Considero-me uma pessoa medianamente tecnológica. Digo medianamente no verdadeiro sentido da palavra — que está na média. Não sou nenhuma nerd, mas também não passo vergonha quando se trata de usar recursos mais, digamos, modernos. Em muitas coisas não vou além por pura preguiça, pois acho que a tecnologia deve nos servir e não nós a ela. Por isso, preocupo-me (pequena e modesta ênclise) com as coisas que me são mais úteis e acabo ignorando outras. Eventualmente, olho por cima apenas para saber que existem esses recursos e caso um dia venha a precisar deles, saberei onde procurar.
Bem, agora que já usei do meu habeas corpus preventivo, vamos às explicações de porquê disse isto à guisa de introdução. A cada dia os carros incorporam mais e mais tecnologia, o que é natural que aconteça, mas esse ritmo está muito longe de ser seguido pelos motoristas. Eu mesma tive carros durante anos que vendi sem sequer ter usado alguns dos recursos que tinham. Atualmente, tenho um no qual desabilitei uma série de “facilidades” justamente porque não vejo vantagem nenhuma neles.
O primeiro exemplo é o assistente de mudança de faixa, o dispositivo que endurece a direção e avisa ao motorista que ele está mudando de faixa se não tiver dado sinal primeiro. Sou motorista super disciplinada e atenta logo, a chance de eu mudar de faixa sem sinalizar é apenas porque vou fazer a tangência de uma curva (desde que o trânsito permita, obviamente) ou porque vou fazer um ligeiro desvio porque há um objeto na pista, por exemplo.
Novamente, só faço isso sem sinalizar se a manobra é necessária de uma forma imprevista e rápida. Aliás, sempre disseram que andar atrás de mim não tem emoção nenhuma, pois é tudo muito previsível já que sinalizo tudo o que vou fazer e não faço manobras erráticas ou abruptas. Não é que não ache esse dispositivo prático, ele é, mas mais para motoristas desatentos que saem da faixa sem perceber que o estão fazendo. E, como tudo na minha vida, não quer dizer que não habilite de novo essa funcionalidade em algum momento.
Outro dispositivo que desabilito cada vez que sento ao volante é o sistema start-stop, aquele que desliga o motor quando o carro está parado, mesmo que após alguns segundos. Me incomoda esse liga-desliga-liga-desliga, especialmente quando estou dirigindo na cidade e as paradas no trânsito são constantes. Prefiro economizar combustível em outros itens, como evitar acelerar quando estou chegando perto de um sinal que vai ficar vermelho para depois ter de frear.
Nem vou mencionar itens de acompanhamento do estado do veículo possíveis de serem observados no computador de bordo, como consumo de combustível. Minha tela fica num modo que tem pouquíssimas informações — apenas as que uso mais e, se necessário, mudo as configurações, mas geralmente só faço isso na garagem e quando quero algum dado específico. Senão, tela quase vazia ou, na maior parte das vezes, num aplicativo como o Google Maps ou Waze, com eventuais mudanças para ligar o ar-condicionado.
Uma das primeiras vezes que saímos com o carro, recém tirado da concessionária e com muitas configurações pré-estabelecidas, fizemos uma pequena viagem, coisa de uns 70 quilômetros pela estrada para um evento da própria fabricante do carro. Foi um inferno. Como diz o meu marido, temos um carro que consegue falar mais do que eu, o que já é um recorde. Além do Waze no meu celular para saber como chegar no nosso destino, tínhamos o Google Maps do carro (depois aprendemos a bloquear um para usar somente o outro) e ambos falavam e, por óbvio, coisas meio diferentes. Somou-se a isso a série de avisos do computador de bordo, que lia cada placa na estrada. “Velocidade 80 km/h”, por exemplo. Fora os apitos do dispositivo que chiava cada vez que saímos um tiquinho fora da faixa, como no caso de tangência de curva.
Teve mais alguma coisa que agora não lembro, mas sim me recordo que chegamos ao evento com um princípio de dor de cabeça e bastante irritados com tanta falação. Ainda no local, desligamos algumas coisas, mas na volta para casa pegamos o manual e começamos a desabilitar funcionalidades. Já eu falando dentro do carro é mais do que suficiente para provocar dor de cabeça, não precisamos mais vozes ou apitos para piorar a situação. (foto de abertura).
Aquela situação me lembrou uma vez que, em 1990, estávamos nos Estados Unidos com um carro emprestado, um maravilhoso Audi quattro. A pessoa que o emprestou mandou um motorista nos entregar o possante e pronto. Era um carro com muitíssima mais tecnologia e recursos do que estávamos acostumados no Brasil. Lembram quando o então presidente Fernando Collor disse que tínhamos carroças no lugar de carros? Pois é, nossa história foi uns meses antes disso. Enquanto meu marido fuçava o painel e tentava se entender com o bólido, eu resolvi mexer no banco do acompanhante. Sempre preciso fazer isso pois, como vocês já sabem, sou um pouco prejudicada verticalmente. Os controles para todos os ajustes eram elétricos: distância do banco, ajuste lombar, altura do banco, ângulo de inclinação do encosto.
Em algum momento fiquei meio dobrada, como um origami, até conseguir reclinar novamente o encosto e voltar para uma posição mais humana e menos Cirque du Soleil. Mas o pior estava por vir. Foi quando apertei, sem querer, o botão para aquecer o banco. Quem diz que eu conseguia desligar? Antes que torrasse algumas partes sensíveis do meu corpo, mas enquanto andava de um lado para o outro com os acionamentos do banco, conseguimos desabilitar o aquecimento do banco, para nunca mais tocar nesse botão.
O segundo grande problema foi quando precisamos abastecer. A tampa do tanque de combustível era um enigma como a pedra de Roseta para nós. E, claro, o posto era de auto-serviço. Como naquela época eu já tentava vencer minha timidez, entrei no posto e fui pedir ajuda ao sujeito que estava no caixa. Expliquei que o carro era emprestado e que não conseguíamos abrir o tanque. Bem-humorado, ele perguntou se eu tinha um martelo. Respondi que entre as ferramentas havia algo parecido e ele disse: então, quebre a tampa. Deu uma sonora gargalhada e saiu para nos ajudar. O quattro tinha algum macete que agora não lembro, mas que ele nos mostrou para as próximas paradas.
Ficamos com o carro por um mês e foi uma das melhores experiências em termos de direção de veículo que já tive. Mas naquela época não estávamos nem remotamente acostumados a tantos recursos num veículo. Isso, como tudo, é um processo e requer tempo e boa vontade. Nem me refiro aqui ao uso do computador de bordo para obter informações. Certamente há muitos mais dados lá do que os que eu uso e dos que eu preciso.
Em compensação, há outros itens dos quais gosto muito e confesso que alguns já me viciaram. Já falei neste espaço sobre a luz no espelho externo que avisa quando tem algum veículo ou objeto no ponto cego. Ele é especialmente útil em São Paulo com a gigantesca quantidade de motos que circulam entre os carros, fazendo inúmeros zigue-zagues. A luzinha já me ‘segurou” antes de eu mudar de faixa, até porque muito motoqueiro simplesmente ignora a luz de pisca ou apenas acelera para forçar o carro a não mudar de pista e lhe dar passagem. Desde o primeiro carro que tive com ela (e que mantenho até hoje), nunca mais consegui prescindir desse item.
No meu carro mais novo tem outro item do qual estou gostando muito: o dispositivo que vira para baixo o espelho externo ao fazer uma manobra em marcha á ré. Sempre fiz isso manualmente ao estacionar o carro, principalmente quando a rua não é reta e ficar próxima da guia pode não ser fácil. Descobri no ano passado que no exame para tirar habilitação é obrigatório virar o espelho para baixo. Já minha cara metade deshabilita essa função. Ele acha que não é prática e prefere estacionar da maneira convencional. Isso é o bom da tecnologia: usa quem quer, como quer e quando quer.
Mudando de assunto: o final de semana do Grande Prêmio do Japão teve mais um momento fofíssimo. Mais uma vez, protagonizado por Max Verstappen e Penélope, a filha de sua namorada Kelly Piquet. Foi lindo ver o vencedor da corrida ir diretamente para beijar a namorada e ser interceptado por “P” como ele a chama que o abraçou com tanto carinho que virou assunto nas redes sociais. Logo depois, enquanto ele estava no pódio, ela gritava “Maxie, Maxie” querendo chamar a atenção dele, que sorriu e acenou para ela. Este ano ficará marcado pelos momentos ternurinha de crianças de pilotos, como já falei aqui foi o caso da filhinha de Kevin Magnussen. Estou gostando muito de ver de volta um pouco do clima familiar que havia na F-1 na década de 1970, quando esposas e filhos de pilotos estavam sempre no paddock, inclusive a trabalho, como quando cronometravam os tempos dos maridos.
Vejam aqui alguns momentos da comemoração de Max e P.
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NG
A coluna “Visão feminina” é de exclusiva responsabilidade de sua autora.