Em 1998, Leonardo Fioravanti mostrou uma criação sua no Salão de Turim, batizado de F100. Seu nome não é nem de perto conhecido como dos outros estilistas de automóveis italianos famosos, por ter trabalhado por vinte e quatro anos, começando em 1964, não no seu próprio estúdio ou casa de estilo, mas para a Pininfarina.
Ele havia desenhado vários modelos Ferrari anteriormente, uma lista de tirar o fôlego: Dino, 365 GTB/4 Daytona, P5, P6, 512 Berlineta Boxer, 308 GTB, 288 GTO, 365 GT 4 2+2 (que seria depois a série 400) e simplesmente o F40.
O F100 foi feito por ele para comemorar os 100 anos do nascimento de Enzo Ferrari, daí o nome do carro.
Numa comparação feita por especialistas da disciplina de desenho de automóveis, Giugiaro é considerado o melhor intérprete de Maseratis cupê, assim como Marcello Gandini foi o homem que deu à Lamborghini sua fama pelos estilos que criou, e Leonardo Fioravanti é o italiano que melhor exprimiu a essência de desenho de Ferraris. Não posso deixar de concordar, já que seus trabalhos estão entre os melhores de todos os tempos, com o ápice da marca sendo o F40.
O modelo F100 tinha dimensões nada exageradas, sendo menor que Ferraris mais novos com motor central-traseiro. Tem 4.390 mm comprimento, 1.910 mm largura, 1.140 mm altura e entreeixos de 2.550 mm.
Grade dianteira e lanternas traseiras são bem de acordo com modelos antigos, mas o carro não tem nada de retrô. Na frente e traseira pode-se ver o emblema com as letras LF, iniciais do estilista, assim como no volante.
As rodas são algo à parte. Não são de liga leve, solução universal em qualquer carro que não esteja entre os menos caros da produção mundial, mas sim de aço. Leonardo sabe, como muita gente, que a liga pode ser leve, mas para ela ter a mesma resistência do aço, normalmente acaba resultando em rodas mais pesadas do que as mais baratas e de desenho por muitas vezes desprezado, por ser apenas um disco de aço estampado com furos para ventilação de freios.
Fioravanti trabalhou com o fornecedor especialista Fergat para conseguir peças de desenho otimizado em computador através de simulações, não tão comum ainda em final dos anos 1990. Por não ser muito profunda em relação à face dos ombros no pneu, as rodas tem desenho que não cria turbulências excessivas.
O ponto triste no F100 pode ser verificado ao se analisar debaixo da cobertura transparente do motor. Se a tradicional posição e a cobertura que permite ver o motor não era novidade, notava-se o motor falso, apenas um mock-up, uma maquete, não uma mecânica de verdade. Havia espaço para o V-10 de Fórmula 1, mas como o modelo não foi encomendado pela Ferrari, não se forneceu uma mecânica funcional. Algo no mínimo desagradável, considerando-se a carreira de Leonardo e a homenagem justa ao Commendatore.
O que choca quando se compara a modelos atuais de produção é a simplicidade do interior. Se hoje temos uma incrível poluição visual que beira o desagradável em muitos supercarros não apenas da marca italiana mais famosa, esse carro é o ápice da simplicidade para algo dessa categoria. Não há console central, já que as trocas de marchas seriam feitas por aletas junto do volante. Os bancos têm extensões para apoiar pernas e pés. Os instrumentos são simplíssimos, nem parecendo de carro concebido para ser bastante caro.
O desenho geral da carroceria favorecia a resultante de força em direção ao solo nos dois eixos, com coeficientes negativos de sustentação (CL). Na dianteira de – 0,25 pela forma curva desde a borda dianteira até antes do para-brisas, e traseiro de – 0,33 pelo aerofólio enorme.
Há dois freios aerodinâmicos, um embaixo e outro junto do aerofólio traseiro. Para o motor há duas tomadas de ar que são dutos por sobre o arco do teto, no alinhamento das colunas A e B, cujas aberturas estão imediatamente sobre o pára-brisa e início do teto, uma região de alta pressão. É um ponto interessante do desenho técnico-artístico do carro, pontos de honra de Leonardo Fioravanti, que tem formação de engenheiro mecânico e é especializado em aerodinâmica.
Dois anos depois que o F100 foi sensação em Turim, veio o F100r, um roadster, carro cujo desenho é feito para não ter capota, portanto, não pode ser chamado de conversível, onde a principal novidade era o pára-brisa com forma curva, com várias superfícies combinadas. Foi projetado utilizando análise de computador para dinâmica de fluidos, abreviado CFD (computational fluid dynamics) para evitar turbulência nos ocupantes e dirigir ar para a linha de cintura e para as entradas de ar do motor.
A cobertura do motor é bem alta, e serve como proteção para as cabeças em caso de capotagem ou tombamento, com superfície concordante com as áreas de apoios de cabeças dos bancos.
Depois de uma década da apresentação do F100, em 2008 a empresa Fioravanti S rl foi contratada por um cliente do Japão, Junishiro Hiramatsu, para fazer um veículo funcional que foi batizado de SP1, e inclui alguns poucos elementos criados e aplicados no F100. Ao menos essa é a versão oficial de inspiração do cliente e do estúdio, apesar de não ser tão evidente.
O carro, exemplar único, foi feito modificando-se um Ferrari F430, e podem ser vistas as linhas das laterais e os faróis de contorno mais afilados, além da traseira bastante diferente, resultando em um carro bem mais interessante visualmente que o original Ferrari, principalmente pela modificação nas linhas das tomadas de ar dianteiras e a quase total eliminação de contornos exageradamente arredondados do F430, tendências que seriam seguidas pela própria Ferrari em modelos que viriam, como o 458 Italia.
Muitas vezes, o que parecia ser apenas uma idéia sem sentido acaba sendo utilizada depois de muito tempo por quem deveria ter feito algo a respeito na hora certa.
JJ