Com infinitamente muito menos visibilidade do que as campanhas “Vidas negras importam” ou “We race as one” uma pequena parte da Fórmula 1 está numa justíssima campanha para que não se use o celular ao volante. Chama-se “It can wait” (pode esperar, em tradução livre). Não é uma iniciativa da categoria como um todo, mas irônica e responsavelmente, é patrocinada por uma gigante das telecomunicações, a AT & T. A equipe Red Bull está apoiando e postou em seus websites diversas mensagens de apoio explícito (foto de abertura). No domingo, deu para ver diversas placas no circuito de Abu Dhabi com os dizeres “It can wait”.
Certamente não tem o apelo moral ou politicamente correto das outras, mas tem um enorme fundamento: usar o celular ao volante é extremamente perigoso. Não estamos falando (nem eu nem a F-1) em não usar o Bluetooth ou dispositivos de viva-voz, mas sim de tirar a vista do caminho para ler mensagens ou mesmo digitar. Diga-se de passagem, escrever no espertofone enquanto se dirige é um apelo na linha “todas as vidas importam”, independentemente de cor ou qualquer outra coisa. Pronto, abri as portas do inferno. Me julguem.
Um dado interessante (sim, DataNora ataca novamente) é que 57% das pessoas estão dispostas a deixar de se distrair ao volante se um amigo ou carona pedir, segundo pesquisa feita pela empresa especializada Kantar em 2018. Ou seja, mais da metade espera apenas que alguém lhe diga que tem de fazer algo certo. É meio absurdo do ponto de vista lógico, mas como dado para uma campanha é excelente. É como se houvesse um enorme público à espera de que alguém dê o pontapé inicial.
Acho extremamente importante este tipo de campanha e infelizmente não tem tido a menor repercussão nas mídias. Exceto Verstappen e Albon, não vi nenhum piloto fazer como Hamilton fez com o “vidas negras importam” — sequer o próprio levantou um dedinho ou mencionou isso em algum dos zilhões de entrevistas que dá. Não começou nenhuma campanha em suas redes sobre o assunto — embora em plena bandeira vermelha no Bahrein tenha corrido às suas mídias sociais para postar comentários sobre o acidente do Romain Grosjean. Outros pilotos tentando informações sobre o estado do piloto francês e o inglês viu no fato mais uma oportunidade de tuitar algo. Lamentável.
Como alguns dos meus leitores sabem, O-D-E-I-O mensagens de áudio por WhatsApp. Pessoalmente, só os tolero quando se trata de alguém pouco ou nada alfabetizado, como marceneiro, jardineiro, pedreiro e faxineira e sei das dificuldades que eles têm para escrever. Tenho também no rol de exceções uma pessoa queridíssima que mora na Argentina. Ela foi nossa empregada durante alguns anos, mas virou pessoa da família desde o início.
Quando viemos para o Brasil, ficou trabalhando na casa da minha tia e mesmo depois, quando se aposentou, esta senhora tomava conta da casa deles nas férias e dormia no quarto dos meus tios — apenas para que houvesse movimentos e luzes na casa. Anos depois minha irmã ficou doente, minha mãe ligou para ela, que morava em outro estado. Ela na primeira hora do dia seguinte se despencou até Buenos Aires para cuidar da minha irmã, antes mesmo de ter acertado valores ou mesmo a passagem com minha mãe, que era quem estava pagando tudo. Ficou uns dois meses, até que minha irmã se recuperou.
Ela sentava à mesa com a gente em todas as refeições (o mesmo na casa da minha tia) e por alguns anos a filha dela também, que veio morar conosco. Sentávamos para ver televisão todas juntas. Até hoje me chama de “Norita” e eu a trato pelo nome, mas “senhora”.
Hoje ela tem quase 90 anos e acho maravilhoso que tenha um celular e o use, ainda que não conheça todas as funcionalidades. Como pedir para ela digitar? Fora que adoro ouvir a voz que escuto desde meus 8 anos de idade. Mas digamos que é a exceção da exceção da exceção. Até hoje quando vou a Buenos Aires ela vem me visitar na casa da minha tia e já me mandou canjica de milho já preparada, pois sabe que adoro e fazia para mim quando eu era pequena. Ela achava que não tinha no Brasil. Ela me manda mensagens de voz a cada 10 dias, mais ou menos, e eu respondo por escrito.
Mesmo entre os prestadores de serviços, sou seletiva. Se a criatura tem um pouco mais de educação formal, devolvo com uma mensagem “não escuto mensagens de áudio. Favor digitar”. Certamente fiz vários inimigos com isso, mas não me importo.
Uma pessoa chegou a me responder: “Você precisa trocar de celular, kkkkkkkk”. Pensa em alguém bravo! Euzinha. Mandei uma resposta de um monte de linhas explicando por que não escuto mensagens de áudio: 1) nem sempre estou num lugar onde posso escutar, como é o caso de cabeleireiro, com secador funcionando, na rua ou em reunião. 2) se estou em reunião, consigo dar uma rápida olhada numa mensagem de texto, e até mesmo responder, mas como fazer isso com uma de áudio sem parecer mal educada? 3) mensagens de áudio ocupam memória no celular. Ao contrário das de texto, que quando você apaga do uotizápi somem para sempre, as de áudio devem ser baixadas e ficam na pasta de downloads. Mesmo para apagá-las de lá, você tem de ouvir uma por uma. 4) falta objetividade. Recebo mensagens de 2 minutos 30 segundos, às vezes 4 minutos. Quando peço que digitem, o recado tem não mais do que 2 linhas. E fica perfeitamente compreensível. No áudio a pessoa fala: então… eu pensei que… aí ela me disse que… 5) não se tem o histórico da mensagem. Quando preciso de alguma informação que recebi digitada é só ir no “pesquisar” e colocar uma palavra-chave que, shazam!, vem todas as que mencionam isso. No áudio, você tem de lembrar quem mandou, quando e, ainda por cima, ouvir uma por uma pois não há título nem referência. 6) não tem clareza e muitas vezes geram confusões desnecessárias. Canso de receber mensagem de áudio com dados como endereço comercial ou de e-mail, mas tem gente que não soletra ou não o faz com clareza e você envia mensagem para o endereço errado ou vai para a rua errada. Por escrito não tem engano. 7) não evitam que o receptor tenha que digitar. O que fazer quando alguém revisa um texto e manda as alterações por áudio? Aí, quem recebe, tem de digitar tudo de novo. Se viessem por escrito, era só copiar e colar. 8) sigilo. Deveria ser óbvio: ninguém tem nada a ver com minhas mensagens, e no áudio é muito difícil evitar que outros escutem.
Ultimamente tenho recebido como resposta às minhas mensagens escritas, mensagens de áudio. Claro que disparo imediatamente o tal “não escuto mensagens de áudio…”. Aí, o mais absurdo: “É que estou dirigindo”. Xingo muito, muito mesmo, claro que sozinha. O que leva uma pessoa a ler um recado de uotizápi escrito, que é como foi o meu, enquanto está dirigindo? E depois ainda responde, por escrito, a explicação de por que mandou áudio? Acho surreal. Desnecessário. Espera e responde quando estiver em condições de fazê-lo. Não é óbvio?
Evidentemente deixo de saber muitas coisas nos grupos dos quais participo porque não escuto os áudios. Sinceramente? Não fazem falta. Se a pessoa não se dá ao trabalho de digitar, eu não preciso me dar ao trabalho de ouvir. Fora que existem (eu sempre indico) programas de espertofone que escrevem o que lhes é dito. Assim, quem tem preguiça de digitar pode fazer uso de um desses. Facinho!
Espero que se dê mais visibilidade à iniciativa “It can wait”. É justa e salvaria vidas. Sei que não está na moda, mas gostaria de ver pessoas que realmente se importam com os outros repercutirem essa campanha. Seria coerente, não?
Mudando de assunto: o último GP de Fórmula 1 foi deveras chatinho. Depois de várias corridas sensacionais ao longo do ano, terminamos com uma totalmente esquecível. Acho que passarei meu período de abstinência de corridas vendo vídeos da corrida de Portimão, as do Bahrein… tem várias para escolher. Para mim foi especial ter visto o circuito onde estive há um par de anos, inclusive o maravilhoso hotel Viceroy, onde fiquei. Como sempre digo, nossa extensão de viagem a Abu Dhabi foi daquelas idéias que justificariam um segundo pedido em casamento por parte do meu marido. Noratur mandou muito bem daquela vez.
NG