Steve Jobs dizia que fazia aparelhos para ele mesmo, seus amigos e sua família. Que não tinha interesse nenhum em dinheiro além do fato de que, ganhando mais dele, podia criar mais coisas legais.
Como muitos pioneiros da indústria automobilística, Jobs adorava os produtos que criava. Não é à toa o megassucesso da Apple; gente assim colocada sem freios raramente falha. Mas por outro lado, quando falha, o faz catastroficamente.
Por isso a tendência de toda empresa em colocar processos e procedimentos que controlem tudo, colocando grande previsibilidade no seu futuro. Se as previsões de vendas não forem suficientes para gerar lucro comparado ao investimento necessário para colocar o produto a venda, nada feito. Mas a previsibilidade não é garantia; é só aparecer um Jobs novo em sua área de atuação, criando algo novo e mais desejável, que você e sua previsibilidade vão para o brejo, mesmo com investimentos “seguros”.
Então por que não ser corajoso e desperdiçar um pouco do dinheiro da companhia para fazer você mesmo feliz, seus amigos e sua família? Não roubando da empresa como faria a maioria dos políticos, mas sim de forma honesta, colocando coisas legais no mercado, mesmo que os números e previsões digam que é furada. Erra-se com números favoráveis e com números desfavoráveis, então porque não tentar a mais divertida? No mínimo você vai poder dizer: gostou daquele carro? Eu é que trouxe ao mercado!
O sucesso, na verdade, é garantido: se o financeiro não vier, o apoio incondicional dos entusiastas certamente criará tanta boa-vontade para com a empresa que a sua imagem só ganha. Ok, imagem não se mede tão bem quanto saldo bancário positivo, mas nem por isso é menos real. E sempre há o risco de ser um sucesso, e se tornar uma boa fonte de renda. Sucesso? Qual a sua definição para ele?
O problema na realidade é que um fabricante de automóveis no Brasil não é lugar para procurar entusiasta. Pode parecer um absurdo, mas é a verdade. E mesmo se você achar algum, ele estará preocupado em apenas ganhar dinheiro, seguindo os processos e a cartilha da empresa à risca, para se manter empregado. Faltam líderes nesta indústria. Líderes de verdade, não gente que administra bem a própria carreira. E sem líderes não temos carros realmente legais. Estes precisam de alguém com coragem para aparecerem.
Esta lista de hoje é uma prova disso. Cada um destes carros não custaria uma fortuna para se colocar a venda no Brasil. E todos seriam boa aposta de sucesso. Claro que não tenho certeza desse sucesso: não há como tê-lo sem se tentar. Pode parar de fazer conta; será sempre um chute. Na minha definição particular de sucesso, basta colocá-los a venda, que já é sucesso.
No mínimo, seria um presente aos fãs brasileiros destas marcas. No mínimo, é algo que nós, que gostamos de carro, agradeceríamos. Faria maravilhas para a imagem, criaria fluxo em concessionárias, e uma imensidão de propaganda gratuita da imprensa.
Sem essa de que “não vende”. Honrem suas saias e calças e os cargos que ocupam. Façam algo para seus fiéis clientes, coitados, e não somente para você e o seu chefe. Façam algo melhor com sua vida que apenas dinheiro.
Sem nenhuma ordem particular, os carros que podiam muito bem ser vendidos aqui se existisse alguma boa vontade, são:
1) Citroën Berlingo Multispace
O Berlingo é uma das coisas mais divertidas, e ao mesmo tempo úteis, que se pode ter neste mundo. Pode ser antigo, mas é também leve, divertidíssimo, e mais útil que uma picape cabine dupla e uma perua de sete lugares juntas.
É também talvez o último Citroën de verdade, original, diferente, único. A marca está desesperadamente precisando de algo que a diferencie da turba hoje em dia. Digo por experiência própria: não existe ninguém que ande de Berlingo e não se espante com ele, com seu espaço, sua versatilidade, e sua diversão ao volante. É só ver o Paulo Keller no vídeo abaixo.
E o mais difícil de entender é que seria facílimo trazê-la. Como furgão, retornou recentemente ao mercado nacional. Sua idêntica versão Peugeot Partner nunca saiu. E o Multispace continua a ser vendido na Argentina. Porque não oferecer também esta versão por aqui, mesmo que venda pouco? Não faz sentido.
2) Dodge Challenger SRT Hellcat
Se a GM traz Chevrolet Camaro e agora a Ford traz Mustang…. Porque a FCA não pode colocar um Challenger nas concessionárias Jeep ou Fiat? Eu acho uma chance boa demais para desperdiçar.
E não seja boba, FCA. Se for trazê-lo, que seja a versão mais malvada. O inigualável Hellcat. Nada traz mais imprensa que um destruidor de pneus do calibre do gato do inferno. Mais de 300 km/h de final também é uma manchete que no mínimo, chama atenção. E trazendo esta versão, certamente colocará a concorrência em segundo plano, mesmo vendendo pouco. Um chute na canela da GM e da Ford. Se você é o último a chegar na festa, tem que chamar atenção de alguma forma criativa…
3) Jeep Grand Cherokee Trackhawk
O Grand Cherokee já vendido por aqui, mas é praticamente invisível ao grande público. A versão oferecida é a com a menor motorização, o moderno V-6 Pentastar com 295 cv, uma escolha sensata para nosso mercado.
Mas trazer a nova versão TrackHawk, equipada com o mesmo V8 Hemi com compressor dos Dodge Hellcat, seria uma maneira perfeita de chamar a atenção para este SUV. O Trackhawk é a nova sensação da imprensa americana, um SUV com alma de supercarro, sem dúvida nenhuma trazendo um sem-fim de clientes para as versões mais baratas no seu país de origem.
Por que não fazer o mesmo aqui? Certamente seria caríssimo, e venderia relativamente pouco. Mas não é este o objetivo. É chamar a atenção para outros atributos da marca, e dar um presente a todo entusiasta que puder comprá-lo. Mesmo usado. E de quebra, a traria uma boa-vontade para com a marca entre os entusiastas, que hoje mantém uma boa dose de desprezo pelos onipresentes Renegade e Compass.
4) Fiat 124 Spider
O atual Mazda MX5 Miata é um dos mais fantásticos carros esporte da história do automóvel. E nem custa muito dinheiro; nos países em que é vendido tem preço de Honda Civic.
Se não temos Mazda aqui, pelo menos a Fiat podia ajudar a gente e comercializar esta sua versão do famoso roadster japonês. O 124 Spider, apesar de carregar outro motor e ter uma série de outras características diferentes, é produzido na mesma fábrica no Japão, e compartilha sua alma divertida com o Mazda.
Seria algo sensacional para revitalizar a linha de automóveis da empresa, hoje em viés de baixa. E de novo, garantir o agradecimento eterno de uma infinidade de fãs de ambas as marcas.
5) Toyota GT86/Subaru BRZ
Este cupê esporte é talvez o melhor carro que já dirigi na Estrada dos Romeiros. Incrivelmente divertido, é um carro esporte tradicional, motor aspirado com vontade de girar, baixo, estável e em casa em estradas truncadas. Seria ótimo para revitalizar a injusta imagem tradicionalista da Toyota. E cairia como uma luva exposto em concessionárias entre os Subaru WRX à venda por aqui.
6) Chevrolet Camaro 1LE
A GM deveria contra-atacar o interesse gerado pela chegada do Mustang no Brasil de uma forma simples, barata, e terrivelmente efetiva.
A versão 1LE dos Camaro, vendidas nos EUA nas versões V-6, V-8 e ZL1 (V-8 com compressor), fazem o cupê virar uma arma de pista: suspensão e freios melhores, acabamento diferenciado, desempenho muito mais focado. O câmbio manual é outra coisa que eleva o prazer de dirigi-lo a outro patamar. E de quebra pode humilhar carros muito mais caros nos track-days brazucas, algo que não deve ser ruim para a imagem do carro. Que hoje por sinal, é ligada muito mais à música caipira e pagode, do que a esportividade e pista.
Trazer uma versão de acabamento de um carro já em oferta é tão difícil assim?
7) Chevrolet Tahoe/Suburban
Num país como o Brasil, cheio de gente rica em fazendas, e usando blindagem nas cidades, me espanta como esses enormes SUV da Chevrolet não são vendidos aqui.
As picapes grandes, e estes SUVs derivados delas, são o que de melhor a Chevrolet faz; talvez única categoria onde são imbatíveis, os melhores do ramo. Por que não espalhar o que você faz de melhor?
Muito melhor do que trazer inócuos sedãs Malibu de quatro cilindros. Francamente…
8) Ford F-150 Raptor
Dotada de um V-6 biturbo de 450 cv, e suspensão, chassis, pneus e rodas preparados para andar realmente rápido em terreno acidentado, emulando as populares corridas em deserto como a Baja 1000, o Raptor é um enorme sucesso nos EUA. Um carro inovador e incrivelmente desejável, um Ferrari das vias não pavimentadas.
Me dá medo em pensar o quanto é divertida esta caminhonete da Ford. Pare para pensar um pouco como faria sentido por aqui. Quebra-molas? Nunca mais pararia para eles.
Na verdade, toda picape grande americana faria sentido por aqui, fossem elas GM, Ford ou Dodge/Ram, especialmente nas versões Diesel. Mas a que causaria mais furor e entusiasmo sem dúvida é a Raptor.
Recentemente foi lançada uma Ranger Raptor nos EUA, algo que, apesar de menos impressionante que a F150, já seria ótimo. E ainda mais fácil de trazer para cá.
9) Ford Focus RS
Se a Ford não fizer nada, seus carros param de vender completamente em breve. Só o Ka hoje gera algum movimento de venda, e coisas assim exigem medidas radicais.
Importar o Focus RS, a magnífica versão com tração integral e 350 cv, no mínimo vai gerar interesse geral, e muita imprensa; na melhor hipótese revitalizaria o interesse na linha Focus, que sofre de venda praticamente nula hoje. Além de humilhar o pobre Golf GTI, que reina hoje sozinho numa categoria definida por ele mesmo.
10) VW Polo GTI
OK, não há muito sentido em trazer o Polo GTI europeu para cá. A diferença em preço em relação ao Golf GTI, do qual herda a mecânica básica, seria ínfima, fazendo o exercício fútil.
Não, o que precisamos é de algo mais simples e barato. Câmbio manual, suspensão, direção e rodas/pneus de GTI, e um motor entusiasmado, que poderia ser o 1,6 16V, 1,0 TSI ou 1.4 TSI. Qualquer um deles, desde que o preço estacionasse ao redor dos 70 mil reais.
Existem fortes rumores de que a VW está trabalhando em algo assim, e que receberia o nome de GTS. Não seria genial? Mal posso esperar!
MAO