Sempre disse que na minha vida tem de tudo exceto tédio. Em todos os aspectos, diga-se, e apesar de todo meu planejamento e organização. Por mais que tente evitar perrengues, eles me perseguem. Ou, mais provavelmente, se eu não planejasse tudo tão cuidadosamente meus perrengues seriam ainda piores. Mas vamos logo ao assunto, que é minha mais recente viagem ao noroeste da Argentina, Buenos Aires e Atacama (Chile).
O objetivo da viagem era triste, mas, ao mesmo tempo, reconfortante: levar as cinzas da minha mãe para Buenos Aires e espalhá-las no Tigre, onde meu avô teve casa durante muitos anos, assim como um dos seus irmãos. Meu tio-avô já faleceu há muito tempo, mas meus primos mantêm e usam muito a casa, que era muito próxima à do meu avô. Jamais recusaria um pedido da minha mãe por ela ser quem foi, mas também porque foi uma das raríssimas coisas que ela quis em toda a vida. O Tigre é o delta do rio Paraná, a pouco mais de 30 quilômetros de Buenos Aires, um lugar de muitas ilhas onde é comum algumas pessoas morarem e muitos têm casa de final de semana. Foi lá que minha mãe aprendeu a nadar e a remar, como, aliás, quase toda a família. Lugar de lindas lembranças para todos nós.
No entanto, faz algum tempo que tento juntar as visitas à família em Buenos Aires com passeios a outras regiões do meu país de forma que meu marido não tenha hipotecadas as férias dele a uma interminável sequência de visitas a parentes a amigos — que felizmente são muitos, mas hoje todos moram no mesmo lugar, com algumas distâncias relativas apenas aos bairros. Foi assim quando fomos a Buenos Aires e de lá a Ushuaia e El Calafate, ou Buenos Aires e Mendoza ou Buenos Aires e Bariloche, por exemplo.
Assim, desta vez Noratur reservou carro e hotéis nesse lindo enclave do planeta com a valiosa ajuda da minha prima Anália, fizemos o roteiro a quatro mãos. Ela já havia feito esse itinerário de carro desde Buenos Aires e juntas criamos um roteiro sob medida para meu marido e esta que vos escreve.
Sabedora que sou das dificuldades em atravessar a fronteira entre Argentina e Chile com carro alugado, contatei uma das maiores locadoras de veículos perguntando se ao alugar um carro deles poderia ir ao Chile. Sim, eles disseram que tinham as autorizações necessárias e que, com um pagamento adicional, a travessia poderia ser feita. Vai e-mail, volta e-mail, aluguei o carro a ser retirado em San Miguel de Tucumán, atravessaria para o Chile na altura do Atacama e voltaria para a Argentina onde devolveria o carro alguns dias depois na cidade de Salta. Parece fácil, não? Também caí nessa.
Havia reservado um suve, pois a maioria dos caminhos pelas regiões que eu andaria é de rípio (cascalhos) e queria um carro mais alto para atravessar melhor os muitos buracos e os “badenes”, as depressões que atravessam as estradas para permitir que corra a água de degelo ou mesmo pequenos cursos d’água. Na retirada do veículo, confirmei mais uma vez que atravessaria para o Chile e me disseram que estava tudo OK. Guardei cuidadosamente todos os papéis numa pastinha que sempre levo. Aí saímos dirigindo pelas Rodovias s 38 e 307 em direção a Cafayate, já na província de Salta. O primeiro susto veio ao sair de Tucumán. Imaginem uma terra de ninguém em termos de trânsito — assim é a capital da província de mesmo nome. Motos com até três pessoas, incluindo crianças, que atravessam por onde querem, inclusive a estrada de um lado a outro, ignorando qualquer sinalização, andam pelo acostamento e, claro, ninguém de capacete embora fizessem tudo o possível para cair…
Ao sair da cidade, começou um lindíssimo trecho de mata tipo selva, mesmo. O caminho pelo Paso de los Sosas, é simplesmente maravilhoso. Paramos em alguns mirantes para observar o minúsculo Rio Sosa, mas a estrada em si já é uma paisagem.
Chegamos no final da tarde a Cafayate para ficar num hotel dentro de uma vinícola. O vinho Torrontés, típico do lugar, sempre foi um dos meus favoritos. Era o último dia da festa da colheita das uvas e o pequeno povoado fervia de gente. As festas na rua foram até de madrugada. Depois de fartas doses do meu vinho branco predileto à tarde e no jantar, de manhã seguimos viagem de carro. A ideia inicial era seguir tudo pela Rodovia 40, a Panamericana, que corta o continente de Norte a Sul e é mais conhecida na altura de Buenos Aires. No vilarejo de Cachi começaria a pior parte da estrada — não que o trecho anterior fosse um tapete, muito pelo contrário. Mas insisti em desviar e ir até a Quebrada das Concha,, um maravilhoso lugar que já foi o leito de mar há milhões de anos e de onde vem o seu nome, já que foram encontradas conchas marítimas.
No caminho, encontramos um valente Falcon ainda rodando!. Como Noratur sempre tem flexibilidade, depois de percorrer uns 40 quilômetros pela Rodovia 68 achei melhor seguir pela mesma estrada em direção a Salta e aproveitar o asfalto e todo o caminho que já havíamos percorrido em vez de voltar pelo mesmo lugar. Sorte nossa, pois à noite fiquei sabendo que o trecho entre Cachi e San Antonio de los Cobres pela Rodovia 40 estava interditado por causa do estado da via. Passamos pela maravilhosa Quebrada del Toro e chegamos a San Antonio de los Cobres — uma cidade que na época da mineração era relativamente pujante, mas hoje é outro daqueles lugares perfeitos para esconder testemunhas protegidas pelo Estado. Mas, suprema maravilha moderna, tem um único posto de gasolina — algo crítico nesta viagem, diga-se. Nestas alturas do campeonato estávamos a 3.800 metros de altitude, mas já havíamos passado dos 4.100 metros de altitude. Felizmente, sem nenhum problema, embora seja mais do que comum as pessoas passarem mal — vômitos, tontura e uma sensação geral de mal-estar que deixa qualquer um prostrado.
De lá visitamos um lugar incrível: Salinas Grandes, na província de Jujuy. É um depósito de sal que emerge da terra e tem 212 quilômetros quadrados, a 3.500 metros de altitude. Uma das coisas mais legais desta viagem foi que fizemos tudo de carro — inclusive entrar nas Salinas, com a guia dentro do nosso carro. É estranho dirigir sobre o sal e não ver nada que não seja branco ao redor. Lembrei da Finlândia, quando fui em pleno inverno (foto 8). Só que aqui o sol é inclemente e esta morena jambo não acreditou nos conselhos que todos nos deram. Resumindo, o protetor solar ficou na mochila e, aparentemente, se não é passado na pele não tem efeito… Resultado: dois turistas esturricados no final do dia, mas superfelizes.
Depois de diversos passeios pela região, incluindo o Tren a las Nubes, nos dirigimos à fronteira para ir para o Atacama. Pois bem, pausa para o primeiro perrengue: segundo as autoridades locais, faltava parte da documentação que a locadora deveria ter-me dado. Ou seja, nós poderíamos atravessar, mas o carro não! Isso tudo começou às 17h15 de um dia e a alfândega de Paso de Sico fecha às 18h00. O gentil funcionário da alfândega argentina tentou me acalmar e pediu que eu procurasse com calma. Quem sabe os papéis estavam no carro? Eu sabia que não, mas ainda assim dei uma chance e abri a mala com alguns papéis. Ao ver um deles cheio de carimbos e selos ele disse: “Deixa eu ver? Pode ser este”… Não, meu senhor, estas são as autorizações para trazer as cinzas da minha mãe, que faleceu há pouco tempo… e, sem conseguir me segurar, comecei a chorar. O amabilíssimo funcionário me abraçou, disse para ter calma, que era um gesto lindo da minha parte e me trouxe um copo d’água. Parecia cena de filme.
No entanto, nada da documentação solicitada pela Norma 3311 que ele citou. E agora, José? Alfândega fechada e como única opção, voltar 140 quilômetros pelo rípio até San Antonio de los Cobres, com sei lá quantas depressões e, claro, à noite. Daqui ninguém me tira, disse eu, disposta a passar a noite dentro do carro. Claro que não havia sinal de telefone nem de internet, embora eu sempre compre um chip local e desta vez não foi diferente. Pedi para usar um telefone para ligar para a locadora, mas o aparelho via satélite da Gendarmeria argentina (os militares com função de polícia) estava quebrado, assim como a internet deles. Ou seja, nenhuma chance de, naquela noite, contatar a locadora. Isso num lugar tão ermo que tem apenas três prediozinhos térreos: um da alfândega chileno-argentina, outro da própria Gendarmeria e o terceiro, descobrimos então, um conjunto de três quartos, cozinha e dois banheiros para “emergências”. Pois é, a nossa era uma emergência e os gentilíssimos gendarmes nos ofereceram passar a noite lá.
Eu tinha reservado (e pago) um lindo hotel 4-estrelas em San Pedro de Atacama e me vi dormindo num quarto cheio de beliches, diretamente sobre um colchão e tendo de usar um banheiro no qual não funcionavam as torneiras e o vaso devia ser esvaziado com baldes d’água colhido na cozinha ou no chuveiro. Mas não tínhamos toalhas nem para tomar um reles banho. Também não tínhamos comida, exceto meio pacote de bolachinhas sabor queijo e meia garrafa de vinho que sobrara do jantar do dia anterior. OK, “jantamos” meia dúzia de bolachinhas e vinho no gargalo. Lá fora, 5 ºC negativos, um vento indescritível e, à meia-noite, o gerador é desligado e só volta às 7 horas do dia seguinte. Escovamos os dentes na pia da cozinha e fomos dormir.
Na manhã seguinte, o pessoal da alfândega argentina nos emprestou a senha de internet, que ia e voltava, e consegui contatar a locadora de carros logo às 8h00 da manhã. Expliquei tudo e pedi que resolvessem o problema naquele mesmo dia antes das 17h30 para que pudéssemos ir para Atacama. Por volta das 11 horas, um dos maravilhosos gendarmes veio perguntar se tínhamos comida. Pela nossa cara, deduziu que não e nos convidou com pão caseiro e geleia e, bênção das bênçãos, um chá quente.
À tarde o pessoal da alfândega argentina nos convidou para umas empanadas recém-feitas e pudim de leite de caixinha. Aceitamos de muito bom grado não apenas pela fome, mas também porque eles eram tão, mas tão gentis que ficamos sem graça. E, supremo prêmio, conversamos com gente. Aleluia! Comi as melhores empanadas da minha vida não apenas porque estavam realmente muito boas, mas porque foram compartilhadas com muito carinho e solidariedade. Lavei a louça, sob protestos dos nossos anfitriões, mas era o mínimo que podia fazer, não? Mas não deixava de lembrar como eram as fotos do hotel que eu havia reservado e pago…
No final do dia, o movimento no tranquilíssimo Paso de Sico aumentou exponencialmente: dois ciclistas alemães pediram albergue para não seguir viagem à noite e dois casais argentinos também, pois chegaram 10 minutos depois do fechamento da fronteira. Detalhe: na internet há a informação de que o Paso funciona 24 horas por dia, mas na realidade é das 8h às 18h. Entre nosso primeiro e o segundo dia, cruzaram somente dois veículos. Na hora do rush. E nada, absolutamente nada do motorista da locadora que deveria ter chegado antes das 18h00 com nossa documentação em ordem.
Os alemães nos ofereceram compartilhar o jantar com eles. Eles tinham arroz, purê de tomates e ervilhas. Aceitamos, pois o frio à noite lá é intenso. Oferecemos o resto do nosso vinho e um micropacote de cookies que eu havia esquecido que estava na porta do nosso carro. Meu marido e eu dividimos um prato de plástico dobrável e uma colher e os simpáticos alemães, o mesmo. Novamente, conversar era algo muito bem-vindo, até para esquecer que o indigitado da locadora não chegou a tempo de atravessarmos a fronteira e teríamos de enfrentar mais uma noite lá. Mais uma noite num dormitório precário. O motorista chegou às 21h30 e, adivinhem, ficou para dormir no “nosso” quarto. Eu só pensava no hotel de Atacama, no banheiro privativo, chuveiro de água quente e toalhas e lençóis macios, mas aí a realidade me lembrava que estava dividindo tudo com sete absolutos desconhecidos. Mas se alguém quiser emagrecer, a dieta Gendarmeria-Locadora de carros funciona que é um espetáculo. Perdi mais de 1 kg em dois dias, apesar de não fazer nenhum exercício, apenas a eficiente combinação de fome + estresse + frio.
No dia seguinte, logo pela manhã, apresentamos a nova documentação de um outro carro que a locadora nos mandou e fizemos a troca. Passamos de um Nissan Kicks com 3.000 km para uma Spin com 70.000 km, cheia de amassados e riscada, com cheiro de chulé e meio tanque de combustível em vez de completado 140 quilômetros antes como o Kicks. Sem comentários que eu não sou pessoa de escrever palavrões… No final, autorizaram nossa travessia. Ao apresentar meus documentos pessoais, um dos argentinos do serviço público me disse: “Norita, acabamos de colocar a chaleira para ferver. Esperem um pouquinho que podemos lhes oferecer chimarrão ou chá. Não vão embora de estômago tão vazio…”. Não foi lindo? O sujeito da alfândega argentina veio até o carro nos despedir, me deu um beijo e um abraço e nos desejou boa viagem. E um dos gendarmes que abriu a cancela para nossa passagem (finalmente!) fez o mesmo.
Seguir pelo Paso de Sico foi duplamente agradável. Primeiro por finalmente podermos continuar nossa viagem e outra pelo caminho em si. Depois de apenas 12 quilômetros de rípio saindo da fronteira, a Rodovia 51 é de asfalto. Eba! E que paisagens!
Mas demos muita risada quando nos deparamos com a placa de falta de sinal telefônico nos seguintes 115 km. Ora, nós já vínhamos sem sinal havia mais de 150 então mais 115 eram fichinha. Detalhe: os primeiros 150 quilômetros entre San Antonio de los Cobres e Paso de Sico haviam sido feitos em duas horas e meia e mais dois dias na Gendarmeria Argentina Lodge and Towers. As variações de temperatura, aliás, forma outra marca desta viagem (foto 13). Ao meio-dia chegávamos aos 30 graus, mas às quase 10 horas da manhã encarávamos 4 graus — e alguns negativos à noite. Mas a paisagem compensava qualquer variação térmica.
Outro problema da Spin é que ela não cobria nossas malas no porta-malas – algo que sempre faço questão de ter para que quando deixamos o carro parado não se veja que há coisas. E, para aumentar minha insegurança, o estepe era aquele temporário, estreito. Chequei o manual da Spin e lá dizia que não se deve rodar mais do que 80 km com o estepe temporário e a não mais do que 80 km/h. Li e reli várias vezes e voltei a lembrar da locadora em termos não muito educados. Um estepe desses em caminhos de rípio? E onde íamos achar um borracheiro em menos de 80 quilômetros quando não há absolutamente nada em centenas de quilômetros? Por sorte, parece que minhas preces a Deus, Buda, Shiva e sei lá quem mais deram resultado e conseguimos não furar nenhum na viagem inteira. Antes de deixar nosso hotel em San Antonio de los Cobres conversei com um casal polonês que em três semanas rodando pelos mesmos lugares havia furado seis (!) pneus.
Como comentei brevemente semana passada, uma das melhores coisas desta viagem foi que fizemos tudo de carro. Com um veículo vai-se até qualquer lugar e andamos muito, mas menos do que em outras viagens. Pode-se estacionar com conforto e tranquilidade em mirantes e seguir a pé por trilhas. Não há necessidade de se contratar excursões e com apenas um mapa e alguém bom no volante faz-se tudo sozinho. Exatamente o tipo de viagem que eu gosto.
Indescritível, a sensação deliciosa de finalmente poder desfrutar do conforto de um belo hotel em Atacama, depois da aventura na fronteira. Isso sem mencionar o visual incrível da estrada com os sempre presentes vulcões, e o próprio deserto, os salares, as salinas, e as lagoas.
Depois de ver algumas das paisagens mais lindas que se possa imaginar, saímos do Chile pelo Paso de Jama e voltamos a Jujuy. Naquele dia teríamos o maior esticão da viagem — previstas 7h40 de direção, sem paradas. É claro que paramos em vários lugares, pois os mirantes até e logo depois do Paso de Jama são deslumbrantes. Descer a encosta do vulcão extinto Lipán (mais conhecida como ‘cuesta del Lipán’) é coisa para autoentusiastas (ver as quatro fotos abaixo). Sugiro aos que o fizerem que usem um veículo com câmbio manual, pois reduzir e passar marcha é algo que bate os recordes de qualquer GP de Mônaco de Fórmula 1. Isso sem falar nas vistas. Imagino que fazer esse trecho de moto também seja algo maravilhoso.
Terminamos a travessia dos 17 quilômetros de encosta do Lipán e chegamos a Purmamarca às 17h00. A somente 68 quilômetros de Humahuaca, de onde teríamos mais 30 quilômetros pela Rodovia 9, asfaltada, e depois o perrengue das Rodovias 13 e 133 até a cidade-luz de Iruya que mencionei semana passada. Se de novo parecia fácil, vocês também caíram no mesmo conto que eu. Foi exatamente aí quando passamos a ter uma real dimensão do que é o Carnaval na região da Quebrada de Humahuaca e de quantas normas de trânsito conseguem ser violadas ao mesmo tempo: carros trafegando no acostamento (nos dois acostamentos!), outros na contramão… um show de horrores. Cinco horas no ritmo primeira-para-primeira-para na Rodovia 9 e depois duas horas e meia pelo caminho que eu não queria de jeito nenhum que fizéssemos à noite — feito, é claro, à noite. Aqui mais uma vez palmas para o meu marido. O sujeito dirige muito, muito bem (foto 25 dois dias depois, com luz natural).
Mas tal qual as propagandas tipo “ligue já”, isto não era tudo. Mais problemas à nossa frente. Chegamos a Iruya às 0h30 depois de ter saído de San Pedro de Atacama às 8h30. No total, eram 540 quilômetros, mas nos levaram 16 horas. E ao chegar ao hotel, ele estava fechado. Havia luzes acesas no lobby, mas nenhuma porta abria. No final, meu marido encontrou uma e entramos com nossas malas. Começamos a bater em todas as portas do hotel que não tinham um número que indicaria que ali havia um quarto. Nada! Comecei a olhar para os sofás do lobby mas, sinceramente, ainda não estava totalmente reposta das duas noites na Gendarmeria e antes de deitar aí mesmo, morta de cansaço, tive uma ideia. E se pulássemos o balcão da recepção? Será que não havia uma chave de algum quarto vazio? Afinal, o nosso estava reservado, pago e, ainda por cima, naquele dia havia mandado exatos quatro e-mails e deixado três gravações na secretária eletrônica avisando que chegaríamos tarde, mas que iríamos para o hotel, sim.
Como sou um pouco prejudicada verticalmente, meu marido fez as honras e pulou o balcão. Atrás dele, uma portinha. Bateu. Bateu novamente. Bateu pela terceira vez, tipo Sheldon Cooper em “The Bing Bang Theory”. Nada. Empurrou a porta e, dentro, uma cama, uma garrafa de vinho e um celular. Mas ninguém. Como já haviam se passado 30 minutos desde nossa chegada e queríamos muito descansar, meu marido procurou chaves e encontrou uma junto de um controle remoto de televisão. Peguei a chave e fui até o quarto. Bati na porta (somente duas vezes, não sou o Sheldon…) e como ninguém respondeu, entrei. Quarto limpo, arrumado e vazio. Era aí mesmo que nós ficaríamos. Voltei ao lobby do hotel e deixei um bilhete: “Oi, depois de procurar alguém por 30 minutos nos autoinstalamos no quarto 2. Nora Gonzalez.”
Malas no quarto, pensei que se nós havíamos entrado, qualquer um o faria e coloquei a cadeira atrás da porta. Meio ridículo, penso agora, pois como já mencionei Iruya está mais para esconderijo de testemunhas protegidas do que qualquer outra coisa. Mas como paulistana…
No dia seguinte, fomos tomar café da manhã e veio o que seria o porteiro da noite disser que havia tido um problema de saúde com o filho e o levara ao hospital. Nem prestei muita atenção na explicação, pois era sábado de Carnaval e todo mundo naquela região estava pulando Carnaval. Mas nem um pedido de desculpas, nada. E quando veio a conta, foi tudo cobrado, inclusive o vinho e o lanche que pedimos na tarde daquele dia. Faltou um mínimo de profissionalismo, não?
Para nossa sorte, depois de duas noites na Gendarmeria e uma “invadindo” um hotel, o resto foi normal. Paisagens lindas, lugares muito, muito simples mas charmosíssimos… Enfim, uma viagem de sonhos.
Para não dizer que não houve mais problemas, os rios no Tigre sofreram com uma sudestada, a tempestade que vem do sudeste e é a pior naquela região, e subiram mais de 3,5 metros. Invadiram as casas, inclusive a dos meus primos, e tivemos que reagendar a questão das cinzas. Mas no final, pudemos cumprir o ultimo desejo da minha mãe num lindo dia de sol e com a presença de alguns familiares muito queridos, numa cerimônia íntima. Triste, mas que me deu algum alívio.
Mudando de assunto: fiquei muito feliz com o reinício da temporada 2019 de Fórmula 1, mas a corrida em si foi meio chocha. Bottas fez tudo certo, mas exceto pela ultrapassagem do Verstappen em Vettel, não vi nada memorável — exceto o próprio circuito, que acho lindo. Gostei também da pintura da Haas, que me lembra a da Lotus em 2012 e a da Lotus que Ayrton Senna dirigiu na época que a escuderia tinha patrocínio da John Player. Quanto ao ponto extra pela volta mais rápida, se fosse retroativo o Kimi Räikkönen ganharia um monte de pontos extra…
NG