A previsão para esta segunda semana com o Volkswagen Gol 1.6 MSI automático era a estreia do álcool no tanque, que foi cumprida à risca neste que é carro mais vendido do catálogo da Volkswagen. Tal dado é referente aos emplacamentos durante o ano de 2018, e confesso que tal realidade, ser o velho Gol (mais de uma década sem mudanças profundas) o mais vendido dos VW faz pensar: o que será que falta aos mais modernos e/ou bem equipados up!, Fox e Polo (novo ou antigo) da marca para bater o veterano? Difícil responder…
Sem pensar muito, o motivo deve ser o mais simples de todos: o preço. O Gol é o Volkswagen mais acessível, único entre todos cujo preço está abaixo dos 50 mil reais considerando versões de entrada. Mas, seria este o único motivo? Acho que não. Acredito que o preço mais baixo ajuda bastante, mas há também fatores menos tangíveis como, talvez, o conservadorismo que acomete a quem precisa de um carro para trabalho e pauta sua escolha sem considerar critérios “entusiastas” como modernidade técnica, desempenho, design e, principalmente, o status entre vizinhos de garagem.
Apaixonados por carros, mas também meio avessos a novidade, brasileiros são um povo contraditório em suas escolhas. Afirmação esta que não se restringe à preferência pelo Gol face aos outros VW citados mas… como aqui o assunto é o Gol com álcool no tanque, vamos à ele!
Faço sempre questão de “secar” o tanque dos carros avaliados antes da mudança de combustível, e assim que o computador de bordo mostrou autonomia de 5 km, resolvi parar e abastecer. Aproveito a menção ao computador de bordo para alertar leitores que desconfiam da tecnologia empregada neste equipamento para relaxar e… aproveitar! Comparar o dado do computador com a clássica continha ao pé da bomba resultará em trabalho à toa, desconfiar que as fábricas ajustam tais equipamentos para serem otimistas é incorreto.
Desde sempre equipamentos de medição – qualquer um, da trena ao mais sofisticado dos paquímetros – estão sujeitos a uma margem de erro. Às vezes tal erro pode ser até benéfico. No caso dos velocímetros por exemplos, que podem marcar até 10% mais do que a velocidade real.
Quanto litros de álcool entraram no tanque? 54,96 litros, num tanque que, segundo a Volkswagen, cabem 55 litros, e aí cabe uma explicação: todos os fabricantes especificam capacidade nominal, não real, que é sempre maior que a nominal.O padrão da indústria é a capacidade real ser cerca de 10% maior que a nominal, e certamente havia mais do que 40 ml no tanque, claro.
Por que essa solução? É para não haver possibilidade de combustível fluir pela mangueira que sai do topo do tanque e vai até o filtro de carvão ativado contido num reservatório metálico mais conhecido por cânister. Tal equipamento é o controle, obrigatório há exatos 30 anos, de emissões evaporativas. Se chegar combustível ao cânister, e não apenas vapor de combustível, como previsto, o filtro encharca-se, perde sua função, e, pior, o combustível ali recolhido é aspirado pelo motor, enriquecendo a mistura ar-combustível de maneira descontrolada.
É exclusivamente por esse motivo que em todos os manuais de proprietário há a instrução de encerrar o abastecimento de combustível ao primeiro desarme automático do bico da mangueira da bomba. Inclusive, tornou-se lei paulista, a de número 16.656/18, de 13 de janeiro do ano passado.
Escrevendo sobre essa questão me lembrei do meu 1º ano de colegial, no Colégio Bandeirantes em São Paulo. Um professor de nome Décio dava aula de laboratório da matéria Teoria dos Erros. Em síntese, a aula consistia em medir, exaustivamente, peças com diversos instrumentos, micrômetros, paquímetros e outros para, ao final das diversas medições, chegar a um número que pudesse ser considerado a medida padrão da peça. Mas o alvo real da aula não era apenas descobrir dimensões, mas sim mostrar como o ato de medir sempre comporta um desvio, um erro, que tanto depende de quem mede como do instrumento medidor e até mesmo do que está sendo medido e quando, pois temperatura e pressão variam constantemente, alterando sólidos e líquidos.
Gostaria que todo esse discurso servisse para acalmar os leitores críticos dos sistemas de informação presentes nos atuais carros. A precisão destes sistemas é bem razoável, mas que como qualquer método, serve apenas para referência. Como me ensinou o estudo da Teoria dos Erros, a busca pela precisão exige mais do que uma única medição, exige método também. Para nosso assunto aqui, a avaliação de carros, o dado sobre consumo é e será sempre indicativo, e jamais absolutamente preciso.
Nesta semana usei o Gol durante 592 km dos quais 443 km na rodovia e 149 km na cidade (será mesmo que foi exatamente isso que rodei? Como acreditar no hodômetro e velocímetro? E a marcação das rodovias, será exata? Percebem a quantidade de variáveis?) e o dado obtido, consumo global de álcool indicado pelo computador de bordo, foi de 10,7 km/l, sendo a melhor marca 13,8 km/l andando comportadamente a 110 km/h em trecho de rodovia plano e sem curvas significativas, cifra que caiu a 11 km/l quando a pressa aumentou e as curvas apareceram. E na cidade? A pior marca foi de 5,8 km/l, para e anda das horas de pico de tráfego, média horária abaixo de 15 km/h. A melhor, quase 9 km/l rodando em horários calmos e com vias expressas no cardápio.
Segundo a Volkswagen, o motor EA211 que equipa este Gol conquista 10 cv a mais quando “bebe” álcool. Esse vigor não se percebe em uso normal, uma vez que 110 cv ou 120 cv são sempre razoáveis para empurrar um carro que pesa pouco — bem pouco, apenas 1.040 kg em ordem de marcha. Ou seja, um motor que faz sempre pouca força para levar a massa à frente e que conta com um parceiro de grande valor para tal: o câmbio automático de seis marchas com escalonamento preciso e ajuste impecável, em que a 120 km/h no velocímetro, em sexta marcha, ronrona a 2.500 rpm, mas que a 120 km/h “GPS”, ou velocidade verdadeira, a cifra sobe para 2.650 rpm.
O comportamento preciso da dupla motor-câmbio é, por enquanto, o item que considero ponto alto deste Gol, o mais apreciado de todos, mas que entrega não apenas desempenho especial, como também consumo baixo e conforto. Não se percebe o câmbio trabalhando a não ser prestando atenção e, assim, usar as borboletas no volante ou a alavanca para fazer trocas manuais, ao menos nas estradas que encarei (planas e com poucas curvas), é absolutamente desnecessário.
Quanto ao resto do conjunto, tendo acumulado quase que 34 horas ao volante e rodado mais de 1.000 quilômetros, posso confirmar que o ajuste de suspensão visa o equilíbrio. Há um razoável padrão de conforto sem que o Gol seja molengão. Quando o limite de velocidade de 120 km/h é superado abundantemente, mudanças abruptas de faixa de rolamento exigem pequena atenção.
Uma série de freadas fortes me deu conta da eficácia do sistema e me lembrou da opção VW por coxins grandes, que “trabalham” para isolar asperezas transmitidas pelo sistema de suspensão. Por isso, ao frear forte, há uma balançadinha longitudinal que em nada afeta a eficiência do sistema de freios, sendo apenas característica, não defeito.
Um aspecto observado na primeira semana, sobre o encosto do banco ter pouco apoio na base da coluna, foi minimizado ajustando o banco em posição mais alta. Minha coluna não sofreu em 600 km de viagem num só dia, mas o sistema de regulagem de altura exige, a rigor, sair do carro para conseguir elevar o assento ao máximo. Compensa tal característica estranha a regulagem micrométrica do encosto, precisa e prática.
O que faltou fazer ainda, visto que já rodei com gasolina e álcool, em rodovia e cidade? Falta lotar o Gol, colocar gente dentro e carga no porta-malas. Aliás, falando no compartimento de carga, precisei transportar um objeto grande — moldura de quadro com vidro — que deu chance para rebater o encosto do banco traseiro. Boa notícia é que o assento traseiro dobra para frente, permitindo ao encosto criar um plano uniforme, praticamente horizontal. Má notícia é a ausência de qualquer acabamento que proteja a espuma do assento e da proteção no espaldar do encosto que vira plataforma de carga, sem proteção. Outro pecadinho é não haver ganchos para fixar a eventual carga que pode ser levada no porta-malas, de pé ou estendida. Por outro lado, a cobertura plástica do porta-malas é de boa qualidade e fácil de tirar e ser recolocada.
O que mais? Calma: ainda faltam mais duas semanas e muito a conhecer do mais vendido Volkswagen do Brasil, um carro com uma história longa, há décadas no catálogo, e ainda longe de perder sua admirável eficiência. Na semana que vem volto para a gasolina, andar com o Gol lotado e ver o que acontece.
RA
Leia o relatório da 1ª semana
Volkswagen Gol 1,6 MSI automático
Dias: 14
Quilometragem total: 1.178 km
Distância na cidade: 550 km (47%)
Distância na estrada: 628 km (53%)
Consumo médio: 10,2 km/l (49,8% gasolina – 50,2 % álcool)
Melhor média (gasolina): 19,2 km/l
Pior média (gasolina): 8,7 km/l
Melhor média (álcool): 13,8 km/l
Pior média (álcool): 5,8 km/l
Média horária: 34,8 km/h
Tempo ao volante: 33h52 minutos
FICHA TÉCNICA VW GOL 1,6 MSI AUTOMÁTICO 2019 | ||
MOTOR | ||
Designação | EA211 R4 MSI 1,6 | |
Descrição | 4-cilindros, transversal, bloco e cabeçote de alumínio, duplo comando de válvulas, variador de fase na admissão em 50º, 4 válvulas por cilindro, atuação indireta por alavanca-dedo roletada com fulcrum hidráulico, correia dentada, flex | |
Diâmetro x curso (mm) | 76,5 x 86,9 | |
Cilindrada (cm³) | 1.598 | |
Taxa de compressão (:1) | 11,5 | |
Potência máxima (cv/rpm, G/A) | 110/120/5.750 | |
Torque máximo (m·kgf/rpm, G/A) | 15,8/16,8/4.000 | |
Comprimento de biela (mm) | 140 | |
Relação r/l | 0,31 | |
Corte de rotação | 6.600 (teórico, sobe marcha a 6.200 rpm) | |
Formação de mistura | Injeção no duto | |
Gerenciamento do motor | Simos 15 | |
TRANSMISSÃO | ||
Câmbio | Transeixo dianteiro com câmbio automático epicíclico Aisin AQ 160-6F de 6 marchas marchas à frente mais ré, tração dianteira | |
Relações das marchas (:1) | 1ª 4,667; 2ª 2,533; 3ª 1,556; 4ª 1.135; 5ª 0,859; 6ª 0,686; ré 3,394 | |
Relações do eixo motriz (:1) | 3,502 | |
SUSPENSÃO | ||
Dianteira | Independente, McPherson, braço triangular, mola helicoidal, amortecedor pressurizado e barra estabilizadora de Ø 19 mm | |
Traseira | Eixo de torção, mola helicoidal e amortecedor pressurizado | |
DIREÇÃO | ||
Tipo | Pinhão e cremalheira, assistência hidráulica | |
Diâmetro mín. de curva (m) | 10,9 | |
Relação de direção (média, :1) | 14,9 | |
N° de voltas entre batentes | 2,9 | |
FREIOS | ||
De serviço | Hidráulico, duplo-circuito em diagonal, servoassistido a vácuo | |
Dianteiros (Ø mm) | Disco ventilado/256 | |
Traseiros (Ø mm) | Tambor/200 | |
Controle | ABS (obrigatório) e distribuição eletrônica das forças de frenagem | |
RODAS E PNEUS | ||
Rodas | Aço 6Jx15 | |
Pneus | 195/55R15H | |
Marca e tipo no carro testado | Goodyear Efficient Grip | |
Estepe temporário | Roda de aço 5Jx14, pneu 175/70R14T Goodyear Efficientgrip | |
PESOS (kg) | ||
Em ordem de marcha | 1.040 | |
Carga máxima | 460 | |
CONSTRUÇÃO | ||
Tipo | Monobloco em aço, sedã hatchback 4-portas, 5 lugares, subchassi dianteiro | |
AERODINÂMICA | ||
Coeficiente de arrasto (Cx) | 0,373 | |
Área frontal (m²) | 2,04 | |
Área frontal corrigida (m²) | 0,761 | |
DIMENSÕES EXTERNAS (mm) | ||
Comprimento | 3.892 | |
Largura sem/com espelhos | 1.656/ 1.893 | |
Altura | 1.474 | |
Distância entre eixos | 2.467 | |
Bitola dianteira/traseira | 1.423/1.411 | |
Distância mínima do solo | n.d. | |
CAPACIDADES (L) | ||
Porta-malas | 285 | |
Tanque de combustível | 55 | |
DESEMPENHO | ||
Aceleração 0-100 km/h (G/A, s) | 10,7/10,1 | |
Velocidade máxima (G/A, km/h) | 179/185 | |
CONSUMO DE COMBUSTÍVEL INMETRO/PBEV | ||
Cidade (km/l, G/A) | 11,1/7,7 | |
Estrada (km/l, G/A) | 13,6/9,6 | |
CÁLCULOS DE CÂMBIO | ||
v/1000 em 6ª (km/h) | 45,3 | |
Rotação em 6ª a 120 km/h (rpm) | 2.650 | |
Rotação em vel. máxima, 5ª (rpm) | 5.100 |