Quando no dia 18 de novembro do ano passado decidi escrever sobre perrengues com locadoras, parei num determinado momento para que a coluna não ficasse por demais longa. Mas algumas coisas ficaram de fora e, ao escrever as respostas aos comentários (uma das minhas partes favoritas, o contato com os leitores) acabei lembrando de mais algumas. Por isso, volto aqui a um tema que me é muito caro, embora seja motivo de alguns dissabores. Não posso negar que reservar um carro para alugar (foto de abertura) e ter que sair com um “similar” não tenha lá suas vantagens: amplio, e muito, meu vocabulário em qualquer idioma. Treino paciência. Pago karma para não reencarnar novamente. E provavelmente outras coisinhas que nem sei e provavelmente não deveria escrever neste nobre espaço.
Anos atrás, meu marido Ricardo foi a trabalho a Cancún — sim, já sei o que parece, mas ele também foi a Las Vegas a trabalho e eu fiquei uma semana ouvindo piadinhas a esse respeito. Acredito nele e há muitas testemunhas do fato. Bom, ele teria que trabalhar uns quatro ou cinco dias e ia com quatro colegas de trabalho que também eram amigos. Todos resolveram esticar até o final de semana, por conta própria, para passear pela Riviera Maia.
A viagem começou atribulada. Depois de anos de pagar passagens aéreas na classe executiva, os cinco iam de econômica. Culpa de contenção de despesas, mas até mesmo o presidente da empresa em que os cinco trabalhavam deixou a primeira classe que frequentava para, teoricamente, ir de simples classe econômica — embora certamente as empresas aéreas lhe davam upgrade para a primeira classe, mas isso é apenas uma dedução minha. Um dos amigos do meu marido teve uma brilhante ideia: reservar os cinco assentos do meio, pois segundo ele, normalmente não eram ocupados, assim poderiam se espalhar no avião e ficar mais confortáveis. Eu sei, nunca entendi por que alguém achou que aquilo fazia sentido, principalmente em se tratando de cinco marmanjos com 1,80 m ou mais, mas o fato é que assim foram. Claro que o voo lotou e os cinco ficaram espremidos e, para piorar, na última fileira que reclinava apenas uns 5 centímetros.
O trabalho no México foi tudo OK. Bem corrido, como era sempre, e o mesmo sujeito que teve a ideia dos assentos no avião ficou encarregado de reservar na locadora o carro para o final de semana. Deu ruim, parte II. Só tinha Fusca. Imaginem, caros leitores, cinco adultos num Fusca. Mas naquela viagem nada dava tão errado que não pudesse piorar. Só tinha Fusca cabriolet. — não o conversível, mas o de teto solar de lona. Resignados, reservaram o carro. Sábado de manhã, descem os cinco e se encontram no pátio da locadora, que ficava no mesmo hotel. Para desespero de todos o carro não era apenas um Fusca. Novamente: era cabriolet. E era rosa choque. E era o último da locadora. Reclamaram o quanto puderam na locadora, mas era o único veículo disponível e era pegar ou largar. Meu marido, menos irritado do que os outros, resolveu fazer do limão uma limonada e tirou uma foto ao lado do possante e mandou para mim. Mas rapidamente sentou-se no banco do carona. Se era para passar vergonha, pelo menos que fosse como passageiro e sem se espremer com outros três no banco traseiro. Dos outros não há provas que sequer tenham andado naquele carro e por uma questão de amizade não darei os nomes.
Imaginem rodar 130 quilômetros, entre Cancún e Tulum, desse jeito. Era um tal de ser ultrapassados por caminhões com mexicanos gritando um monte de coisas que não vou reproduzir, acenando e buzinando para eles. Fora os ônibus de linhas domésticas com quem cruzavam o caminho. Na ida e na volta.
E ainda restava o aluguel de domingo que já havia sido reservado. Na volta de Tulum, os cinco estavam mais do que furiosos e pelo menos garantiram um Fusca azul para o domingo que acabara de ser devolvido. E no dia seguinte foram todos para Cozumel sem passar vergonha — apenas passaram inveja, pois meu marido dormiu no catamarã e os outros quatro, assim como quase todos no barco, enjoaram e odiaram minha cara metade, que acordou lépido e faceiro ao chegar a Cozumel enquanto os outros estavam amarelos e haviam vomitado até o que haviam comido na semana anterior. Mas desse segundo Fusca não tenho fotos, pois estavam todos bem zangados e se houvesse algum registro provavelmente seria o de quatro sujeitos esganando um quinto.
Às vezes as dores de cabeça são questão de falta de planejamento. Anos atrás aproveitamos uma promoção da Air France. Pelo preço de uma passagem normal, classe econômica, na baixa temporada, São Paulo-Paris, ganhava-se uma semana de hotel para duas pessoas, na capital francesa, com café da manhã e impostos incluídos e, supremo bônus, um mês de leasing de um Renault zero-quilômetro. Lembro que era um sedã médio a diesel, mas não lembro qual modelo.
A promoção era mesmo imperdível e lá fomos nós, para cinco semanas de férias. Em tempos de pandemia, mal me lembro como era viajar e especialmente como era viajar por tanto tempo e para tão longe. Rodamos toda a França num belo roteiro que fiz com a ajuda do meu amigo Pablo que tem uma agência de viagens e providenciou tudo. Pela duração da viagem, claro, tivemos que fazer a primeira revisão do carro. Mas fomos avisados na hora da compra das passagens e havia várias cidades onde podíamos executar o serviço que, de resto, levou um par de horas apenas. Nada que fosse um problema e, pelo preço do pacote inteiro, foi um supernegócio.
A revisão em si foi feita em um par de horas e nem saímos da concessionária. Tudo com hora marcada, rigorosamente pontuais (característica que adoro nos franceses) e seguimos nosso Tour de France. Sei de gente que passou dificuldades com revisão de carros, mas a nossa foi perfeita. Novamente, acho o planejamento fundamental nessas horas, como estar numa cidade onde houvesse concessionária para fazer a revisão e agendar o horário que nos era mais conveniente.
Bem, em termos de pagar mico com carro alugado, nada supera minha viagem ao noroeste da Argentina e ao Atacama chileno, já contada neste espaço. Mas, ainda assim, depois de ter passado duas noites dormindo de favor na Gendarmería argentina em Paso Sico, a viagem foi maravilhosa. Fusca cabriolet cor-de-rosa depois de pouco tempo virou motivo de brincadeira e mais uma história divertida de viagem que agora parecem tão longínquas e que não vejo a hora de retomar.
Mudando de assunto: esta piadinha me lembrou outra, sobre qual seria a maior cidade da Alemanha — uma tal de Ausfahrt (“saída” em alemão), já que toda estrada leva a ela.
NG