Cá estou de volta, depois de um triste intervalo. Agradeço as palavras carinhosas de tantos leitores. Bem, vamos ao trabalho.
Segunda-feira assisti uma boa entrevista com Nélson Piquet. Ele é sempre uma surpresa pela sinceridade e, por mais que conheça sobre a carreira e a vida dele, toda vez aprendo algo. Desta vez, gostei de ver confirmada a história de que na noite da véspera da corrida de Super Vê em Goiânia, nos idos de 1974, ele realmente pulou o muro do boxe para fuçar no carro do Ingo Hoffmann para checar algo motor do “Alemão”, segundo ele, o que é que ele poderia estar fazendo de errado no próprio carro. Essa é uma característica que adoro não apenas no Piquet, mas em pilotos como o jovem Leclerc — a humildade. O sujeito é um grande mecânico, mas achou que poderia estar fazendo algo a menos.
Houve outras coisas interessantes, e quem quiser encontra aqui a íntegra da entrevista. É claro que eu tinha várias perguntas que gostaria de ter feito, mas apenas meu marido ficou sabendo delas. Uma coisa que me chamou a atenção, e da qual gostei muito, foi o destaque que o jornalista Celso Miranda deu à vida depois das pistas do empresário Nélson Piquet. De fato, a carreira do tricampeão é mais conhecida e exaltada, mas poucos lembram do que ele vem fazendo depois que ele deixou os cockpits. Nas palavras do ex-piloto “Eu me diverti até os 40 anos. A partir daí é que comecei a trabalhar”. Tem coisa melhor do que se divertir com a própria profissão? E não deixa de ser interessante alguém se divertir arriscando, literalmente, a própria vida.
A primeira vez que vi Piquet foi pouco depois da batida os treinos em Indianápolis, já nos primeiros passos (trocadilho horroroso tendo em vista o acidente nos EUA que acabou com o pé dele) como empresário. Fui entrevistá-lo justamente por seu papel dentro da área de logística, então incipiente. Trabalhava eu num grande jornal diário e já era fã de Fórmula 1 e especialmente dele. Confesso que achei loucura alguém que poderia morar em qualquer país do mundo voltar para o Brasil, investir seu dinheiro aqui mesmo e, ainda, trazer toda a filharada para que completassem seus estudos e morassem aqui. Eu mesma provavelmente não faria isso, nem naquela época nem nos anos subsequentes. Esse fato despertou minha curiosidade e fui pesquisar quais foram os rumos de alguns pilotos depois da aposentadoria.
Mas ex-Fórmula 1 é um bicho estranho. Depois que deixam as pistas eles tomam rumos muito diferentes. Alguns, é claro, continuaram ligados ao automobilismo. Disputaram campeonatos em outras categorias, como Nannini, Villeneuve, Barrichello, Fittipaldi ou Mansell, ou viraram executivos de equipes de corrida, como Prost, Stewart ou Andretti, ou, ainda, comentaristas de automobilismo, como Hunt, Laffite, Burti, Coulthard, Brundle ou Herbert. Mas vou focar naqueles que saíram deste círculo. Também não vou discorrer sobre aqueles que se aposentaram e voltaram às pistas de F-1, como Räikkönen, Schumacher, Alonso, Massa ou Kubica. Vários se dedicaram a gerenciar a carreira automobilística de filhos, como Scheckter, Prost, Alesi, Piquet e Fittipaldi. E, claro, alguns fizeram várias coisas, como voltar à F-1, virar dirigentes de equipe, investir na carreira de filhos e investir em negócios fora do circo, como Prost. Então aqui menciono apenas os pilotos depois que deixaram não apenas a F-1, mas também outras categorias de automobilismo, motociclismo, corridas de caminhão, barco, qualquer coisa.
Piquet continuou ligado às pistas e investiu na carreira de 5 dos 7 filhos, mas o dinheiro disso veio dos lucros das empresas dele de logística e rastreamento de veículos, a Autotrac, área em que foi pioneiro.
Alessandro Nannini, outro ex-piloto de Fórmula 1 e, coincidentemente colega de Piquet na Benetton, tem uma rede de cafés na sua Itália natal, como já contei aqui neste espaço.
O escocês David Coulthard, além de comentarista de F-1 da BBC, é dono de hotéis em Londres, Suíça e Mônaco.
O irreverente irlandês Eddie Irvine foi para o ramo imobiliário. Investiu em casas de férias e de praia na Flórida (EUA) e num complexo de luxo no Caribe, entre outros.
Algo que era bastante frequente alguns anos atrás, e até parece bastante óbvio, era virar concessionário de carros. O argentino pentacampeão Juan Manuel Fangio abriu uma concessionária Mercedes-Benz na sua cidade natal, Balcarce. Anos depois, foi nomeado presidente da Mercedes-Benz Argentina.
Outros ex-pilotos deram asas (outro trocadilho meio infame, mas irresistível) à paixão por aviões. O belga Thierry Boutsen, em sociedade com a própria esposa, abriu a Boutsen Aviation, uma muito bem-sucedida revenda de aviões e helicópteros baseada em Mônaco. O austríaco tricampeão Niki Lauda, apaixonado por pilotar aeronaves, era dono da Lauda Air, renomeada Austrian myHoliday, uma companhia de transporte aéreo.
Entre os empreendimentos mais, digamos, saborosos, está o pouco conhecido ex-piloto da Minardi, Paolo Barilla. Sim, o sobrenome é mais famoso do que o ocupante do cockpit. Em 1990, depois de tentar sem sucesso se classificar em diversas corridas e perder espaço até para seu companheiro Pierluigi Martini, Barilla se aposentou e foi cuidar da fábrica de “pasta” da família, da qual se tornou vice-presidente.
Algo pouco frequente são as incursões na política. O discretíssimo argentino Carlos “Lole” Reutemann mostrou seu talento nas pistas (embora não tenha conseguido ser campeão) e fora delas. Foi um competente governador de sua província natal, Santa Fe, por dois mandatos e é senador desde 2003. Atualmente, aliás, enfrenta sérios problemas de saúde.
Outro rumo, digamos, diferente, foi o seguido pelo campeão sul-africano de 1979 Jody Scheckter (foto de abertura). Ao deixar as pistas, criou uma empresa de simuladores para treinamentos militares. Doze anos depois a vendeu por uma fortuna e comprou uma megafazenda na Inglaterra, onde cria gado leiteiro e produz alimentos orgânicos — mas no lugar também mantém um galpão com os 12 carros com os quais competiu na F-1 e também alguns que utilizou antes de chegar a essa categoria.
O obscuro piloto luxemburguês Bertrand Gachot alcançou mais sucesso fora das pistas do que dentro delas. Quando se aposentou das corridas, começou a distribuir na França a bebida energética Hype. A iniciativa foi tão bem-sucedida que no ano 2000 ele comprou a empresa.
Assim como dentro das pistas todos estes pilotos alcançaram resultados tão diferentes entre si, fora delas escolheram rumos muito diversos. Em comum apenas o sucesso — o que confirma minha teoria de que para pilotar um bólido de F-1 não basta ter talento e, ultimamente, dinheiro. Tem de ter, principalmente, cérebro.
Mudando de assunto: Acabei conhecendo o Azerbaijão por causa da Fórmula 1, pois fui de férias para lá depois de ver uma corrida pela televisão e fiquei apaixonada pelos lugares em que estive e especialmente pela capital, que considero uma das cidades mais lindas do mundo, como já contei neste espaço. Adoraria voltar lá. A corrida de Baku mereceria uma coluna inteira, pois embora não seja especialmente fã de circuitos de rua, gosto muito deste, com muitos lugares de ultrapassagem, subidas, descidas e aquele lindíssimo retão que, ao vivo é ainda mais lindo pois fica ao lado de um parque maravilhoso que margeia o mar Cáspio. Estou gostando muito do Max Verstappen este ano e o Giovinazzi largou no melhor estilo Kimi Räikkönen e passou cinco carros na primeira volta — três antes da primeira curva. O Vettel parece ter renascido e, claro, é sempre bom ver um pódio diferente daquele ao qual já estávamos acostumados.
NG