Esta semana continuo escrevendo sobre pais e filhos na Fórmula 1 — nem sempre as duas gerações correram nessa categoria e mantenho o critério usado semana passada neste espaço. Mesmo sendo bastante frequente que herdeiros da mesma família se encontrem nas pistas, os resultados são bastante díspares entre si. Mas há casos de campeões mundiais seguidos, como Graham e Damon Hill e Keke e Nico Rosberg. No entanto, há muitos filhos que não alcançaram o mesmo sucesso dos pais, como Jack e David e Gary Brabham, Mario e Michael Andretti e casos de filhos que superaram os pais, como Max e Jos Verstappen.
Novamente, o critério adotado para aparecerem nesta lista é o aleatório: depende da minha memória. Não há razão cronológica, de talento nem de número de títulos. E, como são muitos, termino na semana que vem. Prometo. Ou pelo menos prometo tentar…
Gilles e Jacques Villeneuve (foto de abertura)
É claro que como fã incondicional de Gilles Villeneuve, o primeiro nome que cito é o dele e do filho, Jacques. O pai jamais chegou a conquistar um campeonato, mas é muito provável que tivesse conseguido algum. Talento e arrojo tinha de sobra, além de um carro muito veloz. Gilles disputou somente 68 grandes prêmios de F-1 (67 largadas), mas obteve 6 vitórias —impressionantes quase 10% — além de 13 pódios. Fez uma única corrida pela McLaren (Silverstone, em 1977) e todas as outras pela Ferrari, onde até hoje é considerado um ídolo. É fato que quebrava muitos carros e sofria acidentes, mas isso fazia parte do espetáculo que era vê-lo dirigir. Era o próprio piloto em estado puro. Morreu muito jovem, no início de sua sexta temporada na categoria (embora na primeira tenha disputado somente três corridas) e aos 32 anos. Em sua terceira temporada já havia sido vice-campeão, ano em que seu companheiro de equipe, Jody Scheckter, levou o título.
Jacques tinha acabado de completar 11 anos quando seu pai morreu na pista de Zolder, num treino de F-1 em maio de 1982, deixando a esposa Joanne, sua grande incentivadora, e a filha Melanie. Estreou na Champ Car (então Indy) em 1994 e já no ano seguinte ganhou o campeonato e a 500 Milhas de Indianápolis por 2 segundos de vantagem sobre Christian Fittipaldi. Em 1996 foi para a F-1, onde conquistou a pole position em sua primeira prova e foi vice-campeão naquele ano. No ano seguinte, sagrou-se campeão mundial de F-1. Ficou na F-1 até 2006 e depois correu na Fórmula E, Nascar Xfinity Series, Nascar Truck Series e Nascar Cup Series e Indy Car, mas sem resultados relevantes. O quinto (sim, quinto) filho de Jacques, nascido em janeiro deste ano, se chama Gilles.
Keke e Nico Rosberg
Mesmo tendo sido o terceiro piloto finlandês na F-1, provavelmente Keke Rosberg tenha sido o pioneiro da lista de famosos corredores daquele país, embora tenha nascido na Suécia. Estreou tarde na F-1, aos 29 anos, e nela permaneceu entre 1978 e 1986. Em 1982 foi campeão mundial com somente uma vitória. Nos 128 grandes prêmios disputados (114 largadas), somou só 5 vitórias e 17 pódios por seis diferentes equipes (Theodore, ATS, Wolf, a brasileira Fittipaldi, mais conhecida como Copersucar, Williams e McLaren). Seu filho Nico, nascido na Alemanha em 1985, começou no kar e seguiu a trajetória mais ou menos comum a todos os pilotos da idade, incluindo a Fórmula 3. Chegou à GP2 no ano de estreia da categoria, 2005 e já naquele ano ganhou o campeonato. Foram 10 anos de F-1, duas equipes (Williams e Mercedes), um título mundial (logo depois do qual veio a aposentadoria voluntária que surpreendeu a todos) em 2016, 206 largadas, 23 vitórias e 57 pódios. Depois de abandonar a F-1, não disputou mais nenhuma categoria de carros.
Graham e Damon Hill
O inglês Graham Hill ganhou os campeonatos de Fórmula 1 de 1962 (pela equipe BRM) e de 1968 (pela Lotus). ambas inglesas. Disputou 179 grandes prêmios (foram 176 largadas), 14 vitórias e 36 pódios. Não menciono pontos, especialmente quando escrevo sobre pilotos de outras décadas, porque não faz sentido quando o número de corridas aumentou tanto ao longo dos anos e, especialmente, mudou o sistema de atribuição de pontos. Antigamente o vencedor marcava 10 pontos, hoje são 25. Só aí já há uma grande distorção. Por isso acho melhor comparar número de disputas com número de pódios e de vitórias, porcentualmente. No total, Hill (pai) correu na F-1 de 1958 a 1975. Em 1966 disputou e venceu a 500 Milhas de Indianápolis e em 1972 ganhou a 24 Horas de Le Mans. Essas duas vitórias, somadas a uma em Mônaco, lhe deram o que se chamava Tríplice Coroa. Morreu vítima de um acidente de avião, em 1975. Seu filho Damon tinha 15 anos quando o pai morreu. Aos 23 anos (em 1983) estreou no esporte a motor, mas disputando provas de moto. Ganhou o campeonato de 350 cm³ e só foi para os veículos de quatro rodas em 1984. Começou na Fórmula Ford, onde alcançou algumas vitórias, e em 1989 foi para a Fórmula 3000, onde não ganhou nenhuma prova ao longo de quatro temporadas. Aos 31 anos, já bem tarde, ingressou na Fórmula 1, na equipe Brabham enquanto era piloto de testes da Williams-Renault. Com a saída do também inglês Nigel Mansell em 1993, para dedicar-se às corridas pela CART, Hill passou a fazer dupla com Alain Prost ao volante da Williams. Ajudado pela experiência do francês, ganhou várias provas em 1993. Em 1996 ganhou seu primeiro e único título na F-1. Permaneceu na categoria até 1999 de onde se aposentou depois de ter disputado 122 provas (115 largadas), ter subido ao pódio 42 vezes e ter conquistado 22 vitórias. Sei que são números nada desprezíveis, mas como foi uma época em que já acompanhava de muito perto as provas, sou das que acham que ele era um piloto medíocre num carro muito bom, mas reconheço que sofreu muito com Michael Schumacher que por várias vezes jogou muito sujo com o britânico. Em 1989, Damon Hill tentou a 24 Horas de Le Mans, mas nem concluiu a prova. Ainda assim, a dupla ficou conhecida justamente por ser dos poucos casos em que os dois foram campeões mundiais na F-1.
Michael, Mario e Marco Andretti
Meu pai gostava muito do Mario Andretti que, pelo que vi, era realmente muito bom, mas acho que havia aí uma certa quedinha por ser “oriundo”. Sabem como são os italianos, não? O ítalo-americano Mario ganhou o campeonato de F-1 de 1978 com o imbatível Lotus, com o famoso efeito-solo projetado por Colin Chapman. Como curiosidade, e para não deixar de fazer as minhas digressões, embora eu tenha escrito ítalo-americano hoje ele seria considerado croata, pois nasceu em Motovun, na Ístria, atualmente parte da lindíssima Croácia, mas que na época de nascimento de Mario Andretti fazia parte da Itália. Com a criação da Iugoslávia, a família buscou asilo na Itália e depois nos Estados Unidos, onde Mario começou a correr de Stock Car. Ganhou algumas corridas e foi para a Nascar, intercalando com participações nas 24 Horas de Le Mans. Naquela época era comum um piloto disputar mais de uma categoria ao mesmo tempo. Entre 1968 e 1974, Andretti correu esporadicamente na F-1. Mas foi só a partir de 1975 (e até 1982) que ele se dedicou exclusivamente à categoria. No total foram 131 corridas (128 largadas) , que resultaram em 19 pódios, 12 vitórias e um título mundial, em 1978. De 1982 a 1994, Andretti disputou a IndyRacing Car e levou o título em 1984. Tentou 29 vezes vencer a 500 Milhas de Indianápolis mas apenas uma vez, em 1969, conseguiu.
Os dois filhos de Mario, Michael e Jeff, correram e disputaram provas em diversas modalidades de automobilismo, mas apenas Michael participou da F-1. Ele estreou na CART em 1983, categoria na qual disputou 317 largadas e conseguiu 42 vitórias. Em 1993, Michael foi para a F-1, onde correu pela McLaren. Foram 13 corridas com 1 pódio e nenhuma vitória. Ele correu tendo como companheiro de equipe Ayrton Senna (que ganhou 5 corridas naquele ano) e Mika Hakkinen como piloto-reserva, que no final do ano o substituiria depois de vários acidentes e de uma demissão. Mas o título ficou com Alain Prost naquele ano.
Foi na Indy onde os dois Andrettis tiveram resultados mais parecidos. Em 1991, Michael ganhou o campeonato da IndyRacing Car, para onde voltou depois de uma temporada apagada na F-1, onde ficou até 2002. O maior recordista de vitórias na Fórmula Indy é o americano AJ Foyt, com 67 vitórias, seguido de Mario Andretti, com 52, Scott Dixon, com 50 e Michael Andretti, com 42.
Mas há muitos Andrettis no automobilismo que correm ou correram, alguns ao mesmo tempo. A título de curiosidade, eis a lista: Mario Andretti (pai de Michael), Jeff Andretti (irmão), Marco Andretti (filho), Aldo Andretti (tio e irmão gêmeo de Mario), John Andretti (primo, filho de Aldo), Adam Andretti (primo, filho de Aldo). Hoje quase todos eles estão ligados ao automobilismo, mas como dirigentes de equipe.
Jack, David, Geoff e Gary Brabham
O australiano tricampeão de Fórmula 1 Jack Brabham (1959, 1960 pela Cooper e 1966 pela Brabham) disputou 18 corridas (126 largadas), subiu 31 vezes ao pódio e alcançou 14 vitórias entre 1955 e 1970. Fundou a própria equipe de automobilismo e viu dois de seus três filhos disputarem algumas provas de F-1, embora sem chances e por equipes de pouca expressão. David correu na categoria em 1990 e 1994, num total de 30 corridas, sem nenhum pódio, vitória ou mesmo ponto. Simultaneamente, ele correu a 24 Horas de Le Mans, foi piloto de testes de F-1 da pequena escuderia Footwork. Mesmo tendo corrido pela Brabham (quando seu pai já não tinha participação) e pela Simtek (quando seu pai tinha participação), os resultados não apareceram. Algumas vitórias vieram em outras categorias, como a Turismo e GT e uma vitória na 24 Horas de Le Mans.
Gary Brabham chegou a correr na F-1por apenas duas provas, em 1990, pela equipe Life. E sim, tive de pesquisar porque nem lembrava dessa equipe, fundada pelo italiano Ernesto Vita. Largou em apenas 14 provas, todas em 1990, e não marcou nenhum ponto. Gary correu na Fórmula Ford australiana em 1982 e na Fórmula 3 britânica em 1986-87-88 (ano em que foi vice-campeão). Em 1989 venceu a Fórmula 3000 britânica com 4 vitórias e7 pódios em nove corridas.
O outro filho de Jack Brabham, Geoff Brabham foi campeão da CanAm de 1981. Correu na CART entre 1981 e 1994, disputou a 500 Milhas de Indianápolis e o campeonato IMSA GT, onde foi campeão consecutivamente entre 1988 e 1991. É o pai do também piloto Matthew Brabham, que disputa a Indy Lights.
Mudando de assunto: mal posso esperar para ver a próxima corrida de F-1. Imagino o que deve ser ver Ferrari, com reais chances de fazer uma dobradinha de primeiro e segundo lugar, na Itália. Mesmo sendo em Imola e não em Monza, deve ser incrível.
NG
A coluna “Visão feminina” é de exclusiva responsabilidade de sua autora.