Nessa semana rompemos a barreira dos 400 mil inscritos no canal do YouTube. E mais do que agradecer a todos, vou contar minha história através de uma bela produção do canal One 50 Racing. O texto segue o roteiro do filme, mas tem algumas coisas a mais.
Pois bem, a minha paixão por carros começou ainda na gestação. Meus pais tinham um Dodge Charger R/T e minha mãe guiou grávida durante vários meses. E naquele 2 de junho de 1979 saí da maternidade a bordo desse clássico nacional. Diz a lenda que parei de chorar só para ouvir o ronco compassado do V-8.
De qualquer forma, desde os primeiros anos a minha ligação com carros ficou clara. Brinquedos relacionados ao tema. Decoração de quarto. E foi evoluindo com o passar do tempo. Me lembro de sentar atrás do banco do motorista antes de ir para a escola ou alguma viagem e ficar simulando a troca de marcha e entendendo como aquilo tudo funcionava. Tenho memórias bem vivas nesse sentido.
Uma passagem curiosa sobre isso é que em casa sempre teve revista de carro. Então desde muito cedo comecei a folhear, ver as fotos, e sentir aquele cheiro peculiar da impressão dos anos 80. E nesse momento eu passei a desenhar naqueles pratinhos de papel de aniversário os volantes que eu via nas revistas e os carros de casa também. E dava uma impressão mais real, que eu estava guiando atrás do banco.
Aí por volta de seis ou sete anos ganhei um volante de presente. Tinha câmbio na coluna e você podia colocar ele na parede. De qualquer forma eu passava um bom tempo no sofá guiando por estradas imaginárias, dando volta na cidade, estacionando em algum lugar de casa e deixando o volante lá. Esse volante ficou comigo até 2001 como recordação. Mas poderia ter guardado.
Acho que gostar de carros para mim sempre foi algo bastante sensorial. Por volta dos 10 anos mais ou menos tinha uma Quantum a álcool em casa. E lembro que eu tomava o café da manhã rápido e descia correndo porque minha mãe me deixava esquentar o carro. Para quem é mais novo talvez não vá entender mas era uma necessidade crucial nos carros a álcool com carburador. E eu dava partida e fica sentindo aquele cheiro delicioso do álcool e vendo a fumaça branca sair pelo escape. Nada de catalisadores que, vale lembrar, tinham um cheiro bem ruim.
E nesse campo sensorial provavelmente surgiu a ideia, mesmo de forma inconsciente na época, da Garagem. A minha relação com elas começou cedo. Minha mãe, sempre ela, me deixava colocar a chave para abrir o portão do prédio, algo comum na década de 70 e 80 com menos insegurança, e para sair eu puxava uma cordinha. Depois nós moramos em um edifício grande em Araraquara chamado Vila do Sol e a garagem era enorme. Não somente para minha visão de criança. É algo bem legal.
E daí vem uma memória que eu acho fantástica: o cheiro da garagem. Talvez seja a combinação de borracha, algum pouco de óleo respingado, o fato de ser subterrânea, enfim, aquilo ficou na minha mente e, curiosamente, só sentia quando era criança. Parecia algo meio mágico.
Agora eu vou aproveitar e dar um pulo no tempo. Quando nos mudamos para São Paulo, em 2001, eu estudava Direito. Não foi exatamente minha escolha, mas era uma carreira que trazia várias opções, apesar da minha vocação natural para algo relacionado à comunicação. Mas mesmo assim me formei dois anos mais tarde.
E em 2004, após escrever uma matéria sobre os então 40 anos do Mustang, resolvi que seguiria outro caminho. A fotos só começariam em 2006. Foi algo que evoluiu para uma primeira matéria no ano seguinte e a criação de um blog. O nome, claro, “Na Garagem”, com toda essa carga emotiva que já comentei.
O trabalho foi crescendo e naquela época não conhecia absolutamente ninguém no meio. Um colecionador, meu primeiro contato, acabou se tornando um amigo e um elemento-chave para esse início difícil. Afinal, não espere que alguém abra a sua garagem para você sem uma boa indicação. E faz todo sentido, claro.
O início no YouTube foi curioso. Aliás, o site era bem vazio, quase analógico, fazendo uma comparação com os carros. Comecei usando as fotos que tirava e fazendo slide shows com música. Naquela época também não havia essa questão de direitos autorais das músicas tão desenvolvido.
Mas a coisa evoluiu. Logo estava fazendo vídeos bem simples apenas para complementar as fotos e textos. Mostrava externamente sem dizer nada e o proprietário dava uma volta sem aparecer e depois saía com o carro. Um take para tudo.
A partir de 2011 achei que era hora de mudar. E esse sem dúvida foi um momento crucial para a “Garagem”. Comecei a apresentar. Não fazia ideia de como desenvolver ou me comportar em frente à câmera. Mas fui mesmo assim porque na vida a gente tem que ir para cima e enfrentar os medos e receios para buscar algo diferente.
E deu certo, apesar de que em muitos vídeos a apresentação é bastante robótica. Mas eu me divirto assistindo novamente e lembrando dos detalhes. Na época, inclusive, eu fazia um roteiro com frases fixas, algo que ficava bem claro e me parecia bacana. Mas o tempo foi mostrando outras necessidades.
Eu acho que o segredo do YouTube é você ser autêntico. Ou seja, o importante é ter um estilo e, a partir desse ponto, você começa a se desenvolver a aperfeiçoar aquilo. É um trabalho que leva tempo, porém é muito prazeroso ver a evolução da postura, da forma de dizer as coisas, da naturalidade. Com o passar dos anos trabalhei gravando com profissionais de áudio e vídeo em algumas produções que participei e, mesmo com uma equipe enorme ou enxuta, eu sempre olho para a lente e vejo a minha primeira câmera. É algo meio surreal, como se eu me desligasse e voltasse no tempo lá em 2011. E a coisa vai fluindo.
Viver com o YouTube não é fácil. As métricas e algoritmos são algo desconhecido para nós. Mas felizmente seguimos acelerando. O importante é manter o ritmo (atualmente quatro matérias por semana) e, essencial aliás, é manter a sua identidade, como falei há pouco. Tudo que foi feito na “Garagem” até hoje teve uma lógica, um sentido e uma coerência. Não perca seus princípios.
Muita gente não sabe mas sigo a máxima do Fellini, ou seja, uma câmera na mão e uma ideia na cabeça. Não tenho equipe e faço a produção toda, da captação à edição final. É cansativo, mas também me dá uma grande satisfação de ver que o público gosta e entende nossas pautas. Eu recebo um retorno legal quando encontro nossos seguidores em algum evento ou andando na rua com o Opala, o Fusca ou o Mercedes.
Aliás, escolhi ele para ilustrar minha história aqui. Uma versão que também foi um divisor de águas para a marca e um ícone da esportividade com o cabeçote Cosworth. E fica minha homenagem também ao eterno Ayrton Senna, vencedor da Corrida dos Campeões a bordo de um exemplar idêntico, porém com câmbio manual.
Minha última mensagem é uma síntese do que falei aqui: seja autêntico, siga seu estilo e persista, porque a vida é como uma prova de endurance, tem percalços mas o que vale é saber que você fez o máximo pra seguir até a linha de chegada.
GDB