Para mim uma das melhores coisas da vida é viajar. Outra é dirigir. Logo, alugar um carro e sair por aí nas férias está na minha lista de coisas que antecedem o Nirvana. Como sou muito curiosa, de uma forma em geral quando chego a um lugar já tenho algum conhecimento prévio sobre o país ou a cidade em si, mesmo que não tenha tido tempo de ler muito. Mas nem sempre consigo pesquisar sobre meu destino e uma vez só soube para onde ia quando estava dentro do avião. Mas em minha defesa naquela ocasião não alugamos carro, só andamos a pé, de táxi e num navio.
Mas voltemos a minha história inicial. Há muitos e muitos anos fui de férias aos Estados Unidos. Três semanas na Flórida e outra na Califórnia — bons tempos aqueles em que conseguia tirar férias realmente longas! Para as primeiras três semanas, meu marido e eu decidimos convidar nossas mães. Sim, vocês leram bem. O casal viajou com as duas sogras. Tão estupefato quanto vocês ficou o sujeito da Imigração dos Estados Unidos. Ele me perguntou quem estava no meu grupo e eu respondi. Ele voltou a perguntar, achando que eu tinha me enganado no inglês!
Havíamos alugado uma casa em Kissimmee, bem pertinho de Orlando, por uma semana. O imóvel era superbacana e ficava num condomínio onde a maioria das pessoas morava de maneira permanente e os inquilinos eram também moradores. Naquela época era raro turistas alugarem casas. Para completar o quadro “não somos turistas”, ao saber que ia aos Estados Unidos uma fábrica de carros me ofereceu um veículo emprestado enquanto estivesse lá. Vantagens de jornalista que já naquela época escrevia sobre a indústria automobilística… Ou seja, nem placas de “Budget” o carro tinha.
Recebi o carro quase zero, recém-enviado de Detroit. Maravilha. Um Audi quattro fantástico. Dava gosto dirigir. Chegamos em Kissimmee logo depois do almoço e nos dirigimos à nossa casa. Já dentro do condomínio, ficamos rodando por alguns quarteirões atrás de um ônibus escolar, igualzinho aos que tinha visto nos filmes. Amarelão mesmo. Na primeira parada, meu marido sinalizou com pisca para a esquerda, olhou e se adiantou ao ônibus. Imediatamente aconteceram várias coisas ao mesmo tempo: um bracinho na forma de uma placa de “Pare” se ergueu da lateral do ônibus, bem no meu nariz e a motorista gritou uma longa série de impropérios exatamente na minha orelha. Eu, meio surda e quase cega, não entendia nada. Meu marido seguiu dirigindo super devagar, também sem entender nada. As duas mães no banco de trás menos ainda e ainda ficaram mordidas por verem seus filhinhos queridos e perfeitos serem xingados por uma desconhecida furiosa.
Chegamos em casa nos perguntando o que tínhamos feito errado. Eu O-D-E-I-O fazer coisas erradas, principalmente fora do meu país. Me preocupo com os estereótipos, que achem que “brasileiro é assim mesmo, sem educação” e por aí vai. Quando pequena, minha mãe sempre me disse para me comportar bem em casa, mas na casa dos outros tinha que me comportar mais do que bem, como uma verdadeira princesa. Imaginem então meu remorso. Começamos a levantar várias hipóteses, tipo “será que você deu mesmo seta?”, “será que a luz do pisca não funciona?”, mas nada dava indícios de porquê fomos merecedores de tamanho xingamento. Somente um par de dias depois descobrimos que nos Estados Unidos quando um ônibus escolar pára para pegar ou desembarcar crianças uma luz na parte superior do ônibus acende e os carros são obrigados a parar. É proibido ultrapassar o ônibus (aãaa, agora sabemos) e mesmo os carros que vêm na direção oposta têm que parar, pois uma criança pode atravessar na frente do ônibus mesmo que seja no meio do quarteirão. No horário de entrada e saída das escolas (por volta das 8 da manhã e às 3 da tarde), as ruas em volta das escolas têm um poste que pisca uma luz amarela que significa que você tem que diminuir a velocidade para 20 milhas por hora (32 km/h) mesmo que não tenha nenhuma criança por perto.
Bacana, dar tanta importância às crianças, especificamente àquelas que estão estudando. Me parece que passa uma mensagem de que são importantes e que devemos dar prioridade a elas. Gosto desse princípio, pena que não conhecia as normas de trânsito específicas.
Claro que cada país tem suas particularidades, inclusive no trânsito, e depois desse mico passei a me preocupar em conhecer mais sobre a legislação antes de viajar. OK que “dê a preferência” é um triângulo invertido em qualquer país do mundo, mas tem as pegadinhas como a do ônibus escolar. Até hoje às vezes me atrapalho com a conversão à direita mesmo com o sinal fechado. Canadá é de um jeito e Estados Unidos, dependendo do tipo de via, de outro. Na dúvida, freio e espero o de trás buzinar. Aí então, acelero e viro. Posso não ser a motorista mais simpática do ano com isso, mas evito uma multa — a não ser que um engraçadinho sabedor disso buzine de propósito e me faça andar quando não deveria. Mas prefiro não pensar nessa possibilidade. Meus leitores não fariam essa maldade comigo e por enquanto vocês são os únicos que sabem que eu faço isso.
Mudando de assunto: Não quero parecer implicante com o prefeito de São Paulo, mas ele dá muito motivo para críticas. Agora ele reduzirá em 27% a quantidade de ônibus na cidade. Dos atuais e insuficientes 15.000 passaremos a 11.000, e com maior número de bi-articulados, que levam mais passageiros e não têm cobrador. Segundo ele, aumentará a oferta de lugares e a velocidade será maior. OK, pode ser desde o ponto de vista de uma planilha Excel, mas e quem terá de ficar no ponto esperando mais 27% de tempo vai gostar disso? E os sindicatos? Isso significa 27% menos motoristas e um número ainda superior de cobradores a menos. Salvo engano, só vejo vantagem para as empresas de ônibus…
NG
Foto de abertura: huffingtonpost.com
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