Og Pozzoli nos deixou anteontem após dois anos de luta contra grave enfermidade. Tinha 87 anos. Deixa esposa, quatro filhos e uma neta. Deixa também um grande vazio tanto no campo pessoal quanto no antigomobilismo — foi o fundador do pioneiro Veteran Car Club, em 1968, do qual era o sócio número 1. Sempre se diz que ninguém é insubstituível. Com Og Pozzoli esse conceito carece de qualquer sentido. Nem precisava conhecê-lo bem para se sentir isso. Ele irradiava simplicidade e um enorme coração.
O AUTOentusiastas lamenta profundamente a perda de um grande brasileiro nascido em Itaboraí (RJ), criado em Natal (RN) e radicado em São Paulo desde 1956, e expressa as maiores condolências à sua esposa, filhos e netos.
Preparamos uma matéria, que contou com a participação de colunistas e editores do AE para mostrar um pouco mais do Og Pozzoli e homenageá-lo postumamente.
Requiecast in pace, Og Pozzoli
AE/BS
(Atualizado em 21/11/17 às 21h40, inclusão do texto do Marco Antônio Oliveira)
Boas lembranças, uma receita para mitigar a saudade
Por Alexander Gromow
Seguindo a máxima que diz que a melhor maneira de homenagear os que se foram é acalentar as boas lembranças, vamos recordar um fantástico evento que foi a festa de aniversário oferecida ao Og Pozzoli por mais de 200 amigos.
A data do aniversário do Og Pozzoli é 27 de outubro, que em 2010 caiu numa quarta-feira: foi quando ele completou 80 anos! Amigos de longa data do aniversariante, Eduardo Pessoa de Mello (Auto Union DKW Club do Brasil) e Caetano Carmignani (Clube de Automóveis Antigos de Piracicaba), decidiram iniciar uma conspiração: organizar uma festa-surpresa para o Og. A data escolhida foi o sábado dia 23 de outubro de 2010. O João Pozzoli (Sociedade Paulista de Automóveis Antigos), filho do Og, foi chamado para reforçar a equipe de organização.
O local escolhido foi a excelente churrascaria Gramado, na Granja Viana, em Cotia, situada no km 26,5 da Rodovia SP-270 Raposo Tavares.
Num trabalho que levou um mês foram feitos centenas de contatos telefônicos com todo o Brasil, de norte a sul, e a resposta foi significativa, duzentas pessoas em números redondos encheram o salão e alegremente participaram da festa. Um tributo ao amigo Og Pozzoli que era e sempre será uma unanimidade entre todos os amantes de automóveis antigos brasileiros. Ele conquistou a todos com sua competência como colecionador, sua simpatia e humildade.
O local foi cuidadosamente ambientado para a festa de aniversário, com vários banners e até um Ford antigo foi colocado dentro da churrascaria:
O aniversariante e sua esposa Maú (Maria Lúcia) fizeram questão de receber a todos na entrada do salão — a felicidade do Og era evidente. Amigos que não se viam há muito tempo se encontraram lá. A mesa de presentes ficou logo ficou lotada.
Salões da Churrascaria logo lotaram com os convivas, todos felizes de estarem ali participando desta comemoração.
A mesa do homenageado teve um destaque especial já que era o centro das atenções de todos:
Muitos antigomobilistas de destaque estiveram presentes, dentre eles uma dupla muito conhecida aqui no AUTOentusiastas:
Outro digno representante dos demais antigomobilistas presentes a este almoço de aniversário foi o amigo Fábio de Cillo Pagotto que compareceu com toda a família:
O nobre aniversariante recebeu as mais variadas homenagens e uma mesa foi pequena para todos os presentes que ele recebeu:
De mim o Og recebeu, com alegria, uma singela homenagem, já que ele também tinha um Fusca em sua incrível coleção:
O amigo Eduardo Pessoa de Mello, sempre atencioso, cuidou de vários detalhes como a garrafinha de óleo com rótulo personalizado oferecida pela Wynn’s e que fez parte de um brinde que todos os participantes receberam (Fotos: AG):
Um cartaz com uma foto do Og Pozzoli e a mensagem “80 Anos” foi recebendo as assinaturas dos presentes para depois ser entregue ao aniversariante durante as homenagens:
Naquele ano o Og Pozzoli havia sido eleito “O Antigomobilista do Ano 2010”, num certame organizado pelo jornalista André Gomide no contexto do ABC Old Car & Parts, que ofereceu um lindo troféu. Curiosamente seguiram-no dois AUTOentusiastas com a eleição em 2011 do Roberto Nasser e em 2012 , eu (depois disto esta eleição foi temporariamente interrompida). O Troféu do Og e um banner comemorativo foram expostos durante o evento:
Logo depois do almoço foram realizadas homenagens através de discursos. O eloquente potiguar e jornalista Fernando Siqueira, num inflamado discurso, ressaltou as qualidades do aniversariante com detalhes que só uma grande amizade de cinquenta anos permite.
Seguiu-se Roberto Nasser que revelou para todos como é que o Og foi parar lá na Granja Viana há 40 anos em busca de um lugar que permitisse espaço para criar a sua coleção que hoje tem mais de duzentos carros.
Boris Feldman relatou a importante participação do Og Pozzoli na consolidação do movimento antigomobilista em Minas Gerais através do apoio dado aos eventos e iniciativas daquele estado.
Tudo isto, mais as manifestações de todos os presentes criaram um clima incrível na hora do Og fazer seus agradecimentos, e ele, com muita emoção, começou dizendo:
Amigos!
Antigomobilistas!
Peço perdão se a emoção me embargar a voz,
É que diante disto e com tantos amigos, com tantos companheiros é difícil segurar a emoção!
Aqui estou vendo amigos e companheiros que não vejo há muitos anos.
Companheiros de jornada atravessando a Cordilheira dos Andes em carros antigos…
E o carro antigo tem este poder de unir e juntar árabes e judeus, ricos e pobres, mecânicos e intelectuais, todos envoltos no mesmo sentido sem jamais ter uma divergência, qualquer que seja.
Todas as falas foram registradas em um vídeo que hoje passa a ter um valor ainda maior, em especial agora que combatemos a saudade com estas boas lembranças:
Terminado o discurso chegou a hora do bolo….
Logo depois do discurso, uma foto histórica unindo o Og Pozzoli, o Boris Feldman e o Roberto Nasser:
Seguem algumas fotos que registram os participantes, certamente são fotos sem pretensão alguma, já que tirar fotos deste “meninos irrequietos de cabelos brancos” certamente não foi uma tarefa fácil, mas alguns de nossos leitores e leitoras reconhecerão alguns dos personagens que estiveram presentes, quando não se reconhecerão a si mesmos (a ideia é apresentar o maior número de participantes possível):
Uma recordação de belos momentos felizes com o agora saudoso Og Pozzoli e é assim que ele deve ser mantido em nossas lembranças.
Os parabéns aos organizadores do evento, aos que vieram abrilhantá-lo com sua prestigiosa presença, aos oradores e em especial ao grande homenageado o Og Pozzoli.
Como todos, fiquei feliz de poder ter estado lá e ter participado neste evento marco do antigomobilismo brasileiro.
AG
Quatro autoentusiastas visitam o Og
Por Bob Sharp
Fazia tempo que eu conhecia o José Luiz Vieira, um jornalista automobilístico de uma competência ímpar, a quem chamo de Papa dos profissionais da imprensa que trata de automóveis. Seu grande feito na sua longa carreira — começou com 21 anos como colaborador de uma revista chamada Revista de Automóveis, do Rio de Janeiro — foi dirigir com maestria aquela que é considerada por muitos. quase uma unanimidade a melhor revista do gênero, a Motor 3, do nascimento em 1980 ao término oito anos depois.
Durante todos esses anos eu e o Zé mantivemos estreito relacionamento e até fomos colegas na revista Autoesporte na década de 1990.
O AUTOentusiastas ainda era praticamente um bebê no começo de 2010, tinha só um ano e meio de existência, e nas nossas conversas internas dois editores, o MAO e o Juvenal Jorge, vinham manifestando vontade de conhecer o José Luiz Vieira, admiradores que eram dele e da Motor 3, da qual tinham saudade e todas as edições cuidadosamente guardadas.
Por coincidência, toda vez que eu visitava o José Luiz e a esposa Vera Lúcia em sua casa na Granja Viana, ele dizia que eu tinha que conhecer a coleção do Og, que quando eu quisesse ele fazia questão de me levar até lá, era perto de onde morava.
Assim, eu disse aos dois, MAO e Juvenal, com o Paulo Keller no vácuo, interessado também, que os levaria para conhecer José Luiz e também o Og e sua coleção. Combinei com o Joe — como também é tratado depois de passar alguns anos nos Estados Unidos — e às 9 da manhã de sábado 20 de março de 2010 quatro autoentusiastas bateram na porta da casa do Joe. Para o JJ, MAO e PK foi um momento especial, emocionante, lembro-me disso até hoje.
Depois de um saboroso café da manhã preparado pela Vera Lúcia fomos para a casa do Og. Os quatro autoentusiastas não escondiam a emoção e a expectativa. Era como um sonho, conhecer o José Luiz e partir para a residência do Og.
Foi uma manhã e parte da tarde inesquecível. Para o JJ, MAO e PK, que tiveram o prazer de conhecer o José Luiz, seu ídolo, e para mim, conhecer mais o Og do que apenas breves contatos nos encontros. O favor que o José Luiz, sempre prestimoso, nos fez, é imensurável.
A visita ao Og foi registrada numa matéria assinada pelo PK, com fotos, publicada pouco depois, em 2 de abril, e pode ser lida aqui.
Ficou-nos uma impressão do Og Pozzoli ainda melhor do que imaginávamos. Que pessoa admirável! Fará muita falta.
BS
Conhecendo dois ídolos de uma só vez
Por Marco Antônio Oliveira
Mesmo antes de conhecê-lo pessoalmente, sua fama o precedia. O nome Og Pozzoli sempre foi, para quem acompanha a história do automóvel no Brasil, uma das referências mais claras e recorrentes. Colecionador de primeira safra, que junto com Roberto Lee, Angelo Martinelli Bonomi e Eduardo Matarazzo, praticamente começou o movimento antigomobilista no Brasil, nos hoje longínquos anos 60. Com seu característico bigode à la Hercule Poirot e o físico bonachão, era como o patrono da atividade aqui em terra tupiniquim, o velho sábio da montanha, o mestre de incontáveis gafanhotos ávidos pelo saber. Era de longe o mais conhecido dos quatro pioneiros, e o mais reverenciado. Eu em breve saberia o porquê.
Eu e o Juvenal Jorge somos amigos de longa data, desde que cursamos juntos o último ano de engenharia na FEI. O último ano é onde o curso de Engenharia Mecânica se torna Automobilística, e, portanto, acaba por reunir todos os malucos por carro que vagavam pela entidade de ensino até ali, até então perdidos em meio a física e matemática, imaginando onde estava a tão sonhada parte automobilística que os levara a escolher a renomada instituição de ensino como alma mater, quatro (ou no meu caso cinco) anos antes.
O JJ é um sujeito esquisito pacas, mas conversando com ele entre aulas, logo no início do ano, descobri algo que nos aproximou imediatamente. Como eu, o Juvenal lamentava profundamente o fim da revista Motor 3, coisa relativamente recente então, e era ardoroso fã do criador e editor da publicação, o jornalista José Luiz Vieira, ou JLV, iniciais com as quais assinava seus textos. Obviamente nos tornamos rapidamente amigos, algo que conto como uma das grandes sortes que o divino nos dá de vez em quando.
Botão do FF apertado por uns 20 anos, até meados de 2010. Eu e o JJ escrevemos no AE e temos a incrível sorte de tratar como amigo outro ídolo de nossa adolescência: Bob Sharp. Se conhecer o JJ foi uma sorte danada, trabalhar com o Bob era, e ainda é, quase surreal para mim. Dizem que não devemos conhecer nossos ídolos para não nos decepcionarmos com suas falhas humanas inevitáveis, mas tenho que dizer que no caso do Bob, acabamos por admirá-lo ainda mais quando o conhecemos de perto.
Eis que o Bob, num dos momentos de generosidade espontânea que lhe são característicos, me liga um dia e pergunta: o que você acha de conhecer o José Luiz Vieira?
Mas ainda tinha mais. Depois de conhecer o JLV em sua casa, fomos todos juntos até a chácara de Og Pozzoli, ali perto, conhecer sua coleção. Foi realmente um dia incrível. Surreal. O Og, diferente do que esperava de um obviamente bem-sucedido e ocupado colecionador famoso, se mostrou uma pessoa simples, generosa, que não apenas quis compartilhar sua coleção conosco, o fez de maneira extremamente simpática e entusiasmada. Não apenas um dono de 200 carros raros, cada um deles nos foi mostrado por ele com o carinho e conhecimento de quem mostra uma vida dedicada a preservação da história do automóvel.
Tudo me deixou boquiaberto, catatônico. A simpatia e as histórias incríveis que emanavam daquele senhor; a alegria dele em mostrar aquilo tudo; o tamanho da coleção, a quantidade de carros; a beleza e a extrema organização e limpeza do lugar; o estado impecável de todos os carros; e o fato de que todos eles foram restaurados ali mesmo. Para quem tem dificuldade de manter dois carros em casa, foi algo que me faz passear por ali sob um manto de admiração avassalador. Só mantê-los limpos, sem um grão de poeira em cima, deve ser quase uma operação de guerra.
E eu, um ilustre desconhecido, fui levado para dentro da casa de Og Pozzoli. Sim, porque cada galpão tinha cadeiras, objetos pessoais, tapetes, um ambiente caseiro e obviamente pessoal. Aquela era sua casa, e Og Pozzoli nos mostrava tudo com um cuidado e detalhe, e respondia perguntas de todos com cuidado e atenção.A marca de um ser humano especial, que compartilha suas realizações com desconhecidos, dando algo para eles sem esperar nada em troca. Não tinha como conhecer Og Pozzoli sem imediatamente adorar sua companhia, e ao mesmo tempo admirá-lo por saber o que ele representa.
Infelizmente, não é mais possível conhecê-lo. Pelo menos, não aqui neste nosso plano. Certamente deve estar com Roberto, Angelo e Eduardo agora, bolando um clube de carro antigo no Céu, e explicando ao Senhor tudo de incrível que nós, seres humanos, criamos aqui embaixo para nos locomover e ampliar a liberdade que Ele nos deu.
Levei desse dia, além dessas lembranças que contei aqui, duas fotos que mantenho com carinho comigo, tiradas pela lente sempre emocionada de Paulo Keller. Uma mostra eu e JJ ao lado de Bob, JLV e Og Pozzoli, dois ídolos de infância e um novo (foto do texto do Bob, acima). A outra, claro, não poderíamos deixar de fazer: ao lado do Chrysler da coleção de Og que foi capa da Motor3 número 1, ninguém menos que José Luiz Vieira. Eu e Juvenal Jorge, ao seu lado, emocionados.
Os dois garotos de pouco mais de 10 anos que abriram maravilhados suas cópias da Motor3 número 1 em 1980, prestes a serem apresentados a um mundo incrivelmente legal, em algum lugar lá dentro de nós, agradeciam emocionados. Como agradecer algo assim? É impossível. Mas sei que, para quem o fez, não é necessário. Mesmo assim, aproveito para fazê-lo novamente.
Obrigado, Og Pozzoli. E que a luz da face do Senhor o ilumine até o final dos tempos.
MAO