Se eu perguntar o que o leitor imagina como carro ideal, a resposta certamente conterá ser barato, leve, resistente, econômico, simples, funcional, confortável, grande área envidraçada sem pontos cegos, seguro, boa posição de dirigir, boa performance, bonito, aerodinâmico, fácil de estacionar, fácil manutenção, boa dirigibilidade etc.
O que é um carro barato ? Custar R$ 20.000, R$ 30.000,00…
O que é um carro leve? Pesar 800 kg, 1.000 kg…
Veja o leitor que a maioria das respostas são subjetivas e comparativas com os modelos de veículos disponíveis no mercado.
Estabelecer métricas adequadas para uma determinada classe de veículo é, na realidade, a essência de seu projeto, englobando todos os objetivos traçados pelo fabricante em termos de custos e entrega de atributos.
Vou dar um exemplo prático, a escolha dos pneus. O balanço é ficar elegante e funcional, partindo da premissa que o estreito é feio e o largo é bonito.
É parâmetro fundamental do pneu manter a segurança do veículo em todas as manobras dinâmicas com transferência de carga, tanto no sentido longitudinal como transversal, frenagens, curvas, mudanças de faixa de rolamento, em piso seco e molhado.
A relação carga vertical atuante na manobra por área de contacto pneu com o solo (“mancha”) é uma das características responsáveis pela segurança de rodagem. Veículo muito leve para uma grande área de contacto pode se tornar sensível a aquaplanagem, por exemplo.
O esforço direcional também depende da “mancha” de contacto com o solo, além da geometria da suspensão e direção, incluindo o diâmetro do volante. Em veículos com assistência hidráulica ou elétrica, fica bem mais fácil estabelecer o melhor compromisso.
Me lembro do Escort XR3 1983/84 com pneus 185/60-HR 14 e com o volante de direção lindíssimo porém com pequeno diâmetro (360 mm), que resultava em um grande esforço direcional, principalmente em manobras. Foi um item muito reclamado principalmente pelas mulheres e corrigido nos modelos seguintes, com volantes maiores.
Pode ser que eu seja um sonhador, porém com a tecnologia atual de materiais e das ferramentas virtuais de projeto e processos de manufatura, as fábricas de automóveis têm tudo para satisfazer o leitor/cliente na maioria de seus desejos, basta querer. Quem sabe o mais difícil seja encontrar designers que criem obras-primas tão em falta no mercado atual. As décadas de 1950, 1960 e 1970 foram anos de ouro no surgimento de estilistas de valor, verdadeiros artistas! Como foi o caso do italiano Pio Manzù, que se destacava na época com suas criações inteligentes e de grande conteúdo estético e funcional, valorizando em seus projetos os espaços internos e a habitabilidade.
Bons projetos são sempre elogiáveis e normalmente alavancam o sucesso das empresas. Dentre os projetos de Pio Manzù, quem sabe o mais valioso viabilizado em produção, seja o Fiat 127, com a fórmula pequeno por fora e grande por dentro.
O pequeno Fiat 127 foi lançado na Europa em 1971 e logo eleito o “Carro do Ano” em 1972, pelos jornalistas europeus. Com apenas 3,59 m de comprimento, era espaçoso e leve com seus 700 kg, mantendo razoável desempenho com seu motor 4-cilindros em linha de 903 cm³ (45 cv), de três mancais e comando de válvulas no bloco, instalado transversalmente no eixo dianteiro. Com suspensão dianteira McPherson com mola helicoidal, tinha a suspensão traseira de conceito bem interessante, independente e McPherson também, mas feixe de molas instalado transversalmente na linha do eixo traseiro, que pela atuação agia também como barra estabilizadora. Outro ponto de destaque era o estepe instalado no compartimento do motor para ganhar espaço interno. Sua velocidade máxima era de 141 km/h
Com sucesso crescente, foi o veículo mais vendido na Europa em 1975, batendo todos o seus concorrentes diretos VW Polo, Renault 5, Fusca e Citroën 2CV. Foi produzido na Europa de 1971 a 1983 com um total de 3,8 milhões de unidades produzidas.
A Fiat queria entrar no mercado brasileiro que passava pela grande crise do petróleo iniciada em 1973. A decisão resultou em um grande investimento na cidade de Betim, na região da Grande Belo Horizonte, em Minas Gerais, uma moderna fábrica para produzir o pequeno Fiat 147, baseado no seu irmão italiano Fiat 127.
Apresentado em 1976 no Salão do Automóvel em São Paulo, tinha como slogan ser o veículo mais econômico do segmento. As propagandas divulgavam esta característica aos quatro ventos, tanto é que a Fiat patrocinou um teste de economia de combustível na Ponte Rio–Niterói. O 147 percorreu os 13,3 km de extensão da ponte com apenas 1 litro de combustível no tanque.
Outro teste interessante patrocinado pela Fiat foi descer os 365 degraus da igreja da Penha no Rio de Janeiro para demonstrar a robustez de sua suspensão e carroceria.
No pioneirismo do Fiat 147, destaca-se que foi o primeiro veículo fabricado no Brasil a conter todos os segmentos: hatch, sedã, perua, furgão e picape. Só não veio o conversível.
Apelidado de pequeno notável tinha um moderno e inédito motor de 1.049 cm³, com comando de válvulas no cabeçote acionado por correia dentada. Como nem tudo são flores, a famigerada correia dentada tinha pouca durabilidade e vira e mexe quebrava deixando os proprietários na mão. O problema era grave, pois na quebra os pistões “atropelavam” as válvulas causando um grande estrago. Outro problema freqüentemente reclamado era a posição pouco ergométrica do volante da direção, embora fosse apenas questão de ajuste errado do banco em relação ao volante, querer ficar muito afastado.
O estepe também era instalado dentro do cofre do motor como o seu irmão 127. Quer inteligência maior do que adotar este conceito para ganhar espaço interno?
Outra curiosidade é que o Fiat 147 foi o primeiro veículo brasileiro com tração dianteira a adotar a posição transversal do motor para ganhar espaço interno, com a eliminação do túnel da transmissão.
Outra qualidade do 147 era ser o veiculo brasileiro mais estável da época com características “fun to drive” que chamava a atenção.
Destaque para o modelo esportivo de série, a versão 147 Rallye lançada em 1978 com motor 1300-cm³, carburador Weber de corpo duplo e 72 cv a 5.800 rpm. Chegava a 145 km/h.
Em 1979 a Fiat inova novamente lançando o 147 como o primeiro carro movido a álcool do Brasil.
O Fiat 147 foi produzido no Brasil de 1976 a 1983/84
Aqui entre nós, o pequeno Fiat 147 é cultuado até hoje como carro de tuning, com motorzão turbo e outras alegrias mais. Eu também gostaria de ter um para deixar muito carro comer poeira…
Como de costume encerro a matéria com uma homenagem.
Eu não poderia deixar de elogiar a Fabbrica Italiana Automobili Torino que no Brasil é a marca que, sem dúvida, conhece nosso mercado como ninguém.
CM
Créditos: carplace.uol.com.br – webmotors – Fiat automóveis S.A. Gerência de comunicação