais de uma vez Alberto Trivellato mencionou este caráter exclusivo do novo Honda. E gostou. “É bem diferente do Fit!”, exclamou o colaborador fazendo questão de forçar o ritmo, buscando as ruas mais tranquilas em uma tarde paulistana onde congestionamentos, irregularidades, buracos, valetas e lombadas estão por todo lado.
Alberto exaltou a boa ergonomia, a facilidade com que encontrou um bom posicionamento ao volante. Elogiou também a resposta do sistema de direção mas quanto ao ajuste de suspensão fez reparos: ao passar despachado em uma lombada fez notar o que chamou de “uma oscilação à mais” do que seria preferível.
“Especialmente a traseira oscila demais, os amortecedores deveriam ter mais resistência à distensão. Na verdade, o conjunto mola-amortecedor mereceria uma revisão”, disse Trivellato, buscando mais lombadas para exemplificar sua afirmação. Já os pneus, para o colaborador, têm a medida certa para o espírito do pequeno suve porém, como já fizera no 30 dias do Citroën C3, observou que estes Pirelli P1, que tem como característica o baixo atrito de rolagem (o que ajuda na economia de combustível) não é exatamente o máximo em termos de aderência em piso seco.
Enquanto cutucava o WR-V em rápidos ziguezagues na larga rua deserta, o colaborador observou novamente a boa resposta e agilidade do Honda apesar de sua altura e da suspensão traseira que “poderia ser melhor, mas não é ruim. Com bagagem e lotação máxima, a coisa deve piorar…”, afirmou.
Elogio mereceram freios e a sensibilidade do pedal, mas nem tanto a resposta do acelerador que, assim como observado no texto anterior, faz com que o motor do WR-V responda com certa letargia se o motorista quiser/precisar de uma saída mais rápida. A impressão é que o ajuste do acelerador eletrônico é diferente do aplicado ao Fit, há uma incerteza inicial marcante nas saídas desde parado.
Alberto não é um fã de câmbios CVT mas entende bem a proposta do sistema, que se destina a priorizar suavidade. Seus usuários, em tese, não se incomodarão com a progressão peculiar. A rotação do motor elevada e estabilizada nas alturas, sem que a aceleração efetiva seja sentida, não atrai quem gosta de alguma esportividade.
De volta à oficina, capô aberto, Alberto critica o degradê na pintura do capô: “era melhor deixar no cinza primer, não?”. Sim, concordo. Mas de resto há admirável organização que costuma se ver em todos os Honda, um espécie de origami caprichado no qual não se há um cabeamento frouxo, uma tubulação mal passada ou desleixo de qualquer entidade. É Honda, não é? É!
Suspenso no elevador, o WR-V revela as entranhas. Chama a atenção o robusto peito de aço (que não é equipamento de série, mas acessório). Por trás dele, a capa plástica inferior esconde totalmente motor e câmbio e assim, destaque visual quem ganha são os braços de suspensão (“bandejas”), que Trivellato observa serem robustos e ao mesmo tempo essenciais. Lembrei do começo, onde está escrito “tecnologia que não transborda nem falta”.
É um Fit? Sim, só que não… Uma grossa barra estabilizadora somada a reforços estruturais cá e lá fazem o WR-V se diferenciar do irmão. Tais reforços, pequenas “orelhas” realizadas em tubos de aço e uma barra que “amarra” o assoalho logo após o tanque de combustível, que é central como no Fit, geram questionamentos. Alberto, seus colaboradores, eu e o PK, presente ao evento, chegamos à conclusão que tais reforços existem não por conta de real necessidade, ou seja, tornar o monobloco do WR-V mais rígido e/ou resistente. A razão talvez esteja na cara do modelo, que com suas suspensões mais altas e carinha de suve faça com que um ou outro proprietário ache que ele pode ser submetido a um indevido uso radical.
Colocar o WR-V em uma estrada de terra vá lá, mas exigir dele habilidades de fora-de-estrada só por conta de sua boa altura em relação ao solo e ângulo de ataque dianteiro e traseiro à prova de irregularidades? Calma, não é nada disso. Mas daí, talvez, a Honda ter resolvido dar a tal “amarrada” por baixo do WR-V pois… vai quê! Entenderam?
De diferente, mesmo, há o eixo de torção traseiro, visivelmente mas robusto que o do Fit e, dizem, ser o mesmo do HR-V. Lendo a ficha técnica do WR-V e comparando-a com a do irmãozinho salta a vista o fato de que a novidade tem a bitola traseira mais larga que a dianteira, enquanto no Fit é o exato oposto. Eis aí uma importante diferença.
A análise se encerra com um veredito sintético: simples, bem construído e com soluções de engenharia interessantes. Posicionar o tanque de combustível no centro do carro é uma, aproveitar isto para dotar os bancos traseiros do excelente sistema que permite bascular assentos para cima e para trás e com isso obter versatilidade incomparável, é outra. Cabeças pensantes também estão por trás da eficácia do câmbio CVT dotado de conversor de torque ou do valente motor i-VTEC de 1,5 litro.
Problemas? Sim, claro que há. Do mesmo modo que a eficientes nipônicos pensando em boa engenharia, há eficientes nipônicos cortando custos. Daí os faróis de parábola simples, daí não haver controles eletrônicos de estabilidade e de tração (que existem nos Fit vendidos na Europa e EUA), daí a essencialidade de equipamentos que vai da ausência de temporizador no limpador de para-brisa a uma central multimídia que deixa a desejar em alguns aspectos — a conexão entre o telefone celular e ela não foi jamais confiável.
Porém, o WR-V é um carro que, mesmo com pecadinhos, entra no rol do que eu considero altamente recomendável: gostoso de dirigir na cidade, competente na (pouca) estrada que percorri, espaçosíssimo, confortável, razoavelmente ágil e com consumo adequado. Some a isso a renomada qualidade do pós-venda e, voilá, temos um sucesso, concordam?
RA
Leia os relatórios anteriores: 1ª semana 2ª semana 3ª semana
HONDA WR-V EXL
Dias: 30
Quilometragem total: 1.076 km
Distância na cidade: 962 km (89,4%)
Distância na estrada: 114 km (10,6%)
Consumo médio: 7,0 km/l (81% gasolina – 19% álcool)
Melhor média: 14,1 km/l (gasolina)
Pior média: 6,2 km/l (gasolina)
Melhor média: 8,1 km/l (álcool)
Pior média: 4,9 km/l (álcool)
Litros Consumidos: 153,71
Custo: R$ 490,27
Custo do quilômetro rodado: R$ 0,45
FICHA TÉCNICA HONDA WR-V EXL | |
MOTOR | |
N° e disposição dos cilindros | Quatro, em linha, transversal, flex |
Cilindrada (cm³) | 1.497 |
Diâmetro e curso (mm) | 73 x 89,4 |
Potência (cv/rpm, G/A) | 115/116/6.000 |
Torque (m·kgf/rpm, G/A) | 15,2/15,3/4.800 |
Taxa de compressão | 11,4:1 |
Distribuição | 4 válvulas por cilindro, comando no cabeçote, corrente, variador i-VTEC de fase e levantamento conjugados, coletor de admissão variável |
Formação de mistura | Injeção no duto Honda PGM-FI |
TRANSMISSÃO | |
Tipo do câmbio | Automático CVT, tração dianteira |
Conexão motor-transeixo | Conversor de torque |
Relações de marchas (:1) | Frente 2,526 a 0,408, ré 2,706 a 1,382 |
Espectro (:1) | 6,191 |
Relação de diferencial (:1) | 4,992 |
SUSPENSÃO | |
Dianteira | Independente, McPherson, mola helicoidal, amortecedor pressurizado e barra estabilizadora |
Traseira | Eixo de torção, mola helicoidal e amortecedor pressurizado |
DIREÇÃO | |
Tipo | Pinhão e cremalheira, assistência elétrica indexada à velocidade |
Voltas entre batentes | 2,79 |
Diâmetro mínimo de curva (m) | 10,6 |
FREIOS | |
Dianteiros (Ø mm) | Disco ventilado/262 |
Traseiros (Ø mm) | Tambor/200 |
RODAS E PNEUS | |
Rodas | Alumínio, 6Jx16 |
Pneus | 195/60R16 |
Estepe | Temporário |
CONSTRUÇÃO | |
Tipo | Monobloco em aço, monovolume, 4 portas, 5 lugares |
DIMENSÕES | |
Comprimento (mm) | 4.000 |
Largura (mm) | 1.695 |
Altura (mm) | 1.599 |
Distâncias entre eixos (mm) | 2.555 |
Bitola dianteira/traseira (mm) | 1.482/1.490 |
Distância livre do solo (mm) | 207 |
PESOS E CAPACIDADES | |
Peso em ordem de marcha (kg) | 1.130 |
Capacidade do porta-malas (L) | 363 (906 c/banco rebatido, 1.045 c/banco traseiro rebatido, dianteiros todos à frente |
Tanque de combustível (L) | 45,3 |
CONSUMO (INMETRO/PBEV) | |
Cidade (km/l, G/A) | 11,7/8,1 |
Estrada (km/l, G/A) | 12,4/8,8 |
CÁLCULOS DE CÂMBIO | |
v/1000 em D (km/h) | 59,2 |
Rotação a 120 km/h D (rpm) | 2.000 |