O Paulo Keller descreveu detalhadamente o novo Jeep Grand Cherokee há algumas semanas, quando do lançamento do modelo Diesel no Brasil. Como sabemos ao verificar os preços de qualquer item em nosso País, vivemos em uma nação milionária, e para nós, quase tudo que vem importado é topo de linha, já que é o que pagamos com facilidade, gosto e tranqüilidade (ironia). Saindo da brincadeira, quando se viaja ao exterior descobrimos que há versões mais simples de quase tudo que chega por aqui, já que carro de rico no Brasil tende a ser carro comprável pela maioria, nos países onde a classe média tem poder de compra decente.
Aqui, a classe média é cada vez mais pobre, para o governo dizer que os pobres saíram da pobreza e hoje são classe média. Para eles, uma renda de pouco mais de mil reais por pessoa de uma família já a coloca na classe média. Um casal com salário de mil reais cada um é classe média para o governo federal. Então tá bom. É uma distorção da realidade que poderia também ser chamada de mentira deslavada. A classificação é inacreditável, mas é verdade, podem pesquisar o que digo. E tem gente que acredita.
O Grand Cherokee avaliado é um modelo Limited, apenas com tração traseira, disponível nos Estados Unidos. Não é um carro pelado, tem bastante conteúdo útil, mas é bastante aliviado em equipamentos em relação ao diesel ou gasolina 4×4 vendido aqui no Brasil. É quase, assim, um Jeep para os pobres americanos, classe na qual eu gostaria muito de me incluir. Minha distância percorrida com a família foi acima dos 3.500 km em vinte e quatro dias, o que me deu uma perfeita familiaridade com o comportamento do carro, que tem muita coisa de bom.
Para começar, o coração da máquina, o motor V-6 de 3,6 litros que produz 286 cv a 6.350 rpm rpm e 35,4 m·kgf a 4.300 rotações. Não há, em uso de rua ou estrada, momento em que falte força, mesmo com uns 400 kg de carga, um pouco longe dos 580 kg que é o máximo permitido. Mas a desenvoltura de movimentação provida pelo trem de força me deu a certeza que não se torna um carro desagradável nem com a carga máxima. Outro item muito bom e que ajuda muito o motor é a transmissão. Como se diz, o câmbio certo não ajuda, mas o errado atrapalha.
Mas as coisas estão mudando, principalmente com a escalada do número de marchas que se verifica atualmente. A 40 mph (64 km/h) a oitava marcha já pode ser engatada no modo manual, comandado pelas aletinhas ou borboletas. Não gosto de borboletas. Nas curvas onde se vira bastante o volante, como em manobras, você não acha a de subir ou descer marcha. Alternar entre primeira e ré numa condição dessa é chato. Deixei em automático a maior parte do tempo, e foi bem satisfatório. Nessa condição automática ele não mostra a marcha engatada, mas pelo consumo, é claro que está sempre na mais longa possível, com baixa, confortável e civilizada rotação.
Aliás, silêncio é algo que foi muito prezado pela engenharia da Chrysler/Jeep, com nenhuma ressalva a ser feita nesse sentido, seja nas ruas, seja em velocidades de viagem. Esse câmbio permite um consumo ótimo para um carro grande e pesadão, e aí está a ajuda que a transmissão trouxe para o motor, a capacidade de ser econômico mesmo sendo grande e forte. Não vi médias abaixo de 10 km/l nem em trechos de cidade apenas, com números de estrada sempre por volta de 13 ou 14 km/l, e consumos instantâneos chegando a mais de 16 km/l facilmente, em muitas vezes, sem acelerações de dragster, claro. Estou falando de uso normal, sem andar em terra, areia ou outro piso solto qualquer.
O tanque de 94 litros é sinônimo de sossego, de não precisar parar a toda hora, mesmo em carro mais gastão. No Grand Cherokee, fazendo o tempo todo mais de 10 km/l, é uma beleza. As rotações de velocidades de viagem, sempre muito baixas na oitava marcha, é a chave para a economia de combustível e uma deliciosa necessidade mínima de parar em postos, algo sempre muito chato a meu ver. Não sei o que acontece com nossa gasolina cheia de álcool, mas na americana, com até 10%, funciona muito suavemente. No Jeep, não houve nenhum tipo de falha de funcionamento, em nenhum momento, frio ou quente.
Um motor muito bem feito e de funcionamento exemplar. O câmbio não tem as passagens de marcha mais suaves do mundo, dá para sentir nitidamente as trocas, embora não comprometam o conforto. É uma caixa muito mais refinada mecanicamente do que de carros pequenos que estamos acostumados aqui em solo pátrio. O Limited 4×2 usa rodas 8Jx18 e pneus 265/60 R18. Por ter perfil maior, mais conforto, bem melhor que os 20 polegadas também disponíveis, para uso fora de estrada ao menos, e ruas ruins como as brasileiras. Nos EUA, nada que desabone o carro.
Conforto puro nas vias muito bem cuidadas. A assistência de direção é eletro-hidráulica nas versões de 3,6 litros, mas hidráulica convencional no V-8. Há sensor de temperatura no sistema, e aviso de sobreaquecimento do fluido. Se ele acende, a recomendação é parar o carro e deixar em marcha-lenta, sem mexer o volante, até a luz apagar, mesma recomendação para quando o câmbio aquece demais, condição vista como normal principalmente quando se reboca, coisa muito comum nos EUA.
Esse modelo 4×2 3,6 litros pode puxar até 2.812 kg, mais que os 2.100 kg de peso em ordem de marcha do carro. Há controle de tração e de estabilidade, além do já obrigatório ABS, então, nada de preocupações com aderência, nem acelerando nem freando. Um fato curioso e que mostra bem por que não se pode descuidar da manutenção em nenhum veículo, mesmo que ele tenha inúmeros magos eletrônicos para ajudar. A estabilidade direcional deixava um pouco a desejar em velocidades de estrada, e não pude entender inicialmente se era pelo carro ter uma suspensão e direção pensadas inicialmente para o sistema de tração nas quatro rodas, ficando esse modelo mais barato com uma mínima deficiência nessa área, ou por algum outro motivo.
Depois de verificar a etiqueta colada na coluna central, e ver as pressões indicadas na tela, descobri que a pressão correta era 29 lb/pol² (libras por polegada quadrada, psi em inglês), por isso a situação levemente incômoda, parecendo um andar de sapato com sola de couro em chão liso. Todos os pneus estavam com pressão bem acima disso, e desigualmente, para piorar, como aparece na foto da tela abaixo. Esses sensores de pressão me agradaram muito. Se a pressão estiver muito baixa, o quadradinho verde ao lado de cada pneu muda para vermelho, e acende uma luz espia fora dessa tela, sendo o aviso que é necessário calibrar, e mesmo se você andar um pouco e o aquecimento fizer a pressão chegar a um nível que não danifique o pneu, a luz continua acesa.
Aí está um sistema eletrônico útil de verdade, algo de filosofia totalmente diversa a coisas invasivas como um sensor de chuva que liga o limpador de pára-brisa quando ele quer, e não quando o motorista julga necessário. Pode mostrar a pressão em lb/pol²como nós e os americanos estamos acostumados, ou em kPa (quilopascal), como é mais comum aos europeus.
E aqui chegamos ao ponto principal de meu uso do Grand Cherokee, descobrir que existe versão sem tração nas quatro rodas. Em nenhum momento de minha vida eu desconfiei que isso existisse, ignorância pura de minha parte. Mas é real. Há modelos de tração apenas traseira com motor V-6 de 3,6 litros como esse que andei, além do 5,7 litros V-8. Assim, passei a encarar “meu” carro de forma diferente, não como um Jeep com tração nas quatro rodas, mas como uma perua grande e alta. Já aí se define uma coisa importante.
O assoalho do habitáculo e do porta-malas são altos, com as soleiras a 520 mm do solo, e o piso do porta-malas a 622 mm, mas a altura externa não é tão grande, só dois milímetros acima de 1,80 m, e os vidros também são pequenos na vertical. A visibilidade já complica teoricamente, mas ao menos em espelhos não há nenhum problema, nem vidros laterais. O vigia traseiro é bom, e tem o auxílio dos espelhos e da câmera para ré. Onde é necessário raciocinar um pouco é no para-brisa, pois o espelho é gigante e seu alojamento plástico um bocado gordo, pela presença do sistema eletrocrômico.
A altura livre de visibilidade abaixo do espelho é pequena, e assim, regular o assento corretamente para que esse espelho não fique na altura dos olhos é importante.Tive que tomar um cuidado extra em curvas para a direita, quando o espelho encobria a maior parte da rua, até acertar uma altura de assento de banco que fosse a melhor para a visibilidade, mas não a melhor para meu conforto. Nada grave realmente, mas que requer atenção do motorista.
A tampa traseira tem comando elétrico, abrindo e fechando por um botão no console de teto, pela fechadura lá na própria tampa e também por um botão dentro do porta-malas, além da tecla no controle remoto. Quando abre e fecha emite um aviso sonoro, pi-pi-pi, para que ninguém fique no caminho e seja atingido. Há sensores que param o movimento e o invertem, caso haja obstáculos, como um braço ou algum objeto resistente. Funciona devagar e há vezes em que uma simples tampa com molas a gás mais rápidas fazem falta.
Mas na chuva é ótimo colocar ou pegar algo no porta-malas, apertar o botão para ele fechar, e sair correndo. Além de não se sujar as mãos quando o carro não estiver limpo. Muita coisa pode ser observada na ficha técnica divulgada no texto do Paulo Keller quando da apresentação do modelo diesel no Brasil, e vários desses dados mostram coisas muito boas, e outras que poderiam ser melhores. Há alguns números nessa ficha que não são iguais aos desse texto, já que peguei os dados dessa versão de tração em duas rodas apenas.
Um dos itens que deveria ser melhor é o tamanho de porta-malas, que é bom mas não enorme, sendo necessário estudar com cuidado onde colocar cada mala, sacola ou caixa para aproveitar bem o espaço. No porta-malas há uma lanterna que fica presa na lateral esquerda. Ela se mantém carregada pelos contatos que há em seu encaixe, e fica bem a mão, logo que se abre o porta-malas. Esse é um item que não custa muito para a fábrica, e é encantador para o cliente. Fica a dica. Deveria existir em todos os carros. Mas alguém pode perguntar se não há luz de cortesia no porta-malas.
Existe, claro, mas a lanterna é prática e pode ser usada em qualquer outro lugar. E mesmo no porta-malas há um porta-objetos junto do estepe, abaixo do tampão do assoalho, que pode ficar bastante escuro, e para isso a lanterna resolve.
Encaixada no alojamento, carregando
O estepe é de tamanho normal, mas lendo o manual, descobrimos que ele não deve ser usado mais do que o tempo necessário para consertar um pneu furado, por exemplo. A explicação é que esse estepe não tem a mesma durabilidade do pneu normal de uso, mesmo com as dimensões idênticas às dos de rodagem. Um tipo de redução de custo que eu não conhecia. O vidros têm acionamento elétrico, mas um-toque, só na porta do motorista, e apenas para descer. É algo que não combina com um carro de preço razoável, mais de US$ 30.000 lá.
Os bancos são bons, há comando elétricos nos dois dianteiros, ajuste lombar idem, com a região de atuação variável em altura, permitindo quase uma massagem, desde que se fique com o dedo no botão, subindo e descendo o ponto de aplicação do lombar. Claro que isso não é bom de ser feito, pois esses motores elétricos não são para uso constante, mas que é bom de experimentar, não resta dúvida. Revestimento em couro claro, bege nesse carro, é magnífico. macio e muito bem acabado nos recortes e costuras.
Os apoios de cabeça são ativos, deslocando para a frente sua almofada em caso de colisão traseira, para diminuir ao máximo a movimentação da cabeça e pescoço para trás. Melhor ainda, são rearmáveis, não necessitando substituição caso não tenham sido avariados. O manual do proprietário ensina a fazer esse rearme, nada de “dirija-se ao concessionário mais próximo”. Algo notável é o instrumento central do quadro do painel, à frente do motorista, uma pequena tela na verdade. Ali sim entusiastas encontram informações preciosas para saber como está a mecânica do carro.
Pode-se monitorar temperatura da água do motor, temperatura e pressão do óleo lubrificante deste, vida restante do óleo em porcentagem, temperatura do fluido hidráulico do câmbio, pressão dos pneus, consumo instantâneo, consumo médio, autonomia, tensão na bateria (provida pelo alternador) e outras informações como resumo de viagem, bússola que indica o rumo, temperatura externa, além das luzes-espia normais para os avisos comuns.
Tensão na bateria
Pressão de óleo do motor, 41 lb/pol², igual a 2,9 kg/cm²
Além disso, o velocímetro ocupa a parte externa dessa pequena tela, e pode ser usado em milhas por hora ou quilômetros por hora. É absurdamente preciso, e sempre dava a mesma leitura que aparecia em alguns medidores de velocidade que existem nas ruas, apenas em locais de risco superior à média, como entrada de pontes dentro de cidades, ou próximo de escolas, por exemplo. Esses medidores até chegam a piscar uma luz quando se está acima da velocidade, mas não tiram fotos para multas. Ficam como um aviso e daí depende o respeito do motorista.
…ou em quilômetros por hora
O ar-condicionado é de duas zonas, esquerdo e direito, ótimo como sempre em carros americanos, quando a potência máxima de refrigeração é projetada para conservar os ocupantes congelados para sempre. Com o carro, vem em papel um manual de usuário, já que cada vez os carros são mais parecidos com computadores, com um resumo de todos os sistemas, mas pouca coisa de mecânica. O manual do proprietário com detalhes bem explicados está em um disco, ou pode ser baixado no site da Jeep, para qualquer um ler o que quiser, mesmo que não tiver o carro.
São 674 páginas de informações muito bem detalhadas sobre a utilização normal e o que deve ser feito em diversas situações de problemas e emergências, mas não há uma ficha técnica que possa ser classificada como boa. Gostei bastante do Grand Cherokee utilizando-o em sua casa. Precisamos ver agora como será o uso no Brasil, com todos os percalços prejudicadores de automóveis que aqui existem. Pela qualidade de construção notada nesses dias, a durabilidade por aqui parece garantida. Mais fotos a seguir.
Belas proporções para um utilitário esporte moderno
Estilo bem cuidado no carro todo
No último dia de férias, com vários mosquitos colados na dianteira
Fotografar dirigindo requer atenção, mas minha navegadora me ajudou bem, como sempre
Painéis de porta são simples e de bom gosto
Nenhuma crítica aos grupos óticos, tranqüilidade à noite
Sentei atrás de mim mesmo e os joelhos ficaram com folga para os 1,81 m de altura que tenho
Brilho de uma estrela já tradicional no panorama dos suves
Muito bom desenho geral do painel e comandos, além do console central com apóia-braço
Na tela central, rádio, bússola e comandos de climatização. Nesse modelo não havia GPS, telefone, nem rádio via satélite, mas são disponíveis
Iluminação azul para o gatilho da fechadura
Reflexo no retrovisor. Peças claras e brilhantes no painel de um carro agradam, mas podem atrapalhar no uso
Ótimo lugar para passear!
JJ