Nas duas últimas semanas dois acidentes movimentaram o noticiário em São Paulo mas repercutiram em todo o país pela dimensão e pela comoção social que ambos provocaram. O primeiro foi o engavetamento de um caminhão-tanque e 35 carros na rodovia Carvalho Pinto, seguido de incêndio e morte de duas pessoas, além de mais de uma dúzia de feridos.
Como sempre, em casos de acidentes nunca há um único fator mas sim uma soma deles. E aí eu me lembro de algo que aprendi quando era pequena — sim, lá vem a Norinha com seus exemplos de infância… Desculpem, caros leitores, não consigo evitar.
Quando era pequena minha mãe trabalhou durante vários anos na multinacional DuPont. Uma das características da empresa naquela época, além da excelência de seus produtos, era a enorme preocupação com segurança. Em todos os sentidos: de seus funcionários, visitantes, todo mundo. Tinham cursos de prevenção de acidentes quando ninguém nem sonhava que isso poderia ser obrigatório um dia e quando nenhum sindicato se preocupava com esse assunto.
Bom, o fato é que um dos lemas era que “não existem acidentes”. Segundo eles, qualquer “acidente” era, na verdade, um incidente e, portanto, poderia ser prevenido. Se o pneu de um carro explodia podia ser porque ele estava gasto (logo, falta de manutenção e deveria ter sido checado e trocado a tempo, ou erro de produção). Se um carro capotava por ter caído num buraco era por falta de manutenção na estrada. Se alguém provocava um acidente por desviar de um animal de atravessava a pista era porque esse animal não deveria estar solto (se fosse doméstico) ou porque deveria haver contenção para animais selvagens. E por aí vai. Sempre tinham uma razão.
Herdei daquela época manias como nunca deixar uma gaveta aberta (nem mesmo semiaberta), entre outras coisas. Porque eles levavam o assunto tão a sério que os funcionários acabavam se acostumando e fazendo a mesma coisa em casa e ensinando seus familiares.
Bom, voltando ao assunto da Carvalho Pinto. Comecemos pela queimada. Por que raios há queimadas, especialmente à beira das estradas? As concessionárias têm câmeras de segurança. Elas não podem acionar os bombeiros? E, se o fazem, não poderia ser mais rapidamente? Se os prédios comerciais e residenciais têm de ter CIPAs, as concessionárias também não têm?
É claro que é falta de civilidade de quem põe fogo no mato, já que a maior parte das vezes é intencional. Acho que isso, assim como soltar balões, deveria ser punido de forma realmente severa. Mas não somente punido, especialmente fiscalizado, investigado e evitado. Já há perícia e inteligência para chegar até quem faz isso que, em geral, não se preocupa em apagar rastros. Não acredito que essas pessoas tenham QI acima de corruptos de colarinho branco ou mesmo traficantes internacionais que, ainda assim, são descobertos.
Então… a má visibilidade certamente prejudicou as condições de trânsito na Carvalho Pinto. Provavelmente aí aconteceu outra coisa que abomino nas estradas brasileiras: os motoristas, em vez de apenas diminuir a velocidade e se guiarem pelas linhas brancas do asfalto e seguir até um lugar onde possam parar em segurança (como um posto de gasolina), muitas vezes param totalmente em plena pista. Não tenho certeza de que tenha acontecido, mas é muito comum.
Já fui vítima inúmeras vezes de paupérrimas condições de visibilidade na estrada. Provavelmente a pior e na pior situação possível foi na minha lua de mel. Íamos de carro até o Rio, pela serra de Taubaté em direção a Ubatuba (sim, péssima ideia), quando caiu a maior tempestade que vi até hoje.
Pista simples, serra cheia de curvas, sem acostamento. Meu marido no volante e eu de navegadora. Naquela época, nosso carro não tinha ar-condicionado e os vidros embaçavam, então abrimos as janelas, apesar da água que entrava e enquanto um seguia a linha branca (ou amarela) no asfalto, o outro olhava o paredão da serra e eu avisava: vira tudo para a direita, vira tudo para a esquerda. E ele esterçava o volante conforme as linhas ou o paredão viravam, pois à frente não se via virtualmente nada.
Felizmente uma hora apareceu um carro na nossa frente e pudemos seguir os faróis dele por algum tempo. Mas aí ele encostou Deus sabe onde e tivemos de passá-lo – apenas para que ele voltasse à estrada, bem atrás de nós. Ele queria era alguém para seguir. Foi a pior viagem que fizemos até hoje e depois daquela vez nunca mais ultrapassamos ninguém com má visibilidade. Mas parar nessas horas sem ser num lugar absolutamente seguro, como um posto de gasolina, é suicídio.
Obviamente, quando a visibilidade é baixa — seja por fumaça, chuva, nevoeiro, nada de ligar o pisca-alerta como fazem alguns, o que só confunde quem vem atrás pois ele só deve ser acionado por quem está totalmente parado ou por alguns segundos antes de parar para avisar quem está atrás que vai se parar quando o trânsito se detém subitamente na pista.
E, claro, sempre manter uma distância segura do veículo à frente.
O segundo fato foi o atropelamento de um ciclista, que foi levado sobre o capô do carro, ainda vivo, por dois quilômetros, pelo motorista do carro. Ainda falta apurar uma série de coisas, mas vamos a algumas considerações sobre os fatos concretos, líquidos e certos. Em primeiro lugar, evidentemente, qualquer que tenha sido o motivo do atropelamento, deixar de socorrer uma vítima é, além uma obrigação legal automática imposta pelo artigo 176, inciso I e crime de trânsito do artigo 304, ambos do Código de Trânsito Brasileiro, absolutamente desumano. Sem falar em responsabilidade penal (Artigo 135 do Código Penal). Não consigo imaginar alguém deixar de socorrer uma vítima. Tanto é que no mar ou no rio, deixar de socorrer alguém à deriva é gravíssimo — como deve ser, mesmo. Deve ter poucas coisas mais cruéis do que isso.
Se o motorista estava ou não alcoolizado, como chegou a ser dito, também deve ser investigado, é claro. Mas não nos deixemos levar pelo coitadismo de sempre que acomete com alguma frequência aos brasileiros e que tende a nos fazer ficar do lado da vítima. O ciclista estava atravessando a pé, desmontado, segundo seu amigo e que estava junto com ele. Mas no local não havia nenhuma faixa de pedestres, a avenida é de trânsito expresso, de várias pistas, era de noite, a visibilidade é baixíssima e não vi nenhuma luz nem roupa reflexiva na bicicleta ou na vítima. Novamente, como diziam na DuPont, não existem acidentes. E nenhuma acidente é provocado por um único motivo.
Apenas para que fique claro, não estou aqui defendendo nenhuma das duas partes, nem motorista nem ciclista. Estou tecendo considerações de que todos os fatores devem ser levados em conta. Nada mais estúpido do que os paladinos de Feicibúqui que saem vomitando opiniões o tempo todo e linchando pessoas sem ter todas as informações, postando centenas de mensagens. São eles os que cometem as maiores injustiças mas, incapazes de reconhecer os próprios erros, nunca publicam uma única errata ou pedido de desculpas. Como exemplo disto, o fato aconteceu em Osasco, município vizinho à capital, mas a imprensa comparou o número com o de atropelamentos em São Paulo no ano passado. Ai que falta faz um mapa nessas horas!
Mudando de assunto: Pois é, acho que este ano dará Hamilton na Fórmula 1. Mas, assim como nas eleições americanas (e lá só há dois candidatos, portanto seria ainda mais fácil), erro pra caramba meus prognósticos neste quesito. Em todo caso, ver a corrida de Monza valeu nem que fosse pelas ultrapassagens de Ricciardo (sobre Pérez, uau!!!, que drible, meu Deus), de Kimi e de Bottas. O Ocón e o Stroll também fizeram lindo papel. E sou a favor de cortarem o rádio do Alonso. Não aguento mais o chororô dele. Ele é uma mistura de dois personagens de quadrinhos: a hiena Hardy com o Iznogoud, aquele grão-vizir que queria ser califa no lugar do califa.
NG