Recentemente, escrevi aqui sobre pedágios e concessão de rodovias. Mas faltou abordar outro aspecto do assunto: muitas vezes as estradas são bem construídas e até bem sinalizadas — caso da maioria das do Estado de São Paulo. Mas, como dizem, o diabo está nos detalhes. Vocês, caros leitores, já viram como são feitos os acessos a estas rodovias?
Um dos mais problemáticos, pelo volume de trânsito e especialmente de caminhões, são as alças de acesso ao Rodoanel. Um verdadeiro horror. O Rodoanel ainda não está pronto e por isso não é bem um “anel”, está mais para 3/4 de anel”, mas ele foi planejado justamente para desafogar o tráfego de caminhões que cruzam desnecessariamente a cidade da São Paulo. Ele ligará as principais rodovias que chegam à capital sem cruzar o centro. Parece uma boa ideia. E é. Tanto que as principais cidades do mundo (e mesmo algumas menores) usam rodoanéis semelhantes ao nosso.
Mas, fala sério. Precisava fazer uma alça de acesso com um aclive que os caminhões têm enorme dificuldade em vencer? Os tombamentos são tão frequentes que puseram radar e placa de… 40 km/h (foto de abertura). Isso numa pista dupla. Faz sentido? Claro que não. E num lugar onde espaço não era problema. A curva tem ângulo errado também e, como nunca acontece nestas paragens tupiniquins, não foi feita a superelevação necessária para manter os veículos na pista.
A Rodovia Raposo Tavares é outro exemplo. Ela foi duplicada entre São Paulo e Araçoiaba da Serra, a 120 quilômetros da capital. Mas os acessos são absurdos. Mesmo a pista marginal construída há um par de anos ao longo de Sorocaba tem acessos cegos, a 90 graus. Fazer o retorno na altura do novo Hospital Regional nos faz dar de cara, literalmente, com a rodovia. O acesso é um “T” torto. Isso porque foi inaugurado há somente alguns meses. Como entrar numa pista na qual a máxima é 70 km/h sem ter uma pista de aceleração e desaceleração? Aliás, já tratei desse assunto neste espaço há dois anos e infelizmente pistas de aceleração e desaceleração são itens desconhecidos para as autoridades de engenharia de trânsito – embora fantasticamente úteis, necessárias e lógicas.
Na cidade o problema se repete. Alças de acesso a pontes são mal projetadas, inclusive nas marginais. Diria até que nem foram projetadas. Parece que alguém desenhou numa prancheta sem nenhuma preocupação com a realidade ou seque com volume, espaço… ou seja, nada tridimensional. Pontes bastante novas, com menos de quatro anos de inauguradas, começam com três pistas e terminam num funil de apenas uma, como é o caso da Ponte Laguna ou, um pouquinho mais antiga, mas pouco, a Ponte Estaiada. Esta, aliás, é incrível. Pretendia melhorar o fluxo de trânsito da Av. Roberto Marinho, que tem quatro a cinco pistas dependendo do trecho, e termina do outro lado do rio Pinheiros com somente uma faixa (foto 4 ponte estaiada). É piada corrente em São Paulo que essa ponte consolidou os congestionamentos em altura. Transferiu-os (a ênclise da semana) do nível do chão para o alto de uma ponte. Bem, mas o que dizer de uma cidade onde a engenharia de tráfego é tão avançada que temos uma via elevada (o “Minhocão”) que inunda?
Então… não basta projetar a rodovia ou a ponte. Que tal pensar um pouco nos acessos? Até porque quando mal desenhados acabam criando congestionamentos nas próprias estradas. E aqui vai um parêntese: lembram daquele supermercado que eu não frequento porque não respeita vagas de idosos ou deficientes? Pois é. O estacionamento subterrâneo tem dois acessos. Um deles, em declive, é uma tentativa de homicídio no trânsito, pois na saída do estacionamento sobe-se a rampa para dar de cara não apenas com uma rua de acesso de razoável trânsito, mas bem no meio de uma rotatória. Ai fica a dúvida: quem projetou não sabia que vias em aclive têm prioridade? Mas, veja bem, quem está na rotatória tem prioridade. E aí? Nem menciono que o comércio em si é um hipermercado, com milhares de metros quadrados de área que permitiriam várias soluções. Todas elas muitíssimo melhores do que a que foi adotada. Mas, raciocínio parece ser artigo em falta há tempos…
De vez em quando baixa a Nora má em mim e desejo ardentemente que aqueles que projetam coisas sejam obrigados a usá-las. Refiro-me (outra ênclise, hoje estou terrível) a arquitetos que desenham casas impossíveis de se habitar ou móveis incômodos, engenheiros que constroem estradas que provocam acidentes em vez de evitá-los ou, no mínimo, apenas permitir o deslocamento de veículos e pessoas sem tentar matá-los e por aí vai. Assim como acho que políticos e ocupantes de cargos públicos deveriam usar apenas serviços públicos como escolas e assistência médica para si e para seus familiares — oquei, peguei pesado aqui, né? Mas, como disse, de vez em quando baixa a Nora má em mim e desejo para outros aquilo que eles me obrigam a usar…
Imaginem o engenheiro que fez a alça de acesso do Rodoanel em Alphaville ter de dirigir um caminhão várias vezes por semana para circular pela via? Acredito que em pouco tempo o traçado errado seria corrigido. O mesmo para as “otoridades” que aprovaram o projeto…
Mudando de assunto: esta é totalmente off-topic. O programa em questão é sobre obesos mórbidos nos meses antes a passar por cirurgias bariátricas. Não resisti à ironia do fato. Por quê? Leiam o pequeno texto…
NG