O percurso já é manjado. De São Paulo a Ubatuba, e respectiva volta. Perto de 500 quilômetros de caminhos variados, da ótima Rodovia Ayrton Senna ao festival de lombadas que virou a popularmente conhecida como Rio-Santos, tudo isso entremeado por descida/subida de serra, estradas de terra — melhor dizendo, de lama, por estarmos em “Ubachuva”, a localidade com um dos maiores índices pluviométricos do planeta.
E o Honda ZR-V, gostou do passeio? Acho que sim, respondendo com atitude de veículo adequado à tarefa de levar quatro adultos e um cão pequeno, e porta-malas lotado, para um longo final de semana. A viagem somou exatos 478,6 km ao hodômetro, e trouxe a devida informação que se pretende de uma viagem para o Teste de 30 Dias.
Premissa básica: os 389 litros anunciados pela Honda como sendo o volume do porta-malas parecem uma medida tímida para um carro deste porte. Todavia, por conta de sua forma — paredes laterais regulares e verticais, e fundo plano alinhado com a porção inferior da 5ª porta — carregá-lo com toda a bagagem não exigiu muita arte, e apenas uma pequena mochila acabou indo parar no assoalho entre os dois passageiros do banco de trás.
Outros detalhes do compartimento de carga merecem comentário, primeiro deles a polêmica solução do ZR-V para esconder o interior do porta-malas de olhos externos, uma tela leve, que pode ser dobrada e guardada no porta-revistas atrás do banco do passageiro (por que não tem no banco do motorista também?). Vantagens desta solução: leveza, jamais será fonte de ruído e é simples. Desvantagens: não permite que se apoie absolutamente nada sobre ela, com exceção de um guarda-chuva ou talvez um paletó. Segundo aspecto que poderia ter sido melhor solucionado é o próprio assoalho do porta-malas, uma placa acarpetada de espessura mínima, que exigirá cuidado com objetos pesados e de formato anguloso, sob pena de ser danificada irremediavelmente.
Sob esta placa, no compartimento dedicado ao estepe temporário, há um porta-objetos de EPS (isopor) preto que, cá entre nós, deve roubar alguns litrinhos de capacidade do compartimento de carga. Fosse meu o ZR-V, daria um jeito de ocupar tal espaço de modo mais útil, aposentando trambolho de isopor na garagem quando necessário, acomodando chave de roda, macaco e triângulo em uma bolsa.
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Terceiro aspecto, este positivo, é a existência de quatro ganchos para amarração de carga no piso do porta-malas, assim como boa é a solução para evitar riscos e consequente má aparência do revestimento das laterais em plástico rígido depois de uso intenso, que foi a de adotar espertamente uma superfície frisada.
Termino o quesito compartimento de carga com uma consideração: tendo em vista a possibilidade grande de ter de ocupar o compartimento até o teto, oferecer — até mesmo como opcional — uma rede para que a bagagem não voe para dentro da cabine em uma eventual freada mais forte seria adequado, porém, na lista de acessórios, só consta uma rede para fixação de carga ao piso, e não uma divisória. Busquei por eventuais pontos de fixação nas colunas traseiras, nada, mas… descobri que a própria telinha de cobertura do porta-malas se encaixa verticalmente no vão, dividindo o compartimento de carga da cabine perfeitamente. O problema é que ela não seria suficientemente forte para conter a carga sem ter uma fixação superior.
Viro a página deste assunto, que pelo visto considero mais importante que os projetistas da Honda, para informar que o porta-malas é bem iluminado (duas fontes de luz, uma de cada lado) e que há a sempre útil tomada de 12 V no compartimento. E mais: antes de carregar o ZR-V rebati os encostos bipartidos (padrão 60:40) e verifiquei ser o plano de carga bastante regular, sem degrau pronunciado. Desta maneira, a capacidade de carga, segundo a Honda, sobe a 885 litros até a linha inferior dos vidros ou 1.306 litros até o teto.
Carro carregado, passageiros embarcados e, de cara, todos comentam sobre o agradável e muito confortável (especialmente atrás) espaço interno, no que pese não haver apoio de braço central, vacilo feio e inexplicável neste padrão de veículo (o ZR-V europeu tem). A viagem, que em tese duraria pouco mais de três horas, durou cinco. Culpa de cerca 25 km de brutal engarrafamento para sair de São Paulo em uma quarta-feira fim de tarde. Haja paciência e, viva o ZR-V e seu interior luminoso, graças ao revestimento claro de teto e bancos e de um teto solar pequeno, que quando totalmente aberto ou posicionado em ângulo ajuda muito no arejamento da cabine em todos os sentidos. Ainda sobre o teto, julgo que o ZR-V mereceria um teto panorâmico, como o que equipou o HR-V Touring de 1ª geração, alvo de um “30 Dias” em setembro de 2019. Aliás, tal equipamento, salvo engano, estranhamente não está disponível nem mesmo no novo HR-V.
Falando de ausências, a turma do banco de trás apreciou o conforto, mas estranhou não haver saídas de ar-condicionado. Checando versões de ZR-V vendidas mundo afora, descobri que tais modelos na Europa (todos híbridos, creio made in Japan) contam com tal item, enquanto os americanos (todos 4×4, made in Mexico, como o nosso) não as tem.
Se atrás os passageiros não contam com saídas de ar-condicionado, quem ocupa os bancos dianteiros tem belas e facilmente ajustáveis grades de dispersão de ar fresco, e com a possibilidade de escolher temperaturas diferentes, duas zonas. Por outro lado, a impressão de conforto dos bancos parece mais acentuada no sofá traseiro que nos bancos dianteiros — o do motorista com ajustes elétricos – uma vez que os assentos não são dos mais macios, algo compensado pelo bom apoio oferecido pelo encosto.
O torturante para e anda deu oportunidade não apenas de aferir o bom conforto geral da cabine como a atuação de dois dispositivos de segurança, o “LaneWatch”, câmera que situada na base do espelho retrovisor direito mostra a respectiva lateral na tela da central multimídia. Um bom recurso, que é ativado sempre que o pisca-pisca é acionado para a direita ou apertando a extremidade da alavanca de seta. O outro dispositivo é o CMBS – sigla em inglês de sistema de frenagem para mitigar o efeito de uma colisão, integrante do sistema Honda Sensing, que detecta iminente colisão e antes de atuar autonomamente no freio faz uma luz laranja piscar no painel, acompanhada de sinal sonoro. É utilíssimo em vias congestionadas, em especial para motoristas distraídos.
Passado o congestionamento, a rodovia de limite de 120 km/h confirma que uma das grandes qualidades do ZR-V é o silêncio a bordo, de nível incomum. Outra boa notícia vem do controle de cruzeiro adaptativo, que permite regular a distância que se deseja manter do veículo à frente quando impostamos uma velocidade de cruzeiro. Como a viagem foi noturna, ponto para os bons faróis de LED e para o farol alto automático, a partir do baixo, quando nenhum veículo é detectado à frente, seja em contrário ou no mesmo.
O Honda Sensing ainda traz ainda o alerta de quando “se come a faixa”, bem como o controle de centralização nela. Tais dispositivos funcionam muito bem, mas exigem habituarmo-nos, uma vez que o volante age independentemente da ação sobre ele, coisa que nem todo mundo digere.
Da rápida Ayrton Senna para a lenta rodovia dos Tamoios (80 km/h, as vezes até 60 km/h de limite) e o ZR-V seguiu oferecendo conforto e grande sensação de segurança. E o motor? E a estabilidade? Plenamente suficientes nesta condição de viagem familiar, na qual nenhuma ousadia é permitida.
A chegada ao destino, marcada por muitas lombadas à beira-mar e um trecho de cerca cinco quilômetros mal conservados, com partes não pavimentadas, fez ver que o ZR-V é alto o suficiente para nunca raspar no solo mesmo carregadíssimo. No trecho final, subida íngreme, na qual muitos carros de tração dianteira tem dificuldades quando o piso está molhado, o Honda não deu trabalho: o sistema de controle de tração “segurou a onda” das mínimas perdas de aderência, assim como foram bem os pneus Michelin Primacy All Season 215/60 R17, medida certa sob o ponto de vista prático, mas talvez tímida sob o aspecto estético.
Chuva constante e, consequentemente, lama, puseram o ZR-V à prova, especialmente nos muitos trechos em desnível acentuado da estradinha local. Seria melhor se ele fosse um 4×4? Seria, mas em nenhum momento houve risco de atolamento ou perda de aderência acentuada. Apenas notei que, em determinadas situações, o ZR-V ergue uma das rodas traseiras do solo, um aspecto que não prejudica a dirigibilidade, mas denuncia um curso de suspensão pequeno, de um carro que, lembremos, deriva do sedan Honda Civic em termos de estrutura.
Na volta da viagem, chuva ainda mais acentuada fez ver a excelência dos limpadores de para-brisa, silenciosos e dotados de um sistema de lavagem dos vidros cujos bicos estão na própria haste dos limpadores, o que proporciona grande eficiência.
Ao cabo da viagem, cabe gastar palavras sobre consumo: no trecho congestionado o computador de bordo registrou míseros 5,5 km/l, cifra que ao concluirmos o trecho rodoviário da ida subiu para 12 km/l. Na volta, serra acima, e sempre sem pressa, respeitando os limites de velocidade rigidamente, a marca foi de 11,4 km/l. Para um motor aspirado de 2 litros em um carro de quase 1,5 tonelada em ordem de marcha, que carregado beirou as 2 toneladas, a cifra me pareceu coerente, lembrando que o motor do ZR-V só admite gasolina. Importante: o tanque de 50 litros permitiu percorrer quase 500 km e ainda oferecer boa reserva de acordo com o computador de bordo.
Para a sequência do Teste de 30 Dias, a análise técnica de Alberto Trivellato, mais viagens e uso urbano intenso, quesito no qual ouvir a opinião feminina é importante, especialmente neste mundo dos suves, no qual elas formam um grupo de clientes muito expressivo.
RA
Leia o relatório anterior: 1ª semana
Honda ZR-V
Dias: 14
Quilometragem total: 600,7 km
Distância na cidade: 172,1 km (29%)
Distância na estrada: 428,6 km (71%)
Consumo médio: 9,5 km/l
Melhor média: 12,5 km/l
Pior média: 5,5 km/l
Média horária: 34 km/h
Tempo ao volante: 17h56 minutos
FICHA TÉCNICA HONDA ZR-V TOURING | |
MOTOR | |
Designação | K20Z5 |
Descrição | Dianteiro, transversal, bloco e cabeçote de alumínio. duplo comando de válvulas, corrente, controle de fase e de levantamento na admissão e escapamento, árvores contrarrotativa de balanceamento, injeção no duto, sistema de injeção PGM-FI. gasolina 91 RON (comum) |
Cilindrada (cm³) | 1.996 |
Diâmetro x curso (mm) | 86 x 85,9 |
Potência (cv/rpm) | 161 / 6.500 |
Torque (m·kgf/rpm) | 19,1 / 4.200 |
Taxa de compressão (:1) | 10,8 |
Densidade de potência (cv/L) | 80,6 |
Densidade torque (m·kgf/L) | 9,6 |
TRANSMISSÃO | |
Tipo | Transeixo Honda dianteiro com câmbio automático CVT, trocas manuais sequenciais por borboletas, modo Sport, conversor de torque, tração dianteira |
Número de marchas | 7 |
SUSPENSÃO | |
Dianteira | Independente McPherson, braço de controle triangular, mola helicoidal, amortecedor pressurizado e barra antirrolagem |
Traseira | Independente multibraço, mola helicoidal, amortecedor pressurizado e barra antirrolagem |
DIREÇÃO | |
Tipo | Pinhão e cremalheira, dois pinhões, eletroassistida indexada à velocidade |
Relação de direção (:1) | 12,5 |
Diâmetro mínimo de curva (m) | 11 |
Voltas entre batentes | 2,8 |
Diâmetro do voante (mm) | 370 |
FREIOS | |
Atuação | Servoassistência a vácuo, duplo-circuito em diagonal, ABS, distribuição eletrônica das forças de frenagem, auxílio a frenagens de emergência |
Dianteiros (Ø mm) | Disco ventilado / 312 |
Traseiros (Ø mm) | Disco / 310 |
Freio de estacionamento | Eletromecânico, atuação rodas traseiras |
RODAS E PNEUS | |
Rodas | Liga de alumínio, 6,5J x 17 |
Pneus | 215/60R17H (Michelin Primacy All Season) |
Estepe | Temporário estreito T135/90D17M com roda de aço |
CONSTRUÇÃO | |
Tipo | Monobloco em aço, suve, 4 portas, 5 lugares, subchassi dianteiro e traseiro de alumínio |
DIMENSÕES (mm) | |
Comprimento | 4.568 |
Largura sem / com espelhos | 1840 / 2.093 |
Altura | 1.611 |
Entre-eixos | 2.655 |
Distância mínima do solo | 178 |
ANGULOS (º) | |
Entrada | 16,4 |
Saída | 20,2 |
Transposição de rampa | n.d. |
PESOS E CAPACIDADES | |
Peso em ordem de marcha (kg) | 1.446 |
Capacidade de carga (kg) | 464 |
Peso bruto total (kg) | 1.910 |
Volume do porta-malas (L) | 389 / 1.306 com os encostos do banco traseiros rebatidos |
Tanque de combustível (L( | 53 |
DESEMPENHO | n.d. |
CONSUMO DE GASOLINA, INMETRO | |
Cidade (km/L) | 10,2 |
Estrada (km/L) | 12,1 |
GARANTIA | 3 anos |