Bem, caros leitores, cá estou eu depois de um breve intervalo. Estive ausente por um bom motivo — bem, para mim, pelo menos: saí numas rápidas férias, decididas de última hora. Apesar do não planejamento, tudo deu muitíssimo certo. Estivemos no Amazonas, um curto período em Manaus e a maior parte do tempo na selva. Eu havia feito a mesma viagem com minha mãe muitos anos atrás, quando meu marido precisou ficar trabalhando e gentilmente transferiu tudo para minha mãe. Nós adoramos e sempre quis voltar, mas desta vez com a cara-metade.
Selva do Amazonas significa, claro, que não tenho nada para escrever nesta coluna, pois nossos deslocamentos foram todos feitos de barco e os mais curtos, pé. Mas recomendo muito essa viagem para quem, como eu, gosta de coisas no estilo Indiana Jones, mas com conforto — sim, ar-condicionado no quarto é fundamental, mas a ausência de televisão foi positiva pois desligamos (OK, o trocadilho é péssimo, mas não resisti) realmente de tudo.
Então, vamos lá. Como havia prometido ao leitor FOC, hoje vou falar sobre alguns exemplos de mulheres desenhistas de carros e até de partes deles. Para não variar, como já imaginam, a ordem em que aparecem os nomes é completamente randômica — ou melhor, depende de minhas lembranças e pesquisas. Até mesmo porque não saberia como listar nomes. Por importância? Impossível. Por ordem alfabética? Como portadora de sobrenome com “C” (sim, na Argentina qualquer lista é feita por sobrenome e o meu de solteira começa com C) tenho um certo trauma de estar sempre entre os primeiros nomes a serem chamados então, não, nada de ordem alfabética.
E um adendo: ao escrever, costumo referir-me a mulheres pelo nome, ao contrário dos homens, que menciono pelo sobrenome. Não é misoginia nem nada, apenas hábito, pois na época em que havia Manual de Redação na imprensa, e ele devia ser respeitado rigorosamente, todos eles estipulavam isso. Nunca questionei, assim como também nunca questionei que siglas acima de três letras desde que pronunciáveis (como Inpe, Inmetro e outros) devem ser grafadas com maiúscula e minúscula. Abaixo disso (como CET ou IPT) ou não pronunciáveis (como CEEE ou CPFL), usa-se tudo em maiúscula. Isto posto, vamos lá:
Michelle Christensen
Depois do sucesso da linha Honda NSX, lançado na década de 1990, a fabricante japonesa se viu em dificuldades para renovar o modelo, que teve um enorme sucesso e foi considerado lendário por muitos. Para desenvolver a segunda geração do NSX que faria parte da linha Acura, a divisão de luxo da Honda, foi chamada Michelle Christensen.
Michelle havia se formado no Art Center College of Design, na Califórnia. Assim que terminou a faculdade, foi trabalhar na Honda e pouco tempo depois foi chamada pela Acura. Em algum momento entre esses dois, trabalhou um ano na GM. Mas, como despertou o interesse dela por desenhar carros? “Meu tio corria com um Plymouth Barracuda 1973 e meu pai preparava seus carros para provas de arrancada. Passei minha infância ao lado de muscle cars e na adolescência convivi com hot rods. Sempre gostei de desenhar pessoas, animais e roupas. Mas nunca havia desenhado automóveis”, disse ela numa entrevista em 2015.
Ela foi a primeira mulher a trabalhar com design exterior na Acura e teve como missão criar um carro que fosse “mais intimidante, mais malvado e mais extremo” do que o NSX, segundo contou a própria Michelle numa entrevista sete anos atrás. Pelo visto, os executivos gostaram do resultado. O diretor-geral da Acura, Mike Accavitti, disse, na época: “Ele parece rápido até quando está parado. É a expressão máxima da marca Acura”. Ah, e o público também adorou, quando o novo modelo foi lançado, em 2015, nos Estados Unidos.
Na Honda, Michelle também participou dos projetos do crossover ZDX e ajudou na reestilização do sedã RLX. E qual é o carro dos sonhos da designer que nos faz sonhar com carros lindos? O Chevrolet Chevelle SS 1967.
Diane Allen
Mais uma mulher e, novamente, numa fábrica japonesa: Diane Allen foi quem desenhou e coordenou o time de design da Nissan que deu forma a modelos como o 370Z coupé, o Titan, o Rogue, o Armada, o primeiro Infiniti M5 e do esportivo 350Z (“meu bebê”, como ela sempre se referiu a esse carro), entre outros. O design de Diane para o 370Z em 2009 se manteve durante anos incluindo em versões posteriores.
Quando Diane desenhou o Titan, nunca havia dirigido um veículo como ele, uma picape gigante. Ela esteve por trás da primeira picape Titan que a Nissan desenvolveu para o mercado americano e também da última geração dela, quando o núcleo que coordenava venceu a competição contra um grupo da divisão japonesa da companhia.
Diane foi diretora sênior de Design na divisão da Nissan em San Diego, EUA. Trabalhou na companhia de 1984 até dezembro de 2019, quando anunciou a aposentadoria. Recebeu diversos prêmios por seu trabalho, incluindo o Gold Award for Industrial Design Excellence.
Tisha Johnson
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Um dos desafios do trabalho da designer Tisha Johnson, designer-chefe de interiores da Volvo (chegou a ser vice-presidente da divisão), dentro da empresa foi unir a forma à função. “Os clientes não estão dispostos a comprometer a beleza de um carro pela praticidade”, disse ela numa entrevista anos atrás. A preocupação de Tisha sempre foi com fazer com que todo o design do veículo fosse primoroso, incluindo o espaço de carga. “Ele tem de ser tão especial quanto o resto do interior do carro”.
Nos modelos como o S90 e o V90, da Volvo é visível o cuidado com o design limpo e elegante da marca sueca. Eles não são apenas carros seguros (a principal identificação que surge sempre quando se fala na marca), mas também são primorosamente desenhados. Nestes dois modelos, Tisha coordenou o projeto desde o espaço para os joelhos dos ocupantes nos banco traseiros, passando pelo suporte ergonômico, até o teto solar panorâmico.
Além do design de veículos inteiros, Tisha foi responsável por projetos-conceito da Volvo, como um banco infantil que realiza giros de 360 graus e um sistema de mostrador digital intuitivo para os painéis da marca. Em 2021, Tisha saiu da Volvo para ser líder global de design da Whirlpool, grande fabricante de eletrodomésticos.
Irina Zavatski
Irina Zavatski (foto de abertura) nasceu no Tajiquistão, então uma república soviética, mas fez carreira nos Estados Unidos, especialmente na Chrysler. Ela se formou na Escola de Artes Criativas de Detroit e no Instituto de Artes de Cleveland, no estado de Ohio.
Irina criou o design exterior do minivan Chrysler Pacifica desde seus primeiros esboços até o lançamento, em 2016, em substituição ao Town & Country. A missão dela, à época foi, textualmente: “fazer o minivan ser legal de novo”. O trabalho foi considerado tão bom que recebeu um convite para participar também da divisão Jeep da FCA, onde desenvolve a renovação do exterior de veículos como o Cherokee e o Renegade. Ela gosta tanto de carros que seu hobby é… pintar quadros sobre carros – especialmente óleos. Seus favoritos são os modelos clássicos e o motivo é muito interessante: “eles tinham menos exigências de segurança, então eles são realmente únicos”, disse Irina numa entrevista em 2019.
E qual é o carro que Irina tem na própria garagem? Ela diz que adorava o Mini Cooper, mas quando se tornou mãe de dois filhos teve de vendê-lo. A nova opção dela parece óbvia: um minivan Pacifica.
Helena Rother
Sim, tudo diz que este nome deveria ter sido o primeiro, pelo menos se a ordem fosse cronológica. Mas vamos lá: Helena Rother foi nada mais e nada menos do que a primeira mulher a se tornar designer de automóveis numa grande fabricante de carros, a General Motors, em 1943.
Naquela época era raro uma mulher ocupar um alto cargo numa grande empresa, mas Helena marcou seu tempo não apenas por ser mulher, mas por ser excelente em sua área.
Toda a história de vida de Helena é interessante. Quando era jovem e ainda morava em Paris, ela criava joias finas, relógios e acessórios para chapéus. Então, a guerra estourou e ninguém podia se dar ao luxo de tais extravagâncias. Quando os alemães ocuparam a França, Helena e sua filha, Ina, embarcaram no primeiro navio que conseguiram, sem se importar com o destino, que era Casablanca, no Marrocos. Lá passaram alguns meses num campo de refugiados até que conseguiram a documentação e foram para Nova York. O primeiro emprego de Helena nos EUA foi como ilustradora na Marvel Comics, onde desenhou o personagem Jimmy Jupiter, que às vezes aparecia em edições ao lado da Tocha Humana e do Namor, o príncipe submarino. Pouco tempo depois, viu um anúncio no qual a General Motors precisava de um designer. Mesmo sem nenhuma experiência industrial, Helena conseguiu o emprego na divisão de design de Interiores de Detroit. Em 1947, Helena foi trabalhar para a Nash Motors, onde desenhava maçanetas e outros itens do interior dos veículos. Em pouco tempo o interior dos carros da Nash virou ícone de bom gosto e luxo, tanto que ela passou a ser anunciada como Madame Heléne Rother de Paris. Era uma grife.
E aqui vai um parêntese: a chegada de Helena à indústria automobilística teve um toque de ironia. Helena era considerada uma péssima motorista, sempre atrasada e sempre correndo de maneira estrambelhada. Vivia sendo parada, levando multas por excesso de velocidade e envolvendo-se em pequenos acidentes, por isso quando foi trabalhar para a Nash Motors e comprou um carro da marca, ninguém se surpreendeu quando, em pouco tempo, ele estava totalmente detonado.
Até sua morte, em 1999 aos 91 anos, Helena havia desenhado ambulâncias, vitrais de igreja, e tênis para a Goodyear, entre uma infinidade de objetos.
Mudando de assunto: adorei ver a corrida de F-1 do Azerbaijão, pois me lembrou quando estive lá de férias. Para mim, sem dúvida, Baku é uma das cidades mais lindas do mundo, ao lado de Praga, Lubliana e Budapeste. Aliás, como já contei neste espaço, foi vendo o primeiro grande prêmio que ocorreu lá que tivemos a ideia de conhecer o país. Mas, claro, a polêmica que ficou foi o “porpoising” (ou o efeito golfinho) dos carros, a imagem de Hamilton saindo do carro como se tivesse um milhão de anos e a reclamação da Mercedes para que a FIA mude o regulamento. Vi que os pulos acontecem em todos os carros e Russell saiu muitíssimo mais inteiro do que Hamilton de um carro igual (nesse sentido). Tem a diferença de idade entre os dois ingleses? Sim, mas Hamilton tem 37, Alonso vai fazer 41 nos próximos dias e Vettel fará 35 em breve e não se queixam disso com tanta insistência ou absolutamente nada e, sinceramente, se o corpo não aguenta é porque está na hora de se aposentar. Racionalmente, vejo outro problema na queixa da Mercedes: se nas outras equipes esse problema não é tão sério é porque investiram nesse acerto, na aerodinâmica, na altura do carro, etc. Com o teto de gastos imposto a todos, é justo que se altere o regulamento no meio do ano para favorecer quem não colocou dinheiro nisso? Agora a Mercedes se vê às voltas com um carro que pula demais e não quer elevar a altura dele para não perder velocidade. Não me parece justo que uma equipe que conseguiu um carro que não pula tanto, seja prejudicada agora por outra que deixou de lado a preocupação e os gastos com o “porpoising”. A Mercedes que invista o que for necessário para arrumar o defeito de conceito do seu carro e se vire para não exceder o teto, como as outras fizeram.
NG