Concessão de rodovia à iniciativa privada é tema para longa discussão para quem quer debater o assunto. Pessoalmente, acho que essa é uma das áreas em que o Estado tem de garantir que a infraestrutura exista, mas não vejo necessidade de o governo operar rodovias. Nem o poder municipal, nem o estadual, nem o federal. Mas todos eles devem, sim, assegurar certos parâmetros. O mais óbvio é aquele que diz respeito às condições das vias, mas também alguns níveis mínimos deveriam constar das concessões ou privatizações. E, claro, supervisor e garantir o cumprimento de tudo isto. Sem esquecer do valor do pedágio que, por óbvio, não deveria ser extorsivo embora seja lícito que haja remuneração do investimento.
Tenho muitas críticas às concessões que foram feitas no Estado de São Paulo. Não porque tenham sido feitas pois, como disse, sou a favor de a iniciativa privada cuidar das estradas. Mas houve falhas gritantes. Por exemplo, deveria haver exigências claras e com prazos de ampliação da via periodicamente, em determinados trechos ou mesmo em toda sua extensão. Manutenção, é claro, deve ser impecável. Infelizmente nos acostumamos com péssimas superfícies que duvido sequer possam ser chamadas de superfícies asfálticas e muitos acham até mesmo normal vias sem sinalização adequada. Em São Paulo é comum circularmos por ruas e avenidas que sequer tem a marcação de pistas.
A forma de cobrança também poderia ser muito melhorada. Em diversos países, como vi na Eslováquia, paga-se uma “vignette” que sequer é física, apenas um registro eletrônico, e vai-se abatendo o pedágio automaticamente, que é controlado a distância, ao longo das estradas. Não há nem mesmo cabines. O valor a ser carregado é de, no mínimo, 10 euros para veículos de passeio, mas se for ultrapassado é só recarregar eletronicamente. E garanto que funciona muitíssimo bem. Sem cabines, sem filas, sem dor de cabeça. E, caros leitores, adorei aquele país mas, sendo bem realista, trata-se de uma economia de média para média-pequena mundialmente. Ou seja, não há razão para que não seja implementado no Brasil.
Ainda assim, outras soluções simples poderiam ser adotadas no Brasil e não o são. Na Argentina e no Uruguai os espertinhos que entram na fila do Sem Parar mas não tem o tag pagam o dobro da tarifa. Eu já sou mais dura: cobraria umas dez vezes o valor, pois com tarifa de R$ 3 não chega a ser prejuízo para o bolso mas atrasa aqueles que tem, sim, o tag. E ainda acrescentaria uma espera de uns 30 minutos. Pois é, hoje estou bravinha…
No caso da Argentina, além da cobrança há multa e pontos na carteira, pois é considerado evasão
Por falar em braveza e mau humor, outra coisa que me tira do sério são ônibus e caminhões nas pistas da esquerda do Sem Parar. Ando muito pela Castello Branco que tem, em sua maioria, três pistas. No caso dos veículos pesados é comum que andem pela pista central deixando a da direita totalmente vazia – affe! Mesmo assim, ao se aproximar das cabines, boa parte deles vai para a esquerda mesmo quando do lado direito há cabines do tipo Sem Parar. Eu diria que o esforço e a distância são os mesmos mas segundo apurou o DataNora, 38,71% dos veículos pesados vão para a esquerda ao se aproximar das cabines de pedágio.
Em minhas noites de insônia, quando já começa a me abater o mau humor porque o sono teima em fugir, cheguei a pensar em soluções drásticas, draconianas, maldosas mesmo. A mais recorrente é a instalação de uma barra que impeça a entrada de veículos acima de uma determinada altura nas cabines do lado esquerdo, como aquelas que ficam antes da entrada de alguns túneis. Um exemplo, em São Paulo, é o túnel Ayrton Senna. É claro que penso numa bem, bem resistente, feita de “adamantium”, com as garras do Wolverine dos quadrinhos. Assim quero ver quem ia ser louco de se aventurar a escalpelar o próprio caminhão ou ônibus. Claro que haveria outros danos colaterais, cairiam pedaços de carroceria nos outros veículos, pessoas sairiam feridas, mas queimaria os engraçadinhos com o fogo dos dragões de “Game of Thrones.” Já pensaram eu comandando um desses seres alados? Seria implacável com os transgressores: “dracaris!”. Nessas horas gosto de lembrar o que me disse uma vez uma psiquiatra — que não podemos controlar nossos pensamentos, apenas nossas atitudes. E aí consigo dormir mais tranquilamente sem me achar uma bruxa ruim. Afinal, essas coisas só ficam dando voltas na minha cabeça quando estou de mau humor, mas não saem de lá.
Outra coisa que facilita, e muito, a fluidez dos trânsito nos pedágios é a cobrança mais racional e rápida. Acredito que facilitar (e não cobrar) o tag reverteria em mais benefícios para a concessionária. Quando as primeiras rodovias foram outorgadas à iniciativa privada em Buenos Aires instituiu-se no edital que não poderia haver fila de mais de cinco veículos em cada cabine. Se isto acontecesse, automaticamente a passagem deveria ser liberada, sem cobrança para o usuário (não aconteceria o visto na foto de abertura, praça de pedágio em Gravataí, RS). Eu mesma presenciei isso algumas vezes no início e quando começava a se formar fila, os motoristas começavam a buzinar exigindo a liberação do pedágio. E rapidamente isso acontecia, caso não tivesse sido feito automaticamente pelos operadores.
Das duas últimas vezes que estive em Buenos Aires, em agosto de 2018 e no mês passado, apesar de ter rodado bastante pelas “autopistas” de Buenos Aires, em nenhum momento isso aconteceu. Sinal de que quando querem as empresas acham uma solução para cobrar. Digo mais: nem acho que o poder público tenha que estabelecer uma solução para o fim das filas nas cabines. Deixem a concessionária achar uma solução e garanto que se doer no bolso, ela será achada. Não tem o milagre da multiplicação dos pães? Tem também o milagre da multiplicação das soluções – neste caso, obra de São Finanças.
Sempre digo que o “não” é criativo. Ouvir uma negação em resposta a algum pedido nos obriga a achar uma solução. Se sempre levamos um “sim” para qualquer pleito, nada feito. Alguém resolveu nosso problema. No caso oposto, temos que viabilizar uma saída. Sabe aquela de “pai, me leva à festa?” se ouvimos um “sim”, pronto, viramos a página. Se for um “não”, muitas variáveis à frente. Pai, me empresta o carro para ir à festa?. Pedir carona para um irmão ou amigo. Ir de transporte público. Ou até mesmo não ir à festa. Todas as opções estão sobre a mesa.
Mudando de assunto: aleluia! Desta vez, o defeito do ar-condicionado do nosso carro apareceu perto da oficina e deu tempo de levar o possante para um diagnóstico e o conserto. Ufa, com tanta eletrônica até os especialistas têm dificuldade em detectar um problema se ele não pode ser medido em bits e bytes.